Discurso durante a 51ª Sessão Especial, no Senado Federal

Comemoração do Dia do Índio.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA INDIGENISTA.:
  • Comemoração do Dia do Índio.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2011 - Página 11696
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA, INDIO, MANIFESTAÇÃO, APOIO, CRIAÇÃO, ESTATUTO, PROTEÇÃO, DIREITOS, COMUNIDADE INDIGENA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Exmº Sr. Wilson Santiago, que preside esta sessão, o Exmº Sr. Senador Vicentinho Alves, membro atuante da minha Comissão de Direitos Humanos, foi lá, quando eu estava presidindo, e disse: “Olha, se você não for lá falar, se prepara, porque a moçada vem aqui com tacape na mão...” Existe outro nome além de tacape? “A borduna e o tacape, e tu vais ter de chegar lá.”

            Eu me lembro desse tacape numa negociação de que participei, há anos, sobre a questão das terras dos senhores. Esse tacape jogou pesado lá, como símbolo, como me disse o nosso querido Terena, de autoridade. Foi como símbolo de autoridade. Eu me lembro desse momento.

            Enfim, parabéns, Vicentinho, pela iniciativa.

            Eu estava presidindo os trabalhos da Comissão de Direitos Humanos, combatendo a violência nas escolas e nas ruas, essa violência absurda que acontece em todo o País. No momento em que encerrei, eu disse para eles que eu vinha para cá, com muita convicção, porque eu tenho certeza de que, se as tradições, a história, a forma de agir dos povos indígenas... Se aqueles que não são índios, sejam brancos ou negros, tivessem aprendido mais com vocês, nós não teríamos massacres como esse que aconteceu agora, no Rio de Janeiro, em que um filho desta geração assassinou 12 jovens.

            Por isso, parabéns a vocês, à cultura de vocês. (Palmas.)

            Nós, brancos e negros, temos de aprender muito, muito, muito com os povos indígenas.

            Quero dizer também, com carinho, ao Vice-Governador do Estado do Tocantins, que representa aqui o Governador Siqueira Campos, que eu tenho muito orgulho de ter recebido o título de Cidadão de Tocantins. Acompanhei a luta do Siqueira, quando ele fez greve de fome - eu era Constituinte à época - para a fundação do Estado do Tocantins. (Palmas.) Assinei e participei, e foi um gesto nobre.

            Meus parabéns ao Secretário Nacional de Saúde Indígena, Sr. Antonio Alves, que está aqui!

            Para mim, o bravo são aqueles que não querem vir discutir, que não querem ouvir críticas. Têm que vir e ouvir as críticas. Por isso, a minha crítica aqui à Funai, que está ausente. Tem que vir e ouvir. (Palmas.) Este é o Governo de que faço parte.

            Por isso, Secretário de Saúde Indígena, Antonio Alves, meus parabéns!

            Amanhã, realizaremos uma audiência pública às 9 horas, e eu vou insistir para a Funai estar lá. Eu dizia agora mesmo ao nosso amigo Terena que a vantagem da audiência pública é que lá vocês poderão falar; vocês vão poder manifestar as suas angústias, as suas indignações e dizer o que vocês esperam de nós, que somos Governo. Nós somos Governo e nós queremos ouvi-los.

            Esta sessão de homenagem tem uma simbologia importantíssima. Eu conversei com o Vicentinho, que, a partir desta sessão, me sugeriu que poderíamos marcar uma audiência pública no dia subsequente.

            Então, quero cumprimentar, mais uma vez, o Senador Vicentinho Alves, que me propôs marcar uma audiência pública. Ele vai estar lá dividindo a Presidência comigo para ouvi-los amanhã.

            Bom, eu diria aqui ao Marcos Terena, que o horário da audiência pública será, amanhã, às 9 horas, na Comissão de Direitos Humanos.

            O Marcos Terena é um ícone. Eu tenho o maior respeito pelo Marcos.

            Sabe, Terena, que eu insisti muito inclusive, para que você viesse e estivesse conosco amanhã. Você confirmou que vai estar amanhã conosco, haja vista a importância da sua presença. Segundo o meu protocolo, Marcos Terena estará representando as comunidades indígenas e, com alegria, ressalto que ele é Professor da Cátedra Indígena Internacional, queria pedir que déssemos uma grande salva de palmas a todo o povo indígena de todas as tribos, as origens e as etnias aqui presentes. (Palmas.)

            Permitam-me, porque eu fiz um discurso por escrito e vou ler para vocês aqui. São rápidas palavras. Tive o orgulho de, em um desses chamados abril indígena, fazer uma audiência no auditório Petrônio Portella, e lá estavam, no Petrônio Portella, mais de mil, que lá debateram com profundidade, cobraram, criticaram, lá vocês disseram: “Só discurso não adianta. Queremos ação”. E eu tive que ouvir, e dizer: “Vocês têm razão”. É isso mesmo. Não adianta acharmos que vocês vieram aqui só para ouvir o nosso discurso. Vieram para ouvir, para falar e para cobrar. E tem que ser assim mesmo. Eu sempre digo que não acontece nada se a gente não souber ouvir - e isso eu escrevo aqui no meu discurso - a batida do tambor; e o tambor bate e bate com razão.

            Enfim, quero fazer uma síntese homenageando vocês. Escrevi ontem à tarde o pronunciamento em homenagem a vocês:

            Uma vez falaram-me que houve um tempo em que tudo era bom. Tudo era alegre. Um momento feliz em que os deuses olhavam por todos nós.

            Naquela época, não havia doenças, então, não havia pecado; então, não havia nenhuma dor, nem febre, nem varíola, nem azia, nenhum desperdício. Saudáveis vivíamos.

            Mas esse tempo acabou. Foi embora, ficou para trás. Pois o ódio chegou e com ele seus hediondos cães de guerra.

            Navios, com suas velas brancas trazendo cobiça, engano, mentira, traição. E, pelos séculos que passaram, podemos ver os semblantes refletidos, devastados, queimados, esmagados, torturados, mortos.

            Fala-se em mais de 100 milhões de indígenas sacrificados, caídos em genocídios, um continente inteiro escravizado, para saquear a madeira, o ouro, a prata, a terra.

            América Latina, ah, América Latina, o que fizeram com teus filhos que aqui nasceram? (Palmas)

            Ah, América Latina, que se peça perdão, sim, aos negros - e eu sou negro -, que foram sequestrados na África; que se peça perdão! Mas que se peça também perdão porque massacraram toda uma nação dos povos indígenas! Peçam perdão também aos povos indígenas! (Palmas.)

            América Latina, sim, América Latina! O que fizeram com teus filhos que aqui nasceram junto com a criação da terra, do sol, da lua, do ar e da vida?

            Vitor Heredita assim descreveu Taki Ongoy: movimento indígena de dimensões complexas, que surgiu na América Latina, entre 1564 e 1572, em oposição à invasão do homem estrangeiro.

            Este movimento combinava elementos políticos, religiosos e culturais.

            Duzentos anos depois, no atual Estado do Rio Grande do Sul, o meu Estado, o Cacique Guarani Sepé Tiarajú, Corregedor dos Sete Povos das Missões, e mais de 1.500 indígenas são trucidados e tombam em defesa do solo pátrio, em defesa do Rio Grande, em defesa do Brasil.

            O bravo guerreiro Sepé não entendia de políticas externas e acordos internacionais, apenas desejava preservar a sua terra contra aqueles a quem via como inimigos de seu povo, que entravam pela fronteira.

            A resistência heróica de Sepé não compreendia que o Tratado de Madri, assinado pelos reis de Portugal e Espanha, dava ao primeiro os Sete Povos das Missões e, ao segundo, a Colônia de Sacramento, hoje, a atual República do Uruguai.

            Poderia lembrar aqui, no século passado, outros mártires, com Ângelo Kaigang - estão aqui os kaigangs -; lembro aqui de Marçal Tupã; lembro aqui de Xicão Xucuru; lembro aqui de Galdino Pataxó, queimado vivo; lembro aqui de Arnaldo Apurinã; lembro aqui de Marcos Verón, Dorvalino Guarani-Kaiowá, e tantos outros que se juntaram à constelação sagrada das estrelas que iluminam os caminhos que nos levam ao destino que nos espera, que é alcançar uma terra sem males.

            Eles foram sacrificados, estão lá a iluminar a todos nós.

            Enfim, os povos indígenas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, primeiramente, têm direito, sim, à memória, à verdade, à sua história, à preservação da sua cultura.

            Fala-se tanto na Comissão da Verdade. Eu quero a Comissão da Verdade, para saber o que aconteceu no tempo da ditadura, mas por que a gente não faz a Comissão da Verdade para punir e lembrar aqueles que massacraram e que estão massacrando até hoje os povos indígenas? Que haja duas Comissões da Verdade!

(Manifestação nas galerias.)

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Sr. Presidente, paralelamente a isso, queremos os direitos que lhes garantam acesso à vida, à liberdade, à terra, à demarcação das suas terras, à proteção da biodiversidade, à saúde e ao ensino. Por que não lembrar aqui todas essas catástrofes que envolvem o meio ambiente? Se tivessem ouvido a sabedoria dos povos indígenas, isso não estaria acontecendo.

            Sr. Presidente, existem hoje, no Congresso Nacional, tramitando nas duas Casas, mais de 100 propostas sobre o tema. Sei que é fundamental, sei que é importante a aprovação desses temas, desde que ouçam os povos indígenas. Que não prevaleça só a visão da maioria que está aqui dentro e que não são descendentes ou nem conhecem a história dos povos indígenas. Eu, por exemplo, confesso, tenho uma simpatia pelo estatuto dos povos indígenas, mas entendo que elas podem andar, tramitar, se vocês avalizarem. Falo isso, porque sei da importância do estatuto. Sou autor do Estatuto do Idoso, aprovado, é lei, sancionada pelo Presidente Lula. Sou autor do Estatuto da Pessoa com Deficiência, aprovado aqui e agora tramitando na última Comissão da Câmara dos Deputados. Da mesma forma, sou autor do Estatuto da Igualdade Racial, que também é lei sancionada pelo Presidente Lula. Claro que ajudei na elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente, e sabemos da sua importância. Mas, quanto ao Estatuto dos Povos Indígenas, se vocês assim entenderem, teremos de fazer um grande movimento para aprová-lo na visão dos povos indígenas e não na visão deste ou daquele Parlamentar.

            Sabemos que os interesses contra o estatuto são enormes - e vocês sabem disso, principalmente se ele representar a visão de vocês -, mas entendemos também que só alcança uma vitória quem está na luta - e vocês sabem disto - exigindo seus direitos.

            Eu sempre digo que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário só escutam o barulho das ruas, o vento das florestas, o movimento bonito, lindo das águas dos rios e dos mares e a batida dos tambores com uma grande mobilização. E sei que vocês estão peleando historicamente com esses objetivos.

            Termino, Sr. Presidente. Deixo aqui com essas simples palavras a minha sincera homenagem, o meu respeito e a minha permanente adesão à causa de todos os indígenas do Brasil e da chamada Pachamama, a nossa América Latina.

            Viva! Vida longa aos povos indígenas!

            Um abraço a todos.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2011 - Página 11696