Discurso durante a 103ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca dos desafios para retomada do crescimento econômico brasileiro, tendo em vista a intensificação dos reflexos da crise econômica na zona do euro.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA NACIONAL.:
  • Considerações acerca dos desafios para retomada do crescimento econômico brasileiro, tendo em vista a intensificação dos reflexos da crise econômica na zona do euro.
Aparteantes
Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DSF de 15/06/2012 - Página 25845
Assunto
Outros > ECONOMIA NACIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, EFEITO, CRISE, SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL, FATO, REDUÇÃO, INDICE, CRESCIMENTO ECONOMICO, PAIS, OBJETIVO, DEMONSTRAÇÃO, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA, ALCANCE, AUMENTO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Srª Presidente em exercício desta sessão e Vice-Presidente do Senado, Senadora Marta Suplicy.

            Srª Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, os reflexos da crise na Zona do Euro se intensificam dia após dia, tornando cada vez mais evidente o impacto e as conseqüências dessa grave crise estrutural por que passa o conjunto dos países que integram o continente europeu.

            Por conta dessa crise, por conta das conseqüências dessa complexa crise, especialistas já asseveram em nosso País que o Produto Interno Bruto (PIB), em 2012, será inferior a 3%, embora a equipe econômica insista que as medidas de incentivo adotadas recentemente já começaram a surtir efeito e os resultados vão aparecer no segundo semestre de 2012.

            De qualquer forma, o momento é de incertezas. E o grande, o mais importante e relevante desafio é, seguramente, a retomada do crescimento econômico em um patamar que possa proporcionar condições de os brasileiros continuarem encontrando oportunidades.

            Para isso, Srªs e Srs. Senadores, é preciso, de fato, tirar o pé do freio em termos de investimentos públicos e privados. Só uma injeção maciça de recursos em setores estratégicos, como, por exemplo, o da infraestrutura será capaz de fazer girar mais depressa a roda da economia brasileira.

            O programa de concessão de aeroportos e rodovias, que já vem sendo conduzido pelo Governo, é da maior importância e precisa ser ampliado para o setor portuário, o quanto antes, para que o nosso País possa ser mais eficiente na atração de investimentos numa área de fundamental importância para a competitividade da economia brasileira.

            Medidas pontuais de desoneração fiscal e impulso ao crédito também são positivas, mas estão longe de resolver o problema no atual cenário econômico.

            O Banco Central acertou em cheio ao optar por uma trajetória consistente da queda da taxa Selic; a Presidente Dilma Rousseff marcou não apenas um gol, mas uma goleada ao estimular a concorrência no mercado financeiro, com a redução das taxas de juros do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal.

            Só que o modelo de crescimento baseado na expansão de crédito já não tem o mesmo vigor de antes, quando o aquecimento do consumo doméstico foi fundamental para evitar o agravamento dos efeitos da crise financeira de 2008.

            A política, enfim, de expansão de crédito, a política, enfim, de expansão do consumo foram, efetivamente, muito importantes nessa quadra e nessa conjuntura da vida brasileira; mas a minha impressão é que a situação, hoje, é um pouco diversa.

            As famílias brasileiras chegaram a um nível de endividamento alto. O comprometimento da renda com pagamento de juros e amortizações da dívida passa de 30% dos orçamentos familiares, e há ainda cálculos, como os do ex-presidente do Banco Central, o economista Affonso Celso Pastore, que avalia e conclui que esse comprometimento está na faixa de 40%.

            A margem, portanto, para expansão do consumo doméstico está bastante restrita, Senador Roberto Requião, e já se observa um nível de inadimplência em razão do elevado consumo observado nos últimos anos.

            Por que o Governo não se vale da ampla base, da qual faço parte, para que nós possamos, aqui no Senado, ampliar e intensificar as importantes reformas estruturantes que poderão melhorar a competitividade da economia brasileira?

            Mais que medidas pontuais que estejam desonerando a nossa economia, precisamos intensificar as reformas estruturantes do Estado brasileiro.

            E nunca é demais bater na antiga tecla: a precariedade da nossa infraestrutura continua a ser um dos maiores nós da economia brasileira. E não há como desatar esse nó sem reforçar os investimentos públicos.

            E a nossa Presidente Dilma tem determinado a seus ministros que coloquem o pé no acelerador. Ela quer que os projetos saiam do papel. No entanto, apesar da preocupação e determinação da Presidente Dilma e dos esforços na condução do PAC e de programas importantes, como o Minha Casa, Minha Vida, programas que geram renda, emprego e oportunidades para tantos brasileiros, o fato objetivo é que nós estamos chegando na metade do ano e só 15% do Orçamento de investimento foi executado. Esses são dados oficiais, do Siafi.

            Portanto, precisamos acelerar os investimentos públicos. E essa nova medida apresentada pelo Governo Federal, na direção de buscar parcerias com governos estaduais por meio do BNDES e do Banco do Brasil, poderá, sim, intensificar esses investimentos.

            Se existe dinheiro, se existe vontade política por parte da Presidente da República, por que, afinal das contas, os projetos públicos não andam e não andam na velocidade adequada?

            Há problemas de toda natureza: burocracia; maior rigor nos contratos e na execução das obras, para evitar irregularidades; projetos mal feitos que precisam, a todo tempo, ser revisados ou retificados; atrasos constantes no licenciamento ambiental e assim por diante.

            Não importa a origem do problema; não importa a cor do gato; o que importa é que o gato cace o rato, seja lá como for. O relógio do tempo não para. Já entramos em contagem regressiva para as eleições municipais, período em que convivemos com um conjunto de restrições, em função da legislação eleitoral, nos investimentos em nosso País.

            O que está em jogo, Senador Requião - e já o ouço com muito prazer -, diante da baixa execução do orçamento, não é só a nossa capacidade de retomar o crescimento econômico. Com o dinheiro represado, assistimos, mais uma vez, a uma novela que vem se repetindo ano após ano, como a novela mexicana, que tem princípio, que tem meio e que não tem fim, numa novela absurda, inaceitável num País, que, nas últimas décadas, foi capaz de um salto formidável em mudanças e em transformação.

            Refiro-me à prática inadequada dos restos a pagar, que vem se acumulando ano após ano, gerando mesmo um orçamento paralelo àquele que o Congresso Nacional discute.

            Para que tenhamos uma ideia desse problema, em 2005, os restos a pagar não chegavam a R$22 bilhões; no ano passado, já eram quase R$129 bilhões; e, no início de 2012, esses mesmos restos a pagar chegaram à casa dos R$140 bilhões. Para ser mais preciso, R$140,9 bilhões!

            Mas ouço com prazer o eminente Senador Roberto Requião.

            O Sr. Roberto Requião (Bloco/PMDB - PR) - Senador Ricardo Ferraço, o PIB tem sofrido avaliações terríveis. A última avaliação da qual tenho conhecimento é de que ele, tendo descido de 7,5% para 2,7%, pode ir, este ano, para qualquer coisa ao redor de 1,9%, 2,0%. Não adianta a Presidenta diminuir o IPI dos automóveis, porque, mesmo baixando o preço dos automóveis, não vai aumentar o consumo de automóveis, porque os brasileiros já compraram os seus carros e os seus eletrodomésticos, em 2009, e ainda têm pela frente 50, 60 prestações. Por outro lado, V. Exª se referiu ao gasto orçamentário em cerca de 15%. Mas, nos transportes, é apenas de 6%. E o problema da Presidenta também são os gatos, mas não por meio desse ditado chinês a que V. Exª se referiu: “não importa a cor dos gatos, desde que os gatos comam os ratos”. Foram gatos que obrigaram a Presidente a demitir sete ministros da República, e isso desestruturou o trabalho dos ministérios, notadamente no Ministério dos Transportes. Então, a Presidente não está conseguindo investir, e só há uma forma de segurar a queda do PIB no País: é investimento público. Porque nós estamos num descenso da economia mundial - Grécia, Espanha, Itália. Não há aquele clima que o Lula teve quando enfrentou o tsunami, com empréstimos públicos, eliminando a contenção de depósito compulsório dos bancos, e a ação do Banco do Brasil, da Caixa Econômica, do BNDES, do BRDE. Nós precisamos investir. Então eu coloquei hoje uma sugestão - e levei, inclusive, ao Vice-Presidente da República -, inspirada numa palestra do João Sicsú, do José Carlos de Assis e, segundo consta também, em algumas ideias do Belluzzo. Vinte e nove bilhões e meio foi o que os Estados pagaram à União no ano de 2011. A União não está conseguindo investir. Se o PIB cair para 1,9% ou 1,2%, ela não vai receber mais nada dos Estados; e, se ela não receber esse dinheiro, ela tem que empregar...

(Interrupção do som.

            O Sr. Roberto Requião (Bloco/PMDB - PR) - A União não irá distribuir dividendos aos acionistas porque não é uma empresa privada. Ela tem que investir no País. Então, a proposta é a seguinte: um convênio autorizado, através de uma medida provisória ou de uma lei complementar, que nós já redigimos, e esse convênio possibilitaria que Estados e Municípios apresentem ao Governo Federal propostas de investimentos em infraestrutura - portos, hospitais, escolas, estradas, ferrovias, rodovias - e deixariam, então, de pagar à União. E esta forneceria esses recursos através de um convênio - um acordo entre as partes, absolutamente constitucional -, para que os 27 Estados se somem ao esforço de multiplicar investimentos para evitar o descenso definitivo do PIB brasileiro. A Presidenta estaria contando com o auxílio de prefeituras e de Estados.

(A Srª Presidente faz soar a campainha.)

            O Sr. Roberto Requião (Bloco/PMDB - PR) - O valor total da dívida dos Estados e Municípios com o Governo Federal, hoje, números de 2010 - deve ser um pouco mais hoje - é de R$421 bilhões. Se metade desses R$29,5 bilhões fossem investidos, R$15 ou R$20 bilhões por parte de Estados e Municípios, nós estaríamos dando uma injeção na veia da economia brasileira. E deveríamos abrir também a possibilidade de investimentos de custeio, não para atividades meio, que são estéreis, mas para atividades fins. Está em crise o sistema de saúde? Então, com esses recursos, a Presidenta autoriza a contratação de médicos, de professores nas universidades, nas escolas, de engenheiros que não existem mais. O Governo Federal não consegue formular um projeto completo de engenharia, de engenharia elétrica, de engenharia hidráulica, e isso alimenta a fábrica de aditivos. Um aditivo em cima do outro. É o processo da Delta: uma cachoeira de aditivos em cima das propostas iniciais das empreiteiras. Contratação de engenheiros, recuperação da capacidade planejamento e de execução de projetos por parte do Estado. É um caminho muito interessante, porque a União não estaria perdoando dívidas; ela estaria utilizando Estados e Municípios devedores como braços executivos dos investimentos em infraestrutura. A proposta está colocada. Mas as últimas projeções de um PIB de 1,9% ou 2,0% são projeções terríveis, porque levaríamos dez anos para recuperar a quebra da capacidade industrial do País, que já está reduzida a muito pouco.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Escravo que sou - e somos - do Regimento Interno e cumprimentando a orientação e determinação de nossa Presidente, ao encerrar o meu pronunciamento, afirmo que é exatamente isso, Senador Requião: nós precisamos ousar mais. Precisamos ser mais criativos diante dos modelos, que estão se esgotando, e que, de fato, percebamos que isso, embora pareça ser apenas uma estatística ou ter apenas um significado técnico, tem uma enorme capacidade de impactar o dia a dia de tantos e tantos brasileiros, os mais jovens sobretudo, que estão chegando ao mercado de trabalho em busca de oportunidades, para que, através delas, possam conceder vida digna.

            O Sr. Roberto Requião (Bloco/PMDB - PR) - Senador Ferraço, com a tolerância da nossa Presidenta, 30 segundos mais. A Presidenta da República propõe - li na imprensa hoje - empréstimos para os Estados: R$10 bilhões. Mas isso só vai aumentar a dívida dos Estados. E essa dívida vai se tornar, num prazo muito curto, impagável, porque impagável já é hoje. Parece a mim muito mais interessante utilizar a capacidade de planejamento e de investimento dos Estados e das principais prefeituras no País para injetar recursos. Nenhum custo para a União, porque ela não está fazendo empréstimo. Os Estados não estão se endividando mais. Eles estão ajudando o Governo Federal a investir numa economia que não terá investimentos privados, nesse momento, porque a economia do mundo está em descenso, como a brasileira também está em descenso. E não adianta diminuir impostos sobre automóveis, porque a famosa classe C, que saiu da D e E, já está endividada.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Não apenas isso, mas iniciativas como aquela que adotou, em bom tempo, o Governo Federal, abrindo concessão para o sistema dos aeroportos brasileiros. Por que não fazermos o mesmo para os nossos portos?

            Tive a oportunidade de integrar uma comitiva liderada pelo Governador Renato Casagrande e, na semana passada, fomos a Singapura. E lá, em Singapura, eu assisti a um porto, com vários terminais. Um porto que faz, em um ano, aquilo que nós, brasileiros, fazemos em cinco anos. O porto de Singapura opera, por ano, 30 milhões TEUs de contêineres. E nós, o Brasil, um país territorialmente desse tamanho, fazemos apenas de 5,5 a 6 milhões TEUs de contêineres.

            Então, é hora também de fazermos com os portos brasileiros, para que nós possamos atrair investimentos internacionais que estão buscando um porto seguro, que estão buscando uma economia saudável. E a nossa economia está saudável, em que pesem os muitos desafios que se acumulam.

            Muito obrigado...

            O Sr. Roberto Requião (Bloco/PMDB - PR) - A última parte do seu pronunciamento não encontraria em mim apoio. Porto é porta de entrada e de saída de um País, e, se for privatizado, nós perdemos o controle da economia regional, e ele passa a atender os interesses dos concessionários e não do Brasil. E, por outro lado, está faltando dinheiro para investimento privado no País inteiro.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Eu não proponho a privatização, mas eu proponho a concessão, porque, mundo afora, o que tem acontecido nessa direção tem enfrentado o corporativismo e tem revelado interesses extraordinários para o conjunto das nações e dos países, como assisti, por exemplo, lá em Roterdã, um porto que é de capital municipal, que é de capital estadual, mas que é governado com as ferramentas da iniciativa privada, que preza o resultado, efetivamente...

(Interrupção do som.)

            O Sr. Roberto Requião (Bloco/PMDB - PR) - Senador, eu prefiro o modelo norte-americano, que não tem um único porto privado; são autoridades municipais, estaduais e federais subordinadas aos interesses do país, não aos interesses de empresas.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Nós estamos falando em concessão; não estamos falando em privatização, e há uma diferença fundamental entre esses dois conceitos.

            Muito obrigado, Srª Presidente.

            Muito obrigado, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/06/2012 - Página 25845