Discurso durante a 157ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas às medidas anunciadas pelo governo para coibir quebra de sigilos na Receita Federal. Críticas às declarações da Ministra Erenice Guerra, diante das denúncias de tráfico de influência envolvendo a Chefe da Casa Civil, seu filho e os Correios. (como Líder)

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Críticas às medidas anunciadas pelo governo para coibir quebra de sigilos na Receita Federal. Críticas às declarações da Ministra Erenice Guerra, diante das denúncias de tráfico de influência envolvendo a Chefe da Casa Civil, seu filho e os Correios. (como Líder)
Aparteantes
Heráclito Fortes, Kátia Abreu, Marisa Serrano.
Publicação
Publicação no DSF de 16/09/2010 - Página 45634
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, DECLARAÇÃO, JOSE DIRCEU, EX MINISTRO DE ESTADO, CHEFE, CASA CIVIL, ANALISE, FUNÇÃO, IMPRENSA, CRITICA, ORADOR, ALEGAÇÕES, PERSEGUIÇÃO, GOVERNO, TENTATIVA, MANIPULAÇÃO, NEGLIGENCIA, CORRUPÇÃO, LONGO PRAZO, IMPUNIDADE, CRIME, FAVORECIMENTO, ELEIÇÕES.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), OMISSÃO, IRREGULARIDADE, RECEITA FEDERAL, QUEBRA DE SIGILO, NATUREZA FISCAL, DESRESPEITO, DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS, QUESTIONAMENTO, DECLARAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, CHEFE, CASA CIVIL, ACUSAÇÃO, OPOSIÇÃO, RESPONSAVEL, DENUNCIA, TRAFICO DE INFLUENCIA, REPUDIO, TENTATIVA, DESVIO, ATENÇÃO, SUSPEIÇÃO, CORRUPÇÃO, REGISTRO, ENCAMINHAMENTO, REPRESENTAÇÃO, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, SOLICITAÇÃO, INSTAURAÇÃO, PROCEDIMENTO, INVESTIGAÇÃO, COBRANÇA, PUNIÇÃO, COMPROVAÇÃO, OCORRENCIA, CRIME, IMPORTANCIA, DEFESA, INSTITUIÇÃO PUBLICA, GARANTIA, PRESERVAÇÃO, ESTADO DE DIREITO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobre Senador João Faustino, do Rio Grande do Norte, Srs. Senadores, Srª Senadora, visitantes de Santa Catarina que nos honram com sua presença - aos visitantes da galeria, a nossa homenagem -, creio que é oportuno fazer uma análise das providências adotadas ontem, tanto pelo Governo quanto pela oposição, relativas às denúncias que lastimavelmente, mais uma vez, provocaram indignação em parte da sociedade brasileira.

            Eu começaria relatando a afirmação do ex-Deputado José Dirceu, um prócer petista de grande influência que, pelo que se anuncia e se eventualmente o seu partido vencer as eleições, terá papel preponderante no novo governo. Ele, além de afirmar que a eleição de Dilma Rousseff é mais importante do que a eleição de Lula, porque ela representa o projeto político do partido e vai depender muito mais do partido do que Lula, já que este se sobrepôs à própria agremiação partidária, destacou que as teses defendidas pelo PT ao longo do tempo, ignoradas durante o período Lula de Governo, poderão ser ressuscitadas se eventualmente chegar ao poder Dilma Rousseff. Essa é uma questão que cabe muito mais ao PT do que a nós. Porém, de qualquer maneira, é um registro que se faz necessário nesta fase final da campanha eleitoral, até porque o povo brasileiro precisa saber quem elege e que modelo de governo terá em consequência da escolha feita.

            Mas o que eu queria destacar das palavras de José Dirceu é que ele criticou o que chamou de abuso do poder de informar. Repito: “Abuso do poder de informar”. Houve um tempo em que se considerava que a imprensa brasileira era petista, que defendia os interesses do PT e que, nas redações dos jornais do País, só existiam petistas. Essa era a constatação que se fazia há alguns anos. É evidente que nem todos nós concordávamos com isso. Mas esta era uma afirmação reiterada: a imprensa brasileira tinha o carimbo do PT para muitos neste País. E, agora, ao contrário, há petistas, históricos inclusive, que acusam a imprensa brasileira de ser oposicionista. É mais fácil acusar a imprensa do que justificar crimes, falcatruas, corrupção, ilegalidades, arbitrariedades. E é o que tem acontecido. Até é possível que, em determinado momento, o espaço maior da mídia seja ocupado pela oposição como consequência natural dos fatos produzidos.

            Ora, o rosário de crimes ocupa um espaço grande da mídia; não há como ignorar a existência de tantos crimes, de tantos escândalos, de tantas falcatruas. E se há algo competente, na imprensa nacional, é o jornalismo de investigação. Então, é evidente que há uma competição, em determinados momentos da vida pública brasileira, entre jornalistas e veículos de comunicação, uma competição na busca da notícia, da informação, da revelação, da denúncia, da descoberta. E é natural que seja assim. É por isso que aquele estadista norte-americano afirmou, certa vez: “Entre um governo sem imprensa e a imprensa sem governo, eu prefiro a última alternativa” - Thomas Jefferson.

            Portanto, eu não creio que seja adequado responsabilizar a imprensa pelos crimes de corrupção praticados no Brasil.

            Vejam, agora, estamos comemorando quatro anos do escândalo dos aloprados. O chamado escândalo dos aloprados - vamos rememorar porque, afinal, são tantos escândalos que é até natural que as pessoas não o identifiquem - é aquele que, na campanha passada, há quatro anos portanto, foi denunciado: apareceu uma mala com R$1,75 milhão, num hotel em São Paulo, recursos sem origem, destinados a pagar por um dossiê falso que tinha como objetivo alvejar a candidatura de José Serra ao governo paulista. E foi o próprio Presidente Lula que denominou de “aloprados” aqueles que se encarregavam dessa operação.

            O que importa dizer agora é que se passaram quatro anos e não há notícia de punição. Então, vamos lá: de onde veio o dinheiro? Não sabemos. Até hoje não se informou à sociedade brasileira de onde vieram os R$1,75 milhão carregados em uma mala. E quais são os aloprados? Alguns nomes apareceram na imprensa, mas não houve responsabilização criminal.

            Informa a imprensa, hoje, que o Ministério Público Federal ainda não decidiu se leva os envolvidos à Justiça. Ou seja: se os envolvidos num escândalo dessa natureza não são levados à Justiça, talvez os bandidos que estão presos nas nossas penitenciárias passem a ter o direito de pedir: “Abram as portas das penitenciárias. Somos iguais perante a lei”. Se podem carregar uma mala com R$1,75 milhão, sem origem, para pagar um dossiê criminoso e nada acontece, por que manter as nossas penitenciárias abarrotadas de marginais? Ou a lei não é igual para todos?

            O Procurador da República Mário Lúcio Avelar, que atuou inicialmente, saiu do caso, e o novo está de férias. É uma coincidência. O Ministro Relator do processo do mensalão está de licença; o outro Procurador está de férias. Isso nos faz supor que há uma estratégia deliberada de protelação para aguardar as eleições de 3 de outubro.

            Resultado conhecido, aí vamos trabalhar, aí vamos recuperar o tempo perdido, aí vamos fazer com que os processos caminhem no Ministério Público, no Judiciário. Essa é a estratégia eleitoral. Ou não é estratégia eleitoral? Espero que não seja, mas se não é estratégia eleitoral, por que tanto tempo? O mensalão, cinco anos. O mensalão, 2005; os aloprados, 2006. Também pudemos conhecer informações sobre avião que voava carregando dinheiro em espécie; tivemos, nesse período todo, informação de militante do PT carregando dólares na cueca. Enfim, foram tantos os escândalos, e nós perguntamos: quem foi punido? Quem está na cadeia? Houve responsabilização criminal? Porque o Presidente da República disse, lá em Santa Catarina, há poucos dias, que “a turma dele mata a cobra e mostra a cobra”. Eu não vi a morte da cobra, muito menos a cobra, em relação a esses escândalos produzidos sob a égide do Governo “lulopetista”.

            Mas, Sr. Presidente, ontem, o Governo agiu. Num primeiro momento, o Presidente da República desdenhava. Num comício no ABC paulista, ele brincava: “O que é sigilo? Onde está esse sigilo? Esse tal de sigilo?” - subestimando a inteligência das pessoas. E me lembro que, num dos livros de autobiografia, o livro de autobiografia de Hillary Clinton, ela conta que, quando do episódio Watergate, nos Estados Unidos, ela, Bill Clinton e outros juristas foram escalados para identificar justificativas para o impeachment do presidente Nixon. Entre as justificativas, aquela que mais se ressaltava era a quebra de sigilo fiscal, ou seja, invadiram a privacidade das pessoas violando o sigilo fiscal, para armazenar informações que seriam utilizadas, na campanha eleitoral, contra o Partido Democrata nos Estados Unidos. Lá, não acabou em pizza; lá, o presidente perdeu o mandato. O presidente foi obrigado a renunciar ao seu mandato. Aqui, o que acontece? O Ministro da Fazenda convoca a imprensa e anuncia: “Estamos tomando providências”. Agora, quem violar sigilo fiscal é demitido”. Mas antes não era demitido? É preciso o Ministro da Fazenda anunciar que violação de sigilo fiscal tem como consequência primeira a demissão do servidor público responsável pelo crime? É preciso adotar uma medida provisória para que o País saiba, os servidores públicos saibam que a violação de um sigilo fiscal, preliminarmente, importa na demissão do responsável? E as outras medidas insignificantes diante da violência do crime praticado contra brasileiros, especialmente localizados na oposição?

            É encenação! Isso não passa de um espetáculo de marketing do Governo, na tentativa de abafar o escândalo, primeiramente ocupando o espaço de mídia para reduzir o espaço da denúncia, competindo com o espaço da denúncia.

            Anuncia-se, de outro lado, investigação, e é evidente que o cidadão menos avisado vai se impressionar: “O Governo está tomando providências. Vai investigar e vai punir”. Mas que investigação é essa? Para usar um linguajar bem popular, bem ao estilo do Presidente Lula, é “o cabrito cuidando da horta”. Ora, são instrumentos do próprio Governo, nomeados pelo próprio Governo. E já há precedente: atuam muito mais para acobertar do que para revelar, como ocorre, agora, na Receita Federal. A Corregedoria investiga para revelar ou para acobertar? A Corregedoria da Receita Federal investiga para acobertar, para proteger, para blindar os principais responsáveis pelo crime de violação do sigilo fiscal. Ou não?

            Qual é a estratégia adotada? A versão de hoje desmente a de ontem e espera a de amanhã para ser desmentida. O despiste: ora foi D. Antônia que violou o sigilo, ora aparece uma Adenilde, depois foi um office boy que levou a procuração, enfim, procuram embaralhar. Na verdade, cabe a responsabilização do Secretário da Receita e do Corregedor da Receita, porque estão obstruindo as investigações para proteger criminosos, porque o crime o Governo já admitiu existir. O próprio Ministro da Fazenda, de forma inusitada também, vai e se dirige ao País, dizendo: “Não, isso é normal, isso é banal, isso acontece a toda hora”. Ora, um crime que afronta a Constituição do País, o Código Tributário Nacional, um crime que é, sim, uma ameaça ao Estado de direito é banalizado pelo próprio Governo. O próprio Governo admite que o crime existe, mas não quer que criminosos apareçam e adota essa estratégia de obstrução das investigações com o despiste, com a mistificação, para ganhar tempo, a fim de que as eleições transcorram e isso caia no esquecimento, como ocorreu em 2006, porque, em 2006, também sigilos foram violados, de muita gente, e nenhuma providência conhecida foi consumada, nenhuma punição rigorosa foi anunciada. Aliás, em matéria de quebra de sigilo, o Brasil vai se transformar em campeão mundial.

            Olha aqui mais uma informação no dia de hoje: 400 mil pedidos da Petrobras de quebra de sigilo. Mas por que uma empresa estatal haveria de pedir à Polícia Federal, ou à Polícia Civil, ou a qualquer policial, ou a qualquer espião realizar espionagem, invadindo direitos consagrados constitucionalmente para violar sigilos? Com que direito a direção da Petrobras faz isso? Autorizada por quem? Pelo Presidente da República? Há justificativa para violência às normas jurídicas impostas como garantia de sustentação do Estado de direito? Como pode a direção da Petrobras fazer isso? E o que acontece? Agora, o inquérito foi enviado ao Ministério Público.

            Vejam aqui que coisa interessante: três funcionários da Petrobras disseram, ao depor, que pediam de oitocentos a mil pesquisas de antecedentes criminais por semana. Em troca, a estatal dava material de escritório, cesta de Natal e brindes a policiais. As pessoas que tiveram sua vida vasculhada eram candidatas a emprego na estatal ou eram terceirizadas.

            Esta é uma prática do atual Governo. Isto faz parte da cartilha. É um item indispensável no roteiro de realizações do atual Governo.

            Enfim, Sr. Presidente, a banalização deste crime pode não incomodar pessoas menos avisadas, mas as pessoas esclarecidas deste País, especialmente aquelas que participaram ativamente do processo de redemocratização do Brasil, não podem aceitar passivamente essa violência. E a indagação que se faz é: e os partidos políticos? E as entidades?

            Sr. Presidente, a presença do Ministro da Fazenda, diante desses fatos, anunciando as providências que anunciou, é patética. É uma aparição esdrúxula, estapafúrdia. Não são providências que se compatibilizem com a gravidade do momento que vivemos com a violação de sigilo e com a prática da corrupção no Governo.

            A Srª Marisa Serrano (PSDB - MS) - Permita-me V. Exª um aparte?

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Já concederei o aparte à Senadora Marisa Serrano.

            Quero também abordar o que se anunciou como providência relativamente ao “propinoduto” instalado no quarto andar do Palácio do Planalto.

            Senadora Marisa Serrano, concedo, com prazer, o aparte a V. Exª.

            A Srª Marisa Serrano (PSDB - MS) - Obrigada, Senador Alvaro Dias. Quando a gente fala em sigilo fiscal, em sigilo bancário, as pessoas, às vezes, não têm a exata dimensão do fato. Mais grave ainda é saberem do seu salário, saberem no que você gasta, de onde entrou o dinheiro, como é que você o recebeu e como é que você o gastou. Cidadão nenhum deste País quer ser bisbilhotado, quer que bisbilhotem sua vida. A gente fala em sigilo bancário e em sigilo fiscal, Senador Alvaro, e as pessoas, às vezes, não percebem a gravidade. Ninguém aceita que as pessoas fiquem bisbilhotando sua vida a fim de saberem o quanto ganha, onde gastou o dinheiro e por que o gastou. Cada um tem de ter a sua liberdade, a liberdade de poder gerir sua própria vida. Esse é o problema maior. Como V. Exª disse, é muito grave ver a vida vasculhada. E ver a vida vasculhada ninguém aceita. Agora, causa-me espanto, Senador Alvaro Dias, ver a apatia do povo brasileiro nesse momento. Situações graves ocorrendo, não só nessa área, mas em outras áreas também, o ex-Ministro José Dirceu dizendo aí que a imprensa é livre demais, que precisamos calar a boca de quem fala muito, quer dizer, as coisas acontecendo neste País, mostrando o rumo que as coisas estão tomando, e a gente não vê uma revolta popular, não vê a população realmente indignada com esses fatos todos. Parece até que é só coisa da oposição. Parece até que é só nós que vemos isso: a quebra do Estado de direito, que justamente faz com que o País se apequene frente a todos esses fatos; que as nossas maiores virtudes, as virtudes de um povo que se quer sério, que se quer confiável, vão por água abaixo. E o povo brasileiro aceita isso. É hora de reagir, Senador Alvaro. É hora de o povo brasileiro reagir e ver que não é possível a gente conviver com questões tão sérias como essa. Acho que o povo ainda não se aquilatou. Sei disso porque, às vezes, um funcionário, vamos pegar um funcionário desta Casa, do Senado, não quer que o holerite dele esteja na mão de todo mundo; não quer que todo mundo saiba o que ele ganha e no que ele gasta. Isso é quebra de sigilo. Isso é colocar a vida da pessoa na rua. É por isso que estamos brigando, para que as liberdades democráticas sejam mantidas neste País, para que o Estado de direito aconteça neste País. É por isso a nossa luta, e não porque somos da oposição. Queremos que homens e mulheres da oposição e da situação, gente que confia no País, gente que percebe o que está acontecendo, não permitam que a corrupção desenfreada, que o aparelhamento desenfreado, que o mal feito desenfreado tomem conta de um País como o nosso. Parabenizo V. Exª pela fala. Vamos continuar lutando por aquilo em que acreditamos. Muito obrigada.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senadora Marisa Serrano. Na verdade, querem...

            O SR. PRESIDENTE (João Tenório. PSDB - AL) - Senador Alvaro Dias,...

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Pois não.

            O SR. PRESIDENTE (João Tenório. PSDB - AL) - A Presidência gostaria apenas, interrompendo V. Ex

            ª, de registrar a presença de estudantes e professores do curso de Direito do Centro Universitário de Anhanguera, Estado de São Paulo, que participam desta sessão onde se discute, com muita exaustão e com muita propriedade, o Estado de direito no Brasil.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador.

            É emblemática a presença de estudantes de Direito no momento em que o Brasil é sacudido em razão da violência que se pratica como rotina, a violência banalizada à Constituição do País - repito -, com ameaças visíveis ao Estado de direito.

            Na verdade, quando denunciamos, quando criticamos, somos acusados, porque há aí uma inversão de valores, há uma tentativa de se condenar quem denuncia para absolver quem é denunciado. Traduzindo isso em linguagem bem popular: quem acusa o criminoso deve ir para a cadeia, o criminoso não. É isso que acontece no Brasil.

            Veja o que diz a Ministra Chefe da Casa Civil da Presidência da República, Erenice Guerra. Com todas as denúncias, denúncias ricas em detalhes, em indícios, em depoimentos, com todo esse emaranhado na estrutura da Administração Pública com o objetivo de abrir portas para a corrupção, com tudo isso tendo origem na Casa Civil da Presidência da República, ela tem a ousadia de afirmar que em favor de um candidato a ético e já derrotado, em tentativa desesperada da criação de um fato novo, que anime aqueles a quem o povo brasileiro tem rejeitado.

            Ora, Sr. Presidente, com que autoridade moral e política a Srª Erenice Guerra agride verborragicamente a José Serra? Ela está em condições de agredir agora ou ela teria que, primeiramente, dar explicações sobre esse “propinoduto” da Casa Civil? Antes de atacar, justifique-se, explique-se, defenda-se, busque ter autoridade política e moral para o ataque. Sinceramente, se esse é o atacante do time do Lula escolhido para alvejar a oposição, parece-me que a escolha não foi muito adequada, especialmente neste momento.

            É como se nada estivesse acontecendo no Governo, mas vai para as páginas de jornais e se lê: “escritório assinou dois contratos sem licitação. [...] onde Israel Guerra, filho da Chefe da Casa Civil, costumava despachar, assinou dois contratos, sem licitação, com a União”. É isso que a Srª Erenice Guerra tem que explicar, é dessa denúncia que ela tem que se defender, e não é agredindo o candidato de oposição que ela terá a sentença de absolvição.

            Aí adiante ela diz que é factóide. A Dona Dilma diz que é factóide. A candidata à Presidência da República disse que o caso Erenice é outro factóide, factóide com contratos assinados sem licitação. Aí, adiante, encontra-se outra notícia: “auditoria liga irmão de Erenice a desvios”. Foram R$5,8 milhões desviados. A própria Controladoria-Geral da União auditou e verificou. Esse é irmão.

            Mas vamos adiante.

            A Srª Kátia Abreu (DEM - TO) - Senador, V. Exª me concede um aparte?

         O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Eu já concederei. Deixe-me só... Aí outra notícia: “Empresas de Erenice só existem no papel”. Aí nós encontramos no jornal Correio Braziliense uma pirâmide de quem é quem, ou seja, são os amigos, os parentes, os laranjas, os servidores públicos, todos vinculados à Srª Erenice Guerra num esquema supostamente de corrupção. Vamos ser justos e corretos. Ainda não houve investigação finalizada. Vamos usar a expressão “suposto esquema de corrupção”. E aqui há um descritivo sobre o que ocorreu. Eu gostaria apenas...

         Aqui um dos citados é o Sr. Marco Antonio Oliveira. Ele foi responsável pelos principais contratos celebrados na Infraero durante certo tempo, contratos que foram denunciados como irregulares. Quando houve a mudança na área, pretendeu-se nomear o Sr. Marco Antonio Oliveira. O Ministro Nelson Jobim não acolheu a sugestão, e ele não foi nomeado, mas foi para a Vice-Presidência dos Correios e era Vice-Presidente dos Correios exatamente quando este contrato, agora denunciado, foi assinado.

         A mãe do Marco Antonio, inclusive, consta - provavelmente, o seu nome foi utilizado - como sócia dessa empresa, da empresa do filho de Erenice.

(Interrupção do som.)

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Ela mora no interior de Minas. Evidentemente, o seu nome foi utilizado. A expressão é pejorativa, mas foi utilizada. Como é corriqueiro utilizar-se desta expressão, seu nome foi utilizado como “laranja” para compor, evidentemente, essa empresa.

            Eu vejo que o Senador Roberto Cavalcanti está acionando a campainha para que eu conclua o meu pronunciamento.

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - Não! Eu tenho a maior consideração. Regimentalmente, V. Exª teria direito a cinco minutos. Foram dados, até agora, trinta e cinco minutos.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Não. Regimentalmente, vinte minutos. Em sessão não deliberativa, o horário da liderança é de vinte minutos. Mas o Regimento já foi rasgado nesta Casa há muito tempo. O Regimento foi rasgado há muito tempo.

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - V. Exª é um defensor da legalidade.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Na verdade, o que conduz os trabalhos da Casa é a benevolência de quem preside ou não.

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - V. Exª quanto tempo deseja?

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Eu vou concluir, até porque...

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - Não, não. Darei a V.Exª o tempo que achar conveniente.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado.

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - Quanto tempo deseja?

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - V. Exª é elegante. Vou conceder um aparte à Senadora Kátia Abreu, depois procuro concluir o meu pronunciamento o mais rapidamente possível.

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - Mas peça. Quanto tempo deseja?

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Não há necessidade de estabelecer um tempo, porque vou ser sucinto. Vou utilizar toda a minha capacidade de síntese para encerrar este pronunciamento o mais rapidamente possível.

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - Fui assessorado pela Mesa que, na verdade, informou que, no dia de hoje, o tempo seria de cinco minutos.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Hoje não há sessão deliberativa.

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - Mesmo assim.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Quando não há sessão deliberativa, o Regimento possibilita vinte minutos para a liderança.

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - De vinte V. Exª teve mais quinze e terá quanto tempo desejar.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Essa tem sido a norma utilizada nesta Casa. Se não está escrito no Regimento, é usual que, quando não há sessão deliberativa, o horário de liderança passe a ser vinte minutos.

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - Por isso estou perguntando quanto tempo V. Exª deseja.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Evidentemente, o horário de liderança nesta Casa tem sido de quarenta minutos ou uma hora, dependendo do interesse da Casa e de quem preside a sessão. Obviamente talvez esse assunto não seja tão interessante. Mas agradeço a V. Exª que tem sido sempre um cavalheiro, muito elegante, um Senador cordial.

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - V. Exª terá quanto tempo desejar.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Concedo a palavra à Senadora Kátia Abreu.

            A Srª Kátia Abreu (DEM - TO) - Obrigada, Senador Alvaro Dias. Quero parabenizar V. Exª pelo pronunciamento e pela atenção que tem dispensado a essas questões que estão acontecendo no Brasil, dedicando-se com detalhes e de forma muito justa e muito correta em relação a essas aberrações que estamos vendo todos os dias. Realmente, é desanimador ao que estamos assistindo no País. Não é uma disputa democrática pelo debate, pela convicção, pelos argumentos, pelas propostas. Estamos vendo, de um lado, um candidato que se chama Serra disputando a eleição com o Governo do PT. Ele não está disputando com uma candidata apenas. Ele está disputando com um governo de que um partido tomou conta. É uma disputa desleal, injusta, em que o Presidente não é o cabo eleitoral da campanha, mas o general, é quem faz todo o comando da campanha. Sinceramente, é devastador para a democracia toda essa bisbilhotice averiguando a vida alheia. No interior - e a Senadora Marisa Serrano aqui explicou muito bem -, quebra de sigilo bancário, quebra de sigilo fiscal, é o mesmo que invadir a sua casa sem tocar a campainha, sem bater à porta e sem ser a sua comadre. É um estranho que invade a sua vida, é um estranho que invade a sua intimidade, que invade, na verdade, a sua alma, que invade aquilo que você tem de direito. O resultado de suas contas bancárias, seu saldo bancário, é um direito de propriedade. Aquele dinheiro que está na sua conta, salvo engano, não sendo de mensalão produzido pelo Governo, é fruto de labor, de trabalho, de suor das pessoas. Portanto, ninguém precisa estampar a escritura de suas propriedades, o saldo de suas contas bancárias. Elas são individuais, pessoais. É um direito que o cidadão tem em qualquer democracia. Não queiram fulanizar uma situação dessa como se a quebra do sigilo bancário e fiscal pudesse ser uma coisa simples. Isso é agressão máxima à democracia. E ainda somos obrigados a assistir ao Presidente ir a Santa Catarina, como fez na segunda-feira, inaugurar obras, fazendo campanha para a sua candidata - porque ele não sai da TV, como garoto-propaganda dela. Inaugurou obras durante o dia, porque o candidato Raimundo Colombo, do Democratas, está em primeiro lugar nas pesquisas, e ele não se conforma. Foi lá inaugurar obras durante o dia. E à noite, num “comiciozinho”, ele aproveitou para agredir pessoas. Ele não convive com o adverso. Ele não convive com a oposição. Alguém tem de dizer a esse senhor que na democracia alguém ganha e alguém perde. Nem sempre dá para ser unanimidade, graças a Deus! Não dá pra ganhar em todos os Estados. Portanto, ele não precisa ficar tão feroz por isso, tão arrasado por isso, tão triste e tão mal-educado com isso. Ele disse que o nosso candidato Raimundo Colombo, do Democratas, é um cordeiro vestido com pele de lobo, agredindo frontalmente a família Bornhausen. Agora, Sr. Presidente, meu colega Senador, eu queria dizer que há também ditados interessantes. Ele disse que é lobo em pele de cordeiro. Mas também tem um ditado interessante que diz que a mulher de César tem que ser honesta e tem que parecer honesta. Agora, com este Governo é diferente: não precisa nem parecer e nem ser honesto. É o lobo na pele do lobo, infelizmente. Muito obrigada, Sr. Presidente.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senadora Kátia Abreu.

            Ouço, com prazer, o Senador Heráclito Fortes.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Senador Alvaro Dias, V. Exª tratou de alguns temas da maior seriedade, de fatos que ocorrem hoje no País, e nós chegamos a achar que o País está anestesiado. Essa invasão de privacidade às contas de cidadãos brasileiros é inaceitável. É evidente que nós estamos aqui tratando de três ou quatro casos, porque se tratam de pessoas notórias, cujo pai, cujo sogro ou o próprio - no caso - Eduardo Jorge tem uma militância política direta. Quantos empresários não foram vítimas de chantagens de partidos políticos para fazer doações à Receita Federal. Os indícios existem. Os jornais publicaram, à época, casos concretos. E nada disso nunca foi apurado. Nós estamos vivendo, Senador Alvaro Dias, realmente, um período de difícil compreensão. Esse escândalo envolvendo a Chefe da Casa Civil, seu filho e os Correios e Telégrafos, além da imoralidade do ato do tráfico de influência, tem algo que a Nação brasileira não pode aceitar, que foi a falência do Sedex. O Sedex brasileiro, a rede postal noturna, foi, durante anos a fio, modelo para o mundo. Campeão de eficiência, ganhou medalhas, teve o reconhecimento mundial. Disputava com o correio inglês e, salvo engano, com o correio suíço; ganhava do correio japonês e do correio americano. De repente, entra nesse caos. Um caos anunciado. Se a imprensa for examinar direito, tiver interesse em examinar direito, é preciso ver que algumas empresas que atuavam no setor há trinta, quarenta anos, foram desqualificadas de maneira muito esquisita para que essa MTA, MTB, sei lá, MT alguma coisa, tivesse um lugar ao sol de maneira pouco clara. E agora os fatos vêm à tona. Havia o dedo Palácio do Planalto, através da Chefe da Casal Civil lá dentro, que teve a ousadia de colocar um sócio da empresa numa diretoria. Isso é uma coisa inaceitável” Esse assunto para mim não é novo, porque uma das empresas prejudicadas é uma empresa vizinha ao meu Estado, a Transportes Aéreos Fortaleza, que durante muitos anos serviu aos Correios e passou a ser perseguida de maneira afrontosa até ser sufocada para que se abrisse espaço para... Aliás, eu tive um encontro, fui ao Ministro, juntamente com o Senador Inácio Arruda, do Ceará, de maneira clara, transparente, defender uma empresa nordestina. E eu, naquela época, dizia: “Olha, são as empresas do Centro-Oeste querendo acabar com a única empresa que no momento atua no setor”. A empresa hoje passa dificuldades. E agora está muito claro o que havia por trás disso tudo. Em um país onde as leis são respeitadas, cabe uma ação de indenização por parte dessa empresa prejudicada, porque agora está claro o privilégio dado a uma empresa que tinha como seu representante legal nada mais nada menos do que o filho da Ministra Chefe da Casa Civil. É lamentável, é verdade. Agora, duvido que dê em alguma coisa. Muito obrigado.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Obrigado, Senador Heráclito Fortes.

            Vou concluir, Sr. Presidente, agradecendo...

            O SR. PRESIDENTE (Roberto Cavalcanti. Bloco/PRB - PB) - Senador Alvaro Dias, só uma referência. Nós estamos recebendo os alunos do 3º ano do ensino fundamental da Escola Classe 56, de Ceilândia, Distrito Federal. V. Exª está tendo o privilégio de, além da TV Senado, ter fisicamente a presença desses jovens.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - E esses são felizes porque ainda não terão seus sigilos violados. Nós esperamos que quando se tornarem de maior idade não passem por essa fase em que direitos individuais são ignorados.

            Mas, Sr. Presidente, eu creio tratar-se de uma missão que caberia a todos nós aceitar: defender as instituições brasileiras. Nós estamos assistindo à fragilização das nossas instituições. Por isso o nosso desejo, ao encaminharmos ao Procurador-Geral da República representação que pede a instauração dos procedimentos para investigação judiciária e eventualmente a responsabilização criminal, tem o objetivo de defender as instituições do País. O que não se admite mais é essa estratégia adotada pelo Governo de proteger os desonestos. Não há, da nossa parte, nenhum desejo de levar à desmoralização uma Comissão de Ética ou a Corregedoria da Receita ou a Corregedoria-Geral da União. Não é esse o nosso desejo.

            Mas nós temos um Estado aparelhado. Aliás, um Estado policial aparelhado. O Estado que faz espionagem, que admite a violação dos sigilos e que acoberta esquemas de corrupção, supostamente em nome de um projeto de poder, porque também em relação a esse propinoduto atual da Casa Civil se afirmou que os recursos seriam destinados a pagar compromissos de natureza política. Ou seja, supõe-se que seja em nome de um projeto de poder.

            Crimes são praticados para se chegar ao poder, crimes são praticados para nele permanecer. O que cabe não é ganhar uma eleição. Cabe, acima disso, defender as instituições públicas do Brasil, o que ontem desta tribuna afirmei, que não desejava ver a reedição do stalinismo no Brasil, porque o stalinismo apagava fotos e reescrevia textos para acobertar crimes e proteger criminosos. Que isso não se faça no nosso País.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/09/2010 - Página 45634