Discurso durante a 45ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão acerca de matéria da revista IstoÉ sobre o sucesso da política de cotas raciais no País.

Autor
Anibal Diniz (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Anibal Diniz
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL, EDUCAÇÃO.:
  • Reflexão acerca de matéria da revista IstoÉ sobre o sucesso da política de cotas raciais no País.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Paulo Paim, Wellington Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 09/04/2013 - Página 16321
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL, EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFERENCIA, ELOGIO, RESULTADO, POLITICA SOCIAL, IMPLANTAÇÃO, COTA, ALUNO, NEGRO, INGRESSO, UNIVERSIDADE.

            O SR. ANIBAL DINIZ (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, telespectadores da TV, ouvintes da Rádio Senado, alunos e professores que nos honram com suas presenças aqui nas galerias, trago hoje uma reflexão sobre a ampla reportagem da revista IstoÉ sobre o sucesso da política de cotas nos últimos dez anos.

            Essa matéria traz uma série de afirmações de capa que vale a pena serem mencionadas.

            As cotas deram certo!

            Uma década depois, a política de inclusão de negros nas universidades brasileiras apresenta resultados surpreendentes!

            Eles têm notas mais altas que a média!

            No vestibular, vão tão bem quanto os não cotistas. Os índices de evasão são baixos. A maioria sai da faculdade empregada. Eles ajudaram a melhorar a qualidade do ensino. As histórias de sucesso de quem venceu o preconceito.

            A revista IstoÉ, Senador Wellington Dias, que circula esta semana traz em sua capa o sucesso da política de cotas raciais nas universidades. Segundo a reportagem, o reflexo está na melhora da qualidade do ensino e na redução dos índices de evasão.

            Passo a ler a reportagem produzida pelos repórteres Amauri Segalla, Mariana Brugger e Rodrigo Cardoso, que traz entrevistas e dados significativos e mostra que a política de cotas dos Governos Lula e Dilma deram certo.

            A reportagem começa contando uma historinha bem interessante:

Antes de pedalar pelas ruas de Amsterdã com uma bicicleta vermelha e um sorriso largo, como fez na tarde da quarta-feira da semana passada, Ícaro Luís Vidal dos Santos, 25 anos, percorreu um caminho duro, mas que poderia ter sido bem mais tortuoso. Talvez intransponível. Ele foi o primeiro cotista negro a entrar na Faculdade de Medicina da [Universidade] Federal da Bahia. Formando da turma de 2011, Ícaro trabalha como clínico geral em um hospital de Salvador. A foto [publicada na revista] (...) celebra a alegria de alguém que tinha tudo para não estar ali. É que, no Brasil, a cor da pele determina as chances de uma pessoa chegar à universidade. Para pobres e alunos de escolas públicas, também são poucas as rotas disponíveis. Como tantos outros, Ícaro reúne várias barreiras numa só pessoa: sempre frequentou colégio gratuito, sempre foi pobre - e é negro. Mesmo assim, sua história é diferente. Contra todas as probabilidades, tornou-se doutor diplomado, com dinheiro suficiente para cruzar o Atlântico e saborear a primeira viagem internacional. Sem a política de cotas, ele teria passado os últimos dias pedalando nas pontes erguidas sobre os canais de Amsterdã? Impossível dizer com certeza, mas a resposta lógica seria “não”.

Desde que o primeiro aluno negro ingressou em uma universidade pública pelo sistema de cotas, há dez anos, muita bobagem foi dita por aí. Os críticos ferozes afirmaram que o modelo rebaixaria o nível educacional e degradaria as universidades. Eles também disseram que os cotistas jamais acompanhariam o ritmo de seus colegas mais iluminados e isso resultaria na desistência dos negros e pobres beneficiados pelos programas de inclusão. Os arautos do pessimismo profetizaram discrepâncias do próprio vestibular, pois os cotistas seriam aprovados com notas vexatórias se comparadas com o desempenho da turma considerada mais capaz. Para os apocalípticos, o sistema de cotas culminaria numa decrepitude completa: o ódio racial seria instalado nas salas de aula universitárias, enquanto negros e brancos construiriam muros imaginários entre si. A segregação venceria e a mediocridade dos cotistas acabaria de vez com o mundo acadêmico brasileiro. Mas, surpresa: nada disso aconteceu. Um por um, todos os argumentos foram derrotados pela simples constatação da realidade. “Até agora, nenhuma das justificativas das pessoas contrárias às cotas se mostrou verdadeira”, diz [o Professor] Ricardo Vieiralves de Castro, reitor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

As cotas raciais deram certo porque seus beneficiados são, sim, competentes. Merecem, sim, frequentar uma universidade pública e de qualidade. No vestibular, que é o princípio de tudo, os cotistas estão só um pouco atrás. Segundo dados do Sistema de Seleção Unificada, [o Sisu] a nota de corte para os candidatos convencionais a vagas de medicina nas federais foi de 787,56 pontos. Para os cotistas, foi de 761,67 pontos. A diferença entre eles, portanto, ficou próxima de 3%. A revista IstoÉ entrevistou educadores e todos disseram que essa distância é mais do que razoável. Na verdade, é quase nada.

Se em uma disciplina tão concorrida quanto medicina um coeficiente de apenas 3% separa os privilegiados, que estudaram em colégios privados, dos negros e pobres, que frequentaram escolas públicas, então é justo supor que a diferença mínima pode, perfeitamente, ser igualada ou superada no decorrer dos cursos. Depende só da disposição do aluno. Na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), uma das mais conceituadas do País, os resultados do último vestibular surpreenderam. "A maior diferença entre as notas de ingresso de cotistas e não cotistas foi observada no curso de economia", diz Ângela Rocha, Pró-Reitora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. "Mesmo assim, essa distância foi de 11%, o que, estatisticamente, não é significativo”.

Por ser recente, o sistema de cotas para negros carece de estudos que reúnam dados gerais do conjunto de universidades brasileiras. Mesmo analisados separadamente, eles trazem respostas extraordinárias. É de se imaginar que os alunos oriundos de colégios privados tenham, na universidade, desempenho muito acima de seus pares cotistas. Afinal, eles tiveram uma educação exemplar, amparada em mensalidades que custam pequenas fortunas. Mas a esperada superioridade estudantil dos não cotistas está longe de ser verdade. A UERJ analisou as notas de seus alunos durante cinco anos. Os negros tiraram, em média, 6,41. Já os não cotistas marcaram 6,37 pontos. Caso isolado? De jeito nenhum. Na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que também é referência no País, uma pesquisa demonstrou que, em 33 dos 64 cursos analisados, os alunos que ingressaram na universidade por meio de um sistema parecido com as cotas tiveram performance melhor do que os não beneficiados. E ninguém está falando aqui de disciplinas sem prestígio. Em engenharia de computação, uma das novas fronteiras do mercado de trabalho, os estudantes negros, pobres e que frequentaram escolas públicas tiraram, no terceiro semestre, média de 6,8, contra 6,1 dos demais. Em física, um bicho de sete cabeças para a maioria das pessoas, o primeiro grupo cravou 5,4 pontos, mais do que os 4,1 dos outros (o que dá uma diferença espantosa de 32% em favor dos estudantes cotistas).

Em um relatório interno, a Unicamp avaliou que seu programa para pobres e negros resultou em um bônus inesperado. "Além de promover a inclusão social e étnica, obtivemos um ganho acadêmico", diz o texto. Ora, os pessimistas não diziam que os alunos favorecidos pelas cotas acabariam com a meritocracia? Não afirmavam que a qualidade das universidades seria colocada em xeque? Por uma sublime ironia, foi o inverso que aconteceu. E se a diferença entre cotistas e não cotistas fosse realmente grande, significaria que os programas de inclusão estariam condenados ao fracasso? Esse tipo de análise é igualmente discutível. "Em um País tão desigual quanto o Brasil, falar em meritocracia não faz sentido", diz Nelson Inocêncio, coordenador do Núcleo de Estudos afro-Brasileiros da UnB. "Com as cotas, não é o mérito que se deve discutir, mas, sim, a questão da oportunidade.” Ricardo Vieiralves de Castro fala do dever intrínseco das universidades em, afinal, transformar seus alunos - mesmo que cheguem à sala de aula com deficiências de aprendizado. "Se você não acredita que a educação é um processo modificador e civilizatório, que o conhecimento é capaz de provocar grandes mudanças, não faz sentido existirem professores.” Não faz sentido existir nem sequer universidade.

Mas o que explica o desempenho estudantil eficiente dos cotistas? "Os alunos do modelo de inclusão são sobreviventes, aqueles que sempre foram os melhores de sua turma", diz Maurício Kleinke, coordenador-executivo do vestibular da Unicamp. Kleinke faz uma análise interessante do fenômeno. "Eles querem, acima de tudo, mostrar para os outros que são capazes e, por isso, se esforçam mais.” Segundo o professor da Unicamp, os mais favorecidos sabem que, se tudo der errado na universidade, podem simplesmente deixar o curso e voltar para os braços firmes e seguros de seus pais. Para os negros e pobres, é diferente. "Eles não sofrem da crise existencial que afeta muitos alunos universitários e que faz com que estes desistam do curso para tentar qualquer outra coisa”. Advogado que entrou na PUC do Rio por meio de um sistema de cotas, Renato Ferreira dos Santos concorda com essa teoria. "Nós, negros, não podemos fazer corpo mole na universidade", diz. Também professor do Departamento de Psicologia da Uerj, Ricardo Vieiralves de Castro vai além. "Há um esforço diferenciado do aluno cotista, que agarra essa oportunidade como uma chance de vida", diz o educador. "Ele faz um esforço pessoal de superação.". Esse empenho, diz o especialista, é detectável a cada período estudantil. “O cotista começa a universidade com uma performance mediana, mas depois se iguala ao não cotista e, por fim, o supera em muitos casos.”

O cotista não desiste. Se desistir, terá de voltar ao passado e enfrentar a falta de oportunidades que a vida ofereceu. Por isso, os índices de evasão dos alunos dos programas de inclusão são baixos e, em diversas universidades, até inferiores aos dos não cotistas.

Para os críticos teimosos, que achavam...

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Eu pediria um aparte a V. Exª.

            O SR. ANIBAL DINIZ (Bloco/PT - AC) - Ouço V. Exª com atenção, Senador Wellington Dias. Veja só que dados estatísticos interessantes, não é?

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Fantásticos. Estou aqui admirado com a forma como V. Exª traz, com coisas práticas, esse tema. Primeiro, parabenizar por pautá-lo. Muitas vezes, nós temos aqui informações que não batem com a realidade. Eu quero chamar a atenção para duas coisas, acrescentando ao que V. Exª coloca. Acho que o meu Estado é a prova é maior da importância da política de cotas. Eu tenho defendido no MEC que temos de ir além, reconhecer que nós temos aí um estoque de pessoas que estudaram com professores leigos, em uma fase, no Brasil, com certeza lá no Acre, com certeza lá no Mato Grosso. E é bom a gente não esquecer que, até a década passada, havia pessoas que terminavam o ginásio, que é o ensino fundamental, e já eram professores, muitas vezes, do próprio ginásio; pessoas que, quando tinham uma escola normal, já era algo vantajoso. Então, eu defendo que haja duas coisas: um reforço escolar como parte do currículo, que já há, e um cursinho popular, bancado pelo Poder Público, nesse reforço. Quero aqui citar um exemplo fundamental, e são muitos. Foi feita uma pesquisa pelo Ibope e pelo Datafolha que demonstra o seguinte: 68% da população brasileira aprovam a política de cotas; 18% é que não aprovam a política de cotas. Então, é uma causa abraçada pelo Brasil. Encerro aqui, buscando contribuir com o pronunciamento que faz V. Exª, trazendo um dado fundamental para a gente entender a importância disso. No Brasil, cerca de 90% dos estudantes estudam na rede pública, cerca de 10% na rede privada. Ora, no meu Estado, 92%, na rede pública; 8%, no Piauí, na rede privada; em média, 90 a 10. Pois bem, apenas 18% dos alunos da rede pública tinham acesso à universidade. A política de cotas, junto com o ProUni, junto com o Fies, enfim, faz com que a gente dê uma virada. Hoje, estamo-nos aproximando de 40% das vagas de ensino superior com alunos da rede pública em universidades, portanto públicas, e em faculdades. No meu Estado, nós comemoramos, por essa política de cursinho popular, que também complementa, que já chegamos a 60% das vagas preenchidas com alunos da rede pública, primeiro lugar em Medicina, primeiro lugar em Matemática, em cursos importantes. Então, quero parabenizar V. Exª. Acho que foi acertada a posição do Congresso Nacional - e eu destaco aqui o trabalho de V. Exª - para a aprovação da política de cotas. Muito obrigado.

            O SR. ANIBAL DINIZ (Bloco/PT - AC) - Obrigado, Senador Wellington.

Para os críticos teimosos que achavam que as cotas não teriam efeito positivo, o que se observa é a inserção maior de negros no mercado de trabalho. “Fizemos uma avaliação com 500 cotistas e descobrimos que 91% deles estão empregados em diversas carreiras, até naquelas que têm mais dificuldade para empregar”, diz Ricardo Vieiralves de Castro [que é o Reitor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro]. Com o diploma em mãos, os negros alcançam postos de melhor remuneração, o que, por sua vez, significa uma chance de transformação para o seu grupo social. Não é difícil imaginar como os filhos dos cotistas terão uma vida mais confortável - e de mais oportunidades - do que seus pais jamais tiveram.

Por mais que os críticos gritem contra o sistema de cotas, a realidade nua e crua é que ele tem gerado uma série de efeitos positivos. Hoje, os negros estão mais presentes no ambiente universitário. Há 15 anos, apenas 2% deles tinham ensino superior concluído.

Hoje, o índice triplicou para 6%. Ou seja: até outro dia, as salas de aula das universidades brasileiras lembravam mais a Suécia do que o próprio Brasil. Apesar da evolução, o percentual é ridículo. Afinal de contas, praticamente a metade dos brasileiros é negra ou parda. Nos Estados Unidos, a porcentagem da população chamada afrodescendente corresponde exatamente à participação dela nas universidades: 13%. Quem diz que não existe racismo no Brasil está enganado ou fala isso de má-fé. Nos Estados Unidos, veem-se negros ocupando o mesmo espaço dos brancos - nos shoppings, nos restaurantes bacanas, no aeroporto, na televisão, nos cargos de chefia. No Brasil, a classe média branca raramente convive com pessoas de uma cor de pele diferente da sua e talvez isso explique por que muita gente refuta os programas de cotas raciais. No fundo, o que muitos brancos temem é que os negros ocupem o seu lugar ou o de seus filhos na universidade. Não há outra palavra para expressar isso a não ser racismo.

Com a aprovação recente pelo Senado do projeto que regulamenta o sistema de cotas nas universidades federais (e que prevê que até 2016 25% do total de vagas seja destinado aos estudantes negros), as próximas gerações vão conhecer uma transformação ainda mais profunda. Os negros terão, enfim, as condições ideais para anular os impedimentos que há 205 anos, desde a fundação da primeira faculdade brasileira, os afastavam do ensino superior. Por mais que os críticos se assustem com essa mudança, ela é justa por fazer uma devida reparação. “São muitos anos de escravidão para poucos anos de cotas”, diz o pedagogo Jorge Alberto Saboya.

            Senador Cristovam, por favor.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Obrigado, Senador. Eu fico satisfeito em estar escutando o seu discurso, porque é a comprovação do êxito de um programa que o Brasil já devia ter feito, sim.

(Interrupção do som.)

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - É o êxito de um programa que devíamos ter começado 50 anos atrás. No próximo mês, vai fazer 125 anos da abolição da escravatura, e a elite brasileira continua quase da mesma cor que tinha em 1887. E a elite brasileira continua quase da mesma cor que tinha em 1887, um país mulato, um país plurirracial e uma elite branca, como o Senhor disse muito bem. As nossas universidades pareciam a Suécia. Eu vivi essa experiência quando fiz um circuito na Universidade de Brasília, quando eu era reitor, Senador Blairo, com uma professora da Califórnia. Eu perguntei a ela qual é a diferença daqui para Stanford? Ela disse: aqui não tem negros. O Brasil precisava disso para escurecer a cor da cara da elite brasileira. O bom é que se mostrou que o programa não diminui em nada a qualidade. Não é o lugar em que se passa no vestibular que diz que profissional se vai ser. Ninguém pergunta, Senador Wellington, quando vai ao médico, em que lugar passou no vestibular. Você pergunta onde fez o seu curso, onde fez a sua residência. A entrada no vestibular é somente para selecionar. E quem entra na cota passou no vestibular, apenas não se classificou entre os melhores. Esse é um grande programa, um exemplo que a gente dá. Eu fico orgulhoso de ter sido reitor na Universidade que começou com as cotas. Dito isso, quero dizer o mesmo que disse aqui quando comemoramos, corretamente, a PEC das Domésticas: ainda é pouco. Quero um dia, no meu País, que não sejam necessárias cotas, que o vestibular seja pelas notas tiradas nas escolas, iguais, federais no Brasil inteiro. Como as escolas serão iguais, quem tiver nota boa é que entrará na universidade. A mesma coisa: orgulho-me de ter iniciado aqui as chamadas Bolsas com a Bolsa Escola. Aliás, na próxima semana, fará 18 anos da primeira: 25 de abril de 1995. Mas sonho um dia em que, no Brasil, ninguém vai precisar de Bolsa, e sonho um dia em que, além da PEC das Domésticas, os filhos das domésticas estudem na mesma escola dos filhos dos patrões. Então, a cota é um grande avanço, fico feliz em vê-lo falando do assunto. Acho que ninguém tinha falado ainda, eu mesmo não tinha pensado em falar sobre elas, mas quero que a gente dê um passo olhando lá longe, pensando no dia em que não mais serão necessárias cotas porque todos terão o direito a uma escola igual, quando você só será excluído pelo seu talento, tendo tido a mesma oportunidade. Mas, hoje precisamos de cotas, porque ainda não estamos dando a mesma oportunidade aos jovens da escola pública e nem aos jovens negros, não tanto por serem negros, mas porque, no Brasil, a pobreza tem a cor negra. Então, estamos fazendo um belo serviço. Os Estados Unidos começaram muito antes de nós, e o resultado, o Senhor mostrou aí, é que a proporção de universitários negros nos Estados Unidos é a mesma proporção de população negra por causa das cotas de lá, trinta anos atrás. O Brasil tem de manter as cotas, enquanto não conseguirmos escolas iguais. E aí eu concluo, fazendo um apelo a quem é contra as cotas: se você é contra as cotas, tudo bem, então, lute para que a escola seja igual para todos. Quando a escola for igual para todos, a gente não precisa de cota.

            O SR. ANIBAL DINIZ (Bloco/PT - AC) - Perfeitamente, Senador Cristovam, o aparte de V. Exª qualifica ainda mais esse pronunciamento e dá mais sentido a esse registro que estou fazendo, que não é de minha inspiração, isso aqui é de uma reportagem da última revista IstoÉ, que estou fazendo questão de ler na íntegra, porque não tenho nada a acrescentar.

            Veja só:

São muitos anos de escravidão para poucos anos de cotas, diz o pedagogo Jorge Alberto Saboya, que fez sua tese de doutorado sobre o sistema de inclusão no ensino superior. Acima de tudo, são muitos anos de preconceito. Como se elimina isso? “Não se combate o racismo com palavras”, diz o sociólogo Muniz Sodré, pesquisador da UFRJ. “O que combate o racismo é a proximidade entre as diferenças.” Não é a proximidade entre as diferenças o que, afinal, promove o sistema de cotas brasileiro?

            Então, Sr. Presidente, Srs. Senadores...

(Soa a campainha.)

            O SR. ANIBAL DINIZ (Bloco/PT - AC) - ... caminhando para o encerramento deste pronunciamento, o que quero dizer é que esta reportagem da revista IstoÉ, dos jornalistas supramencionados Amauri Segalla, Mariana Brugger e Rodrigo Cardoso, merece todo o nosso respeito, principalmente hoje, um dia após o Dia do Jornalista, que foi comemorado ontem, 7 de abril. Temos aqui um belo exemplar do bom jornalismo, praticado com pesquisa, com profundidade, com busca de casos, por isso merece o meu louvor e o meu aplauso.

            Ouço, com atenção, o Senador Paulo Paim.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Anibal, só um minuto, eu sei que seu tempo terminou. Primeiro, cumprimentar V. Exª.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - De fato, eu li toda a entrevista da IstoÉ também. Vi, inclusive, como é bom para a gente olhar que aquela sinopse que a gente recebe, no dia de sábado ou domingo, a contracapa era exatamente a capa do Estatuto da Igualdade Racial. Como é bom a gente ver que essa reportagem, no meu entendimento, mostra o fim de um ciclo, porque ninguém mais pode ser contra as políticas de cotas! As cotas deram tão certo que mostraram que a nossa juventude não é preconceituosa, a nossa juventude não é racista. Disseram que haveria uma guerra dentro das universidades. Pelo contrário: é liberdade, é amor, é carinho, é respeito pelo outro. Então, estou muito tranquilo neste momento porque, patrono de todo esse embate, fomos ao Supremo Tribunal Federal discutir essa questão das cotas, e hoje eu diria que é uma página virada. As cotas é uma realidade.

(Interrupção do som.)

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - São 10 anos, como alguém aqui já disse. Oxalá, no futuro não precisemos mais falar em cotas. Neste momento eu estou na linha do grande entendimento e, eu diria, da conciliação. Isso porque aqueles que erraram em ser contra... Ora, errar é humano. Nós erramos tantas vezes também! Eu também muitas vezes errei em análises que fiz e poderia, por que não dizer aqui, do Plano Real. Mas, neste momento, as cotas e essa reportagem belíssima, para mim, mostram que daqui para frente é um outro momento: negros e brancos na mesma universidade, ocupando os mesmos espaços e disputando, com enorme alegria e tranquilidade, eu diria, com carinho e respeito, os espaços na nossa sociedade. Parabéns a V. Exª por trazer esse tema mais uma vez ao plenário, para mostrar que cotas está resolvido; agora, o passo à frente. Parabéns a V. Exª!

            O SR. PRESIDENTE (Blairo Maggi. Bloco/PR - MT) - Senador, para concluir.

            O SR. ANIBAL DINIZ (Bloco/PT - AC) - Muito obrigado, Senador Blairo Maggi, pela tolerância.

            Agora, concluindo. Trouxe essa reportagem da revista Veja, um dia após o dia do jornalista, justamente para mostrar que a prática do bom jornalismo pode prestar um grande serviço à sociedade e à democracia. Esse exemplo dado por Amauri Segalla, Mariana Brugger e Rodrigo Cardoso merece o meu voto de aplauso. Por isso estou apresentando esse pedido de voto de aplauso, que espero tenha a aprovação dos Srs. Senadores.

            Muito obrigado. Parabéns a todos os jornalistas que praticam vocacionadamente sua função, seu ofício, para contribuir com a construção de um Brasil melhor para todos.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/04/2013 - Página 16321