Discurso durante a 20ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas às políticas macroeconômicas adotadas pelo Governo Federal.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Críticas às políticas macroeconômicas adotadas pelo Governo Federal.
Aparteantes
Ana Amélia.
Publicação
Publicação no DSF de 05/03/2013 - Página 7235
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO FEDERAL, REFERENCIA, AUSENCIA, CRESCIMENTO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), RENDA PER CAPITA, REDUÇÃO, TAXAS, INVESTIMENTO, POUPANÇA, ECONOMIA NACIONAL, INFLAÇÃO, AUMENTO, DIVIDA, PROPOSTA, ELABORAÇÃO, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO, DOCUMENTO, ASSUNTO, AVISO, IMPORTANCIA, EDUCAÇÃO, PLANEJAMENTO, POLITICA NACIONAL.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, eu venho aqui mais uma vez para insistir na necessidade de que o nosso Governo, porque é o Governo do Brasil, Senador, desperte para o que está acontecendo com a economia brasileira.

            Tem gente que acha que a Presidenta e o Ministro da Fazenda estão tentando nos iludir, aos brasileiros. Senadora Ana Amélia, eu acho que é muito mais grave. Eu acho que eles estão iludidos. Eles não estão percebendo, porque, se eles soubessem a realidade e estivessem apenas querendo diminuir o impacto disso através de um discurso mais otimista, tudo bem. Mas eu acho que eles não estão vendo. Não estão vendo com clareza, por exemplo - e eu vou listar aqui alguns itens -, o tamanho do nosso PIB, de menos de 1%. E o que poucos estão falando é de 0% no que se refere ao PIB per capita, porque a nossa população cresceu tanto quanto cresceu o PIB. Isso significa que a população ficou na mesma.

            Isso é grave. Isso é muito grave. Inclusive é raro na economia brasileira. E é o pior desempenho entre todos os países do chamado BRICS. É um dos piores, se não o pior na América Latina inteira. É menor do que o dos nossos vizinhos, mesmo aqueles em crise.

            O Governo precisa despertar para isso, mas precisa despertar para as causas disso, porque continua se achando que a causa disso precisa de pequenas receitas financeiras. Não. É preciso mudanças estruturais. E a prova disso é o baixo nível de investimento de nossa economia.

            Nosso investimento teve uma redução do ano passado para este ano. Nós tivemos não uma queda, tivemos um investimento de 18%, mas que já vem de uma baixa, muito pequena, que era 14%. Isso é uma taxa muito, muito baixa, a taxa de poupança de 14%. Em 2011, foi de 17,2%, ou seja, nossa poupança, que era muito baixa, 17%, baixíssima, essa poupança, agora, foi de 14%.

            Não se sustenta uma economia que poupa apenas 14%. E daí que a gente vê a baixa taxa de investimento, mesmo quando se soma a poupança interna com o capital que vem do exterior, que, se não me engano, ficou em 18%. Mas isso tem uma causa estrutural. A causa estrutural - ou as causas, a gente pode listar -, primeiro, é a tentativa de fazer com que as coisas se resolvam no imediato, independente do preço que se vai pagar depois, fazendo com que, para que a crise não se manifeste, incentivos ao consumo são feitos, relegando incentivos à poupança e ao investimento. Não se sustenta.

            Nosso consumo está crescendo por 9 anos seguidos. Isso é muito bom para cada um de nós que estamos vivos neste momento, podendo consumir mais, mas isso não é bom para os nossos filhos, isso não é bom para os que virão depois e que vão ter que sofrer o esgotamento, a exaustão da estratégia da prioridade ao consumo, abandonando a poupança e, portanto, o investimento.

            Pode até mudar de um dia para o outro, mas não somos mais a 6ª economia do mundo, de que tanto se orgulhava o Governo recentemente, já somos a 7ª. É possível que em 2014 possamos voltar a ser, dependendo da taxa de câmbio e dependendo de desempenho de países como a Inglaterra. Mas nós estamos sofrendo de problemas estruturas, que tentamos resolver com medidas simples, imediatistas e sem consequências a longo prazo. A consequência disso, basta ver não só no pequeno PIB, mas algo mais grave do que o pequeno PIB, a queda na indústria, a queda no setor agropecuário, em torno de 2,3%.

            O PIB, que cresceu quase nada, foi graças aos serviços, não foi graças à força do nosso setor produtivo. E, se no setor de indústria, formos olhar aquilo que é mais importante como a indústria de transformação, a indústria química, a petroquímica, caímos 2,5%. Então, per capita, nos caímos quase 2%. Não é possível que o Governo continue dormindo diante disso ou, para superar isso, faça o que chamam por aí de road show: ministro, presidente do Banco Central rodando o mundo tentando convencer que as coisas vão bem.

            Se eles tiverem convencidos de que as coisas vão bem, a situação está muito ruim. Se eles estiverem mentindo, porque sabem que as coisas não vão bem, a situação está muito ruim também. Até porque, lá fora, os investidores têm acesso a informações que nós nem temos aqui, Senadora. Eles sabem a realidade, e nós estamos, esse é outro ponto, com uma crise de credibilidade no sistema econômico em geral, tanto os empresários aqui dentro quanto lá fora.

            Houve uma inversão da situação de euforia que havia lá fora e de confiança em relação ao Brasil para um período de desconfiança. Basta ler os principais veículos de economia do mundo, basta ver os relatórios que são feitos, a cada dia, por serviços de informação relacionada à economia que a gente vê que há uma crise de credibilidade que vem dos indicadores, vem da taxa de inflação, que está acima da média em dois pontos, porque a meta de 4,5% está 6,5%, que é exatamente o limite da banda superior, está mais que isso. Só não está acima disso pela manipulação de preços, pela intervenção do Governo, o que nunca dá certo no médio e longo prazo.

            São formas disfarçadas de controle de preço que não se segura. É o automóvel baixar pela isenção fiscal, é a tarifa elétrica ser reduzida pela mão do Governo, é a tarifa telefônica baixar por determinação do Governo, tudo isso é muito bom para hoje, tudo isso é muito perigoso para o médio e longo prazo porque alguém vai ter que pagar isso em algum momento no futuro. Além disso, traz uma queda de credibilidade hoje, porque lá fora sabe-se que os 6,5% não é a verdade, é o artifício, é o resultado de um artifício.

            Nossa balança de serviços, na comparação entre importações e exportações, está piorando sensivelmente. E lá fora eles tomam consciência disso, eles sabem que tivemos uma piora de 4 bilhões na balança de serviços. Lá fora sabem que nós tivemos uma redução de quase 50% no nosso superávit. Felizmente ainda temos superávit, mas o superávit na balança comercial, que foi de 29,7 bilhões antes, no ano passado foi de 19,4. Isso é muito grave, porque ao ter essa redução no superávit, para cobrir as necessidades nossas, que antes eram financiadas por esse superávit, vamos ter que ir atrás de dinheiro lá fora, vamos fazer esse tal de roadshow, buscando dinheiro para compensar a queda do superávit.

            E lá fora eles vão olhar para cá e vão perceber que nós não temos credibilidade suficiente para receber o dinheiro necessário para cobrir essa redução que aconteceu no nosso superávit.

            Agora, o que é grave, em vez de fazer uma reflexão e perguntar o que está acontecendo, o que está fazendo com que a economia fique assim, o que vemos hoje nos jornais? O jornal diz que o Governo, para compensar essa situação, vai auxiliar as indústrias. O velho esquema do protecionismo que não deu certo no passado.

            O problema não está em dar mais ou menos ajuda às empresas, mas sim em fazer com que elas tenham capacidade de competitividade, capacidade de competir internacionalmente, que faça que nossas exportações cresçam nos setores dinâmicos, graças à alta tecnologia; e não apenas só nos setores de mineração, de agropecuária. Até porque a queda que vimos de 2,3% no produto agropecuário industrial tem a ver, porque baixou o preço das commodities.

            Então, é um país dependente, é um país que sofre se houver especulação lá fora com a carne, especulação com a soja. Nós somos dependentes das especulações internacionais, porque nós não temos uma estrutura capaz de fazer funcionar bem. Nós temos equilíbrios momentâneos. Eu já insisti aqui: nosso governo é um governo de equilibristas, não é um governo de estadistas.

            O equilibrista olha passo a passo e consegue ficar em cima da corda, mas ele não consegue construir uma pilastra sobre a qual caminhe com segurança. Estamos nos equilibrando.

            E por que não falar do endividamento? O endividamento nosso até reduziu-se do ponto de vista líquido, mas cresceu a dívida bruta, mas não só a dívida pública, o endividamento da nossa população. O nosso consumo foi o que dinamizou o PIB, esse pouquinho, e o nosso consumo foi dinamizado pelo endividamento. Isso tem um limite, todo mundo que já se endividou sabe que chega um ponto em que não dá mais para pagar o cartão de crédito, não dá mais para pagar as faturas. E, aí, o que faz? Inadimplência. Que no Brasil já está em 11%. É trágico 11%?: Ainda não, mas é grave. Mais grave, porém, é não perceber, não despertar, não acabar com a autoilusão de que é preciso fazer com que este País, em vez de endividar as famílias, faça com que as famílias poupem. País estável, país com sustentabilidade é o país em que a população, em vez de se endividar, poupa, investe e dinamiza a economia para os próximos anos e, sobretudo, para as próximas gerações. Temo que o Governo esteja querendo nos iludir, que o Governo esteja iludido, cego, diante dos problemas que estão adiante.

            Mas, antes de continuar, Senador, quero passar a palavra à Senadora Ana Amélia.

            A Srª Ana Amélia (Bloco/PP - RS) - Senador Cristovam, em tudo isso, pelo menos, temos uma luz no fim do túnel, porque a Presidente Dilma disse que o mote da campanha eleitoral dela vai ser educação. Então, V. Exª que tem pregado, às vezes, no deserto, para que a educação seja prioridade, pelo menos isso a gente vai acreditar que seja uma proposta de fato concreta e não apenas mais uma retórica de palanque que não ajuda. Concordo plenamente com V. Exª, quando fala desse excessivo intervencionismo do Estado pelo lado errado, na questão de tarifa, na questão de juro. Aparentemente, é bom, é positivo, todo mundo gosta. Mas, para os agentes da economia, isso gera uma incerteza, quebra de contratos, insegurança jurídica e, como disse V. Exª, o reflexo disso é uma redução dos investimentos aqui. Então, o Governo deveria operar muito mais na ampliação dos investimentos, melhorando a capacidade competitiva da indústria, do setor agrícola, que estamos perdendo competitividade. Nós somos muito produtivos na agricultura - houve um aumento substancial na produtividade -, mas a competitividade é perdida, Senador. Perdida por falta de um modal de transporte adequado: nós estamos muito concentrados em rodovias, as estradas estão cada vez mais, digamos, movimentadas com fluxo de escoamento, e não temos estradas novas, não temos duplicação em rodovias importantes para escoamento de safra. Então, eu queria me solidarizar com V. Exª no entendimento desta matéria. E a falta desses investimentos nesses setores de infraestrutura, de logística tem retirado essa capacidade competitiva do Brasil comparativamente até aos nossos vizinhos do Mercosul, que estão fazendo mais do que nós em matéria de logística. Então, eu acho que o alerta não é uma crítica pela crítica; o alerta que V. Exª faz é um alerta chamando à racionalidade e aos riscos que o Brasil corre se não der atenção adequada a todas essas questões, porque o consumo é bom, mas ele tem limitações, ele não é estruturante, ele não tem a base da sustentação da economia, que é o setor industrial, os setores realmente que pesam na nossa economia, como o setor agropecuário também. Então, queria cumprimentá-lo por esse posicionamento, Senador Cristovam.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Muito obrigado, Senadora.

            Eu quero dizer que...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Senador, eu tinha seis minutos há pouco.

            A Srª Ana Amélia (Bloco/PP - RS. Fora do microfone.) - Desconta a minha fala.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Embora eu não precise de tanto tempo.

            A Srª Ana Amélia (Bloco/PP - RS. Fora do microfone.) - Desconta o meu aparte.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Senadora, eu quero dizer - e, Senador Acir, que me honra com a sua Presidência - que eu lamento, mas, ao ler essa matéria de que a Presidenta Dilma vai colocar a educação como tema, eu fiquei perguntando qual marqueteiro colocou isso na cabeça dela, porque já faz 11 anos que este Governo está aí e fez muito pela universidade, mas muito pouco pelo ensino de base - 10 anos.

            Então, eu li como algo de marketing, se não já estaria fazendo e, depois, diria que fez. E aí está um dos pontos estruturais da nossa crise: a falta de mão de obra qualificada que permita dar uma boa dinâmica à economia. Mas vejo mais preocupações, porque lá fora todos sabem: o déficit em transações correntes, que era de R$52,4 bilhões, aumentou para R$54,2 bilhões. O que isso provoca? A necessidade de buscar mais dinheiro lá fora. E o que isso pode vir a provocar? O que ninguém deseja: um aumento da taxa de juros. E, aí, mais uma vez, fica uma medida que não tem substância para continuar: a redução da taxa de juros por determinação, por decisão política, em vez de ser pelo efeito natural do aumento da poupança. É a poupança que baixa a taxa de juros. Não é a vontade do Governo. Eu temo que eles sejam obrigados a aumentar a taxa de juros, o que não vai ser bom para ninguém, mas é a consequência de ter sido reduzida a taxa de juros voluntariamente, e não estruturalmente.

            Eu coloco ainda, embora já esteja para terminar, nestes itens - e vou colocar algumas sugestões -, como indicador fundamental, Senador Acir, o que a gente lê, todos os dias, sobre a situação da Petrobras, da Vale do Rio Doce, do maior dos empresários que nós temos hoje, e outros setores empresariais absolutamente dependentes do BNDES.

            Nosso setor industrial, nosso setor econômico, nossos empresários hoje estão sob a proteção do BNDES e isso é um perigo muito grande para a estabilidade da economia para nossa dinâmica. O que a gente precisa fazer? Uma das coisas é desvincular a economia da campanha e da política do dia a dia. A economia de um país é algo muito maior, não cabe nas manipulações do dia a dia para ganhar votos. Há realidade na economia que exige ser respeitada. Eu creio que o Governo precisa descobrir que o Brasil vai além do mandato do Presidente ou da Presidenta; que vai além de dois mandatos. O Brasil vai além de décadas! E que comecem a colocar, com seriedade, o longo prazo na hora de tomar decisões.

            Hoje mesmo há uma matéria - ou ontem em um jornal -, falando que o ministério que deveria pensar no futuro é absolutamente irrelevante, que o PMDB já está pensando, inclusive, em entregar esse que deveria ser um ministério importante. Mas quantas vezes o Ministro da Fazenda consultou o Ministro de Assuntos Estratégicos? Quantas vezes? É uma pergunta que faço e não tenho a resposta! Na hora de se tomar decisões sobre reduzir os impostos de automóveis, consultou-se o ministério que cuida do futuro? Na hora de se reduzir a tarifa de energia elétrica, consultou-se o ministério que cuida do futuro, a Secretaria de Assuntos Estratégicos? Está-se precisando pensar no futuro!

            Outra coisa é parar as manipulações: as manipulações de preços... Lutar, sim, para baixar as taxas de juros com base estrutural, não para depois a gente ter de aumentá-las outra vez pela volta da inflação ou porque, com os déficits que temos, precisaremos buscar dinheiro lá fora que vem aqui em busca de juros.

            Finalmente, quero colocar aqui uma proposta, Senador. Espero que os Senadores daqui, que são da Comissão de Assuntos Econômicos, aceitem. Eu vou sugerir à CAE que o Senador Lindbergh ponha um grupo de nós para trabalhar, para elaborar um documento chamado Alerta. Não é um documento chamado oposição, até porque sou da Base de Apoio. Não é um documento chamado crítica; é um documento chamado Alerta dos Senadores da Comissão de Educação ao Brasil, para ser entregue às autoridades econômicas, às autoridades financeiras do Governo brasileiro, que temo que não esteja querendo nos iludir, mas que seja mais grave: esteja ele próprio, o Governo, iludido, sem perceber os riscos que estamos correndo, os tropeços que podem aparecer daqui em diante.

            Era isso, Sr. Presidente, o que tinha para falar. Levarei essa proposta à Comissão de Assuntos Econômicos amanhã.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/03/2013 - Página 7235