Discurso durante a 106ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa do voto aberto no Senado Federal; e outros assuntos.

Autor
Pedro Taques (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MT)
Nome completo: José Pedro Gonçalves Taques
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.:
  • Defesa do voto aberto no Senado Federal; e outros assuntos.
Aparteantes
Randolfe Rodrigues.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/2012 - Página 26709
Assunto
Outros > SENADO. COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.
Indexação
  • DEFESA, ORADOR, VOTO ABERTO, AMBITO, LEGISLATIVO.
  • CRITICA, AFASTAMENTO, MAGISTRADO, CONDUTA, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, ENFASE, DECISÃO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), CONCESSÃO, PRAZO, DEFESA, ACUSADO, INVESTIGAÇÃO, FATO, INTERFERENCIA, ATUAÇÃO, LEGISLATIVO.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cidadãos que nos assistem pela TV Senado, que nos ouvem pela Rádio Senado, venho nesta tarde de segunda falar sobre alguns temas. Esta é uma tarde de plenário vazio porque muitos estão no Rio de Janeiro, aquela cidade maravilhosa que nós todos conhecemos.

            O primeiro tema é mais uma vez defender a votação aberta aqui no Senado da República.

            Srª Presidente, nós assumimos um compromisso de toda semana subir a esta tribuna e defender a votação aberta, não só neste rumoroso caso que nos atormenta, que estamos a viver, nós todos aqui no Senado, mas para que nós não possamos, logo no semestre que vem, no ano que vem, discutirmos o mesmo tema se mais um lamentável fato ocorrer com um Senador da República.

            Nós não podemos permitir, Srª Presidente, que a escuridão ainda permaneça na votação dos representantes do povo. Nós não podemos permitir que o cidadão eleitor, o dono do poder, aquele a quem a Constituição da República, no art. 1º, parágrafo único, oferta a titularidade do poder, não saiba de que maneira o seu representante votou.

            Isto não é possível em uma democracia, Srª Presidente: o eleitor do meu Estado do Município de Confresa, de Colniza, de Rondolândia, do Município de Aripuanã, tem o direito constitucional, o direito republicano de saber em quem o seu representante nesta Casa votou.

            Por isso, mais uma vez, subo a esta tribuna para defender uma situação aberta: que S. Exª o Presidente desta Casa, o Presidente Sarney, novamente em reunião com as lideranças, decida que nós precisamos colocar esse tema em pauta. E aí cada Senador, cada Senadora assuma a responsabilidade de votar pelo segredo, pela escuridão, ou votar pela abertura dos votos, votar pelas luzes da democracia dentro desta Casa.

            O segundo tema, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores: o Juiz Federal da 11ª Vara de Goiás, o Dr. Paulo Augusto Moreira Lima, foi aquele juiz federal que decretou a prisão do Cachoeira e da quadrilha que se encontra ao derredor do Cachoeira. Durante quase dois anos, esse juiz levou a cabo uma das maiores investigações já realizadas no Brasil, auxiliado pela Polícia Federal, auxiliado por dois Procuradores da República: Drª Léa Batista e Dr. Daniel Salgado, durante dois anos. Um grande juiz, um corajoso juiz.

            No entanto, por questões que ainda não vieram a lume, esse magistrado, no último dia 14, pede o seu afastamento da 11ª Vara de Goiás. Ele pediu o seu afastamento, e o Tribunal Regional Federal , na sexta-feira, afastou, a pedido, esse magistrado. E, a partir desta segunda, nesta data, dia 18, outro magistrado conduz a ação penal, preside a ação penal que resultou nesse novo escândalo da Republica, o chamado “escândalo Cachoeira”.

            Muito bem! Quais foram os motivos do afastamento desse magistrado? E eu quero aqui, Srª Presidente, mais uma vez, repetir o nome deste grande brasileiro: Dr. Paulo Augusto Moreira Lima.

            Quais foram os motivos?

            Uma semana antes, em um dos vários habeas corpus impetrados pela defesa do Cachoeira, esse magistrado prestou informações ao Dr. Tourinho Neto, o famoso Tourinho Neto, nesse habeas corpus. O juiz defende a licitude das provas. Esse magistrado digno defende, Srª Presidente, que a investigação não se iniciou apenas em denúncias anônimas. O magistrado percorre toda a investigação, defendendo a legalidade da investigação. No entanto, o Desembargador Tourinho Neto, que, aliás, é membro do Conselho Nacional de Justiça, em seu voto, na semana passada, entendeu que a prova era ilícita.

            Conheço o Dr. Tourinho Neto há quinze anos. Como Procurador da República em vários Estados da região Norte do Brasil, já tive oportunidade de ver, nas ações penais que nós, do Ministério Público Federal, manejávamos, esse desembargador nulificar investigações, nulificar ações penais, mas, ao depois, o Superior Tribunal de Justiça muda as decisões dele.

            Felizmente, o Dr. Tourinho Neto não foi ouvido por outros dois magistrados da Turma em que ele se faz presente, no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, porque, nesta tarde, a luz veio à realidade, e dois outros desembargadores entenderam, contrariamente ao que disse o Dr. Tourinho Neto e de acordo com o que diz a lei e a Constituição, e de acordo como o que disse o Dr. Paulo, na 11ª Vara, que a investigação era lícita, ou melhor, é lícita, é constitucional.

            O Dr. Tourinho Neto é useiro e vezeiro em nulificar investigações. Cito aqui uma delas. Por exemplo, em 2002, ele foi o magistrado que libertou, por duas vezes, o então investigado e processado no caso Sudam, o Senador Jader Barbalho.

            Continuo.

            O Dr. Tourinho Neto é useiro e vezeiro em dar sermão em magistrados e procuradores da República em suas decisões. E eu, aliás, disse a ele aqui, na Comissão de Constituição e Justiça, por ocasião de sua sabatina para o Conselho Nacional de Justiça: não cabe a juiz do tribunal, não cabe a qualquer magistrado da República Federativa do Brasil dar sermão em magistrado de primeiro grau, em procurador da República.

            Infelizmente, no Brasil, alguns desembargadores têm o vezo de se arvorarem a juízes da causa. Eles não são juízes da causa. Eles são juízes recursais. No entanto, eles se entendem como juízes da causa, e o Dr. Tourinho Neto é um desses.

            Por exemplo, em 2007, num despacho, ele ofendeu e chamou de desidiosa a Procuradora Lívia Tinoco, acusando-a de retardar uma ação que ela havia assumido apenas semanas antes. O MP moveu contra ele uma ação penal no STJ. Eu não sei a natureza, se essa ação penal foi ou não para frente.

            Muito bem; em 2010, o cidadão Tourinho, o juiz, liberta 40 acusados de roubo e comércio ilegal de madeira em reservas florestais no Estado de Mato Grosso.

            Esse juiz, o Dr. Tourinho Neto, ao meu juízo, é um desembargador que não se encontra cumprindo o que diz a Constituição da República.

            Falo isto desta tribuna, com o dever constitucional de um parlamentar: não cabe a magistrados de tribunal dar sermão em magistrados, em procuradores da República.

            Muito bem; a um magistrado que faz parte do Conselho Nacional de Justiça não cabe agir dessa sorte.

            Eu tenho aqui várias decisões do Dr. Tourinho. Várias decisões! Muito bem. Ele diz, na sua decisão, que felizmente não foi mantida pelo TRF, que as interceptações teriam iniciado apenas com denúncia anônima. Isso não é verdade, Srª Presidente. Isso não é verdade! O Dr. Paulo, da 11ª Vara, nas suas informações, desmente esse magistrado. Desmente esse magistrado!

            Agora, infelizmente, alguns operadores do Direito aqui de Brasília, alguns magistrados, alguns Ministros de Tribunais Superiores entendem que, no Brasil, não existe crime organizado; entendem que crime organizado só existiria em filmes, não na realidade em que vivemos.

            No Brasil, nós temos, sim, organizações criminosas que se adonam inclusive de parlamentares da República, como nós estamos a acompanhar neste caso. Nós temos organizações criminosas que se adonam do aparelho do Estado para, valendo-se de licitações fraudadas, roubar o dinheiro que pertence à República. São os novos bucaneiros, são os piratas do patrimônio público. Estes alguns magistrados dos tribunais entendem que não existem. Eles estão fora da realidade!

            Enquanto magistrados do primeiro grau de jurisdição, enquanto procuradores da República, enquanto policiais federais, delegados e agentes da Polícia Federal expõem a sua vida a risco de morte, os magistrados aqui de Brasília, como que numa ilha da fantasia, nos seus gabinetes, muitos deles enfeitados com vários diplomas e certificados de honra ao mérito - e nós conhecemos alguns gabinetes -, com a bandeira do seu Estado de origem, com um artesanato do seu Estado na mesinha da frente, vivem em uma ilha. Magistrados federais, magistrados estaduais, promotores de justiça, procuradores da República, policiais expõem a sua vida, mais uma vez, a risco de morte, e esses magistrados entendem que nós não estamos vivendo o que se denomina de organização criminosa no Brasil.

            É lamentável, Srª Presidente, que estes vivam no mundo da lua!

            Para minha honra, concedo um aparte ao Senador Randolfe Rodrigues.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - Senador Pedro Taques, quero, ao lhe cumprimentar pelo seu pronunciamento e pelo que V. Exª nele aduz, destacar que V. Exª faz o arrazoado de uma contraofensiva, querida Presidente, que estamos vendo por parte da organização criminosa que foi desbaratada pela atuação corajosa dos procuradores da República aos quais V. Exª já se referiu e da Polícia Federal. É essa atuação corajosa que é responsável por nós estarmos hoje, aqui, no Congresso Nacional, com a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, desvendando uma rede de crimes que envolve grandes empreiteiras, agentes públicos, políticos, Deputados Federais, Senadores e Governadores de Estado, até onde investigamos neste momento, podendo chegar a mais vários outros agentes públicos, com a rede de contravenção da jogatina patrocinada pelo Sr. Carlos Cachoeira. E V. Exª é muito preciso em dizer que isso tudo somente se iniciou devido à atuação corajosa de Procuradores da República e da Polícia Federal. Somente devido a isso! E nós estamos vendo que, da quinta-feira para cá, houve uma contraofensiva da ação criminosa. A ação criminosa tem tentáculos - e estamos percebendo claramente - em Poderes da República, em agentes privados e em agentes públicos. É isso que estamos percebendo: que, de fato, da última quinta-feira para cá, tivemos uma contraofensiva da organização criminosa. Primeiramente, os que querem investigar e avançar na investigação - eu e V. Exª, que estamos acompanhando e participando da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - fomos derrotados, na última quinta-feira, quando foi rejeitado o requerimento de convocação do Sr. Cavendish. Na sequência disso, V Exª já destacou o currículo do Desembargador, o qual proferiu o pedido de relaxamento da prisão do Sr. Carlos Cachoeira. Hoje de manhã, em uma decisão que me pareceu um acinte, uma intervenção indevida ao princípio da harmonia e independência dos Poderes, o Ministro Toffoli, pelo Supremo Tribunal Federal, dá razão a uma ação da defesa do Senador Demóstenes para conceder mais prazo a ele no Conselho de Ética. E, juntamente com isso, nós tivemos o afastamento de alguém que deveria receber aqui, da Mesa do Senado, uma honraria como herói brasileiro: o Juiz Federal que mandou prender o Sr. Carlos Cachoeira enfrentando a tudo e a todos. E o que estamos percebendo? O Tribunal de Justiça de Goiás, ao invés de prestar honraria e homenagem a este juiz, afasta-o. É a máxima do velho e querido bom Chico Buarque: “Chama o ladrão!” Porque se um brasileiro como esse, que prende o contraventor-chefe de uma organização criminosa, como é o Sr. Carlos Cachoeira, é afastado, a quem mais vamos recorrer? Então, estava quatro a zero para eles. Ainda bem que hoje se iniciou uma reação. O Tribunal Regional Federal, numa decisão sábia e acertada, considerou válidas as escutas, as interceptações telefônicas feitas pela Polícia Federal. Eu queria aproveitar o seu pronunciamento e comunicar que estou protocolizando, no Conselho de Ética, uma Questão de Ordem arguindo a suspensão do colega Senador que defendeu a não convocação do Sr. Cavendish, em virtude dos notórios acontecimentos em que o colega se declarou amigo do Sr. Cavendish. Ele disse isso, inclusive, no Twitter, onde se declara amigo do Sr. Cavendish, que é próximo do Sr. Cavendish e que se encontrou com o Sr. Cavendish em Paris. Então, não só não poderia ter votado, como também não poderia dar causa à defesa dele. E o art. 306 do Regimento Interno do Senado, combinado com o art. 254, inciso I, do Código de Processo Penal, é claro e cristalino em arguir suspensão de investigador que tem relações próximas e de intimidade com o objeto da investigação, com o investigado. Nós temos que reagir, Srª Presidente, querido Senador Pedro Taques. Eu tenho a honra de estar ombreando com V. Exª nessa pauta e nessa luta republicana. Temos sido atacados em conjunto nas redes sociais e temos sido atacados em conjunto nos porões em virtude das posturas que temos assumido, mas eu fico feliz por saber que, assim como V. Exª e a Senadora Ana Amélia, nós temos sido companheiros. A palavra “companheiro” vem do latim e significa: aquele com quem você comparte o pão, aquele que está ao seu lado. Temos sido companheiros nessa jornada para que essa Comissão Parlamentar de Inquérito não termine em pizza e para que não triunfe a obsolescência das investigações.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Muito obrigado, Senador Randolfe. Companheiro, hoje, é um termo que não pode ser muito utilizado, porque está quase desnaturado. Imaginem: o Maluf, hoje, é companheiro do Lula! Este é um País de piada pronta. Mas vamos deixar esse tema para outro debate.

            O mesmo Juiz Tourinho Neto determinou a soltura do Cachoeira, dizendo que o Cachoeira havia praticado apenas contravenção penal, que, na Itália, é denominado de crime anão, e o Tourinho disse aqui que é um ilícito menor.

            O Cachoeira não está processado só por contravenção penal! Ele está sendo processado por várias vezes ter praticado ilícito de corrupção ativa. Ele está sendo processado por quadrilha. É quadrilheiro! É membro de organização criminosa já condenado no Rio de Janeiro. Falar que ele deve ser solto porque está a praticar contravenção penal é mentir! Isso é mentira! Basta ler a denúncia. Ele foi denunciado com mais de 70 pessoas. É membro de organização criminosa! E a legislação nacional diz que aquele que comete esse tipo de crime deve ficar preso. No entanto, Srª Presidente, é como eu sempre digo: quando o Ministério Público ou a Polícia Federal entram na casa grande, deixando a senzala, aí a reação vem.

            O Direito Penal, mais uma vez repito aqui, não pode ser igual à Teologia da Libertação: fazer opção só para os pobres. O Direito Penal serve para grandes empresários, inclusive donos de empreiteiras que, em menos de oito anos, recebe quase R$4 bilhões dos recursos do Tesouro Nacional. Esses são os novos piratas da República; são os bucaneiros da coisa pública.

            Srª Presidente, para a minha honra, eu quero comunicar a presença aqui do Dr. Dorileo, Advogado do Estado de Mato Grosso.

            Seja bem-vindo ao Senado, companheiro do PDT! É uma honra tê-lo aqui!

            Encerro, Srª Presidente, também destacando essa decisão de hoje do Ministro Dias Toffoli.

            A Constituição da República, no art. 2º, determina a separação dos Poderes. A Constituição da República diz, no art. 52, que o Senado deve tratar dos seus assuntos internos através de uma resolução, que é o veículo apropriado para vir ao mundo jurídico o Regimento Interno, que é uma espécie de lei em sentido material, a lei que nos regula internamente.

            O Ministro Dias Toffoli, nessa sua interpretação, que é teratológica, entende que pode criar um novo regimento interno para o Senado da República. É um juiz que adivinha que Senadores que receberam as alegações finais do Senador Demóstenes na sexta-feira ficariam dormindo sábado, domingo e não teriam capacidade intelectual para analisá-las. Isso é um absurdo!

            Será que nós, aqui, no Senado da República, poderíamos votar uma resolução para regrar a forma como o Supremo vai votar o mensalão?

            Eles fizeram uma reunião administrativa e decidiram como será a votação do mensalão, porque isso está no Regimento Interno do Supremo. Isso se encontra no alto governo dos tribunais. Portanto, não há que se falar que o Supremo Tribunal Federal possa se imiscuir em decisões internas desta Casa. Está violando a separação dos Poderes. Nós estamos criando uma hipertrofia, uma superforça de um poder em detrimento de outro. Isso não é democracia, isso é ditadura, isso é autoritarismo, isso não é possível na Carta da República.

            O Supremo Tribunal Federal nós devemos respeitar. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal merecem nosso respeito, mas o Supremo não pode, a cada decisão, inventar a Constituição. O Supremo não pode, a cada decisão, criar um novo texto constitucional. E agora estão a criar regimento interno e resolução do Senado da República. Isso não é constitucional!

            Mas existe, ao que consta, um documento chamado Constituição. E este documento chamado Constituição não pode ser apenas uma folha de papel onde existem algumas grafias simbológicas ali ditas. A Constituição tem que ser vivida por nós. A Constituição tem que ser vivida por nós; a Constituição tem que ser sentida por nós. E nós, Senadores, desta tribuna, juramos cumprir a Constituição. Por isso venho aqui criticar essa decisão do Ministro Dias Toffoli.

            Decisão judicial se cumpre, agora decisão judicial se debate. Só na escuridão da ditadura as decisões não eram debatidas. Nós ainda vivemos em um Estado democrático de direito.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/2012 - Página 26709