Discurso durante a 74ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apoio à proposta apresentada por Pérsio Arida durante o simpósio “A Nova Agenda – Desafio e Oportunidades para o Brasil: a Busca de Alternativas para Novos Rumos”, no Rio de Janeiro.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Apoio à proposta apresentada por Pérsio Arida durante o simpósio “A Nova Agenda – Desafio e Oportunidades para o Brasil: a Busca de Alternativas para Novos Rumos”, no Rio de Janeiro.
Publicação
Publicação no DSF de 08/05/2012 - Página 16047
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, SIMPOSIO, DISCUSSÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, PAIS, REALIZAÇÃO, MUNICIPIO, RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CRITICA, GOVERNO FEDERAL, COMENTARIO, APOIO, PROPOSTA, EX PRESIDENTE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), RELAÇÃO, REFORMULAÇÃO, FUNDO DE AMPARO AO TRABALHADOR (FAT), FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS), POUPANÇA, OBJETIVO, DESENVOLVIMENTO, MELHORIA, RENDA, TRABALHADOR.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente Senadora Ana Amélia, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o debate dos últimos dias: todos nós desejamos reduzir as altas taxas de juros no País, promover desenvolvimento e distribuir corretamente a renda nacional.

            É claro que as alternativas são diversas e nem sempre concordamos com as opções que fazem. Sei também que alegam - e até certo ponto com justiça muitos - que não basta criticar, é preciso apresentar alternativas.

            A obrigação, o dever, a responsabilidade precípua da Oposição é a crítica, é a denúncia, é a revelação dos erros, dos equívocos do Governo. Subsidiariamente, pode a Oposição apresentar sugestões, mas seu dever essencial é o da crítica.

            Hoje, compareço a esta tribuna para apresentar a sugestão: em novembro do ano passado, o PSDB realizou no Rio de Janeiro um simpósio denominado A Nova Agenda - Desafio e Oportunidades para o Brasil: a Busca de Alternativas para Novos Rumos.

            E, naquele simpósio, surpreendeu-me positivamente uma proposta de Pérsio Arida que devo relembrar hoje em razão de ter o Governo colocado a mão no bolso dos pequenos poupadores brasileiros.

            E a esse ato denominou-se ousadia. O Governo foi ousado. Este Governo foi mais ousado do que os outros. Mas ousadia com os pequenos? Eu prefiro a ousadia diante dos grandes, dos poderosos. Não gostaria de dizer que ousadia em excesso em relação aos pequenos é covardia, mas certamente diria que ousadia em relação aos poderosos é grandeza.

            Eu quero destacar, deixando de lado essa questão política, como forma de contribuir para que o Governo atual, ao qual fazemos oposição, possa encontrar rumos adequados para solucionar os problemas nacionais, eu quero destacar a proposta apresentada ao PSDB por Pérsio Arida nesse simpósio do Rio de Janeiro. Pérsio Arida, ex-Presidente do Banco Central e um dos formuladores do Plano Real.

            Eu peço atenção para a leitura que farei agora.

            Pérsio sugere que se faça uma revolução na remuneração das três principais fontes públicas de crédito: FAT, FGTS e poupança. Hoje, tais fundos fornecem recursos a baixo custo a apenas alguns grupos de eleitos. Em contrapartida, remuneram mal seus cotistas, ou seja, a massa de trabalhadores e poupadores brasileiros.

            A sugestão de Pérsio Arida é tão singela quanto inovadora: adotar para FGTS, FAT e poupança as mesmas taxas de juros de longo prazo praticadas pelo mercado. O resultado seria a multiplicação do patrimônio dos trabalhadores, um aumento considerável da poupança doméstica e a redução de tributos, como PIS/Pasep. Trata-se, segundo ele, de "promover o bem geral em detrimento de privilégios localizados. Hoje, os mecanismos de crédito dirigido penalizam fortemente os trabalhadores".

            Eu peço atenção até o final desta exposição, Senador Paulo Paim, porque aqui está um verdadeiro plano econômico, na sequência do Plano Real.

            Desprovido de qualquer soberba, Pérsio deixou claro, no início de sua fala, que o seu objetivo não era discutir o passado, ou mesmo acertos e desacertos recentes, mas sim fazer propostas específicas de política econômica para as quais o Brasil está maduro:

Tenho muita convicção de que elas gerarão os seguintes efeitos: primeiro, reduzir a taxa de juros praticada pelo Banco Central; segundo, melhorar a distribuição de renda; e terceiro, aumentar a poupança doméstica e, portanto, o potencial de crescimento do País.

            Antecipando-se a possíveis questionamentos alertou:

Pergunta imediata que qualquer um faria: se há tantos benefícios, qual é o custo? As propostas prejudicam os setores que hoje têm o privilégio de obterem crédito subsidiado lastreado pelo FGTS, FAT ou caderneta de poupança. [Como agora as grandes empreiteiras de obras públicas que estão construindo estádios de futebol, com recursos do BNDES, com taxas de juros privilegiadas, recursos oriundos do Tesouro nacional, especialmente do FGTS e do FAT] Estou falando de propostas polêmicas, mas que promovem o bem geral do País, em detrimento de grupos e estratégias empresariais atendidos por programas governamentais.

            Peço atenção aos comentários apresentados sobre os três subsistemas de crédito:

             

O primeiro é a caderneta de poupança, que Iastreia os empréstimos do Sistema Financeiro de Habitação. O segundo é o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, que provê o lastro de boa parte dos empréstimos da Caixa Econômica Federal e de alguns outros bancos oficiais. O terceiro são os recursos do FAT, que é um fundo de natureza contábil, que Iastreia parte das operações de empréstimo do BNDES e programas governamentais do Banco do Brasil e do Ministério do Trabalho.

O que todos esses subsistemas de crédito têm em comum é o lastreamento em formas de captação baratas, o que lhes permite emprestar recursos abaixo do praticado no mercado. Em todos eles, como se pode imaginar, em se tratando de subsídio, há muito mais gente querendo tomar empréstimo do que o montante disponível. A adequação do excesso de demanda é feita pelo governo, que discrimina quem tem e quem não tem acesso a esses recursos.

            A escolha do Governo, por exemplo, R$16 bilhões para o JBS, o grande frigorífico, que depois adquiriu banco, que adquire outros patrimônios.

            Pérsio prossegue mostrando as deficiências do atual sistema:

Por que esse sistema é ruim? Primeiro, por fazer com que parte do crédito seja precificada a taxas abaixo do mercado. Quaisquer que sejam as condições, para gerar uma mesma demanda agregada, o Banco Central tem que fixar uma taxa base maior do que a taxa que prevaleceria se não houvesse o crédito direcionado. Vou dar um exemplo para explicar melhor a ideia. Vamos supor, para simplificar, que todo o efeito da política monetária transcorra via canal de crédito e que a parte dirigida, subsidiada do crédito, seja 50% do total. Se o crédito dirigido for precificada a 8%, enquanto a taxa média que assegura o controle da demanda agregada é 10%, o Banco Central teria que colocar a taxa dele a 12%, digamos, para conseguir o efeito desejado na demanda agregada.

            Ele ainda ressalta:

O exemplo é ilustrativo, mas capta a natureza do problema. Não estamos falando de um efeito marginal porque o crédito dirigido corresponde de 40% a 45% a oferta global de crédito. Se parte importante da oferta de crédito é subsidiada, alguém paga essa conta. Ou seja, o efeito do crédito dirigido é que o restante da sociedade paga taxas de juros mais altas do que precisaria pagar. Por restante da sociedade entenda-se todo mundo, inclusive o próprio Governo. Esse sistema teve razão de ser no passado. Os sistemas raramente evoluem à toa. Nossos sistemas de captação de recursos e de crédito dirigido foram originados antes do Plano Real, em um momento em que o Brasil, por sofrer altíssima inflação, tinha taxas de juros lastreadas no overnight e os prazos de financiamentos eram curtíssimos. Esses sistemas foram a maneira que se encontrou na ocasião para prover financiamentos mais baratos e de longo prazo. O Brasil mudou muito desde então. É verdade que ainda não extraímos todos os dividendos da estabilização. Muito do crescimento brasileiro de hoje ainda é reflexo da normalização dos mercados iniciada em 1994. Mas, justamente por isso, hoje temos condições de modificar esse sistema.

Ao longo desses anos, o mercado de capitais cresceu muito, o crédito doméstico teve seu horizonte temporal ampliado, os mercados de créditos internacionais estão abertos, a taxa de juros está em processo de convergência a padrões internacionais. É hora de dar impulso à normalização dos mercados de intermediação financeira em curso desde o Plano Real, mudando essas formas antiquadas de financiamentos que distorcem a economia.

O que estou sugerindo, em cada um dos três sistemas, é termos as taxas de juros na ponta de empréstimo parecidas com as de mercado. Não precisa ser tudo com a taxa Selic. Em alguns casos, as taxas podem ser de longo prazo. É óbvio que operações de longo prazo do BNDES ou da Caixa Econômica poderiam refletir taxas de longo prazo de mercado, não necessariamente a Selic, que é de curto prazo

O que estou propondo, grosso modo, é que os três sistemas - Habitação-FGTS, Caixa-FAT e BNDES - passem a emprestar recursos a taxas de mercado, de curto ou longo prazo, dependendo do horizonte temporal do empréstimo. Esse deveria ser o ponto de partida da reforma. Digo ponto de partida porque, mudando as taxas de empréstimo, mudam também as taxas de captação.

            Vamos falar de poupança. Primeiro, de poupança:

Vou falar primeiro da poupança. Tudo o mais constante, a caderneta de poupança iria render mais do que está rendendo hoje. Se o sistema de habitação pode emprestar a uma taxa mais alta, a caderneta de poupança renderia mais. Ganhariam os mais pobres, que acessam a caderneta de poupança porque não têm volume de recursos suficientes para aplicar em CDBs.

            Portanto, a nossa proposta, a proposta de Pérsio Arida, que acolhemos, é exatamente o oposto daquilo que quer o Governo agora, ao reduzir as taxas de remuneração da Caderneta de Poupança, que é o porto seguro dos assalariados brasileiros.

            FGTS:

Temos depois o caso do FGTS. Se a taxa de empréstimo dos recursos lastreados no FGTS é a taxa de mercado, a remuneração do FGTS passa a ser de mercado também. Ou seja, o FGTS renderia muito mais do que rende agora. Nesse caso, estamos falando de um benefício direto a todos os trabalhadores. A distribuição de renda vai melhorar porque remuneraríamos melhor os recursos dos trabalhadores. A poupança compulsória vai aumentar porque vai ser corrigida a uma taxa mais elevada.

            Vejam que, a cada ponto, ressaltamos a valorização do trabalho e o benefício que se deseja transferir ao trabalhador brasileiro.

            Num gráfico, Pérsio Arida mostrou a importância da sua sugestão:

Começo no Plano Real para simplificar a analise.

Desde o Plano Real, R$1,00 aplicado em 1994 geraria R$25,6 hoje, a taxas de mercado. Na verdade, um pouco menos por causa do imposto, algo em torno de 15% a menos.

Se aplicado na caderneta de poupança, esse mesmo R$1,00 renderia R$7,30. Pior ainda é o caso do FGTS. R$1,00 depositado numa conta do FGTS seria hoje R$4,20. Vejam bem, se aplicado à Selic, geraria mais de R$25,00.

            Portanto, estão tirando do trabalhador, estão agindo como Robin Hood às avessas, porque se trata de retirar, com a aplicação de R$1,94 do FGTS, R$20,00 do trabalhador; ou seja, de R$4,20 que rende o FGTS para R$25,00 que renderia na situação proposta nesta exposição que faço.

            Ele prossegue:

Os números são eloqüentes. Temos no FGTS um sistema montado para tirar na surdina o dinheiro dos trabalhadores e subsidiar os empresários que têm negócios que se enquadram nas prioridades políticas dos governos.

            Vou às conclusões agora, Srª Presidente.

1. Estou convencido de que essas reformas podem ser feitas e que o Brasil está maduro para elas. Não tenho tempo de detalhar as propostas mas, em grandes linhas, seria o seguinte. A primeira delas é colocar o sistema financeiro de habitação a taxa de mercado e elevar a remuneração da poupança. A segunda, colocar todos os empréstimos da Caixa Econômica e demais organismos oficiais a taxas de mercado e aumentar a remuneração do FGTS. A terceira, colocar todos os empréstimos do BNDES a taxas de mercado e aumentar a remuneração do FAT.

            Ora, Srª Presidente, nos últimos anos, foram mais de R$260 bilhões transferidos do Tesouro Nacional ao BNDES para subsidiar taxas de juros, atendendo a privilegiados empresários dos maiores do País, empresários que podem comprar hoje a Delta, com a maior tranquilidade, como já está ocorrendo.

            Enfim, nós vamos insistir.

Aumentar a remuneração do FAT é diferente de aumentar a remuneração do FGTS. Aumentar a remuneração do FAT não beneficia diretamente a trabalhador nenhum, porque o dinheiro do FAT vem de um imposto, o PIS. Uma das vantagens de remunerar melhor o FAT é reduzir a necessidade de o BNDES utilizar recursos do Tesouro para fazer suas aplicações. Nesse sentido, haveria uma economia fiscal evidente. Além disso, se não houvesse tantas demandas assim pelos recursos do FAT, poderia-se diminuir o imposto que o alimenta, o PIS. Estou falando aqui de uma desoneração fiscal pura e simples, de redução de imposto.

            Ele insiste:

Todas as três reformas são factíveis. Vejam bem: o que estou propondo nada muda o funcionamento e a função dos bancos estaduais. Também em nada muda as políticas de governo para os empréstimos da Caixa, do Sistema Financeiro da Habitação ou do BNDES. Eu acho há muito o que discutir nas políticas de governo para esses órgãos, mas isso é assunto para outro momento.

            Ele ressalta que as propostas esboçadas, com essa rapidez toda, em função do tempo:

Têm a enorme vantagem de aumentar a poupança dos trabalhadores. É obvio que quanto maior rentabilidade do FGTS maior a poupança e, com isso, maior o crescimento de longo prazo do País. O Brasil tem hoje uma poupança cronicamente baixa. Há vários motivos para isso, o tema é complexo, mas uma das razões é que tiramos dinheiro da poupança dos trabalhadores para subsidiar empresários, que é o que acontece no FGTS. Outra é que transformamos poupança em imposto quando os fundos de poupança do sistema PIS/PASEP viraram um imposto pura e simplesmente, o PIS.

Essas não são as únicas reformas que podem elevar a poupança, poderia falar um bocado sobre isso, mas estou convencido de que são reformas simples e que fazem muita diferença. As reformas que proponho elevariam a poupança, reduziriam a taxa de juros de mercado e provavelmente reduziriam a carga fiscal ao reduzir o PIS. São todas mudanças importantíssimas para elevar a taxa de crescimento de longo prazo da economia brasileira de 3,5% a 4% para algo perto de 5 ou 5,5%. A redução da taxa de juros fixada pelo Banco Central beneficia a sociedade como um todo. Mas beneficia, sobretudo, o Governo também, porque este é o grande devedor Ao implementar as medidas que proponho, o Governo geraria de imediato mais poupança pública.

            Esse excedente de poupança poderia ser canalizado para investimentos em infraestrutura, abatimento de dívida ou abrir caminho para uma redução de alguns impostos.

            São mudanças perfeitamente factíveis e que demandam apenas coragem das lideranças políticas para agir em nome do bem comum, do bem coletivo, e não ficarem presas aos lobbies dos tomadores de recursos amparados nos vários sistemas oficiais. Não há nada de errado com os lobbies dos tomadores de recursos. É natural que o sistema capitalista opere dessa maneira. Se há crédito subsidiado, é natural que todas as empresas busquem de alguma forma se enquadrar nos programas de crédito subsidiado.

            O que se demanda - estou concluindo, Srª Presidente - no caso não é mudança de comportamento do setor privado, mas das autoridades públicas para eliminarem um sistema que talvez tenha tido razão de ser há muito tempo atrás e que o País não podia modificar nos primórdios da estabilização porque era muito cedo ainda. No entanto, hoje, com a estabilização já avançada, está mais do que na hora de mudar. É preciso grandeza para se livrar dos lobbies e abrir mão dos ganhos políticos de agradar esses ou aqueles grupos empresariais em nome do bem-estar da sociedade como um todo.

            Muito obrigado, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/05/2012 - Página 16047