Discurso durante a 152ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a crise do ensino superior no Brasil, exposta por indicadores divulgados pelo Ministério da Educação - o Índice Geral de Cursos das Instituições e o Enade - Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes 2008 - e a preocupação de S.Exa. com a intenção do governo federal de instituir uma política de cotas raciais nesse sistema. (como Líder)

Autor
Demóstenes Torres (DEM - Democratas/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENSINO SUPERIOR. EDUCAÇÃO.:
  • Considerações sobre a crise do ensino superior no Brasil, exposta por indicadores divulgados pelo Ministério da Educação - o Índice Geral de Cursos das Instituições e o Enade - Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes 2008 - e a preocupação de S.Exa. com a intenção do governo federal de instituir uma política de cotas raciais nesse sistema. (como Líder)
Aparteantes
Flávio Torres, Wellington Salgado.
Publicação
Publicação no DSF de 10/09/2009 - Página 42373
Assunto
Outros > ENSINO SUPERIOR. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO, AMBITO NACIONAL, ESTUDANTE, ENSINO SUPERIOR, DEMONSTRAÇÃO, INFERIORIDADE, CLASSIFICAÇÃO, CURSO SUPERIOR.
  • COMENTARIO, PRECARIEDADE, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, SETOR PRIVADO, INSUFICIENCIA, CAPACIDADE PROFISSIONAL, CORPO DOCENTE, DEFESA, NECESSIDADE, MELHORIA, QUALIDADE, APLICAÇÃO DE RECURSOS, EDUCAÇÃO.
  • CUMPRIMENTO, EMPENHO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), EFICACIA, FISCALIZAÇÃO, ACOMPANHAMENTO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, NIVEL SUPERIOR, REGISTRO, COBRANÇA, ENTIDADE, INFERIORIDADE, RESULTADO, AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO, PROVIDENCIA, MELHORIA, INDICE, QUALIDADE.
  • IMPORTANCIA, PROGRAMA, AVALIAÇÃO, SUPERVISÃO, SISTEMA DE ENSINO, CONTESTAÇÃO, AUSENCIA, CRITERIOS, AFERIÇÃO, CONTROLE, DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL, POSSIBILIDADE, CRIAÇÃO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, NIVEL SUPERIOR, INSUFICIENCIA, CAPACIDADE, ENSINO, APREENSÃO, INTERESSE, GOVERNO FEDERAL, ESTABELECIMENTO, COTA, INGRESSO, CURSO SUPERIOR.
  • CONCLAMAÇÃO, SENADOR, VOTAÇÃO, PROJETO, AUTORIA, ORADOR, ESTABELECIMENTO, INTEGRALIDADE, TEMPO, ENSINO FUNDAMENTAL, CRITICA, OBSTACULO, GOVERNO FEDERAL, APRECIAÇÃO, MATERIA, ALEGAÇÕES, EXCESSO, DESPESA, IMPLANTAÇÃO, PROPOSTA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. DEMÓSTENES TORRES (DEM - GO. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, “mais estudo, menos violência”. Manchete da revista Veja.

            Na última semana, o Ministério da Educação (MEC) divulgou dois indicadores que expõem a crise do sistema superior de ensino no Brasil. Primeiro foi o Índice Geral de Cursos das Instituições (IGC) e, depois, o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes/2008 (Enade). Em ambos fomos lamentavelmente reprovados.

            Antes de comentar os indicadores, eu gostaria de deixar claro que considero muito bom que o Brasil tenha programas de avaliação e supervisão dos sistemas de ensino. A providência administrativa é essencial para que possamos atingir padrão de qualidade. Foi exatamente a falta de critério de aferição e controle do desenvolvimento da educação superior no passado que permitiu a proliferação irresponsável de instituições sem a menor capacidade de ensino, pesquisa e extensão, em flagrante rompimento com o que prescreve a própria Constituição de 1988.

         O que realmente me angustia é saber que é sobre essa base extremamente frágil que o Governo Federal pretende forçar a construção da política de cotas raciais, como se o problema fosse o de dividir o bolo para corrigir uma injustiça histórica, quando em realidade há algo de rançoso na iguaria. Tão estarrecedor como os indicadores de ineficiência apresentados é o empenho do Governo Federal em instituir a política de cotas raciais com a finalidade de protagonizar uma ação afirmativa. A junção dos índices negativos do ensino superior com a medida racialista significa a democratização do engodo.

            Os números do Índice Geral de Cursos das Instituições (IGC) - que expressa a qualidade dos cursos de graduação, mestrado e doutorado - mostram que os erros de tal conduta permissiva propiciaram a instalação de verdadeiras fábricas de diplomas sob o pretexto de universalização do acesso à escola de terceiro grau. No lugar de exigir instituições destinadas a produzir conhecimento e formar uma reserva de mão de obra capacitada, a opção foi a desastrosa tolerância com um sistema simulado de aprendizado, que começa mal em sala de aula por falta de preparo ao professor e piora à medida que não há suporte de laboratórios e bibliotecas.

            A reprovação de nada menos do que 36,4% dos 1.613 centros universitários, faculdades e universidades e a constatação de que apenas 1,3% conseguiu atingir cotação de excelência permite dizer, sem exagero, que o ensino superior no Brasil não é em parte um simulacro - é mais do que isso. Vejam que, em uma escala de pontuação de 1 a 5, 19% obtiveram conceito 1; 28%, o conceito 2; 44%, conceito 3; e 5% das faculdades conseguiram atingir o conceito 4. São mais de 700 mil alunos universitários a reproduzir um padrão de conhecimento semelhante ao do analfabeto funcional.

            Isso é especialmente visível nas instituições privadas, cuja indústria de certificação de ensino superior teve uma margem de reprovação de quase 40% com notas 1 e 2. O mais grave, contudo, é que, quando comparado o resultado do IGC com o ano anterior, os indicadores mostram tendência de piora das instituições de ensino. Enquanto em 2007 havia 454 universidades, centros universitários e faculdades em situação inadequada, em 2008 o número pulou para 588 instituições de ensino superior.

            Vigora no Brasil, Sr. Presidente, um mito segundo o qual a universidade pública é destinada aos ricos e a particular aos pobres e desprotegidos. Não é verdade! Ambas são ocupadas primordialmente pelos filhos da elite brasileira e no geral não têm qualidade, embora 52% das universidades federais tenham passado no “vestibular” do IGC. Metade é muito pouco quando se fala de uma instituição que deve ser a vanguarda na produção de conhecimento de um País que pretende se projetar como protagonista global.

            Na semana passada, o MEC divulgou os resultados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade 2008) e os números naturalmente não são bons. No geral, o MEC avaliou 7.329 cursos em 30 áreas de conhecimento. Do total, 34,2% não obtiveram nota por não apresentarem o número de concluintes nos cursos de graduação. Dos que foram examinados, 4.819 conseguiram conceito. O UOL Educação fez as contas e concluiu que 1.752, ou 36,4% tiveram um desempenho ruim, com notas entre 1 e 2, sendo que destes 74% referem-se a faculdades privadas. Já os cursos de ponta, os que obtiveram nota 5, constam apenas 293, Senador Flávio Torres, o que gera um resultado segundo o qual há no Brasil seis boas escolas universitárias para cada grupo de 100 instituições superiores de ensino.

            O Enade 2008 mostrou ainda o quanto é falha a formação do professor brasileiro. De acordo com os dados, dos 763 cursos de graduação em pedagogia avaliados, apenas nove conseguiram nota máxima. São 71 mil alunos em 292 cursos que receberam os piores conceitos do MEC, o que faz com que um em cada quatro professores seja formado em instituição considerada ruim. E a situação, vejam as Srªs e os Srs. Senadores, também piorou em relação a 2005, quando o curso de pedagogia recebeu a última avaliação do Enade. Há três anos havia 172 cursos com notas 1 e 2, o que representava 28,8%, e agora o percentual subiu para 30,1%.

            Ao analisar os números do Enade 2008, Senador Geraldo Mesquita, o Folha Online identificou situação semelhante entre os cursos de pedagogia e engenharia. De acordo com a reportagem, também “um em cada quatro engenheiros do País se formou em cursos inadequados.” Em números absolutos, 6,3 mil dos 24,9 mil formandos da área que participaram no ano passado da avaliação federal estavam em cursos com notas 1 e 2, - os engenheiros - as mais baixas na escala de qualidade. Estamos a falar, repito, do engenheiro, de um profissional absolutamente essencial ao desenvolvimento do Brasil e de um setor que apresenta carência histórica de mão de obra qualificada.

            Os dados são ruins, mas a boa notícia que se extrai destes retratos fiéis da educação superior brasileira é que o Ministério da Educação tem cumprido o seu papel de fiscalização e monitoramento das instituições de ensino de terceiro grau. O MEC, ainda na semana passada, anunciou medidas contundentes para forçar as escolas de baixo desempenho no Conceito Preliminar de Curso - outro parâmetro de avaliação do Ministério da Educação que analisa in loco as instituições de ensino - a reverter os indicadores de qualidade. Entre as providências constam a suspensão do exame vestibular, a redução do número de vagas oferecidas e o arquivamento do processo de autorização de cursos. Aproximadamente 2,5 mil vagas em 83 cursos de graduação serão cortadas e 357 cursos deixarão de ser abertos em instituições de educação superior com desempenho abaixo do considerado satisfatório pelo Ministério da Educação. Conforme muito bem pontuou a Secretária de Educação Superior, Maria Paula Dallari Bucci, “a lógica do trabalho é estabelecer consequências às avaliações e valorizar a qualidade da educação”.

            Sr. Presidente, toda vez que se divulgam dados sobre o desempenho da educação brasileira aparecem várias opiniões convergentes para a necessidade de se investir mais em educação. Concordo em parte, pois acredito que o melhor a dizer é que precisamos melhorar a qualidade do gasto com educação. Veja que o Brasil investe por aluno do ensino superior anualmente R$12.322,00 - conforme dados do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) referentes a 2007. Valor muito próximo da média do mesmo parâmetro de gasto dos países que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD), instituição que agrega os 30 países do primeiro mundo. Então, não se pode dizer precipitadamente que faltam recursos para o ensino superior, falta talvez qualidade na aplicação dos mesmos.

            Para finalizar, Sr. Presidente, eu gostaria de ressaltar que os recursos do pré-sal, daqui a 20 anos, talvez vão gerar possibilidades de investimento que demandarão capacidade tecnológica instalada para que seja atingido o interesse nacional. Não se faz um cientista em menos de três décadas. No mesmo sentido, vamos precisar de mão de obra altamente qualificada para operar o ritmo de desenvolvimento que se projeta extraordinário. Como vamos fazê-lo sem excelência universitária? Como o País pretende ter assento no clube das nações hegemônicas com apenas 1% das instituições superiores de ensino realmente de qualidade?

            Várias vezes o futuro piscou para o Brasil e perdemos oportunidades por falta de preparo. O Brasil precisa criar a cultura de buscar na universidade as ferramentas para enfrentar os desafios da sociedade. Isso vale tanto para a transferência de tecnologia para a iniciativa privada quanto para o cumprimento de atividades-fim do Estado. Acredito que temos de fazer o movimento inverso se quisermos usufruir da riqueza do pré-sal. Em vez de fazer das imensas reservas de petróleo uma promessa segura para daqui duas ou três décadas, deveríamos preparar o Brasil para a era da prosperidade anunciada e trabalhar para reduzir a dependência tecnológica quando a fortuna chegar.

            Concedo a palavra ao Senador Wellington Salgado de Oliveira.

            O Sr. Wellington Salgado de Oliveira (PMDB - MG) - Senador Demóstenes, o discurso de V. Exª hoje toca num ponto fundamental, que é a educação no País. Agora, eu só queria colocar, para tentar fazer parte também do discurso de V. Exª, que tem alguns critérios de avaliação que pessoalmente não concordo. Acho que o MEC criou um critério que mede a condição do aluno ao entrar na faculdade e ao sair, se ele adquiriu conhecimento ou não, o que é superimportante. Agora, essa questão de comparar um padrão de qualidade usado numa cidade como São Paulo, como Belo Horizonte, como Rio de Janeiro com uma faculdade que está sendo criada no interior de um Estado do Nordeste, numa situação difícil, e você criar um padrão de qualidade e aplicar esse mesmo padrão de qualidade aplicado em São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro lá, e depois você falar que lá é 1 e aqui é 5, e por isso fechar onde é 1, aí eu discordo, porque ali está nascendo um conhecimento, uma instituição que procura desenvolver a cultura e nós não poderíamos fechar. Temos que dar, sim, orientações de como ela poderia chegar a 5, mas não simplesmente fechar porque na avaliação ela teve a nota 1. É essa a minha discussão e a discordância em relação ao MEC. Ao restante, não. A avaliação é fundamental, a publicação é fundamental, tornar públicos os critérios, tudo bem; agora, simplesmente, achar que exercer o poder da caneta de fechar está fazendo um grande serviço à Nação, eu discordo. Era só isso que eu queria acrescentar ao discurso de V. Exª.

            O SR. DEMÓSTENES TORRES (DEM - GO) - Agradeço a V. Exª.

            Senador Flávio Torres.

            O Sr. Flávio Torres (PDT - CE) - Senador Demóstenes, eu queria parabenizá-lo pela radiografia com que está trazendo esse assunto para o Senado. Eu queria discordar do Senador Wellington Salgado, quando ele diz que, por ser do Nordeste, tem que ter uma avaliação diferente do Sudeste. Eu sou do Nordeste, Senador, e acho que um médico nordestino tem que ter habilitação e tem que ter qualidade para tratar do nordestino como tem o sudestino para tratar do sudestino. Um engenheiro do Nordeste tem que saber construir uma ponte para não cair na cabeça do nordestino como não cai na cabeça do sudestino. Então, eu acho que essa avaliação é um instrumento poderosíssimo de planejamento, de avaliação; não sei se para fechar, mas é para fazer programas para melhorar a qualidade da universidade brasileira, porque sem qualidade não se faz nada. Tem que usar essa avaliação para melhorar a qualidade, porque o Brasil precisa de profissionais bem formados, e esse é um instrumento poderosíssimo de avaliação. Só para concluir: eu sou nordestino, sou professor de universidade e acho que as universidades do Nordeste têm que se submeter aos mesmos parâmetros a que se submete uma universidade do Sul ou do Sudeste do País. As pessoas que fazem pesquisa têm que obedecer ao mesmo padrão, porque essa é a linguagem da ciência. Não queremos um balcão mais baixo para termos acesso a financiamento ou termos acesso ao balcão de ciências no País. O Brasil tem que ter o mesmo tratamento isonômico, de qualidade, Senador. Não é por sermos do Nordeste que não vamos ter isso. Parabéns, Senador Demóstenes, por trazer este assunto ao Senado.

            O SR. DEMÓSTENES TORRES (DEM - GO) - Muito obrigado a V. Exª.

            Mas eu gostaria de terminar, conclamando a todos os Senadores para, na próxima quarta-feira, nós votarmos o Projeto Escola em Tempo Integral, que, infelizmente, o Governo é contra, porque é caro, custa algo, segundo o Senador Aloizio Mercadante, em torno de 20 bilhões a mais por ano - eu acredito que 30; ou seja, é um troco para o Governo do Brasil criar a Escola em Tempo Integral em todas as escolas do ensino fundamental. Nós temos que preparar o aluno, ficar o dia todo na escola.

            Os senhores viram hoje que o Governo pediu vista. E eu acho que qualquer governo, quando se fala em ter aumento de gasto, se assusta. Mas lembrem-se de que o projeto é para concluir a implantação no ano de 2023, porque eu o apresentei em 2003 e, infelizmente, ele não foi votado até hoje.

            Então, é isso que nós precisamos ter. Nós vamos ter riqueza? Nós vamos ter...? Pode ser que aconteça, não é? Eu até torço para que toda essa expectativa seja verdadeira. Qual o brasileiro que não torce para isso?

            Agora, e na hora em que a prosperidade chegar? Nós estaremos preparados para dar vazão a essa prosperidade? Cadê os nossos homens educados? Cadê os nossos cientistas?

            (Interrupção do som.)

            O SR. DEMÓSTENES TORRES (DEM - GO. Fora do microfone.) - Agora é para concluir mesmo.

            Onde estarão os nossos cientistas? Vamos estar sacrificados por uma sociedade de violência, de desigualdade, de exploração sexual? É esse o futuro que sempre nos espera? Um País próspero economicamente, mas sem condição de dividir com seus filhos os frutos da riqueza e do benefício que certamente advirão.

            Então, eu pediria aos senhores: na quarta-feira, vamos aprovar esse projeto de implantação gradual do tempo integral. Não existem soluções mágicas, não serão as cotas que vão aliviar o sacrifício ou o sofrimento de quem quer que seja. O que vai transformar o Brasil em um país decente, empreendedor, rico, igual, melhor é justamente a educação, e temos de começar com um investimento forte e firme logo na primeira fase, no ensino fundamental.

            Sr. Presidente, agradeço a V. Exª pela tolerância. Realmente era importante eu concluir este pronunciamento.

            Muito obrigado a V. Exª e aos Srs Senadores.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/09/2009 - Página 42373