Comunicação inadiável durante a 46ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apresentação de requerimento de voto de pesar pelo falecimento do humorista Chico Anysio.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Comunicação inadiável
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Apresentação de requerimento de voto de pesar pelo falecimento do humorista Chico Anysio.
Publicação
Publicação no DSF de 28/03/2012 - Página 8282
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, VOTO DE PESAR, MORTE, ARTISTA, ELOGIO, VIDA PUBLICA, COMENTARIO, CONTRIBUIÇÃO, TEATRO, TELEVISÃO, PAIS.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Senadora Marta Suplicy, sei que ontem alguns Senadores já apresentaram requerimento, que será apreciado hoje e ao qual junto o meu também, para que haja inserção em Ata de voto de pesar pelo falecimento, ocorrido na última sexta-feira, 23 de março, do humorista Chico Anysio, aos 80 anos, por falência de múltiplos órgãos, no Hospital Samaritano, na Zona Sul do Rio, bem como a apresentação de condolências à sua esposa, Malga Di Paula, e aos oito filhos, Lug de Paula, André Lucas, Cícero Chaves, Nizo Netto, Bruno Mazzeo, Rico Rondelli, Rodrigo e Vitória.

            Acompanho Chico Anysio desde o começo dos anos 60, fazendo sucesso no rádio e, logo depois, na televisão, com seus múltiplos personagens. Naquela .época não dava para se ter ideia de sua grandeza, o que agora todos nós podemos avaliar, com sua morte.

            Disseram no seu velório que ele era o Pelé dos humoristas. Com toda razão. Nem antes, nem, provavelmente, depois dele, poderá nascer outro humorista aceito por toda a população, que tenha criado 209 personagens, inclusive com uma biografia para cada um feita por ele. Cada um tinha uma identidade que o diferenciava de todos os outros.

            Certo dia, Presidenta Marta, ele fez um que muito me incomodou, até lembrando V. Exª, mas acho que hoje todos nós podemos perceber a sua grandeza.

            Desculpem-me os que me ouvem, mas ele tinha uma personalidade muito similar à do músico Frédéric Chopin, que, em cada peça, tinha várias melodias, todas belíssimas, e que escreveu milhares de peças, sem repetir qualquer uma delas. Esse é um fenômeno raríssimo, que só vi nesses dois artistas.

            Enquanto Chopin trabalhava com a música, Chico Anysio trabalhou com o riso, fazendo dele um instrumento de busca da profundidade de cada um de nós, sem qualquer ambição. Ele fez porque fez, porque era assim. Uma piada sua nunca foi repetida nesses 50 anos de atividade. Por maior que fosse a equipe que o ajudava, ele punha sua marca em tudo. Sabia criar, sem parar, e chegar ao fundo das pessoas, também sem parar.

            O riso é o pastor do ser, o que quer dizer que ele, ao nos provocar gargalhadas ou sorrisos, conseguia manipular os hormônios da alegria e da ternura, como a dopamina, oxitocina, endorfinas e todos aqueles outros hormônios que definem o bem-estar. Ele foi um oásis em um mundo estressante, onde só eram baixados os hormônios que levavam à angústia e à frustração. Daí ser ele um Pelé.

            Não só seus personagens se eternizaram como também alguns “bordões”, isto é, certas falas que sempre se repetiam e, estamos certos, chegaram ao inconsciente das grandes massas. Como o da velha feia e casta, que desmaiava a cada momento que alguém fazia referências sexuais por mais leves que fossem elas: “Ele só pensa naquilo”. Outro do seu quadro mais famoso “A Escolinha do Professor Raimundo”, impagável, era um aluno desse professor que se chamava Rolando Lero, um safado, enrolador, que dizia sempre “Mestre, captei vossa mensagem”. E explicava as perguntas do Professor Raimundo com sua santa e engraçadíssima ignorância, pensando que podia enrolá-lo.

            E assim, muitíssimos outros. Esses e muitos outros “bordões” provavelmente não sairão mais do inconsciente popular. Mas o que torna suas piadas imortais é que ele teve a coragem de enfrentar certos estereótipos impossíveis de serem enfrentados se não fossem de uma maneira muito leve e piadista. Como foi o caso do “Seu Peru”, em que ele enfrentou a homofobia, e com muito brilho. E assim por diante. É por isso que dizemos que sua grandeza foi trazer o relaxamento na alegria, num mundo provavelmente fadado à destruição pela burrice e arrogância da maior parte da humanidade.

            O humor é como uma cachoeira que brota do nosso ser lavando, nem que seja por poucos momentos, as impurezas que deixam a ansiedade, a preocupação com o futuro, ou a falta de dinheiro. E quando subimos de novo à superfície, estamos lavados para mais uma bateria de barbaridades neste mundo cruel que nós mesmos construímos e que foi por uns momentos transcendidos.

            Agora volta a cruel realidade, e no próximo programa de Chico mais um banho de alegria. Foi por isso que sua popularidade nunca declinou, e nós, tal qual Rolando Lero, podemos dizer-lhe, desta vez com emoção: mestre, captei vossa mensagem!!

            Como escreveu Cláudio Gonçalves no Facebook, “pouca coisa sobrou que faça rir também o espírito com a arte de fazer graça”. Morreu Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho, o Chico Anysio. Mas Alberto Roberto, Coronel Limoeiro, Gastão Franco, Azambuja, o coronel Pantaleão...

(Interrupção do som.)

           A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. Bloco/PT - SP) - Para encerrar, Senador Eduardo Suplicy.

           O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - ... o professor Raimundo, o pai de santo Veio Zuza, o Painho, o Coalhada, Bento Carnero - o vampiro brasileiro, o Jovem, o Baiano e os Novos Caetanos, o Bozó, o Justo Veríssimo, a Salomé, e tantos outros já foram eternizados e ficarão na história do humorismo brasileiro.

           Chico dizia que os tirou da vida, do que seus olhos viam nas calçadas, nos campos de futebol, nos estúdios, nas casas que frequentava, nos restaurantes.

O mundo é minha inspiração. Não gosto muito dos personagens feitos em cima de um bordão. Sei que este tipo de personagem funciona, porque o bordão é mais rapidamente difundido, "pega" com maior facilidade, mas, em contrapartida, a vida dele é bem mais curta. Ele "estoura" depressa e muito depressa vira cinza. Parece absurdo dizer que um personagem, para mim, é um ser de vida paralela a minha. Já disse que não gosto do personagem isolado, prefiro o grupo.

            Caçula de oito irmãos, Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho nasceu no dia 12 de abril de 1931, no Município de Maranguape, no Ceará. A cidade constantemente era citada de forma saudosa pelo humorista - seu personagem mais popular, o Professor Raimundo, era de lá. “Maranguape, cidade de que tanto falo, representa uma grande saudade. Foi um pequeno paraíso, o Éden da minha infância durante gloriosos anos. Foi lá que aprendi a ler sozinho", escreveu o humorista em seu site oficial.

            Assim, Srª Presidenta, requeiro que seja apreciado este requerimento juntamente com o outro que está na Mesa. Já vou formalmente apresentá-lo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/03/2012 - Página 8282