Discurso durante a 145ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da volta da discussão sobre a instituição do imposto sobre grandes fortunas.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS.:
  • Defesa da volta da discussão sobre a instituição do imposto sobre grandes fortunas.
Publicação
Publicação no DSF de 26/08/2011 - Página 34716
Assunto
Outros > TRIBUTOS.
Indexação
  • COMENTARIO, DECLARAÇÃO, AUTORIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), FRANÇA, POSSUIDOR, RIQUEZAS, DEFESA, AUMENTO, IMPOSTOS, INCIDENCIA, CLASSE ECONOMICA, SUPERIORIDADE, RENDA, OBJETIVO, CONTRIBUIÇÃO, COMBATE, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL.
  • DEFESA, DISCUSSÃO, SENADO, POSSIBILIDADE, CRIAÇÃO, IMPOSTOS, INCIDENCIA, CLASSE ECONOMICA, SUPERIORIDADE, RENDA.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar meu agradecimento ao Senador Inácio Arruda, que me permitiu estar, neste momento, fazendo esta fala.

            Srª Presidenta - e aproveito, Sr. Presidente Mozarildo, que está assumindo - quem tem lido jornais nos últimos dias, a partir do Brasil, com olhos de brasileiro, deve estar muito surpreso, mas não falo pelas questões de corrupção, pelas questões locais; surpreso por algumas manifestações de estrangeiros.

            Primeiro, a manifestação daquele que é considerado o homem mais rico do mundo no momento, que se chama Warren Buffett. Esse Sr. Buffett, que é o homem mais rico do mundo neste momento, fez um artigo ao New York Times reclamando, Senador Paim, por que o Presidente Obama não está cobrando nada dos ricos. Ele dizia: “Fala-se em sacrifício para sair da crise. Eu conversei com cada um dos meus amigos, megarricos [a maneira como ele se expressa] e todos disseram que não estão dando nenhuma contribuição para sair da crise. Eles disseram que a proposta de mudança tarifária e fiscal, que prevê aumento de impostos para cobrir o rombo das dívidas, não toca nos muito ricos.” A surpresa é que ele esteja reclamando por que a nação não pede a ele uma contribuição.

            Ontem ou anteontem, mais uma vez, o brasileiro que leu os jornais teve uma surpresa, dezesseis super-ricos franceses fizeram um documento se perguntando por que eles não pagavam mais impostos, se a França está numa situação tão crítica? Brasileiro que lê isso deve achar que é outro planeta!

            Mas há uns três ou quatro anos, eu lembro que o pai de Bill Gates - na época, Bill Gates era mais rico do que Warren Buffett - reclamava porque o Presidente Bush estava querendo eliminar os impostos da transmissão de propriedade. E ele dizia: “Se o governo acabar com esse imposto de transmissão de propriedade, nós os ricos não vamos dar essas imensas contribuições graças as quais foram feitas as universidades americanas”, quase todas elas fruto de doações dos ricos em vez de pagarem os impostos - o que aqui no Brasil não existe. Ele defendendo.

            Qualquer brasileiro que leia os jornais e tome conhecimento de um desses artigos: de Warren Buffett, do manifesto de dezesseis franceses super-ricos, da posição do velho Bill Gates pai, deve ficar surpreso. Agora, essa surpresa deve aumentar quando a gente olha um pouquinho a história. E o Senador Paim, aqui presente, é parte dela.

            Quando a gente lembra que em 1989, Plínio de Arruda Sampaio apresentou um projeto de lei para taxar as grandes fortunas. Arquivado! Quando a gente percebe que um ano depois, em 1989, Fernando Henrique Cardoso apresentou um projeto de taxação das grandes fortunas, que passou pela Comissão de Constituição e Justiça, pela Comissão de Orçamento e foi arquivado em 2010. Aí, a gente lembra que, em 2008, o Senador Paim, aqui presente, apresentou o PLS 128, que propunha uma coisa simples: as rendas acima de 10 milhões de reais - Senador Paim, se eu não estou enganado - deveriam pagar uma tarifa especial. E isso foi também arquivado.

            Aí, a gente analisa os argumentos. Não pode ser só egoísmo, tem argumentos. Dois argumentos. Um argumento é de que é muito difícil fazer a arrecadação desse dinheiro. O outro argumento é de que isso levaria a uma fuga de capital.

            Senador Paim, se essas forem as razões, estamos ofendendo os brasileiros. Estão ofendendo os ricos, por falta de patriotismo; e os técnicos da Receita Federal, por incompetência. Se o problema é falta de como arrecadar - caramba! -, os nossos técnicos da Receita estão entre os mais competentes do mundo inteiro. Os melhores quadros do Brasil estão na Receita Federal. Eles não encontram uma maneira de fazer isso?

            Conseguimos contar em duas horas 110 milhões de votos, mas não conseguimos ter um sistema fiscal eficiente. Se o problema é fuga de capital, estão dizendo que os franceses e os americanos são patriotas, os ricos brasileiros são antipatriotas. Prefiro não aceitar nenhuma dessas definições, nenhum desses dois argumentos.

            Por isso, aproveito aqui, considerando que existem esses argumentos contrários, como não tenho aqui os argumentos para me contrapor e dizer como é fácil cobrar os impostos, também não tenho como dizer se os nossos super-ricos são patriotas. Posso até desconfia que é falso dizer que eles são antipatriotas, mas dizer que garanto que são patriotas não tenho como.

            Então, Sr. Presidente Mozarildo Cavalcanti, por que não criamos um grupo aqui - e vou propor na Comissão de Assuntos Econômicos - para estudar essa possibilidade? Vamos chamar os técnicos da Receita para eles dizerem por que é tão complicado isso. Vamos chamar representantes das classes produtoras e dos super-ricos brasileiros, para dizer por que eles levariam o dinheiro deles para o exterior, ao invés de deixar aqui.

            Aí quero dizer que entre esses que estão assinando por aí afora, faço uma questão diretamente aos bancos, Senador Paulo Paim. Temos hoje uma dívida de R$2,2 trilhões. Se a gente tem um imposto de 5%, são 100 bilhões por ano. Não quero que abram mão; só quero que digam para adiar por 10 anos o pagamento. Vamos trocar os títulos, desde que esses 10% sejam usados no processo de transformação da economia brasileira, por meio da educação, da ciência, da tecnologia. Vamos transformar este País numa economia do conhecimento, investindo na inovação desde a educação das nossas crianças. Será que não há patriotismo para isso? Será que não há competência técnica para isso, Senador Paim? Argumentos que usaram para recusar o seu Projeto.

            Agora, por exemplo, esses R$2,2 trilhões representam a dívida de todo o mundo: gente que tem dívida, porque tem a receber da Previdência; gente que tem dívida, porque comprou títulos da dívida pública.

            Pois bem, ficaria difícil negociar com todos, mas 600 bilhões desses 2,2 trilhões estão na mão de bancos. Podemos reunir numa mesa; 600 bilhões de dívida a gente pode reunir os credores numa mesa e discutir com eles, negociar com eles, acertar com eles. Vamos buscar uma forma de transformar essa dívida em algo positivo, sem pedir perdão da dívida, apenas pedir um alongamento no pagamento da dívida. Por que a gente não consegue fazer, pelo menos, o estudo disso. Aí é que eu entro dizendo: Não acredito que não consigamos fazer um estudo sobre isso. Até acredito que o antipatriotismo não deixará que isso aconteça, até acredito que incompetência da receita - como dizem por aí. Eu não digo. Como também não digo que são antipatriotas, mas se argumentam no antipatriotismo e se argumentam na incompetência. Muito bem! Não vamos conseguir. Mas estudemos, trabalhemos essa alternativa.

            Há dois meses entreguei à Presidenta Dilma um documento que faria a revolução total na educação brasileira. Esse documento, que federalizaria todas as escolas do Brasil em horário integral, pagaria R$9 mil, Senador Mozarildo, aos professores. Nove mil reais! Agora, exigindo dedicação exclusiva, avaliação anual e um conceito de estabilidade que não fosse impune para aqueles que não trabalham. Tudo isso custaria R$60 bilhões a mais do que se gasta hoje. É muito pouco comparado com esse dinheiro que está aqui, é muito pouco.

            Pedi esse tempo, Senador Mozarildo, para dizer que lá fora os ricos e os super-ricos estão percebendo que para salvar o mundo dessa crise e até salvar a fortunas deles, eles precisam descobrir que são parte de uma grande família que é o país de cada um deles. De uma grande família que é a humanidade inteira. E por inteligência, não vou nem dizer por abnegação, eles estão se propondo a dar uma contribuição. Aqui eu não vi nenhum fazer isso.

            Então, eu venho aqui sugerir que nós tomemos a iniciativa, Senador Álvaro, de estudá-los e quem sabe de conversar com eles, os banqueiros, com os grandes empresários, com os donos das grandes fortunas, na linha em que Fernando Henrique Cardoso propôs em 1989, e tentemos fazer com que o Brasil não argumente como a gente argumenta, que tem dinheiro para Copa, tem dinheiro para Olimpíadas, tem dinheiro para trem-bala, tem dinheiro para ponte, para estrada, para porto e não tem dinheiro para a educação e para a saúde. O dinheiro existe, o que precisamos é resolver a equação de como fazer ele sair das mãos onde estão para chegar aos braços do que precisam. Isso é possível, isso é preciso. E essa Casa tem obrigação de dar o seu recado, até que um dia tenhamos aqui pessoas ricas e super-ricas, como Warren Buffett, como Bill Gates, como os dezesseis da França.

            Eu espero que não deixemos passar a oportunidade, a crise tem que ser enfrentada e o enfrentamento tem que ser por aqueles que têm patriotismo e competência.

            Era isso, Sr.Presidente, o que eu tinha para colocar.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/08/2011 - Página 34716