Discurso durante a 36ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre a necessidade de uma política de segurança pública consistente em todo o País.

Autor
Pedro Taques (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MT)
Nome completo: José Pedro Gonçalves Taques
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), GOVERNO ESTADUAL, HOMENAGEM.:
  • Reflexão sobre a necessidade de uma política de segurança pública consistente em todo o País.
Aparteantes
Vital do Rêgo.
Publicação
Publicação no DSF de 26/03/2013 - Página 12695
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), GOVERNO ESTADUAL, HOMENAGEM.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, VIOLENCIA, POLICIA MILITAR, ENFASE, ESTADO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), REGISTRO, AUSENCIA, ESFORÇO, GOVERNO ESTADUAL, ASSISTENCIA, SETOR, REFERENCIA, FALTA, EQUIPAMENTO MILITAR, TECNICAS PROFISSIONAIS, DEFESA, ORADOR, MELHORIA, ORGANIZAÇÃO, SEGURANÇA PUBLICA, VALORIZAÇÃO, POLICIAL, MOTIVO, IMPORTANCIA, SERVIÇO, ESTABILIDADE, PAIS, HOMENAGEM, POLICIAL MILITAR, VITIMA, HOMICIDIO, EXERCICIO PROFISSIONAL.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, amigos que nos acompanham pela Agência Senado ou pelas redes sociais, há duas semanas, subi a esta tribuna para falar sobre o papel da polícia cidadã no Estado Democrático de Direito.

            O lamentável episódio do confronto de policiais militares e estudantes da Universidade Federal do Estado de Mato Grosso que narrei aqui serviu não apenas para avaliarmos a ação policial, mas também para aprofundarmos a reflexão sobre essa importante instituição chamada Polícia Militar.

            A Constituição de 1988, Srªs e Srs. Senadores, em seu art. 144, §5º, cristaliza bem a competência das polícias militares, incumbindo-as da nobre missão de realizar o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública por meio de ações planejadas e coordenadas.

            Diante da competência fixada pela Lei Maior, cabe às instituições militares estaduais a missão de realizar o policiamento nas ruas, avenidas, rodovias, com a finalidade de trazer segurança e tranquilidade a uma sociedade com medo da criminalidade, da falta de segurança e da violência, que a cada dia aumenta.

            São muitas as questões que afligem a população brasileira e que não têm recebido respostas suficientes por parte dos atuais governantes.

            Quando nos deparamos com cenas chocantes como a de policiais atirando com balas de borracha em alunos durante uma manifestação pacífica, é comum recorrermos à frase “Polícia truculenta. Para quê precisamos de polícia?” A ação de meia dúzia de policiais acaba colocando em xeque a credibilidade de toda uma instituição.

            Se por um lado, a violência, a corrupção e o despreparo de alguns profissionais são inegáveis, por outro, precisamos evitar qualquer generalização.

            É aí que volto a destacar a importância da Polícia Militar de Mato Grosso, instituição à qual devo a minha vida. Por seis anos, minha família e eu vivemos sob escolta desses homens do Estado, quando ainda era procurador da República.

            Pois bem, aqui quero iniciar minha reflexão. Os nossos policiais militares possuem condições de trabalho que os afastem das vulnerabilidades, de atividades paralelas ou do desinteresse pela carreira abraçada? Será que o Estado está dando condições aos policiais militares de exercerem as suas atribuições constitucionais?

            Ao ser nomeado Presidente da Subcomissão de Segurança Pública do Senado, no ano passado, iniciamos um longo trabalho de enfrentamento da atual realidade. Desde 2011, recebemos inúmeras sugestões, reclamações, pedidos, e analisamos as propostas legislativas já em tramitação na Casa. São valiosos subsídios que nos auxiliam na obtenção das respostas adequadas aos problemas.

            Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, amigos que nos acompanham por todas as formas de comunicação, através da Agência Senado, Rádio Senado, TV Senado e redes sociais, tivemos notícias de que, desde o ano passado, a Rotam de Mato Grosso -- grupo responsável pelas ações de controle de distúrbios civis -- convive com o descaso do Poder Público. Faltam materiais para treinamento. O pior: falta material para as operações policiais.

            A Rotam é uma unidade especializada que vem desempenhando um papel institucional de grande importância. Ela atua nos casos de perturbação da ordem pública, por meio de operações projetadas e executadas com o objetivo de restaurar a ordem quebrada. Ou seja, atuam nos casos em que um grupo -- ou vários grupos -- extrapola o direito de manifestação, causando lesão ao direito do cidadão, bem como causam dano ao patrimônio público e privado.

            Mesmo sem os equipamentos necessários, a Rotam continua atuando nos presídios de Mato Grosso, nos casos de reintegração de posse, e também nas manifestações, como foi o caso dos alunos da Universidade Federal do Estado de Mato Grosso.

            A situação da Rotam vai de mal a pior. Estamos diante de uma tragédia anunciada. Como fiscal da lei e das ações do Poder Executivo, não posso me calar diante desses fatos. Tão importante quanto preservar a vida e o direito à livre manifestação de estudantes universitários, como foi o caso nessa situação na Universidade Federal do Estado de Mato Grosso, também é importante zelar por aqueles que representam o Estado.

            Cuiabá será sede da Copa do Mundo de 2014 e o Governo sequer cumpre o que preceitua a Doutrina de Policiamento de Controle de Distúrbios Civis. Conforme a Doutrina, existe toda uma técnica de aparelhamento da polícia e de equipes especializadas, como a Rotam, e, infelizmente, isso não vem sendo feito no Estado de Mato Grosso.

            Srªs e Srs. Senadores, obtivemos, por meio de denúncias anônimas, feitas por cidadãos do Estado de Mato Grosso, a informação de que faltam materiais para a Rotam no nosso Estado, como escudos, capacetes utilizados por esses profissionais, que não possuem sequer proteção balística. Imaginem, é uma equipe especializada em distúrbios civis e não existem equipamentos necessários para que eles possam exercer as suas atribuições. Os escudos, segundo essa denúncia que foi feita, ainda são de acrílico, o que coloca em risco a vida de policiais que atuam nessas ações. Hoje, a Rotam possui poucos escudos e materiais necessários para o bom desempenho de suas atribuições.

            Para trabalhar, a técnica de policiamento, Sr. Presidente, exige um número certo de materiais, sob pena de a ação não ser feita a contento, o que vem causando prejuízo não só à sociedade, mas especificamente a esses policiais que estão a desempenhar as suas atribuições.

            Mesmo sem a metade dos materiais necessários, segundo essa denúncia, a honrosa Polícia Militar consegue ser referência nas ações de controle de distúrbio civil. É bom lembrar que, em 2011, o batalhão da Rotam permaneceu de prontidão durante 66 dias, quando, por uma reivindicação legítima, que foi a melhora nos salários, 1.750 investigadores ficaram em movimento paredista, em greve, no nosso Estado.

            Mas e se os policiais do Estado de Mato Grosso não tivessem condições de exercer as suas funções a contento? Imagine, Sr. Presidente, a tragédia que existiria no nosso Estado.

            Srªs e Srs. Senadores, mesmo com as deficiências que aqui descrevi, existe a programação de um curso de formação de controle de distúrbios civis que, inclusive, deverá contar com a presença de policiais de outros Estados. Como faremos esse curso, Sr. Presidente, sem a estrutura necessária? Isso não será possível.

            Não entrei no mérito de falar de outro problema da segurança pública do Estado do Mato Grosso, que é o déficit de efetivo. Mato Grosso possui 6,9 mil policiais militares, mil policiais do Corpo de Bombeiros e 2 mil policiais civis. O Governo do Estado, no final do ano, anunciou que mais 2,5 mil cidadãos serão incorporados ao efetivo responsável pela segurança pública, isso até dezembro de 2013. Quero registrar que acompanhamos o anúncio e também cobraremos a aplicação das medidas; não adianta só falar e não fazer absolutamente nada.

            Sr. Presidente, Srs. Senadores, este não é um discurso sobre bandidos e mocinhos, sobre heróis e anti-heróis. Este não é um discurso sobre culpados e inocentes. Este é um discurso para falar de brasileiros que se posicionam diariamente na linha de fogo entre criminosos e a sociedade. De homens e mulheres que chegam a ter seus sonhos interrompidos pelo ofício que escolheram exercer. Gente que perde a vida, Senador Vital, em decorrência do cumprimento de sua profissão.

            Este é um discurso também para falar dos mais de 200 policiais militares mortos no País do ano passado até fevereiro deste ano -- mais de 200 policiais militares! Somente este ano, morreram em Mato Grosso 8 policiais militares. Em 2012, foram 14 policiais mortos em razão do exercício da função. Em 14 meses, morreram 22 profissionais no meu Estado.

            O número é assustador e fica ainda mais alarmante se comparado aos números de pesquisas semelhantes realizadas nos Estados Unidos, por exemplo. O último levantamento aponta a morte de 72 policiais lá nos Estados Unidos -- 72 policiais! --, número que, no Brasil, representa um resultado absolutamente fenomenal. Enquanto lá, com 300 milhões de habitantes, 72 policiais morreram no exercício da função; aqui, com 200 milhões de habitantes, 200 policiais morreram. É um número assustador.

            A organicidade do Estado se dá pelos seres humanos que movimentam a máquina; portanto, quando morre um servidor público por razões de seu trabalho, Srªs e Srs. Senadores, morre também um pouco do Estado.

            Presto minha homenagem aos familiares e amigos desses profissionais que morreram fardados e também às famílias dos profissionais mortos indiretamente em razão do trabalho prestado.

            Por exemplo, durante momentos de folga, muitas vezes, após serem reconhecidos por criminosos, policiais também morrem no exercício da função. Famílias como a do policial da Rotam Wilson de Campos, executado em Várzea Grande, Sr. Presidente; do policial civil Manoel Alves de Almeida, de 55 anos, morto em julho de 2012 durante uma tentativa de assalto no bairro CPA IV, em Cuiabá; do policial militar Devanilson Gonçalves da Cruz, morto em Várzea Grande, no final do ano passado, também no exercício de suas funções; e do policial militar Alex Oliveira, executado após luta corporal com assaltante na cidade de Poconé, portal do Pantanal mato-grossense.

            Muitas vezes acompanhamos policiais sendo presos em razão do exercício da função, mas policiais morrem no exercício da função e poucos levantam os dados das mortes desses policiais, poucas autoridades presenciam o velório, o enterro desses policiais que morreram no exercício de suas funções.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, amigos que nos acompanham, termino este discurso citando a frase do economista norte-americano Jeffrey David Sachs. Ele diz o seguinte: “Estado desorganizado, crime organizado”. Precisamos de uma política pública de segurança consistente, que envolva um projeto sofisticado e profundo de integração institucional e intersetorial, gestão de informação, formação de uma cultura da paz e prevenção ao crime. Enquanto houver descaso na prestação do serviço de segurança do povo, com o povo e pelo povo, fatores como a má distribuição de renda e dezenas de outros problemas sociais continuarão agravando o problema da violência.

            Que Deus abençoe e ilumine esses valorosos profissionais do Estado de Mato Grosso que morreram no exercício da função, ou que ainda estão patrulhando as ruas para proteger o cidadão de bem no exercício do dever fundamental que o Estado tem de proteger aqueles que vivem abaixo do chamado contrato social.

            Antes de encerrar, concedo um aparte a S. Exª o Senador Vital do Rêgo, o amigo Vital do Rêgo.

            O Sr. Vital do Rêgo (Bloco/PMDB - PB) - Senador Pedro Taques, peço licença, com pouco brilho, mas motivado pelo conteúdo do seu pronunciamento, para tentar mostrar um pouco o entusiasmo que tenho, neste aparte, de aderir ao tema que V. Exª traz à tribuna na tarde/noite de hoje. Somente a sensibilidade de um homem com a sua estatura moral, a sua dignidade científica, a sua experiência, a sua posição histórica no combate à criminalidade é que tem condições práticas e políticas de dissecar um tema desta grandeza, a segurança pública no País.

A fragilidade do exercício dessa profissão tão dignificante, tão exposta nessa luta muitas vezes desigual contra a criminalidade. Os números são estarrecedores: quer no Mato Grosso, quer na Paraíba, a criminalidade alcança geometricamente patamares insustentáveis, e o Brasil não está preparado, com políticas públicas, para enfrentar como ciência uma questão que nos atormenta. Nós temos receitas para a educação, nós temos debates para a saúde, mas ainda não colocamos dentro das nossas prioridades a questão da segurança pública. Temos discursos maravilhosos, como o de V. Exª, temos, dia após dia, nos noticiários televisivos, radiofônicos ou nas páginas dos jornais, muito mais da metade desses noticiosos falando a respeito dessa injusta, da desumana constatação de que a criminalidade sempre vence na luta contra o Estado. Só nos resta aguardar, com esperança, que a coisa possa mudar com pronunciamentos como esse de V. Exª. Quero me acostar a ele dizendo que, talvez com uma voz importante como a de V. Exª, possamos sensibilizar as autoridades públicas para pensar segurança pública como um dever do Estado brasileiro, do menor Município deste País à União.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Muito obrigado, Senador e amigo Vital do Rêgo. E lembro que temos um encontro marcado, na quarta-feira, com a Subcomissão de Segurança Pública, para que possamos, junto com a Comissão do Código Penal, tratar desse tema de suma importância.

            Aqui, nesta tribuna do Senado, debatemos temas macroeconômicos, como: a crise internacional, os royalties do petróleo, FPE, ICMS, superendividamento dos Estados, mas nos esquecemos de gente, nos esquecemos que brasileiros estão morrendo no exercício de suas atribuições. O Seu José, a D. Maria, o Seu Pedro estão morrendo no exercício de suas atribuições.

            Eu, como Procurador da República, fui designado pelo Procurador-Geral da República para fazer os júris federais de servidores públicos federais mortos no exercício da função, notadamente policiais federais, policiais rodoviários federais, auditores da Receita Federal, juízes, delegados da Polícia Federal. Eu fiz mais de 30 júris federais pelo Brasil nesses casos.

            Muito bem; matar um policial, matar um servidor público no exercício da função é matar a própria existência do Estado. Não que um servidor público valha mais do que aquele que trabalha na iniciativa privada, mas, naquele momento em que ele está exercendo a sua função, quem está se manifestando é o próprio Estado, porque o Estado é uma entidade abstrata que fala por meio dos seus servidores públicos.

            Eu, na minha vida, só fui servidor público. Tenho orgulho e honra de ser servidor público. Policiais militares, policiais civis, policiais federais estão morrendo pelo Brasil, e o nome deste policial tem que ser lembrado. Assim, nos meus discursos sobre segurança, como fiz neste discurso de hoje, eu lembrarei o nome de policiais mortos no exercício de suas atribuições, que são constitucionais, sob pena de a sociedade ter afastado o contrato social, o que nos faz viver dentro de uma comunidade que chamamos de Estado.

            Muito obrigado pelo seu aparte.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/03/2013 - Página 12695