Discurso durante a 63ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Cumprimentos à população do município de Bujari pelo transcurso dos seus 18 anos de existência. Relato acerca da participação de S.Exa. em reunião da Comissão de Direitos Humanos no Parlamento do Mercosul. Registro de proposição apresentada no Parlamento do Mercosul pelo parlamentar Nelson Alderete, do Paraguai, de criação do Dia da Dignidade do Mercosul. Críticas a projeto, em tramitação na Câmara dos Deputados, que tem o propósito de dificultar o trabalho do Ministério Público.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL). JUDICIARIO. PODERES CONSTITUCIONAIS.:
  • Cumprimentos à população do município de Bujari pelo transcurso dos seus 18 anos de existência. Relato acerca da participação de S.Exa. em reunião da Comissão de Direitos Humanos no Parlamento do Mercosul. Registro de proposição apresentada no Parlamento do Mercosul pelo parlamentar Nelson Alderete, do Paraguai, de criação do Dia da Dignidade do Mercosul. Críticas a projeto, em tramitação na Câmara dos Deputados, que tem o propósito de dificultar o trabalho do Ministério Público.
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 01/05/2010 - Página 17851
Assunto
Outros > HOMENAGEM. MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL). JUDICIARIO. PODERES CONSTITUCIONAIS.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, MUNICIPIO, BUJARI (AC), ESTADO DO ACRE (AC), SAUDAÇÃO, PREFEITO, POPULAÇÃO.
  • PARTICIPAÇÃO, REUNIÃO, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, PARLAMENTO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), APOIO, PROPOSTA, CRIAÇÃO, DIA, DIGNIDADE, HOMENAGEM, PESSOAS, COMBATE, CORRUPÇÃO.
  • FRUSTRAÇÃO, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO DE LEI, AUTORIA, DEPUTADO FEDERAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), PREVISÃO, PUNIÇÃO, AUTOR, AJUIZAMENTO, AÇÃO CIVIL PUBLICA, OBJETIVO, PERSEGUIÇÃO, NATUREZA POLITICA, PROMOÇÃO, BENEFICIO, CARATER PESSOAL.
  • LEITURA, TEXTO, JURISTA, CRITICA, IMPEDIMENTO, CIDADÃO, PROMOTOR DE JUSTIÇA, PROPOSIÇÃO, AÇÃO JUDICIAL, POSSIBILIDADE, PREJUIZO, PATRIMONIO, PERDA, LIBERDADE, REPUDIO, ORADOR, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, GARANTIA, INDEPENDENCIA, DESEMPENHO FUNCIONAL, MINISTERIO PUBLICO, EXPECTATIVA, CAMARA DOS DEPUTADOS, REJEIÇÃO, TENTATIVA, IMPOSIÇÃO, DIFICULDADE, TRABALHO, INVESTIGAÇÃO, JUDICIARIO, AMEAÇA, DEMOCRACIA.
  • IMPORTANCIA, PROPOSTA, HERACLITO FORTES, SENADOR, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, CONVITE, MEMBROS, AGENCIA BRASILEIRA DE INTELIGENCIA (ABIN), GABINETE PESSOAL DO PRESIDENTE DA REPUBLICA, APRESENTAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, DENUNCIA, INTIMIDAÇÃO, JUIZ, ACOLHIMENTO, PEDIDO, LIMINAR, RELAÇÃO, CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, RIO XINGU, ESTADO DO PARA (PA).
  • REPUDIO, PROJETO DE LEI, LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTARIAS (LDO), LIMITAÇÃO, ATUAÇÃO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), DESRESPEITO, RECOMENDAÇÃO, PARALISAÇÃO, OBRA PUBLICA, PERIODO, APURAÇÃO, SUSPEIÇÃO, IRREGULARIDADE.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Mão Santa, nosso querido Presidente nesta sessão do dia 30 de abril; Senador Mozarildo; Senadora Fátima; Senador Eurípedes, que estava por aqui; senhoras e senhores, o tema principal do meu pronunciamento hoje é em torno do Direito.

            Vou falar de uma iniciativa que tramita na Câmara, com o propósito de amordaçar o exercício do Direito. Mas, antes, eu queria aqui, com muita alegria, Senador Mão Santa, parabenizar a população do Município do Bujari, ali pertinho de Rio Branco - V. Exª esteve lá -, pois o Município adquiriu maioridade, completou 18 anos de existência anteontem, dia 28, Senador Mozarildo.

            Meu pai governou o Estado do Acre na segunda metade da década de 70. Fez um Governo sério, compenetrado e voltado principalmente para estruturar o Estado, a fim de que pudéssemos incrementar o processo de produção agrícola, principalmente. Criou empresas importantes, para darem suporte aos produtores; abriu o banco do Estado, que inicialmente só financiava uma meia dúzia, para financiar os pequenos produtores; e criou uma entidade chamada Nari - Núcleo de Assistência Rural Integrada.

            Em alguns pontos do Estado, Senador Mozarildo, essa instituição concentrava todos os órgãos e atividades que estavam a serviço dos produtores: órgãos de assistência técnica, o próprio banco do Estado, órgãos ligados à prestação de saúde ao produtor, de educação. Enfim, todos os órgãos se concentravam em um núcleo.

            Bujari ainda não era município na época. E o meu pai, governando o Estado, instalou um Nari onde hoje é o Município do Bujari. Aquilo foi se enraizando naquela região, os produtores foram ali se instalando e, graças à instalação do Nari, Bujari, que era um pequeno povoado, uma pequena vila, conseguiu crescer, inclusive em termos econômicos, de produção, etc.; e, por fim, transformou-se num município.

            O Prefeito Padeiro já é prefeito pela terceira vez, por eleição direta. Dito isso, não precisa nem falar da simpatia que a população de Bujari tem por ele. O Prefeito Padeiro está lá, empolgado. Eu lhe disse: “Olhe, Prefeito, eu, na impossibilidade de estar presente aí com vocês, nesse final de semana, vou mandar o meu abraço da tribuna do Senado”. E o faço hoje, Senador Mão Santa, com muita alegria, com muito prazer.

            À população de Bujari, ao querido amigo Prefeito Padeiro e a todos que o ajudam a administrar, pela terceira vez, o Município, o meu abraço, as minhas felicitações pelos 18 anos de vida alcançados, de trabalho intenso e de desenvolvimento.

            Mas, Senador Mão Santa, V. Exª falou no Mercosul há poucos instantes, e eu acabo de vir de lá novamente, onde fui participar de uma reunião da Comissão de Direitos Humanos do Parlamento do Mercosul, do qual faço parte, e recebi de um parlamentar, companheiro nosso do Paraguai, Nelson Alderete, a cópia de uma proposição apresentada por ele no Parlamento do Mercosul que instaura o Dia da Dignidade do Mercosul. Olha que coisa interessante! Está em espanhol, vou tentar traduzir: Reconhecendo o trabalho de personalidades no âmbito do periodismo de investigação, do jornalismo de investigação, fiscais (fiscais que eles chamam lá são membros do nosso Ministério Público aqui) e juízes que têm se distinguido em seus países na luta decisiva contra a corrupção.

            Que coisa interessante! Ele está propondo que o Parlamento do Mercosul crie o Dia da Dignidade do Mercosul, para relacionar e prestigiar essas pessoas, que, na imprensa de investigação, no Ministério Público, aqui no nosso País, e no âmbito do Judiciário, se dedicam e se destacam na luta contra a corrupção. E agora - imaginem -, na contramão de uma proposição como essa, Senador Mão Santa, tramita na Câmara dos Deputados brasileira um projeto que, como eu disse, segue na contramão, que objetiva intimidar, colocar uma mordaça, impedir, dificultar o trabalho do Ministério Público brasileiro.

            Esse projeto altera as Leis nºs 4.717, de 1965, e nº 7.347, de 1985, de modo a deixar expressa a responsabilidade de quem ajuíza ação civil pública popular e de improbidade temerárias, com má-fé, manifesta intenção de promoção pessoal ou visando a perseguição política.

            Senador Mão Santa, a Constituição brasileira estabelece, no art. 127, ao tratar do Ministério Público, no § 1º, o seguinte: “ São princípios institucionais do Ministério Público, a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional”.

            Antes de continuar a falar do assunto, Senador Mão Santa, eu queria deixar absolutamente claro aqui que não respondo a nenhum processo, não sou alvo de nenhuma representação do Ministério Público. Portanto, estou aqui absolutamente a cavalheiro para falar do assunto.

            Uma matéria dessa, prosperando e sendo aprovada em nosso País, considero isso muito além de um retrocesso institucional, Senador Mozarildo. Eu fico imaginando, eu que sou Procurador da Fazenda Nacional... O Procurador da Fazenda Nacional é titular da ação de execução fiscal, Senador Mozarildo. Eu fico imaginando: se um projeto desse prosperar, abre uma porta escancarada, para que lá na frente alguém possa propor, por exemplo, que o Procurador da Fazenda Nacional também estaria sujeito a punições e retaliações, atribuindo a ele, por exemplo, no exercício da execução fiscal, má-fé ou afirmar que se trata de uma ação judicial na qual se manifesta a má-fé. Olhe que situação se poderia criar!

            Essa proposição tem, no seu âmago, a motivação da intimidação e é uma coisa que vem borbulhando no nosso País, essa questão da intimidação. Ontem, na Comissão de Relações Exteriores, o Senador Heráclito propôs, em boa hora, trazermos aqui membros da Abin e do próprio gabinete do Presidente da República, para que eles digam por que razão abordaram um juiz. Imagine, Senador Mozarildo! A Abin teria abordado - é o que consta no noticiário - um juiz brasileiro que teve talvez, segundo a Abin, a ousadia de multar o Presidente da República por propaganda eleitoral antecipada. Por sua vez, o próprio Presidente da República espinafrou, um dia desse, num desabafo, a Justiça Eleitoral do País, afirmando - e o País inteiro ouviu isso: “Como é que pode a gente agora ter que se submeter ao que manda um juiz!”

            Rapaz! Olha, eu estou falando de fatos que, aparentemente, talvez não guardem correspondência uns com os outros, mas guardam, Senador Mozarildo. Isso é o vírus da intimidação, do autoritarismo. É esse vírus, é sobre ele que estou falando hoje.

            Você ameaçar de punição, inclusive financeira, monetária, uma associação, uma organização que propõe uma ação popular, uma ação civil pública; ameaçar o Ministério Público e seus membros que, como fiscais da lei, reúnem indícios consistentes, na grande maioria das vezes, de provas de corrupção, de desmando público, e provocam o Judiciário, Senador Mozarildo, isso é intimidação! É intimidação! E viola a Constituição, porque a Constituição prega a independência funcional do Ministério Público.

            Trago aqui algumas considerações feitas por Mateus Eduardo Siqueira Nunes Bertoncini, que é Doutor em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná. Valho-me de algumas considerações suas para aprofundar um pouco a discussão desse assunto. Ele diz aqui o seguinte: “Segundo o projeto [esse projeto ao qual eu me refiro]...” Vou ler o teor do projeto para ficar bem claro a respeito do qual estou falando. Ele diz aqui o seguinte, no art. 2º:

O art. 13 da Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965, nº 7 347 - Lei da Ação Popular - passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 13. A sentença que, apreciando o fundamento de direito do pedido, julgar a lide manifestamente temerária ou considerar que o autor ajuizou a ação com má-fé, intenção de promoção pessoal ou visando perseguição política, condenará o autor ao pagamento do décuplo das custas mais honorários advocatícios.

            O projeto é todo nessa linha, Senador Mão Santa. O art. 3º também altera o art. 18 da Lei nº 7.347, para dizer o seguinte:

Art. 18. Nas ações de que trata esta lei, quando a ação for temerária ou for comprovada má-fé, finalidade de promoção pessoal ou perseguição política, haverá condenação da associação autora ou membro do Ministério Público ao pagamento de custas, emolumentos, despesas processuais, honorários periciais e advocatício”.

            E, por último, o art. 4º, Senador Mozarildo, altera o art. 19 da Lei nº 8.429, para dizer o seguinte:

Art. 19. Constitui crime a representação por ato de improbidade ou a propositura de ação contra agente público ou terceiro beneficiário quando o autor [olha que coisa impressionante] o sabe inocente ou pratica o ato de maneira temerária.

            Quer dizer, ele já está afirmando que o autor saberia, antecipadamente, que aquele que é alvo de sua iniciativa seria inocente. É de um absurdo que chega a... É um absurdo, mas é preocupante, exatamente por ser um absurdo e exatamente pelo fato de a Câmara dos Deputados brasileira estar apreciando uma matéria dessas.

            Recordo aqui, Senador Mozarildo, que, no início do Governo do Presidente Lula, no primeiro mandato, o Ministro José Dirceu, talvez prevendo já o que acabou acontecendo com ele inclusive, réu no processo do mensalão, difundiu, no âmbito do Governo, a necessidade de se propor uma coisa muito parecida com essa que esse parlamentar está propondo, o que passou a ser chamado de a “Lei da Mordaça” do Ministério Público. Por sorte, naquela ocasião, o Governo recuou, mas está aqui. Está aqui, revivido na proposição de um parlamentar paulista. Acho que qualquer um poderia ter proposto esse projeto, menos ele, porque passa a idéia, de fato, de uma represália, uma retaliação, pelo fato de ser um Deputado e ter a prerrogativa de propor uma matéria legislativa. Isso beira à retaliação.

            Senador Mozarildo, V. Exª deseja um aparte?

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Geraldo, V. Exª, como jurista, está abordando, com muita propriedade, com muita serenidade, essa questão. Alguns dias atrás, eu fiz um aparte ao Senador Suplicy, quando ele disse que tinha uma proposta de redução das férias dos juízes, da eliminação do recesso natalino, como forma de os juízes produzirem mais. E eu disse a ele que, embora, em tese, as coisas pudessem parecer simplistas como ele estava colocando, tinha que se aprofundar muito mais, porque o juiz tem a responsabilidade de decidir sobre a liberdade ou a prisão de uma pessoa; sobre a perda ou a recuperação de bens de pessoas. Enfim, lida com as pessoas e sua liberdade, que é a coisa mais cara na vida de uma pessoa, e que não podia ser encarado dessa forma apenas porque há a sensação na sociedade de que a Justiça é morosa. Portanto, teoricamente, matematicamente, eliminando as férias, os juízes trabalhariam mais. E isso não é verdade. O que se está provando agora - o CNJ provou - é que existe uma sobrecarga absurda na primeira instância, que precisa de mais juízes e melhor equipamento para os juízes trabalharem. Mas, no que tange ao Ministério Público, é outra coisa que considero inconcebível. Não é porque, eventualmente, um promotor tenha exorbitado de suas funções, tenha agido até de má-fé, não é por isso que, por exemplo, se tenha de propor esse tipo de legislação. Aliás, eu tenho conhecimento de um ou dois casos desses em que o próprio Conselho Nacional do Ministério Público puniu o promotor. Então, acho que o que tem de se reforçar são os conselhos, tanto o CNJ (Conselho Nacional da Justiça) quanto o Conselho Nacional do Ministério Público, para que eles façam, portanto - vamos dizer assim -, a vigilância não sobre o poder de julgamento dos juízes, nem também sobre o poder de iniciativa do Ministério Público, mas que, quando acontecer um desvio realmente de função, ajam. E aí V. Exª citou a Abin. Esses órgãos de Estado devem realmente ter, primeiro - e têm -, uma lei clara que diga os que eles podem e que não podem fazer. E repito: é fato que aqui e acolá esses órgãos exorbitam? É verdade. O ser humano, até mesmo num monastério, pode cometer esses equívocos, mas eu concordo com V. Exª. Embora eu não seja jurista, eu costumo dizer, com 20 anos de legislador e além de estar positivamente contaminado pela Justiça, porque tenho um filho que é juiz em Roraima e uma filha que já foi juíza em Roraima - e hoje é juíza aqui, no Distrito Federal -, realmente acho, mesmo antes de tê-los, lógico, que: sem Justiça, sem a boa aplicação da Justiça, e aí se inclui uma atuação atenta do Ministério Público, não há como nós garantirmos as outras liberdades. Então, quero parabenizá-lo pela abordagem. V. Exª o está fazendo com muita serenidade: não está condenando a iniciativa, mas está chamando à reflexão e mostrando que, realmente, essas coisas não podem ser por esse caminho. Parabenizo V. Exª e peço permissão de, neste aparte - eu ia fazê-lo em meu discurso -, cumprimentar os trabalhadores de todo o Brasil pelo dia de amanhã, que é o Dia do Trabalhador, especialmente os trabalhadores e trabalhadoras do Estado de Roraima. Amanhã não haverá sessão do Senado, porque é sábado. Então, parabéns a V. Exª e parabéns a todos os trabalhadores do Brasil.

            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Muito obrigado, Senador Mozarildo. V. Exª acrescenta, com seu aparte, algo valiosíssimo nessa questão que envolve a matéria que estou tratando. Toda instituição tem seus mecanismos de controle. O próprio Ministério Público tem sua corregedoria, não é? Soube, ainda hoje de manhã, que o Conselho do Ministério Público abre a qualquer um, ao cidadão em geral, uma janela em seu site para que o cidadão apresente fatos que tenham a ver com alguma infringência à norma legal; fatos que digam respeito a iniciativas no campo da corrupção.

            Enfim, os órgãos têm seus próprios mecanismos de defesa. E, como V. Exª mesmo mencionou, sabemos de um número muito reduzido de fatos ligados à punição de membros do próprio Ministério Público. Eu mesmo sei de alguns fatos. O Ministério Público chamou à responsabilidade membros que exorbitaram de sua função e puniu. E puniu! Então, o que me preocupa, Senador Mozarildo, é esta insinuação: o princípio da intimidação.

         Eu quero até fazer uma retificação aqui. Quando eu me referi à notícia da abordagem da Abin a um juiz, não foi por razões eleitorais, como eu havia dito. É porque o juiz acolheu um pedido de liminar que tinha relação com a Usina de Belo Monte, e a Abin se sentiu incomodada a ponto de abordar o juiz. Eu acho isso muito inconveniente. Esse não é o caminho que a Agência Brasileira de Informação do atual Governo deve trilhar para tratar de questões que a preocupam.

         Mas o jurista ao qual eu me referi, Senador Mão Santa, faz ponderações aqui que devemos observar - e ele diz aqui:

Caso sejam aprovadas as alterações [essas às quais eu me referi], a consequência concreta para a população brasileira será o fim das ações populares e das ações civis públicas destinadas a combater as irregularidades praticadas contra o patrimônio público, pois o cidadão ou a pessoa do Promotor de Justiça que ousar tentar qualquer medida judicial estará sujeito a responder com o seu patrimônio pessoal e com a sua liberdade, pois o seu trabalho será naturalmente interpretado como uma tentativa para criar “situações vexatórias que desgastam irreparavelmente a honra e a dignidade de autoridades injustamente acusadas”, consoante justificativa apresentada pelo Deputado [autor do projeto].

Partindo dessa lógica [Senador Mão Santa, continua o jurista], como ninguém admite ser acusado justa ou injustamente, a resposta do poder político será sempre a mesma: a imputação de responsabilidade pessoal civil e criminal ao autor da medida, que se tornará presa fácil nas mãos dos advogados contratados e municiados com esses contundentes instrumentos de vingança.

            Eu citei aqui algumas ações do próprio Presidente da República que nos fazem imaginar que, em nosso País, o vírus da intimidação se prolifera. E eu lembro aqui mais um ato, mais um fato, mais uma iniciativa também do próprio Presidente da República, que manda para o Congresso Nacional, na proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias, uma alteração que, a meu ver, é absolutamente preocupante, Senador Mão Santa.

            A rigor, hoje, o Tribunal de Contas da União, quando constata, com provas evidentes, a irregularidade de uma obra, seja grande ou pequena, recomenda que o Congresso Nacional suspenda ou determine ou decrete a suspensão dessa obra até que as apurações confirmem ou não a suspeita de irregularidade.

            Pois olhe, Senador Mão Santa, o Presidente da República manda um projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias que acaba com esse mecanismo: ele propõe que essas obras não sejam suspensas, mesmo irregulares, até a decisão final da questão. É mais uma iniciativa intimidatória desta vez ao Tribunal de Contas da União, que, como toda instituição, pode ter aqui e acolá seus equívocos, seus defeitos, mas tem-se mostrado para a Nação brasileira como uma instituição séria, compenetrada, apolítica, porque há uma insistência, há uma reiterada insistência em se atribuir ao Tribunal de Contas da União um papel político nas suas decisões.

            O Tribunal de Contas aprecia tecnicamente a execução dos recursos públicos e, detectando a irregularidade de uma obra, havendo indícios fortes de que isso está ocorrendo, ele recomenda, por prudência, que essa obra seja suspensa até que se elimine por completo ou se confirme a suspeita de irregularidade. Pois o Presidente da República vem na contramão e propõe que a obra continue e só eventualmente seja embargada ou suspensa numa decisão final que constate a irregularidade dessa obra.

            Mas voltando aqui ao assunto. Essa matéria diz respeito à intimidação do Ministério Público, do cidadão comum que vai ficar privado. Quem é que vai ter coragem de provocar o Judiciário se lá na frente pode estar sujeito a uma retaliação inclusive no seu próprio bolso? Esse é o espírito, é o germe da intimidação. Acho que, nesse campo, a Constituição estabeleceu, com muita propriedade, a independência funcional dos membros do Ministério Público, a possibilidade de qualquer cidadão brasileiro provocar as instâncias judiciárias em busca de uma resposta. Isso tudo ficará comprometido, Senador Valter Pereira, se prosperar a apreciação e chegar a ser aprovada uma matéria como essa na Câmara dos Deputados.

            Eu aqui já estou prevenindo a Casa, o Senado, para a possibilidade de um instrumento desse, de intimidação, autoritário, ser aprovado na Câmara. Duvido que a Câmara aprove. Em última instância, se aprovar, precisamos estar preparados para reagir a uma iniciativa dessa.

            No Ministério Público as instâncias estão funcionando. Existem imperfeições? Claro que existem. Mas não podemos nos apegar às imperfeições para justificar a iniciativa de darmos um golpe de morte nessas instituições. Porque isso seria um golpe de morte na atuação do próprio Ministério Público, nesse espírito democrático que a Constituição Brasileira estabeleceu em nosso País, Senador Valter, no sentido de que o Judiciário pode ser provocado, sim, o Ministério Público possa, sim, em face de evidências, principalmente de atos que envolvam corrupção, tomar iniciativa de representar contra quem quer que seja, sem prejuízo das suas garantias funcionais.

            Eu me referia - V. Exª que chegou há pouco - a um projeto que tramita na Câmara dos Deputados, que prevê punições severas ao Ministério Público, que impede severamente a proposição de ação civil pública, de ação popular, porque estabelece punições aos autores dessas ações. Eu estou aqui prevenindo a Casa, acho que a gente precisa interagir com a Câmara dos Deputados, nós que temos companheiros lá atuando, no sentido de preveni-los de que é necessário, é fundamental que a Câmara rejeite essa matéria. Esse é um instrumento de autoritarismo, de intimidação que não pode prosperar lá e, se chegar aqui, eu já estou de pronto manifestando o meu repúdio, Senador Valter, e vou me bater pela sua rejeição no Senado Federal, porque eu acho que isso seria a coroação do retrocesso do retrocesso. E nós não podemos permitir que isso ocorra e saia principalmente do Congresso Nacional Brasileiro, que, tempos atrás, há mais de 25 anos, houve por bem criar todo esse arcabouço jurisdicional, jurídico, de Direito, para que, em nosso País, a gente possa interagir - Justiça, Ministério Público e cidadão - no sentido de buscar sempre o aperfeiçoamento das instituições, da própria democracia brasileira.

            Portanto, esse é o alerta que me coube trazer hoje à tribuna desta Casa, para que todos, Deputados e Senadores, percebam a gravidade da questão. Esse projeto vem-se insinuando ali na Câmara, rasteiramente, devagarzinho, e, de repente, numa sessão em que os Parlamentares não estejam tão atentos, pode ser aprovado e pode vir ao Senado Federal, Senador Mão Santa. É um risco. Cabe a nós, inclusive, interpelarmos nossos companheiros na Câmara dos Deputados, para que isso não venha a acontecer.

            Era isso que eu tinha a dizer nesta manhã.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/05/2010 - Página 17851