Discurso durante a 75ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da restauração da função legiferante do Congresso Nacional.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Defesa da restauração da função legiferante do Congresso Nacional.
Aparteantes
Pedro Taques, Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DSF de 18/05/2011 - Página 16807
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, FALTA, EFICIENCIA, MOTIVO, CRISE, DEMOCRACIA, CRESCIMENTO, PODER, EXECUTIVO, FATO, GOVERNO, MANIPULAÇÃO, PARTIDO POLITICO, NECESSIDADE, ORADOR, CONTROLE, MEDIDA PROVISORIA (MPV).
  • REGISTRO, PROPOSTA, AUTORIA, ORADOR, ALTERAÇÃO, ELEIÇÃO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ESCOLHA, PARTICIPAÇÃO, VOTO, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, vou dar continuação ao que falou o Senador Ferraço, há pouco, aqui: a ideia da restauração do Poder Legislativo no Brasil.

            E nós estamos ameaçados, Senador Taques, a meu ver, por duas linhas. Uma linha é que nós estamos ficando não apenas inoperantes, mas irrelevantes; e, talvez, irrelevantes por sermos inoperantes. Mas o fato é que, hoje, o Judiciário legisla, e o Executivo manda, por meio das medidas provisórias e de todos os instrumentos de que dispõe. Esse é um lado.

            Agora, o outro lado é que está se constituindo, de maneira muito natural, um partido único, hoje, no Brasil: o partido único do governo. E, quando mudar o governo atual, virá outro partido único a favor do próximo governo. Pode até mudar a sigla de um lado para o outro, mas continua um partido com uma maioria tão expressiva, que termina sendo um partido único, embora inseguro, como está provando o debate sobre o Código Florestal.

            O que está fazendo com que o Código Florestal fique nessa crise inteira? Porque os partidos estão divididos. E eles estão divididos porque eles são de ideologias e de interesses econômicos diferentes, os seus Deputados e Senadores. Então, quando o governo quer, ele atrai o partido, em geral, em função de cargos. Vamos chamar em função de uma composição que se faz dos cargos de que o governo dispõe. Mas as pessoas entram no governo com o partido, mas com posições diferentes em cada partido.

            Na hora em que chega um projeto com a ressonância, a importância do Código Florestal, o que acontece? O partido, cada um deles, começa a ter votos diferentes. Quebra-se a unidade que seria ideológica, propositiva e programática. Nós não temos mais o partido programático-ideológico e ficamos com parlamentares pragmáticos. E o pragmatismo não permite alianças demoradas. O pragmatismo são alianças imediatistas, de curto prazo. É isso que a gente está vendo no Código Florestal. A aliança que apoia o governo se fragmenta, porque, num mesmo partido, há ruralista e ecologista. E, na hora do voto, eles ficam cabeças doidas.

            Nós estamos numa crise profunda na democracia, porque o Congresso ficou inoperante, irrelevante. O Judiciário assumiu funções que não são dele, mas o povo está aplaudindo. Isto é ainda mais grave: o povo está dando legitimidade ao que não tem tanta legitimidade, nem tanta legalidade.

            Mas está dando, por culpa nossa e não do Judiciário. Culpa nossa, de não resolvermos os problemas a tempo. E aí me preocupa que a reforma política - e seria o momento de resolvermos tudo isso, de fazer o que o Senador Ricardo chamou de restauração do poder congressual - pode perder a grande chance, porque está sendo conduzida para fazer uma reforma eleitoral. E, para mim, uma reforma política é muito mais do que uma reforma eleitoral.

            Soltei um conjunto de propostas em que divido, na verdade, em seis itens. Cinco são permanentes; o sexto é temporário. Não vou citar aqui todos, até porque de lembrança não dá.

            Mas, primeiro, do ponto de vista eleitoral, não é muito diferente do que se está discutindo. É o voto de legenda. Só que proponho, Senador Geovani, que o voto de legenda venha com o direito do eleitor de escolher quem é o seu nome. Aperta um botão do partido e aparece a lista dos candidatos. Na lista dos candidatos, o eleitor escolhe o seu. É o voto, o candidato avulso, sem precisar de partido, desde que com um número substancial de eleitores indicando. É o fundo público, que sugiro de dois tipos a gente analisar: um com dinheiro público governamental e outro com dinheiro público das pessoas, desde que não tenha empresa colaborando e ninguém possa contribuir além de um certo valor. Isso é mais ou menos o que tem aí.

            É o voto distrital, que proponho para vereador. E na Câmara Federal, para deputado federal, proponho três tipos de eleições: o deputado eleito por distrito, o deputado eleito pelo Estado e o deputado federal eleito nacionalmente. Quarenta por cento dos deputados seriam eleitos por distritos; 50% seriam eleitos pelo Estado, e 10% seriam eleitos com votos de todo o Brasil. É a maneira de trazer aqui para dentro os grandes nomes nacionais. Mas essas medidas são as eleitorais Não quero dar importância.

            Temos que mudar alguns itens fundamentais do Executivo. Por exemplo, é preciso criar no Brasil - embora seja um regime presidencialista - o voto de desconfiança em relação a um ministro. Embora o ministro seja uma prerrogativa do Presidente e deve continuar assim, mas, se o ministro, de fato, se choca com a maioria do Congresso, é possível que a gente tenha aqui o direito de fazer um voto de desconfiança e esse ministro deixar de ser ministro.

            No Parlamentarismo, é o Primeiro-Ministro que recebe o voto de desconfiança, e o governo cai. No Presidencialismo, o Congresso não pode ter o direito de derrubar o governo, mas pode ter o direito de derrubar um ministro, quando ele não estiver sintonizado com a maioria - podemos até colocar - de dois terços.

            Eu creio que a gente tem que restringir, como se está tentando - isso, sim - na Comissão de Reforma, as medidas provisórias. Não extinguir, mas controlar essas medidas provisórias para que não cheguem aqui da maneira como chegam e com as características com que chegam.

            Creio que devemos mudar a maneira como são escolhidos os ministros do Supremo Tribunal Federal. Hoje, o ministro do Supremo é escolhido pelo Presidente da República. Ponto! Porque as sabatinas que a gente faz aqui - vamos falar com franqueza - não são sabatinas verdadeiras.

            O próprio Senador Taques uma vez me disse que já houve sabatina de meses inteiros, nos Estados Unidos, enquanto aqui, raras demoram mais do que algumas horas. A proposta que estou fazendo, Senador Requião, é a de que, para escolher um ministro do Supremo, o Presidente da República receba seis nomes indicados pela comunidade jurídica do País, inclusive os atuais ministros do Supremo, os tribunais. O Presidente recebe seis nomes, escolhe três; desses três, o Congresso escolhe um. Aí, a gente vai ter sabatina boa, porque não é sabatina pra votar sim ou não, porque a gente, aliás, vota antes de terminar a sabatina, em geral. Mas é sabatina para escolher qual deles será.

            O Tribunal de Contas não tem que ter ministro escolhido por ninguém, tem que ser concurso público. Vamos fazer concurso público para escolher os ministros do Supremo, aqui, e os conselheiros, nos Estados. Precisamos de algumas reformas da cultura da população em relação a...

            O Sr. Roberto Requião (Bloco/PMDB - PR) - Solicito a V. Exª um aparte, Senador.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Com todo prazer, Senador Requião.

            O Sr. Roberto Requião (Bloco/PMDB - PR) - Senador Cristovam, de minha autoria, há um projeto de resolução cujo relator, por acaso, é o Senador Pedro Taques, aqui ao meu lado. Eu tenho uma proposta para moralizar a escolha, pelo Senado, de autoridades. Nos Estados Unidos, leva seis ou sete meses a escolha de um ministro do Supremo. Até horários de televisão paga são utilizados para contestar, denunciar. Então, o meu projeto, em primeiro lugar, coloca o relatório de um relator escolhido pela comissão ou por seu presidente. O relatório deve ser apresentado sem a presença do candidato no Senado ou na comissão. Posteriormente, esse relatório deve ser publicado na Internet, no Diário do Senado, para ser discutido pela população, para que possíveis denúncias cheguem ao conhecimento do Senado. No prazo de uma semana, isso ocorre. Então, o relatório entra em discussão na comissão e pode ser aprovado ou rejeitado. Posteriormente, teremos a sabatina do candidato. Agora, a sabatina não pode ser tão ligeira que, antes que ela termine, seja iniciada a votação. Porque, durante a sabatina, mesmo na vigência do atual Regimento, que minha resolução pretende modificar, pode haver um pedido de diligência para um determinado assunto e a votação é suspensa. A votação só pode se dar após o fim das discussões, e a Internet abre, para o País e para a sociedade civil, a possibilidade clara da manifestação. Agora, essa proposta que V. Exª apresenta da tribuna de ampliarmos a possibilidade de escolha, não com a participação corporativa dos juízes do Supremo, que já foram escolhidos também por autoridades da República, mas de uma forma que enriquecesse o meu projeto, que hoje é meu e do Senador Pedro Taques, abrindo o leque de possibilidades de escolha por parte do Senado da República, seria muito bem-vinda. A proposta e o relatório do Senador Pedro Taques estão à disposição da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania para discussão, aprovação ou rejeição, ou a emenda, que V. Exª poderia providenciar.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Com propostas com essa do senhor, nem faço questão de ficar insistindo na que sugeri. Quero provocar o debate para, depois, ver. Só acho que o Presidente deveria mandar mais de um nome, não um nome único, para que possamos escolher a partir de debates com os candidatos, não os três juntos, mas separadamente. Em vez de vir apenas um nome. Acho que o senhor acrescenta muito à minha proposta.

            Senador Pedro Taques.

            O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - Senador Cristovam, são momentos como este de debates deste relevo que nos faz ver uma luz no fim do túnel. Este Senado serve, constitucionalmente, para o debate de assuntos estruturantes para a República, não para ficarmos discutindo perfumaria, aquilo que enfeita. Tomando o exemplo que V. Exª trouxe da fala do Senador Ricardo, seria uma restauração do Legislativo, uma restauração da própria democracia. Se analisarmos historicamente, Senador Cristovam, o papel dos parlamentos europeus antes da Revolução Francesa, eles tinham um único papel: fiscalizar o atuação do Executivo. No século XIX, houve uma mudança disso. Em razão do chamado Estado liberal ou Estado garantidor, houve uma superforça do Legislativo em detrimento do Executivo. No século XX, Senador Cristovam, nós invertemos essa lógica. Em razão do Estado social ou Estado do bem-estar social, nós passamos a necessitar de legislações de emergência, como o decreto-lei no Brasil, o decreto-legge na Itália. Neste século XXI, o Estado não deve ser só garantidor, como no século XIX; ele não deve ser só prestador, como no século XX. No século XXI, o Estado deve ser transformador, e essa transformação do Estado, Senador Cristovam, deve se dar por intermédio dos órgãos que exercem parcela da soberania. O Judiciário está buscando o seu espaço, no que se denomina de ativismo social. Vejamos que isso já ocorreu na Europa depois da Segunda Guerra Mundial. No Brasil,...

(Interrupção do som.)

            O Sr Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - ...o Legislativo não legisla porque o Executivo o faz por meio de medida provisória e o Judiciário decide, como nós temos acompanhado no Tribunal Superior Eleitoral e no Supremo Tribunal Federal. O Executivo se adona, se assenhora de funções do Legislativo. Hoje o Legislativo, esta Casa em particular, em razão do bicameralismo que existe no Brasil... porque tudo aqui nós devemos votar com rapidez. Eu vou dar um exemplo. O Código Florestal está sendo debatido na Câmara dos Deputados há 12 anos, e, agora, nós teremos que debatê-lo em uma semana nesta Casa. Vamos acabar com o bicameralismo, vamos criar uma única Casa, porque nós vamos economizar dinheiro da população. Nós, aqui do Senado, não estamos fazendo outra coisa. Perdemos a nossa função constitucional, e o cidadão que está nos vendo e ouvindo sabe o que está a acontecer. Falando sobre fiscalização, e já encerro...

(Interrupção do som.)

            A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco/PCdoB - AM) - Vou conceder mais dois minutos para V. Exª, Senador.

            O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - Os escândalos se sucedem e nós, nesta Casa, não fiscalizamos absolutamente nada, fazemos de conta que não é conosco. Uma hora, vão ver que o rei está nu. Muito obrigado pelo aparte.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Eu quero dizer, Senador, na linha dos trocadilhos que o Senador Requião gosta de fazer - e o faz com mais competência que eu -, aqui não é só que a gente não fiscaliza, a gente nem pisca diante dos escândalos. Nem pisca diante de tudo que acontece aí fora, quanto mais fiscalizar.

            Bem, Srª Presidente, agradeço pelo tempo, mas eu queria aproveitar a fala do Senador Ricardo Ferraço sobre a restauração do Poder Legislativo no Brasil. Creio que essa é uma bandeira que todos nós devemos empunhar. Cada um pensando da sua maneira própria, com a sua proposta diferente, mas com um objetivo: a defesa da democracia. E a defesa da democracia passa por um Congresso forte.

            Para isso, temos que fazer o dever de casa, porque não vamos ser operantes, ou seja, acabar com a nossa inoperância se não fizermos algumas mudanças aqui dentro. E não vamos ficar relevantes, acabar com a nossa irrelevância, se não acabarmos com a nossa incapacidade de fazer as coisas como se deve.

            Há uma correlação entre a irrelevância e a inoperância. Temos que ser operantes na linha do que o Senador Taques sempre fala, de fazer com que as coisas aconteçam aqui de forma rápida e corretamente.

            Deixo aqui então o meu total apoio à proposta do Senador Ricardo Ferraço da restauração...

(Interrupção do som.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Obrigado, Presidente, faltava só uma palavra, que era a palavra movimento pela restauração do Congresso.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/05/2011 - Página 16807