Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca da saúde pública no Brasil.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Considerações acerca da saúde pública no Brasil.
Aparteantes
Paulo Davim.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2012 - Página 6124
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, TEXTO, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), ASSUNTO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, SAUDE PUBLICA, PAIS, NECESSIDADE, IMPLANTAÇÃO, POLITICAS PUBLICAS, PLANEJAMENTO, GESTÃO, RECURSOS, DESTINAÇÃO, SAUDE, CRITICA, CORRUPÇÃO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS).

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Marta Suplicy; Srªs e Srs. Senadores, hoje, volto a um tema da maior importância e que tem sido esquecido nos últimos dias, em razão dos fatos recentes, mas esse assunto não pode ser esquecido jamais.

            Refiro-me à saúde da população. A saúde do povo deveria ser a suprema lei. E, hoje, trago um texto escrito exatamente para relatar o que pensa a CNBB, pensamento que coincide bastante com a pregação que, reiteradamente, fazemos, demonstrando, sobretudo, o descaso que há das autoridades governamentais para com a população mais pobre do País, afastada dos benefícios imprescindíveis dos serviços de saúde pública, porque há corredores de hospitais abarrotados de doentes, aguardando a oportunidade do atendimento. De outro lado, a constatação de desvios brutais.

            Para não ficar no discurso oposicionista sem consistência, vamos ao Banco Mundial, que, há algum tempo, realizou um estudo de profundidade sobre a saúde no Brasil e constatou que a questão essencial não é falta de recursos. O que falta, realmente, é competência de gerenciamento, planejamento e sobra desonestidade. Os desvios são significativos.

            Mas vamos ao que diz a CNBB, que traduziu as expectativas da população, especialmente da mais carente, considerando que a realidade do setor de saúde clama por ações transformadoras. A conversão pede que as estruturas de morte sejam transformadas.

            O texto base, com lucidez, aborda que a saúde integral é o que mais se deseja. Há muito tempo ela vem sendo considerada a principal preocupação e pauta reivindicatória da população brasileira no campo das políticas públicas. Qualquer pesquisa revela isso. Recentemente, a pesquisa CNI/Ibope mostra que a desaprovação maior do Governo está exatamente no setor de saúde.

            Os temas da saúde e da doença exigem, portanto, uma abordagem ampla, como a proposta pelo Guia para a Pastoral da Saúde, elaborado pela Conferência Episcopal Latino-Americana. O GPS diz que a saúde é afirmação da vida, em suas múltiplas incidências, e um direito fundamental que os Estados devem garantir. O mesmo documento assim define saúde:

Saúde é um processo harmonioso de bem-estar físico, psíquico, social e espiritual, e não apenas a ausência de doença, processo que capacita o ser humano a cumprir a missão que Deus lhe destinou, de acordo com a etapa e a condição de vida em que se encontre.

            Vamos verificar quais são algumas das exigências elencadas pela CNBB: articular o tema saúde com a alimentação, a educação, o trabalho, a remuneração, a promoção da mulher, da criança, da ecologia, do meio ambiente, entre outras.

            Trata-se de uma concepção dinâmica e socioeconômica da saúde que, ao tomar o tema da saúde, não restringe a reflexão a causas físicas, mentais e espirituais, mas avança para as sociais. Com essa abordagem, a Igreja objetiva apresentar elementos para dialogar com a sociedade, a fim de melhorar a situação da saúde da nossa população.

            O texto base focaliza que garantir para a população os direitos e os recursos previstos na Constituição Federal sobre a Seguridade Social é um dos principais desafios sociais da atualidade. Na contramão do que prevê a Constituição, são as famílias que mais gastam com saúde. Dados do IBGE mostram que o gasto com a saúde representou 8,4% do Produto Interno Bruto (PIB) do País em 2007. Do total registrado, 58,4% (ou R$129 bilhões) foram gastos pelas famílias, enquanto 41,6% (R$93 bilhões) ficaram a cargo do setor público. Portanto, o povo está gastando mais do que o Governo. A população pobre é desassistida porque o Governo está gastando menos do que devia. As instituições sem fins lucrativos gastaram R$2,3 bilhões.

            Nos países desenvolvidos, 70% dos gastos com saúde são cobertos pelo governo e somente 30% pelas famílias, segundo o IBGE. Portanto, há uma inversão no Brasil. Nos países evoluídos, o governo é que gasta 70%. Para especialistas da área da saúde, o gasto total com a saúde, em 2009, foi de R$270 bilhões (8,5% do PIB), sendo R$127 bilhões (47% dos recursos ou 4% do PIB) de recursos públicos e R$143 bilhões (53% dos recursos ou 4,5% do PIB) de recursos privados.

            O Sistema Único de Saúde, inspirado em belos princípios como o da universalidade, cuja proposta é atender a todos, indiscriminadamente, deveria ser modelo para o mundo. No entanto, ele ainda não conseguiu ser implantado em sua totalidade e ainda não atende a contento, sobretudo os mais necessitados desses serviços.

            Apesar do avanço que significou a criação do SUS, o Brasil está longe de dedicar atenção à saúde pública semelhante à dos países que contam com um sistema público e universal, como Reino Unido, Suécia, Espanha, Itália, Alemanha, França, Canadá e Austrália. Para atestar essa afirmação, basta lembrar que, em 2008, enquanto o SUS gastou 3,24% do PIB, o gasto público em saúde nos países mencionados foi, em média, 6,7% do PIB.

            O texto base elencou com propriedade alguns aspectos referentes ao financiamento e ao acesso à saúde que merecem ser reproduzidos:

            - financiamento: a tabela de valores SUS está defasada e não condiz com a realidade nacional;

            - carência de uma política direcionada e de incentivos a possíveis parcerias com a rede de entidades filantrópicas na saúde e com as Santas Casas de Misericórdia;

            O Sr. Paulo Davim (Bloco/PV - RN) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR) - Vou conceder com prazer.

            Apenas elencando mais dois itens:

            - subfinanciamento, pois ocorre redução contínua do montante de recursos financeiros aplicados na saúde com o descumprimento da Emenda Constitucional nº 29;

            - desvio e malversação de recursos na área da saúde, como disse anteriormente.

            Concedo ao Senador Davim, com prazer, o aparte que solicita.

            O Sr. Paulo Davim (Bloco/PV - RN) - Obrigado, Sr. Senador. Quero parabenizá-lo pelo pronunciamento, que tem abordado com tanta clarividência, com tanta propriedade. E é uma verdade mesmo. Não adianta tergiversar. A crise da saúde no Brasil é por inanição, é por falta de recursos. Em dezembro passado, esta Casa apreciou a regulamentação da Emenda nº 29. E, infelizmente, não conseguimos aprovar o texto do ex-Senador Tião Viana, que estabelecia a destinação de 10% dos recursos da União para a saúde. Comparando-se com o que o Governo aplicava em 1995, o Brasil destinava 9,6% do Orçamento bruto da União para a saúde. Atualmente, é algo em torno de 7,1%, 7,2%. Então, está mais do que comprovada a necessidade de um maior aporte de recursos, para que possamos oferecer uma saúde digna à população. Muito obrigado e parabéns!.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador. V. Exª conhece bem o assunto.

            Como não há tempo para a conclusão da leitura de todo o discurso, peço que considere-o lido na íntegra.

            Vou concluir, apenas destacando alguns pontos relativos às dificuldades do acesso à saúde: falta de reconhecimento e de valorização à atenção básica à saúde, desarticulação de seus programas entre si e com a sociedade, superlotação das unidades de urgência e emergência, acesso precário com longas filas para marcação de consultas, falta de leitos hospitalares e desigualdade na distribuição pelas regiões do País, insuficiente assistência farmacêutica à população, falta de humanização e de acolhimento adequados nas unidades de saúde.

            O Orçamento da União para a saúde, em 2011, foi de R$68 bilhões. E, do total, R$12 bilhões investidos na atenção básica à saúde, apenas por meio de programas do Ministério da Saúde.

            Concluo, Srª Presidente, destacando que existem no Brasil 52 mil unidades assistenciais públicas, sendo 95% delas administradas pelos Municípios, segundo dados do IBGE. Pesquisa referente à AMS revela que, dos quase 432 mil leitos de hospital no País, 152,8 mil (35%) pertenciam a hospitais públicos e 279 mil (65%) a hospitais particulares e filantrópicos. Essa é a grande diferença.

            Peço a V. Exª que considere lido na íntegra o pronunciamento.

            Muito obrigado, Srª Presidente.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR ALVARO DIAS.

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            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a CNBB traduziu as expectativas da população, especialmente da mais carente, considerando que a realidade do setor da saúde clama por ações transformadoras. A conversão pede que as estruturas de morte sejam transformadas.

            O texto- base com lucidez aborda que a saúde integral é o que mais se deseja. Há muito tempo, ela vem sendo considerada a principal preocupação e pauta reivindicatória da população brasileira, no campo das políticas públicas.

            Os temas da saúde e da doença exigem, portanto, uma abordagem ampla, como a proposta pelo Guia para a Pastoral da Saúde, elaborado pelo GELAM (Conferência Episcopal Latino-Americana). O GPS diz que a saúde é afirmação da vida, em suas múltiplas incidências, e um direito fundamental que os Estados devem garantir. O mesmo documento assim define saúde: "saúde é um processo harmonioso de bem-estar físico, psíquico, social e espiritual, e não apenas a ausência de doença, processo que capacita o ser humano a cumprir a missão que Deus lhe destinou, de acordo com a etapa e a condição de vida em que se encontre".

            A vida saudável requer harmonia entre corpo e espírito, entre pessoa e ambiente, entre personalidade e responsabilidade. Nesse sentido, o Guia Pastoral, entendendo que a saúde é uma condição essencial para o desenvolvimento pessoal e comunitário, apresenta algumas exigências para sua melhoria: articular o tema saúde com a alimentação; a educação; o trabalho; a remuneração; a promoção da mulher, da criança, da ecologia, do meio ambiente etc; entre outras.

            Trata-se de uma concepção dinâmica e socioeconômica da saúde que, ao tomar o tema da saúde, não restringe a reflexão a causas físicas, mentais e espirituais, mas avança para as sociais. Com esta abordagem, a Igreja objetiva apresentar elementos para dialogar com a sociedade, a fim de melhorar a situação de saúde da população.

            O texto-base focaliza que garantir para a população os direitos e os recursos previstos na Constituição Federal sobre a Seguridade Social (Assistência Social, Previdência Social e Saúde) é um dos principais desafios sociais na atualidade. Na contramão do que prevê a Constituição, são as famílias que mais gastam com saúde. Dados do IBGE mostram que o gasto com a saúde representou 8,4% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, em 2007. Do total registrado, 58,4% (ou 128,9 bilhões de reais) foram gastos pelas famílias, enquanto 41,6% (93,4 bilhões de reais) ficaram a cargo do setor público. As instituições sem fins lucrativos gastaram 2,3 bilhões de reais.

            Nos países desenvolvidos, 70% dos gastos com saúde são cobertos pelo governo e somente 30% pelas famílias, segundo o IBGE, Para especialistas na área de Saúde Pública, o gasto total com a saúde, em 2009, foi de R$ 270 bilhões (8,5% do PIB), sendo R$ 127 bilhões (47% dos recursos ou 4% do PIB) de recursos públicos e R$ 143 bilhões (53% dos recursos ou 4,5% do PIB) de recursos privados.

            O SUS (Sistema Único de Saúde), inspirado em belos princípios como o da universalidade, cuja proposta é atender a todos, in¬discriminadamente, deveria ser modelo para o mundo. No en¬tanto, ele ainda não conseguiu ser implantado em sua totalidade e ainda não atende a contento, sobretudo os mais necessitados destes serviços.

            Apesar do avanço que significou a criação do SUS, o Brasil está longe de dedicar atenção à saúde pública semelhante à dos países que contam com um sistema público e universal, como Reino Unido, Suécia, Espanha, Itália, Alemanha, França, Canadá e Austrália. Para atestar esta afirmação, basta lembrar que, em 2008, enquanto o SUS gastou 3,24% do PIB, o gasto público em saúde nos países mencionados foi, em média, 6,7.

            O texto-base elencou com propriedade alguns aspectos referentes ao financiamento e acesso á saúde que merecem ser reproduzidos:

            - Financiamento: a tabela de valores SUS está defasada e não condiz com a realidade nacional;

            - Carência de uma política direcionada e de incentivos a possíveis parcerias com a rede de entidades filantrópicas na saúde e com as Santas Casas de Misericórdia;

            - Subfinanciamento, pois ocorre redução contínua do montante de recursos financeiros aplicados na saúde com o descumprimento da Emenda Constitucional (EC 29);

            - Desvio e malversação de recursos na área da saúde.

            No tocante ao Acesso:

            - Falta de reconhecimento e de valorização à atenção básica à saúde, desarticulação de seus programas entre si e com a sociedade;

            - Superlotação das unidades de urgência e emergência (prontos-socorros);

            - Acesso precário com longas filas para marcação de consultas, procedimentos (como cirurgias) e exames;

            - Falta de leitos hospitalares e desigualdade na distribuição pelas regiões do país, bem como insuficiência de leitos de UTI;

            - Insuficiente assistência farmacêutica à população;

            - Falta de humanização e de acolhimento adequados nas unidades de saúde;

            - Descaso com a saúde mental, mesmo diante do aumento indiscriminado de dependentes químicos no país, principalmente na camada mais jovem da população;

            - Tendência à judicialização na saúde, provocando demandas excessivas e corriqueiras ao poder judiciário e ao ministério público.

            Com lucidez, o texto base afirma: "Os recursos financeiros destinados à saúde pública em todo o Brasil são insuficientes. Várias propostas de lei para regulamentar os repasses à saúde foram colocadas em debate no Congresso Nacional, mas, até hoje, nenhuma foi aprovada em definitivo. Até um novo imposto sobre movimentação financeira foi criado para custear a saúde, a CPMF, no entanto ele foi usado para melhorar os números da arrecadação tributária brasileira e não representou, em nenhum momento, agregação de novos recursos à saúde pública no período de sua vigência, até 2007."

            E ainda: "...O orçamento da União para a Saúde, em 2011, é de R$ 68,8 bilhões (Orçamento 2011, Lei N° 12.381, de 09/02/2011). Deste total, somente R$ 12 bilhões serão investidos na atenção básica à saúde, por meio de programas do Ministério da Saúde, por exemplo, no ESF (Estratégia Saúde da Família), através de transferências fundo a fundo do PAB (Piso da Atenção Básica). Em 2010, foram gastos 9,9 bilhões. Nesta conta, não estão computados os recursos próprios investidos por Estados e Municípios."

            O Brasil conta com mais de 192 milhões de habitantes e 5.565 municípios. Entretanto, vários municípios, principalmente das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste, não dispõem de pro¬fissionais de saúde para os cuidados básicos, sendo que, em centenas deles, não há o profissional médico para atendimento diário à população.

            Existem no Brasil, 52 mil unidades assistenciais públicas - AMS 109. (Assistência Médica Sanitária), sendo 95% administrada pelos municípios, segundo dados do IBGE. Pesquisa referente à AMS revela que, dos quase 432 mil leitos de hospital no país, 152,8 mil (35,4%) pertenciam a hospitais públicos e 279,1 mil (64,6%) a hospitais particulares e filantrópicos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2012 - Página 6124