Discurso durante a 143ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com o quadro da saúde pública no Distrito Federal, repercutindo fatos noticiados pela imprensa e apontando equívocos de concepção e gestão como responsáveis pela situação.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE. GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF).:
  • Preocupação com o quadro da saúde pública no Distrito Federal, repercutindo fatos noticiados pela imprensa e apontando equívocos de concepção e gestão como responsáveis pela situação.
Aparteantes
José Bezerra.
Publicação
Publicação no DSF de 19/08/2010 - Página 42497
Assunto
Outros > SAUDE. GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF).
Indexação
  • APREENSÃO, CRISE, SAUDE, DISTRITO FEDERAL (DF), CONFIRMAÇÃO, INFORMAÇÃO, NOTICIARIO, PRECARIEDADE, SETOR, FALTA, MANUTENÇÃO, PARALISAÇÃO, HOSPITAL, ESPECIFICAÇÃO, CIDADE SATELITE, CARENCIA, MEDICO, ENFERMEIRO, MOTIVO, INEFICACIA, GESTÃO.
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, EFICACIA, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, SAUDE PUBLICA, ATENDIMENTO, FAMILIA, DOMICILIO, DIRETRIZ, MEDICINA PREVENTIVA, CONTROLE, DEMANDA, HOSPITAL, SIMULTANEIDADE, CAMPANHA, PAZ, TRANSITO, REDUÇÃO, ACIDENTE DE TRANSITO, REGISTRO, AUMENTO, REPASSE, RECURSOS, GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF), ATUALIDADE.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero aproveitar este tempo mais leve que nós temos no que diz respeito às atividades do Senado para manifestar a minha preocupação com o quadro da saúde no Distrito Federal.

            Ao lermos os jornais estes dias, percebemos que coisas inadmissíveis vêm acontecendo, como é o caso do grande hospital que tem o Distrito Federal em Taguatinga, que não consegue funcionar por causa de elevadores parados. É inacreditável uma coisa dessa! É inacreditável que não se tenha percebido a necessidade de manutenção. É inacreditável que dois, três, quatro elevadores entrem, no mesmo momento, em crise, a ponto de os doentes não poderem subir, as macas não poderem subir, os pacientes ficarem parados.

            Ao mesmo tempo, os jornais noticiam que um hospital novo em Santa Maria foi obrigado a paralisar-se por falta de condições de funcionamento porque o acordo feito com a empresa com a qual estabeleceu uma parceria público-privada - eu, em princípio, acho esse tipo de parceria positiva, não acho que seja negativa - não teria sido cumprido; o hospital não estaria funcionando porque a empresa não teria recebido o dinheiro do pagamento no momento certo - e não é uma empresa no sentido comercial, é uma Santa Casa! Nós vemos, ao mesmo tempo, segundo manchetes de jornais, filas com milhares de pessoas esperando por cirurgias que não são das mais complicadas.

            Tudo isso vem acontecendo, mas aqui mesmo, no Distrito Federal, Senadora, isso já foi evitado, já houve um tempo em que não havia necessidade disso, em que os hospitais tinham leitos sobrando por conta de um programa que evitava a necessidade de ir ao hospital, um programa chamado Saúde em Casa, que é como o Saúde da Família, mas feito muito intensamente. 

            Tínhamos centenas de pequenas casas atendidas por médicos e enfermeiros. Havia profissionais da saúde em quantidade necessária para cuidar daquela, como a gente aqui chama, quadra - em outras cidades são bairros. Muitos que precisavam de atendimento médico ali eram tratados e não precisavam sair correndo, deslocar-se para um hospital distante, nem ficar em fila.

            Quando se aglutinam todos os doentes em um mesmo hospital, a fila é quase automática. Nem sempre a gente pode criticar um setor de saúde por ter fila em determinado hospital, a crítica vem antes do hospital, não é nem na prevenção, é no atendimento primário.

            Quando a gente fez aqui esse atendimento primário em grande escala, os hospitais passaram a ter leitos sobrando, sobretudo graças à firmeza como fizemos aqui, no Distrito Federal, o programa chamado Paz no Trânsito, por meio do qual se reduziu de maneira muito drástica o nível de acidentes. Parece até brincadeira, mas não é: foi reduzido tão drasticamente o nível de acidentes que as oficinas começaram a ter problemas e a desempregar os mecânicos, não os mecânicos da mecânica, mas os da lanternagem. Caiu a demanda pelo serviço. Foi preciso que o banco do Estado, o BRB, criasse uma linha de crédito para financiar a transformação de oficinas de lanternagem em produtoras de carros de mão e outros objetos metálicos. Os hospitais tinham uma folga. A prevenção de acidentes e a prevenção do doente primário propiciaram isso.

            Isso já foi feito, servia de exemplo para muitas partes do mundo.

            O Saúde da Família, embora sua concepção fosse mais antiga, terminou sendo inspirado nacionalmente graças ao programa em escala que foi feito em todo o Distrito Federal.

            E hoje, lamentavelmente, o que nós vemos é um sistema de saúde falido, é triste dizer, na própria capital da República. Eu digo isso ao mesmo tempo em que coloco à disposição a função que eu tenho de Senador a serviço do governo do Distrito Federal. Embora eu não seja do governo, embora eu não esteja dentro do governo, de qualquer maneira, quero dizer ao governador e a toda a máquina do governo que o que for preciso fazer, a partir do Senado, eu estou disposto a fazer.

            Não acredito que o problema seja de recursos, porque hoje o fundo constitucional que o governo federal transfere ao Distrito Federal já é de tamanho suficiente para fazer funcionar bem a saúde. Para se ter uma ideia, na época a que me refiro, quando a saúde funcionava bem, nem havia o fundo constitucional. A transferência era feita voluntariamente pelo governo federal, e o valor da transferência era a metade do que é hoje. Em oito anos, dez anos dobrou o valor. Não há desculpa na quantidade. É uma maneira equivocada, prioridades erradas, mau funcionamento que levam a isso.

            Eu deixo aqui o meu registro, Sr. Presidente, de que nós não podemos deixar que haja crise de saúde em nenhuma parte. E aqui, além de ser uma parte como qualquer outra, é também a Capital da República, é onde se vê mais facilmente a crise. Um país, uma república pode sobreviver com rendas desiguais, com regiões desiguais, com comidas desiguais, com roupas desiguais, com transportes desiguais, mas não há república quando a saúde e a educação são desiguais. Temos de trabalhar para que a qualidade da saúde e da educação seja assegurada, para que o acesso de qualquer cidadão ou cidadã a esses serviços seja igualiltário, para que todas as pessoas disponham da mesma qualidade na educação e na saúde. Quanto ao resto, a gente pode perfeitamente tolerar certos graus de desigualdade, dentro, obviamente, de alguns níveis. Não tem havido igualdade na educação e na saúde nem próxima da que deveria existir.

            O Sr. José Bezerra (DEM - RN) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Com todo o prazer, Senador.

            O Sr. José Bezerra (DEM - RN) - V. Exª domina a educação e, agora, está também falando sobre o tema saúde. Tenho uma inexperiência muito grande no setor público, nunca fui servidor público, nunca atuei na área pública, mas V. Exª já foi Ministro de Estado e Governador. Eu não queria fazer um aparte, mas uma pergunta a V. Exª: tanto na parte de educação quanto na parte de saúde, essa não seria uma questão de gestão? Digo isso, porque se sabe muito bem que os dirigentes públicos do nosso País, nos âmbitos estadual, municipal e federal, deixaram de mexer politicamente em um setor - e esse setor vai muito bem, obrigado; esse é o único setor que vai bem na área pública -, que é o setor da arrecadação. Nesse setor, não há mais intervenção política. Enquanto isso, fazem uso político das Pastas da saúde e da educação, e aí vem a má gestão, e faltam recursos. Os recursos são mal alocados, não há um disciplinamento na atuação, às vezes, dos professores, dos diretores de escola, dos secretários. Aí está a origem desse caos não só em Brasília, onde o senhor é Senador, mas em todos os Estados do Brasil. Assim ocorre no meu Estado: a educação não funciona, e, quanto à saúde, nem se fala, e por aí vai. Era uma pergunta que eu queria fazer para o senhor.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Respondo com muito prazer, Senador. Sem dúvida alguma, é uma questão de gestão. Não levanto, por exemplo, como alguns fazem, a suspeição quanto aos custos, não digo que os custos estariam inflados artificialmente. Não, não vou entrar nisso. Acho que é uma questão de gestão, mas não só de gestão. É também uma questão de concepção, a concepção de que, para se resolver o problema da saúde, é preciso fazer mais hospitais, não fazer com que haja menos doentes pela prevenção, com a questão da água, do esgoto e das condições de trabalho, e de que, entre o doente e o hospital, é preciso haver um processo de atendimento primário. Essa é uma concepção. A concepção que hoje prima é a concepção da obra, não a da saúde. Essa concepção, a meu ver, é que está matando o processo interno. Quer-se inaugurar prédio de hospital, e aí se faz qualquer coisa para haver mais hospitais, não para haver menos doentes. É, sobretudo, uma questão de concepção, mas é também uma questão de gestão.

            Respondendo a questão, de acordo com sua ponderação, acho que o menor problema é a falta de recursos financeiros neste momento, pelo menos no que se refere ao Distrito Federal, pela transferência que o Governo Federal faz, por sermos a Capital da República. Em outros Estados, isso se deve à falta de recursos, sim. Aqui, há basicamente uma concepção equivocada. O programa do Saúde em Casa, por exemplo, foi extinto com uma assinatura do Governador, com uma assinatura dada no dia 1º ou 2 de janeiro de 1999. Quatro mil servidores que atendiam nesse programa foram exonerados, porque trabalhavam no sistema que funcionava coordenado com o sistema de saúde, mas não dentro do mesmo sistema de saúde. Então, foi uma questão de concepção. E, até hoje, essa concepção não foi retomada no sentido que todos defendem. Aliás, essa não é uma novidade no Brasil, isso funciona, sobretudo, na Inglaterra há décadas.

            Deixo aqui, Senador, minha manifestação de preocupação com a saúde no Distrito Federal. Hoje, somos uma cidade doente, porque a saúde está numa profunda crise.

            Era isso, Sr. Presidente, o que eu tinha a dizer.

 

            


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/08/2010 - Página 42497