Discurso durante a 215ª Sessão Especial, no Senado Federal

Comemoração do Dia Nacional da Consciência Negra e o Dia de Zumbi dos Palmares.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Comemoração do Dia Nacional da Consciência Negra e o Dia de Zumbi dos Palmares.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/2009 - Página 60383
Assunto
Outros > HOMENAGEM. DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, GESTÃO, ORADOR, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), SANÇÃO PRESIDENCIAL, LEGISLAÇÃO, ESTABELECIMENTO, OBRIGATORIEDADE, ENSINO, HISTORIA, CONTINENTE, AFRICA, INDIO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, BRASIL, CRITICA, AUTORIDADE, SOCIEDADE CIVIL, AUSENCIA, INICIATIVA, IMPLEMENTAÇÃO, LEIS.
  • REGISTRO, IMPOSSIBILIDADE, DEBATE, ENSINO, CULTURA, NEGRO, INDIO, JUSTIFICAÇÃO, AUSENCIA, CONGRESSISTA, REUNIÃO, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, UNIVERSIDADE DO LEGISLATIVO BRASILEIRO (UNILEGIS), DEFESA, IMPORTANCIA, DISCUSSÃO, FORMAÇÃO, PROFESSOR, NECESSIDADE, TEMPO INTEGRAL, EDUCAÇÃO.
  • HOMENAGEM, COMEMORAÇÃO, DIA NACIONAL, CONSCIENTIZAÇÃO, NEGRO, REGISTRO, RELEVANCIA, DATA, REPUDIO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, HISTORIA, BRASIL, DEFESA, SISTEMA, COTA, CRITICA, OPOSIÇÃO, OPINIÃO, NECESSIDADE, IGUALDADE, OPORTUNIDADE, GRUPO ETNICO.
  • CRITICA, AUSENCIA, NEGRO, ENSINO SUPERIOR, DEFESA, MELHORIA, QUALIDADE, ENSINO, OBJETIVO, PROMOÇÃO, PAZ, IGUALDADE, OPORTUNIDADE, RESPEITO, DIVERSIDADE, EXTINÇÃO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, CONSCIENTIZAÇÃO, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, REDUÇÃO, DESEMPREGO, CRIME, REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, RELEVANCIA, POPULAÇÃO, LUTA, DIREITOS SOCIAIS, COMENTARIO, DESRESPEITO, LEGISLAÇÃO, GARANTIA, VAGA, CRIANÇA, LIMITAÇÃO, IDADE, ENSINO FUNDAMENTAL, OBRIGATORIEDADE, GOVERNO FEDERAL, ASSISTENCIA, ENSINO MEDIO.
  • ANUNCIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, OBRIGATORIEDADE, DENOMINAÇÃO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, BRASIL, HOMENAGEM, CRIAÇÃO, QUILOMBOS, ESTADO DE ALAGOAS (AL), OBJETIVO, CONSCIENTIZAÇÃO, ESTUDANTE, HISTORIA, SOLICITAÇÃO, APOIO, SENADOR, CRITICA, GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF), AUSENCIA, NOME, ESCOLA PUBLICA, REGISTRO, IMPORTANCIA, ELEIÇÃO, PRESIDENTE, NEGRO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), NECESSIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PAIS, GRUPO ETNICO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Senador Mão Santa, Presidente desta sessão, cumprimento todos da Mesa, cumprimento todos aqueles que aqui vieram prestar esta homenagem no Dia da Consciência Negra.

            Eu quero dizer que eu fiquei pouco tempo no Ministério da Educação, mas um ponto que me deixa orgulhoso é o de ter sido, com a minha assinatura e com a do Presidente Lula, sancionada a Lei nº 10.639, que cria o dia que podemos chamar de Zumbi e, ao mesmo tempo, institui a obrigatoriedade do ensino da história africana,

            da história indígena e da história dos povos africanos no Brasil. Pena que, como muitas leis no Brasil, algumas não são praticadas, inclusive pelo desinteresse não só de autoridades, mas também da sociedade civil.

            Na semana passada, organizei um debate na Comissão de Direitos Humanos sobre o ensino da cultura e da história indígenas e africanas, mas ninguém esteve presente, fora quatro depoentes. Colocamos, inclusive, essa reunião no circuito fechado que a nossa Unilegis tem em cada Assembleia, mas lá nas Assembleias ninguém compareceu, e não pudemos realizar o debate. Mas vou insistir. Vou insistir porque uma lei como essa não pode ficar apenas como um papel. É preciso haver um grande interesse, interesse que leve à formação de professores, interesse que leve à adoção das disciplinas, interesse que vai exigir, inclusive, que todos lutem pelo horário integral nas escolas, porque não há como colocar mais essa disciplina tirando uma das obrigatórias, como Geografia e Matemática. Não dá! É preciso aumentar o horário que as crianças ficam na escola.

            Mas eu não vim aqui para falar só desse meu orgulho - isso é apenas um detalhe. Vim aqui para dizer da importância de fazermos essa comemoração permanentemente no Brasil para que as pessoas neste País percebam que este é um País com mais de uma raça e não um País que esconde as suas raças, como tem sido a história do Brasil ao longo dos séculos.

            Fico indignado quando vejo as pessoas que lutam contra as cotas não assumirem que as cotas tiram lugares de outros que entram mais facilmente na universidade e dizem que as cotas vão trazer o racismo. Se não houvesse o racismo, não se precisaria de cotas. (Palmas.) É o contrário: as cotas são a reação para vencer o racismo. É claro que é um racismo discreto, escondido, debaixo do tapete. Se a luta pelas cotas, Senador Paim, não tivesse servido para mais nada, já teria prestado um grande serviço, o de trazer o assunto de que o Brasil é um país também de negros, que as pessoas escondiam, seja chamando de pardos, de mulatos ou dizendo que são brasileiros e, como todos, são iguais.

            Iguais, primeiramente, não o são. Quando forem iguais, serão de raças diferentes. A igualdade é de oportunidades. A igualdade pela qual a gente precisa lutar não é a da cor da pele. A riqueza do Brasil é ter cores diferentes. A falência do Brasil é que a elite rica, intelectualizada e universitária é quase toda de cor branca na pele, traindo a realidade do País.

            Alguns me perguntam: “Mas existe racismo no Brasil? Como se mostra isso?” Eu digo: “É fácil. Bastaria que um satélite fizesse uma foto do Brasil, e a gente perceberia o racismo”. Se houvesse uma foto detalhada do Brasil, mostraria que as universidades praticamente só têm brancos e as prisões praticamente só têm pretos (Palmas). Se a gente fizesse uma foto da situação educacional, veria que as universidades só têm brancos; e quase todos aqueles deserdados da alfabetização são de cor negra ou próxima da cor negra.

            Temos de vencer isso. E acho que movimentos como a criação desse grande dia é uma maneira. Colocar o nome Zumbi no livro dos heróis brasileiros é um gesto importante. Mas a verdadeira revolução, a meu ver, é quando não houver a menor desigualdade na qualidade da escola no Brasil entre escola de ricos, escola de brancos, escola de negros, escola de pobres - todas as escolas iguais no Brasil (Palmas). E aí que a gente vai quebrar a desigualdade das oportunidades e garantir o respeito às diferenças e à diversidade. É na escola que a gente vai criar isso.

            Da mesma maneira, não vai haver saída para a crise ecológica se não for pelas escolas. Não adianta os Presidentes se reunirem em Copenhague e definirem todas as metas do mundo para dióxido e para emissões de dióxido de carbono se as emissões que saem das cabeças das nossas crianças quando crescem é de consumir, consumir, consumir, consumir, o que significa poluir, poluir, poluir. É na escola que a gente vai enfrentar o problema ambiental, o problema do desemprego, o problema da segurança. Cadeia pode até trazer segurança, mas não traz paz. Paz o que traz é a escola. Não é cadeia.

            Por isso, deixo aqui uma mensagem: que nós, que somos batalhadores pelo respeito à diversidade, pela igualdade de oportunidades e pelo respeito aos negros brasileiros, lutemos pela igualdade da escola no Brasil. Eu sou, como todos sabem, desde o primeiro momento, um defensor radical das cotas nas universidades. Mas não deixo de puxar a atenção e muitas vezes até orelhas - Paim sabe disso - dos movimentos negros de defesa das cotas quando eu não vejo esse movimento lutando com a mesma força pela erradicação do analfabetismo entre os negros. (Palmas.) Não vejo! Vejo e apoio a luta pelas cotas para ingresso na universidade, mas não vejo a luta pela cota de 100% dos negros terminando o ensino médio com qualidade. Tem que incluir isso na luta. Não adianta garantir vaga na universidade... Não adianta, não, é um passo obviamente, mas um passo pequeno garantir vaga para as universidades que só vão se beneficiar os que terminaram o ensino médio. Ficaram de fora todos aqueles que foram deixados no caminho. Nós não podemos deixar que nenhuma criança seja deixada para trás no caminho.

            Por isso, a luta além das cotas já, porque a gente não pode esperar os 20 anos que levará a revolução educacional. Não pode esperar, tem que mudar a cor da cara da elite brasileira já. E o caminho de mudar a cor da cara da elite brasileira já é através da cotas, mas tem que lutar para que, em 20 anos, todas as escolas sejam igualmente boas.

            Por isso, peço que se envolvam em algumas outras leis que ainda não pegaram. O Presidente Lula já sancionou a lei que garante vaga na escola para todas as crianças a partir dos quatro anos. Está valendo! E os pais não estão levando seus filhos para a escola aos quatro anos. Está valendo a lei sancionada pelo Presidente Lula, ambas originárias no Congresso, mas ele sancionou - se ele não sancionasse, não valia -, que garante vaga para qualquer jovem que termine o ensino fundamental e quiser fazer o ensino médio. Porque o Brasil é um dos últimos países do mundo, de porte como somos, onde o ensino médio não é uma obrigação do Governo oferecer vagas. A obrigação só fica no ensino fundamental.

            Pois, hoje, já vai dos quatro aos dezessete anos. A gente precisa lutar para que isso vire não apenas lei, que já é, mas vire realidade, que precisa.

            Digo isso, ao mesmo tempo que fico feliz de ver voltar aqui presente o meu amigo, que precisamos lutar para que, no Brasil, haja uma revolução educacional. Esse é o caminho da igualdade de oportunidades. Esse é o caminho da construção de uma consciência de respeito aos negros, inclusive entre os brancos; de respeito aos índios, inclusive entre os negros; de respeito aos brancos, inclusive entre os índios. É a educação. É com educação que a gente vai fazer com que essa revolução ocorra.

            Até lá vamos fazer nossos gestos simbólicos, Senador Mão Santa, como esta sessão. Vamos fazer gestos simbólicos como este dia que estamos comemorando. E vamos fazer, eu proponho, um gesto simbólico, se o Senador Paim quiser assinar comigo um projeto de lei, o Senador Mão Santa também, vamos fazer um projeto de lei que obrigue que, em cada cidade, pelo menos uma escola se chame Escola Zumbi dos Palmares. (Palmas) Pelo menos uma escola por cidade, porque, a partir dos nomes, chegando às crianças bem pequenininhas começam a construir uma consciência.

            Estudei, Senador Paim, Senador Osvaldo, a primeira escola que fui, aos cinco anos, se chamava Castro Alves. Eu não tenho a menor dúvida de que, ao ouvir falar nesse nome, no primeiro dia de aula, eu comecei a descobrir que havia poesia, que havia poeta, e que esse poeta era o poeta dos negros, era o poeta da antiescravidão no Brasil. Isso influi. Sou furioso com o fato de que aqui, no Distrito Federal, não aceitam ainda a minha ideia de pôr nomes nas escolas. As escolas aqui têm números. Eu, ontem, quase consegui convencer o Vice-Governador a que, no aniversário de 50 anos de Brasília, que será no dia 21 de abril do próximo ano, a gente batize todas as escolas brasilienses com nomes. Nomes que possam passar uma mensagem às nossas crianças. Nomes bem escolhidos obviamente, nomes respeitados democraticamente, nomes de pessoas que já morreram e jamais de pessoas ainda vivas, obviamente, mas nomes que passem às nossas crianças a ideia de que há alguma coisa que eles precisam aprender na história do País. E a gente ter uma escola com o nome de Zumbi dos Palmares em cada cidade ajudaria bastante.

             Essa é uma ideia que deixo aqui como contribuição nesta sessão, Senador Paim. Convido os quatro Senadores que aqui estão e a Senadora Marisa que já saiu, mas que aqui falou, para que juntos apresentemos esse projeto. Vou preparar e trago para assinatura de todos nós.

            E vamos continuar a nossa luta, que é uma luta muito longa. Os Estados Unidos, muito antes de nós, elegeram um Presidente negro. A gente precisa não apenas ter Presidentes negros, a gente precisa ter Presidentes da negritude, até porque há negros que podem, para se eleger, mudar a cor, se não externamente, internamente. Mesmo assim seria um avanço para o Brasil. Mas vamos fazer com que haja Presidentes da negritude, que respeitem o fato de o país ser um país multicultural, mas não um país que esconde a diferença racial, não um país que diz que não é racista porque nega ao negro o direito de ser chamado negro. E eu tenho muitas histórias sobre isso e não vou contar aqui. Mas um País que se orgulho de termos negros. E que se orgulhe de ter dado aos negros a mesma oportunidade que dá aos brancos e aos índios; que dá aos pobres, não importa a raça, a mesma oportunidade que dá aos ricos. O caminho para isso é a escola igual para todos: o filho do trabalhador na escola onde estuda o filho de seu patrão. Este, para mim, é o slogan do socialismo do século XXI: escola igual para todos. E, obviamente, uma escola que passe uma consciência de solidariedade e falta de preconceitos para todas as crianças. Essa é nossa luta e este dia é um dia para lembrarmos da luta.

            Um grande abraço para cada uma e para cada um de vocês. (Palmas.)


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/2009 - Página 60383