Pela Liderança durante a 110ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Manifestação sobre o êxito e as limitações da Conferência Rio+20.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Manifestação sobre o êxito e as limitações da Conferência Rio+20.
Publicação
Publicação no DSF de 26/06/2012 - Página 27722
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • COMENTARIO, RESULTADO, CONFERENCIA INTERNACIONAL, MEIO AMBIENTE, MUNICIPIO, RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ELOGIO, PARTICIPAÇÃO, MOBILIZAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL, IMPRENSA, REGISTRO, ELABORAÇÃO, DOCUMENTO, ACORDO INTERNACIONAL, COMPROMISSO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, ECONOMIA INTERNACIONAL, NECESSIDADE, INOVAÇÃO, CONCEITO, SUSTENTABILIDADE.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Sras Senadoras, eu vim aqui tratar do mesmo tema de que os Senadores Collor e Rodrigo Rollemberg falaram mais cedo, mas com uma visão um pouco diferente, tocando no assunto da Rio+20.

            Primeiro, vale a pena dizer que teve um aspecto exitoso a reunião por ter existido. O simples fato de existir, de acontecer uma reunião com tantos Chefes de Estado e de Governo já é positivo. Além disso, era uma reunião com Chefes de Estado e de Governo para discutirem os assuntos de médio e longo prazo da economia da sociedade no mundo. Não há dúvida de que o fato de ela ter ocorrido foi um êxito para o mundo inteiro.

            Segundo, foi exitoso o fato de, ao redor do encontro dos Chefes de Estado, nós termos tido uma imensa mobilização de ONGs, de pessoas, noticiário permanente nos rádios, jornais, televisão, embora tenham demorado muito a trazer o assunto. Eu aqui mesmo falei muitas vezes que 2014 parecia estar mais perto do que 2012, porque todo mundo falava da Copa e ninguém falava da Rio+20. Mas, nos últimos dois meses, o assunto apareceu, cresceu e tomou conta da opinião pública. As próprias crianças, nas escolas, passaram a falar da Rio+20. Os professores davam trabalhos relacionados com a Rio+20. Esses são dois êxitos.

            O terceiro é que tenha surgido um documento; um documento ter sido assinado por todos, diferentemente do que aconteceu em Copenhague, do que aconteceu em Durban, em que não se conseguiu chegar a nada de unidade. Além disso, o fato de esse documento ter legitimado alguns conceitos, como economia verde e desenvolvimento sustentável. Esses são três êxitos, ninguém pode negar. E ninguém pode tirar o mérito, inclusive, para esses êxitos da diplomacia brasileira, da Ministra do Meio Ambiente e da Presidente da República.

            Mas, manifestado o êxito, quero, agora, manifestar o meu lado de ver como um fracasso as limitações desse êxito. Esse era o momento não apenas de falar em desenvolvimento sustentável e economia verde. Era o momento de falar, ainda que não ficasse um documento, que o mundo precisa mudar o conceito de progresso. É preciso mudar o conceito de progresso ao ponto de que a palavra desenvolvimento seja substituída por outra que indique avanço da humanidade e não apenas desenvolvimento, que quer dizer da economia sustentável. Mais do que economia verde, que é para produzir o mesmo usando combustíveis renováveis em vez de combustíveis fósseis, precisamos de economia azul, do bem-estar, que deixe de medir se um mundo é rico ou é pobre pelo produto que faz, e, sim, pelo tempo que usufrui, pelas vantagens que tem, pela harmonia com que os seres humanos convivem entre eles e eles com a natureza. Uma economia que também seja branca, deixando de considerar como produto as armas que são feitas na economia e pela economia para as guerras.

            Quando uma pessoa cerca a sua casa, não aumenta a sua riqueza; apenas protege a riqueza que já tem. Armas para guerra têm o mesmo objetivo: fazer a defesa de um país, mas não enriquecê-lo. Então, não tem por que a gente considerar a produção de armas - US$1,5 trilhão, em 2010 - como parte da riqueza mundial.

            Essa é parte dos gastos necessários para proteger cada país que investe em armas.

            Nós temos de ter uma economia vermelha, do ponto de vista de não haver desemprego, de ninguém deixar de ter uma parcela suficiente do produto, para que sua sobrevivência seja garantida.

            É muito pouco falar em economia verde. Ainda que não fosse possível fazer essa revolução do conceito de progresso, era preciso que a Presidenta do Brasil tivesse falado nesse assunto com uma posição brasileira para ser debatida, ainda que não aceita.

            Nós fracassamos ao não ousar. E o próprio Secretário-Geral das Nações Unidas disse isso, embora, no outro dia, tenha voltado atrás. Nós não ousamos e não ousamos, em parte, porque o nosso governo é desenvolvimentista dos anos 50, que põe a palavra sustentável para justificar o mesmo de sempre, ao invés de procurar revolucionar o de antes e trazer uma dimensão nova para o projeto brasileiro. Além disso, porque, politicamente, se desejou de tal maneira fechar um documento que mesmo aqueles mínimos princípios que o Brasil poderia até levar como novidade não foram levados.

            Em alguns momentos, Srª Presidenta, quando se está para firmar um acordo internacional, é possível colocar itens que reconheçam o direito de não concordar com os seguintes aspectos, e listá-los. Eles ficariam no ar, sendo debatidos, sendo ouvidos, falados e negociados ao longo dos próximos anos. Mas, ao fechar um documento como algo terminado, pronto, conseguimos inibir qualquer avanço maior na intenção de o mundo mudar o rumo do progresso que temos cumprido nos últimos cem ou até mesmo duzentos anos e que se esgotou. Esgotou-se porque aquele casamento que havia, da democracia política com a inovação científica e tecnológica, com o crescimento econômico e o bem-estar, esse casamento a quatro entrou em crise, porque sugiram três novos vetores: os limites ecológicos, a ultra, super, megaconcentração de renda e o fato de que o sistema financeiro ficou independente, não respeita mais fronteiras e pouco tem a ver com o processo da economia.

            Nessa nova realidade, ao invés de quatro vetores que se casavam e sete que não se casam, era o grande momento de discutir o que fazer, de discutir um novo pacto, um novo acordo mundial que permitisse redefinir os conceitos que hoje estão velhos: o conceito de desenvolvimento, o conceito de economia verde, que ficou velho com pouco tempo de ter sido concebido; o conceito de emprego; o conceito até mesmo de democracia; o conceito de desigualdade. Todos esses conceitos estão precisando ser redefinidos. E lamentavelmente eles vão continuar sendo puros debates acadêmicos, porque os políticos, os Chefes de Estado e de Governo, não aceitaram o risco, não tiveram a ousadia de trazer isso para a mesa onde eles se sentavam na Rio+20.

            É uma pena, mas pelo menos nós podemos dizer que houve um ou outro êxito. Eu só espero é que nós não nos contentemos tanto com o que fizemos até aqui, na Rio+20, e ela termina como uma espécie de CPI, que serve para mobilizar e termina virando pizza, porque não leva a nada concreto de transformação naquilo que é uma realidade carcomida, esgotada, como é a realidade do sistema social e econômico no mundo inteiro.

            Por isso, fiquei satisfeito de ver o Ex-Presidente Collor, Senador Collor, nesta tribuna, há pouco, decidindo levar para a Comissão de Relações Exteriores a proposta de manter a subcomissão que funciona para acompanhar a Rio+20. E agora seria uma subcomissão que acompanharia aquilo que foi assinado e que buscaria avançar naquilo que foi acordado até aqui.

            Eu espero, Senador, que o Senado brasileiro - País que foi o anfitrião da reunião - que o Senado Federal possa dar esta contribuição nos próximos meses: fazer avançar o que os Chefes de Estado e de Governo não tiveram a ousadia de fazer, ou seja, redefinir para onde queremos levar cada país, para onde queremos levar a humanidade inteira, para onde queremos que o progresso nos conduza. É disso que a gente precisa. Muito mais do que pequenos ajustes, precisamos de novos conceitos. Vamos buscá-los.

            A Rio+20 não terminou, apenas o encontro dos Chefes de Estado para fazer uma bela foto. Mas agora cabe a nós continuar aquilo que eles não fizeram, esperando talvez Rio+40 ou Rio+50, mas um momento que não seja tarde demais para reorientarmos o futuro do nosso progresso.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/06/2012 - Página 27722