Discurso durante a 52ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre reportagem veiculada pelo programa Fantástico sobre práticas corruptas do mercado de fornecedores de hospitais públicos.

Autor
Pedro Taques (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MT)
Nome completo: José Pedro Gonçalves Taques
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Considerações sobre reportagem veiculada pelo programa Fantástico sobre práticas corruptas do mercado de fornecedores de hospitais públicos.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2012 - Página 11045
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, EMISSORA, TELEVISÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), MATERIA, RELAÇÃO, EXISTENCIA, CORRUPÇÃO, SETOR, SAUDE PUBLICA, ORADOR, FATO, NECESSIDADE, PROVIDENCIA, SENADO, OBJETIVO, EXTINÇÃO, PROBLEMA.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs. Senadoras e Srs. Senadores, cidadãos brasileiros que nos ouvem pelos veículos de comunicação do Senado Federal, no dia 18 de março deste ano, o programa "Fantástico", da TV Globo, veiculou extensa reportagem sobre práticas corruptas do mercado de fornecedores de hospitais públicos. Numa criativa abordagem, um hospital universitário permitiu a um repórter passar-se por gestor de compras e gravar as ofertas ilícitas que recebia dos candidatos a fornecer bens e serviços sem licitação.

            Nós todos ficamos horrorizados, chocados.

            A revelação dos fatos gravados logo provocou reações bastante ruidosas, Srª Presidente. Abriram-se inquéritos para apurar criminalmente os fatos noticiados. Iniciaram-se auditorias nos contratos que as empresas pilhadas nas condutas ilícitas mantém com a Administração Federal. Foram propostas providências de inabilitação dessas mesmas empresas para contratar com a União. Nada de novo.

            Todas essas reações são positivas, pois revelam a força da indignação popular contra a corrupção, bem como a tomada de providências corretivas pela Administração Pública nos casos concretos.

            Mas cabe a esta Casa Legislativa, como titular das altas funções de controle externo que lhe atribui o artigo 71 da Constituição Federal, fazer mais que isso. Repito: fazer mais que isso. É preciso olhar para o caso isolado revelado pela reportagem e analisar as suas características para criar meios de antecipar os riscos e prevenir as irregularidades. Se não fizermos isso, Srª Presidente, continuaremos apenas a reagir mecanicamente contra situações isoladas que vierem a ser flagradas por ações individuais. Ou seja, arrumar a tranca na porta depois que a porta já foi arrombada.

            Como fazer isso? Primeiro, pela avaliação criteriosa dos aspectos comuns da prática de todas as empresas pilhadas na tentativa de corromper. Que aspectos seriam esses que todos têm em comum? Que todos os casos tem em comum?

            Primeiro todos os casos foram de dispensa de licitação. Repito: dispensa de licitação por uma suposta situação de emergência, situação em que cabe um alto grau de discricionariedade ao gestor público para selecionar as empresas, sem os procedimentos formais de licitação. Esta hipótese legal deveria ser utilizada apenas em casos excepcionalíssimos e o seu abuso apresenta riscos enormes de fraude nas compras públicas. Ou seja, o que é para ser exceção está se transformando em regra na República Federativa do Brasil. 

            Segundo, foram esses empresários que se aproximaram dos agentes públicos com o ânimo de oferecer-lhes vantagens ilícitas em troca de vantagens ainda maiores para suas empresas à custa dos cofres com os recursos para a saúde dos brasileiros. Os mecanismos de prevenção e repressão da corrupção precisam prever e tratar tão rigorosamente os agentes privados beneficiários do ilícito como tratam os servidores públicos que o comentem - até por que não há corrupto sem corruptor.

            Terceiro, a fraude oferecida nesses casos seria tornada possível pela contratação a preços acima do custo de mercado dos bens e serviços oferecidos; os infames "dez por cento" ou "quinze por cento" sairiam do Tesouro Nacional, acrescidos, que seriam, ao preço que a empresa entendesse adequados à remuneração de seus serviços.

            Isto nos recorda que uma das lacunas mais graves do atual sistema de controle é a deficiência na caracterização dos projetos básicos dos bens e serviços contratados, na elaboração dos orçamentos analíticos e na manutenção de padrões de referência confiáveis de preços de mercado, que permitam à Administração e aos órgãos de controle e fiscalização saberem se está sendo pago o preço justo em cada aquisição.

            Falta uma melhor elaboração nos chamados projetos básicos. 

            Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, precisamos enfrentar cada um desses desafios, de forma mais abrangente e mais completa que a simples reação em um único caso isolado. Este é o nosso papel como representantes do povo, elaboradores das leis e responsáveis pela fiscalização das finanças públicas. É para isso que trago aqui um conjunto de medidas também imediatas.

            Quais seriam essas? Em relação ao abuso da dispensa de licitação por emergência, a legislação ainda é muito genérica, mas temos muito pouco conhecimento ainda sobre as práticas que facilitam esse abuso. Precisamos focalizar nossa atenção como legisladores para essa realidade, e aprender mais sobre os fatos para concluir, no final, por uma redação legal que reduza as possibilidades dessa forma de fraude.

            Por exemplo, apresentei um projeto de lei no ano passado. Esse projeto, que ainda não tem relator, obriga, no momento da contratação com dispensa de licitação, que o Ministério Público e os Tribunais de Conta possam ser notificados disso para que possam fazer esse acompanhamento. Como começar a fazer isso, Srª Presidente? Primeiro, criando recursos para direcionar à fiscalização.

            Hoje sequer sabemos qual a proporção dessas dispensas de licitação, pois os registros contábeis e orçamentários sequer individualizam, nas consultas gerenciais, as diferentes modalidades de dispensa de licitação. Nisto, é possível agir imediatamente: essa informação, embora não seja objeto de individualização contábil, deve constar do documento de empenho, o que não ocorre. A partir daí, o Senado Federal pode contribuir diretamente através da extraordinária ferramenta que é o Siga Brasil, desenvolvido e mantido por esta Casa. Caso esse sistema incorpore a variável "inciso", presente nas Notas de Empenho individuais, o monitoramento dessa hipótese de exceção poderá ser conduzido com muito mais eficiência, representando mais uma grande contribuição do Siga Brasil às finanças públicas.

            Srª Presidente, essa melhoria é objeto de Indicação que apresentarei à Comissão de Meio Ambiente, Defesa. Fiz essa indicação à Comissão, ao Presidente Rodrigo Rollemberg.

            E preciso, porém, Srª Presidente, avançar desde já no conhecimento das práticas concretas de abuso. Procedi a um levantamento global das Unidades Gestoras da Administração Federal nas áreas de saúde e segurança pública, para avaliar a proporção das despesas de custeio e investimento executadas na modalidade de "dispensa de licitação" (já descartadas, naturalmente, aquelas relativas a compras de pequeno valor). Detectamos que várias unidades executam mais de 90% de suas despesas na modalidade de dispensa de licitação. Mais de 90% de sua despesa!

            Embora essa execução possa incluir outras dispensas que não por emergência, por exemplo, trata-se de um primeiro indicador para examinar mais detalhadamente, de forma preventiva, essas unidades. Estou propondo, também à Comissão de Controle e Fiscalização, um requerimento de auditoria ao Tribunal de Contas da União para que a Corte de contas examine especificamente a prática da dispensa de licitação por emergência, identificando circunstâncias e lacunas que possam favorecer eventuais abusos. Este é, mais uma vez, o papel do Legislativo, ao menos ao meu juízo: identificar riscos e interagir com os trabalhos de fiscalização do controle externo no sentido de trabalhar questões de maior relevância.

            Aliás, como todos sabemos, o Tribunal de Contas da União é um órgão que auxilia o Poder Legislativo.

            Passamos então à questão, também gravíssima, da responsabilização dos terceiros privados que induzem atos de improbidade ou são por eles beneficiados. Eu me inclinava, inicialmente, Srª Presidente, a desenvolver proposições legislativas sobre o tema em caráter geral. No entanto, constato que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 6.826, de 2010, elaborado pela Controladoria-Geral da União exatamente com este objetivo. Portanto, não apresento o projeto nesse sentido.

            Porém, muita coisa já se pode fazer no campo da definição legislativa de responsabilidades e de exigências relativas a projetos, orçamentos e critérios técnicos para contratos públicos. Comunico, com grande satisfação, que apresentei o Projeto de Lei 56, de 2012, que "institui normas relacionadas à responsabilização na contratação de obras públicas e dá outras providências". Poderia ser denominado de um Projeto de Lei de Responsabilidade de Obras Públicas. Essa iniciativa traz um extenso conjunto de regras dando objetividade e precisão à gestão desse tipo de contrato. Uma proposição, registro com satisfação, que contou com a colaboração de vários especialistas em fiscalização de obras públicas em diferentes Tribunais de Contas do País, que nos reunimos aqui por várias vezes para debater junto com o Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas (Ibraop) na construção deste projeto.

            E não poderia deixar de fazer referência ao Senador Jefferson Praia, do PDT, que nos antecedeu na Bancada do PDT, que também contribuiu e iniciou este debate sobre a responsabilização dos agentes privados na prática de ilícitos.

            Encerro, Srª Presidente, e proponho no PLS 56 que vá se aplicar imediatamente às obras públicas e poderá ser debatido em audiências públicas para que possamos aprimorá-lo.

            Requeiro, na forma do Regimento, que este meu pronunciamento possa constar como lido por inteiro.

            Por fim e não menos importante, Srª Presidente, entendo são formas de enfrentamento imediato dos riscos de malversação de recursos públicos e contemplam, em maior ou menor grau tudo aquilo que ele paga por meio dos impostos.

            Eu venho muito a esta tribuna, Srª Presidente, falar sobre esses temas, mas a cada vez trago uma ação ou iniciativa diferente. Penso que essa seja a função de um Parlamentar. Se V. Exª me permite, eu encerro a minha fala trazendo a consequência da corrupção, da malversação do dinheiro público e da falta de fiscalização na saúde.

            Recentemente, tivemos o falecimento, aqui em Brasília, de um jovem de catorze anos, filho do grande Deputado Federal pelo Estado do Maranhão, Flávio Dino, que faleceu de forma estranha, para se dizer o mínimo, no Hospital Santa Lúcia, no Distrito Federal.

            Esse jovem, chamado Marcelo, faleceu em situações, no mínimo estranhas, que quase chegam ao menos, em um juízo de valor superficial até agora, na prática de crimes. Muito bem! O Flávio Dino fez uma representação junto à Anvisa para que a Anvisa instaure um procedimento de averiguação, investigação e fiscalização junto a esse hospital porque imagine, Srª Presidente e cidadãos que estão nos ouvindo nesse momento.

            As estradas são fiscalizadas, os aeroportos são fiscalizados, os portos são fiscalizados e os hospitais privados? Eles são fiscalizados ou não pela Anvisa? Será que os hospitais privados estão cumprindo a sua atribuição conforme determina a legislação e resoluções da Anvisa?

            Eu comunico a esta Casa que o Flávio Dino fez uma representação junto à Anvisa no sentido de fiscalizar a conduta desse hospital e também dou ciência de que estou analisando, junto com a Assessoria Técnica do gabinete que ocupo nesta Casa, a possibilidade de nós convocarmos uma audiência pública para que possamos debater não só o papel da Anvisa na fiscalização desses hospitais privados, mas também a esse sistema, uma vez que todos sabemos que, em futuro próximo que se avizinha, teremos eventos internacionais no Brasil e precisamos saber e dar conta ao cidadão se essa agência está cumprindo a sua função constitucional.

            Muito obrigada, Srª Presidente, pelo tempo e pela parcimônia em me ouvir.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR PEDRO TAQUES

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            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, cidadãos brasileiros que nos ouvem pelos veículos de comunicação do Senado Federal,

            No dia dezoito de março deste ano, o programa "Fantástico", da TV Globo, veiculou extensa reportagem sobre práticas corruptas do mercado de fornecedores de hospitais públicos. Numa criativa abordagem, um hospital universitário permitiu a um repórter passar-se por gestor de compras e gravar as ofertas ilícitas que recebia dos candidatos a fornecer bens e serviços sem licitação.

            A revelação dos fatos gravados logo provocou reações bastante ruidosas. Abriram-se inquéritos para apurar criminalmente os fatos noticiados. Iniciaram-se auditorias nos contratos que as empresas pilhadas nas condutas ilícitas mantém com a Administração Federal. Foram propostas providências de inabilitação dessas mesmas empresas para contratar com a União.

            Todas essas reações são positivas, pois revelam a força da indignação popular contra a corrupção, bem como a tomada de providências corretivas pela Administração Pública nos casos concretos.

            Mas cabe a esta Casa Legislativa, como titular das altas funções de controle externo que lhe atribui o artigo 71 da Constituição Federal, fazer mais que isso. É preciso olhar para o caso isolado revelado pela reportagem e analisar as suas características para criar meios de antecipar os riscos e prevenir as irregularidades. Se não fizermos isso, continuaremos apenas a reagir mecanicamente contra situações isoladas que vierem a ser flagradas por ações individuais.

            Como fazer isso? Primeiro, pela avaliação criteriosa dos aspectos comuns da prática de todas as empresas pilhadas na tentativa de corromper. Que aspectos seriam esses que todos têm em comum?

            Primeiro, todos os casos foram de dispensa de licitação por uma suposta situação de emergência, situação em que cabe um alto grau de discricionariedade ao gestor público para selecionar as empresas, sem os procedimentos formais de licitação. Esta hipótese legal deveria ser utilizada apenas em casos excepcionalíssimos e o seu abuso apresenta riscos enormes de fraude nas compras públicas.

            Segundo, foram esses empresários que se aproximaram dos agentes públicos com o ânimo de oferecer-lhes vantagens ilícitas em troca de vantagens ainda maiores para suas empresas à custa dos cofres da saúde dos brasileiros. Os mecanismos de prevenção e repressão da corrupção precisam prever e tratar tão rigorosamente os agentes privados beneficiários do ilícito como tratam os servidores públicos que o comentem - até porque não há corrupto sem corruptor.

            Terceiro, a fraude oferecida nesses casos seria tornada possível pela contratação a preços acima do custo de mercado dos bens e serviços oferecidos; os infames "dez por cento" ou "quinze por cento" sairiam do Tesouro Nacional, acrescidos que seriam ao preço que a empresa entendesse adequados à remuneração de seus serviços. Isto nos recorda que uma das lacunas mais graves do atual sistema de controle é a deficiência na caracterização dos projetos básicos dos bens e serviços contratados, na elaboração dos orçamentos analíticos, e na manutenção de padrões de referência confiáveis de preços de mercado, que permitam à Administração e aos órgãos de controle e fiscalização saberem se está sendo pago o preço justo em cada aquisição.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, precisamos enfrentar cada um desses desafios, de forma mais abrangente e mais completa que a simples reação em um único caso isolado. Este é o nosso papel como representantes do povo, elaboradores das leis e responsáveis pela fiscalização das finanças públicas. É para isto que trago aqui um conjunto de medidas também imediatas.

            Em relação ao abuso da dispensa de licitação por emergência, a legislação ainda é muito genérica, mas temos muito pouco conhecimento ainda sobre as práticas que facilitam esse abuso. Precisamos focalizar nossa atenção como legisladores para essa realidade, e aprender mais sobre os fatos para concluir, no final, por uma redação legal que reduza as possibilidades dessa forma de fraude.

            Como começar a fazer isso? Primeiro, criando recursos para direcionar a fiscalização. Hoje sequer sabemos qual a proporção dessas dispensas, pois os registros contábeis e orçamentários sequer individualizam, nas consultas gerenciais, as diferentes modalidades de dispensa de licitação. Nisto, é possível agir imediatamente: essa informação, embora não seja objeto de individualização contábil, deve constar do documento de empenho. A partir daí, o Senado Federal pode contribuir diretamente através da extraordinária ferramenta que é o SIGA Brasil, desenvolvido e mantido por esta Casa. Caso esse sistema incorpore a variável "Inciso", presente nas Notas de Empenho individuais, o monitoramento dessa hipótese de exceção poderá ser conduzido com muito mais eficiência, representando mais uma grande contribuição do SIGA Brasil às finanças públicas. Esta melhoria é objeto de Indicação que apresentarei à Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA).

            E preciso, porém, avançar desde já no conhecimento das práticas concretas de abuso. Procedi a um levantamento global das Unidades Gestoras da Administração Federal nas áreas de Saúde e Segurança Pública, para avaliar a proporção das despesas de custeio e investimento executadas na modalidade de "dispensa de licitação" (já descartadas, naturalmente, aquelas relativas a compras de pequeno valor). Detectamos que várias Unidades executam mais de noventa por cento de suas despesas na modalidade de dispensa de licitação. Embora essa execução possa incluir outras dispensas que não por emergência, trata-se de um primeiro indicador para examinar mais detalhadamente, de forma preventiva, essas Unidades. Estou propondo, também à CMA, um requerimento de auditoria ao Tribunal de Contas da União, para que a Corte de Contas examine especificamente a prática da dispensa de licitação por emergência, identificando circunstâncias e lacunas que possam favorecer eventuais abusos. Este é, mais uma vez, o papel do Legislativo: identificar riscos e interagir com os trabalhos de fiscalização do controle externo no sentido de trabalhar questões de maior relevância.

            Passamos então à questão, também gravíssima, da responsabilização dos terceiros privados que induzem atos de improbidade ou são por eles beneficiados. Eu me inclinava, inicialmente, a desenvolver proposições legislativas sobre o tema em caráter geral. No entanto, constato que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 6826, de 2010, elaborado pela Controladoria Geral da União exatamente com este objetivo de responsabilizar administrativa e civilmente as pessoas jurídicas envolvidas em atos contra a administração pública. Esse projeto tem recebido na Câmara Baixa uma intensa movimentação, indicando tramitação célere e grande atenção por parte dos deputados. Estando a matéria em estado tão avançado, entendo ser mais benéfico ao interesse público aguardar a chegada desse projeto ao Senado e colaborar no seu aperfeiçoamento, em lugar de iniciar do zero uma proposição com o mesmo objetivo.

            Porém, muita coisa já se pode fazer no campo da definição legislativa de responsabilidades e de exigências relativas a projetos, orçamentos e critérios técnicos para contratos públicos. Comunico, com grande satisfação, que apresentei o Projeto de Lei 56, de 2012, que "Institui normas relacionadas à responsabilização na contratação de obras públicas e dá outras providências". Essa iniciativa traz um extenso conjunto de regras dando objetividade e precisão à gestão desse tipo de contratos. Uma proposição, registro com satisfação, que contou com a colaboração de vários especialistas em fiscalização de obras públicas em diferentes Tribunais de Contas do país, reunidos através do Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas, que muito contribuíram para a redação do projeto.

            Neste ponto, muitos cidadãos que nos ouvem poderão perguntar: "mas Senador, o problema divulgado no Fantástico é nas compras dos hospitais, o que tem um projeto sobre obras públicas a ver com isso?". E eu devo esclarecer essa dúvida, porque de fato o meu projeto pode ajudar muito, a curto e principalmente a médio prazo, também o setor da saúde. Em primeiro lugar, porque uma parte da despesa no setor de saúde refere-se a obras de construção e reforma de hospitais, postos de saúde, etc. Mas também porque as melhorias de gestão que nós conseguirmos na contratação de obras poderão ser depois transferidas para os demais contratos. Na verdade, aprender com as experiências bem sucedidas é um dos fatores mais importantes de sucesso na implementação de políticas públicas, e a fiscalização de obras públicas avançou muito nos últimos anos tanto pelo desenvolvimento técnico da engenharia quanto pelo trabalho intenso dos órgãos de controle exigindo melhores definições de projetos e orçamentos. E recomendável acumular experiências naqueles segmentos mais suscetíveis a gerar boas práticas, para depois estender com segurança as novas regras mais rigorosas a todos os setores da Administração.

            E o que proponho no PLS 56, de 2012, que vai se aplicar imediatamente às obras públicas e poderá ser levado, após a acumulação de experiências e conhecimentos, a outras áreas de política pública?

            Começamos tipificando de maneira precisa as definições das práticas irregulares na execução de contratos públicos, o sobrepreço, o superfaturamento e o "jogo de planilhas" - definições estas, aliás, que aplicam-se a qualquer compra ou serviço adquirido pela Administração. Detalhamos, ainda, as regras e condições para os diferentes regimes de execução contratual (empreitada por preços unitários, por preço global ou empreitada integral) que estão apenas genericamente descritos na lei de licitações - aqui também a generalização posterior dessas regras a todos os setores poderá ser feita com muita facilidade. Em todos os casos, definimos com muito detalhe cada um dos componentes que devem compor os projetos, inclusive os orçamentos.

            Quanto à responsabilização, o projeto individualiza minuciosamente as obrigações da empresa contratada e da Administração como contratante, bem como a extensão das responsabilidades dos agentes responsáveis pelos projetos, pela ordenação de despesas, pelo recebimento das obras e serviços e dos demais intervenientes no processo de gestão. Destaque especial merecem as seções que regulam a subcontratação e os reajustamentos contratuais, matérias que são comuns em contratos de grande vulto e que geram sempre riscos de irregularidades.

            A medição, fiscalização e recebimento das obras contratadas recebem também regras muito precisas, delimitando os procedimentos a serem seguidos e os critérios de regularidade da gestão - o que constitui instrumento concreto para a prevenção do prejuízo ao erário e, caso ocorra, para viabilizar a apuração das correspondentes responsabilidades. Também em matéria de fiscalização, explicitamos todo um leque de medidas acautelatórias que a Administração Pública está autorizada a adotar para prevenir prejuízos na execução do contrato e para garantir-se ante prejuízos financeiros antes mesmo que sejam impostos por condutas irregulares dos contratados.

            Por fim, e não menos importante, diferentes dispositivos impõem exigências de transparência que são o melhor antídoto contra a corrupção: os editais e contratos passam a ter de incluir cláusula de livre acesso da Administração e dos órgãos de controle interno e externo aos livros e documentos da empresa contratada referentes à execução do contrato; os órgãos contratantes passam a ter de publicar normas internas uniformizando todas as suas práticas de licitação e contratação (diminuindo a possibilidade de tratamentos favorecidos a empresas individuais), além de disponibilizar na Internet todos os documentos relativos aos processos de licitação e contratação e a respectiva execução. Uma verdadeira "overdose" de transparência, que representa a curto prazo um investimento maior na organização interna e nos meios de tecnologia da informação, mas esse investimento se pagará muito rapidamente com a redução das oportunidades de corrupção e, por conseguinte, a eliminação dos custos adicionais que a corrupção impõe ao Tesouro e aos cidadãos.

            Todas estas características do projeto são formas de enfrentamento imediato dos riscos de malversação de recursos públicos e contemplam, em maior ou menor medida, os problemas postos em evidência pela reportagem sobre a corrupção nos hospitais.

            Por fim, na questão de referências de preços de mercado, destaco ainda que apresentei parecer favorável, como relator na Comissão de Constituição e Justiça, ao Projeto de Lei do Senado 104, de 2012, de autoria do Senador Jefferson Praia, que cria uma série de regras relativas à elaboração e composição de orçamentos e à verificação de compatibilidade dos preços das obras públicas federais com os preços de mercado, dando segurança jurídica para a utilização das melhores práticas de orçamentação e pesquisa de preços nesse campo. Também aqui muitas dessas boas práticas poderão ser estendidas, em breve tempo, às demais compras governamentais, inclusive no setor saúde.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cidadãos e cidadãs brasileiras que nos honram com sua atenção, combater a corrupção e melhorar a gestão pública são dois lados da mesma moeda: devolver ao contribuinte tudo aquilo que ele paga por meio dos impostos. Eu venho muito a esta tribuna falar desses temas, mas a cada vez trago uma ação ou iniciativa diferente. E não é por acaso: lutar contra a corrupção e a contra a má gestão é um trabalho "de formiguinha", um acúmulo de muitas iniciativas, cada uma delas aparentemente pequena, mas que em conjunto reduzem as oportunidades de desvios e desperdícios. A denúncia espalhafatosa de casos pontuais é, sem dúvida, necessária, mas jamais substituirá o paciente e contínuo trabalho de fiscalizar, monitorar, discutir a cada dia um problema concreto da administração publica, melhorar a cada dia um dispositivo da legislação. Essa vigilância permanente constitui um dos mais sagrados compromissos que o meu mandato assume com o povo de Mato Grosso e a cidadania brasileira.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2012 - Página 11045