Discurso durante a 47ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo em favor da adoção de medidas de controle à inflação.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Apelo em favor da adoção de medidas de controle à inflação.
Aparteantes
Inácio Arruda.
Publicação
Publicação no DSF de 11/04/2013 - Página 16948
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, SENADO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ADOÇÃO, MEDIDA, CONTROLE, CRESCIMENTO, INFLAÇÃO, PAIS, NECESSIDADE, AUMENTO, TAXAS, JUROS, OBJETIVO, REDUÇÃO, CONSUMO, INCENTIVO, POUPANÇA, RESULTADO, EXPANSÃO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB).

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Boa tarde, Srªs e Srs. Senadores!

            Senador Inácio Arruda, adoraria ter feito um aparte ao senhor, mas não era permitido. Mas o senhor pode fazer apartes a mim. Fazemos aqui o que este Senado, Senador José Agripino, deveria estar fazendo, que é debater esse assunto. Até porque ninguém pode dizer aqui que tem certeza de que aumenta ou de que diminui e quanto.

            Mas queria dizer que, no caso de Fortaleza, o IBGE publicou hoje o índice de preços: foi 8,11%. Foi a segunda cidade onde a inflação foi mais alta. Só Belém ficou à frente, onde o índice foi 9,19%.

            Oito é muito! Oito significa que a cada seis ou sete anos, o salário cai à metade. É muito, muito mesmo! E quando cair, teremos de fazer a indexação. E quando fizer a indexação, isso pressiona ainda mais a inflação.

            Então, o primeiro ponto em que teremos de estar de acordo: temos ou não de fazer o esforço necessário nacional para impedir que, em Fortaleza, os preços continuem subindo 8%? Temos! Não há dúvida entre nós. E aí vem a discussão sobre os juros.

            Creio que a grande pergunta não é se devemos ou não aumentar juros. A grande pergunta é como combinar consumo e poupança. Isso porque, a cada R$100,00 de renda, uma parte vai para o consumo, outra parte vai para a poupança.

            Quando poupamos pouco, o investimento é pequeno. Então, a produção fica pequena e a demanda vai crescendo para atender ao consumo. Então, os preços sobem. E não há jeito de impedir isso, a não ser um regime autoritário que determine o preço fixo e crie escassez.

            Ou seja, em vez de nós subirmos os preços, criam-se aquelas libretas que, em algumas economias centrais, eram usadas para impedir o aumento dos preços, reduzindo o consumo.

            Ninguém quer isso. É impossível não subir preço quando o consumo cresce mais do que a oferta. Não há como! E a oferta depende hoje do investimento de ontem, que, por sua vez, depende da poupança de antes de ontem.

            E o Governo brasileiro - aí sim, devemos trabalhar - está errando na política extremamente positiva do ponto de vista político de incentivar o consumo, mesmo sacrificando a poupança.

            É aí que têm entrado os juros. Os juros sobem como uma forma de tentar diminuir o consumo e aumentar a poupança. E é claro que traz um prejuízo, um prejuízo a cada um de nós que consome hoje. Mas esse seria o sacrifício necessário hoje para que nós, amanhã, Senador, não tivéssemos de chorar ou a inflação ou, pior do que a inflação, a inflação com estagnação por falta de investimento, por falta de poupança.

            Não nos cabe aqui a meu ver dizer se devem ou não subir os juros. Eu não entro nisso, é uma decisão técnica - e nem cabe à Presidenta da República se meter nisso. Isso é um perigo! Se eu fosse presidente não queria ter o poder de determinar a taxa de juros. Sabem por quê? Porque eu iria jogar lá para baixo: 2% ou 3%, para incentivar o consumo. Mas aí o buraco viria depois, e o Presidente seguinte teria que pagar o preço de enfrentar a crise geral de desabastecimento e de uma inflação descontrolada. E aí nós estaríamos perdidos. Porque não é fácil manter os preços baixos, mas é quase impossível recuperar os preços depois que eles estouram. Por isso, o nosso esforço hoje é não deixar que suba essa taxa de inflação.

            Ontem eu distribuí um pequeno trabalho que chamei de Alertas Sobre o Quadro da Economia Brasileira, em que eu colocava aqui a prospecção do Banco Central de que a inflação iria estourar além do limite de 6,5 no segundo trimestre de 2013. O que se esperava para o segundo trimestre - seria em junho - estourou hoje. Hoje, o IBGE já divulgou que a nossa meta de 4,5 tem dois para cima e dois para baixo. Nós já estouramos os dois para cima. Isso é muito grave!

            Mas não é só isso que é grave. Grave é que o Banco Central não diz o que vai fazer ou, quando diz, fala só em juros - que, aliás, é a primeira responsabilidade do Banco Central. O conjunto da distribuição entre oferta e demanda, entre poupança e consumo é o Governo que deve fazer. É a política econômica, não a política monetária. É o Ministério da Fazenda, não o Banco Central.

            E nós não estamos vendo com clareza o Governo trabalhando no sentido de impedir a inflação. Até porque é bom que haja consumo, é ótimo que haja consumo. Mas cada um de nós sabe que, em casa, quando se consome demais, depois vai pagar um preço no endividamento.

            A taxa de juros entra exatamente para reduzir a possibilidade de financiar o consumo além das possibilidades do nível de renda da sociedade brasileira. Nós jogamos para frente. Já que não temos dinheiro agora, jogamos para frente o pagamento e compramos agora o que a gente não pode comprar. Enquanto isso, nós vamos deixando de fazer estradas, portos, hidrelétricas na quantidade necessária; vamos deixando de colocar dinheiro em máquinas e equipamentos industriais.

            A situação hoje, a meu ver, é extremamente perigosa. Não pela taxa de juros, mas pela relação consumo/poupança. Nós estamos em 14% ou 17% - não me lembro agora - a taxa de poupança. É muito baixo. Não é preciso chegar aos 40% da China, nem chegaremos lá - até porque é uma economia muito controlada e com baixo nível de consumo, com baixo nível de satisfação da população. Mas não podemos continuar entre 14% e 17%.

            Mas não é só isso. Se nós tivéssemos tendo inflação e conseguindo crescimento, aí a gente poderia até analisar: bem, a gente tem o crescimento, mas adiante a gente reduz o preço porque a oferta cresce; mas não estamos tendo. Por que não estamos tendo? Basicamente porque, não havendo poupança, não há investimento; não havendo investimento, não há crescimento. Esse é o primeiro ponto.

            Segundo, porque hoje as grandes alternativas de investimento são os setores de alta tecnologia. Setor como commodities tem limites; ninguém come mais de uma quantidade de soja por dia, não há jeito, mas computador você compra mais de um por ano, se houver um bom preço.

            Nós não estamos aproveitando o que os economistas chamam de nichos - não gosto dessa palavra -, os núcleos de alternativa de investimento. Por quê? Porque não temos a ciência e a tecnologia, Senador Randolfe. E por que não temos? Porque não temos educação. O problema é muito mais complexo do que taxa de juros. Aí estou de acordo com o Senador Inácio Arruda. Não podemos enfrentar a inflação apenas com aumento de juros, mas não podemos descartá-lo também, se isso for preciso diante das análises.

            Minha preocupação é que agora, pelo que parece, vai ser a taxa de juros o centro da luta contra a inflação, porque o que a gente vê é a Presidenta convidando economistas que chegam aqui propondo o aumento da taxa de juros.

            A sensação que eu tive, Senador José Agripino, foi a de que a Presidenta chamou esses economistas para ter uma justificativa para fazer o que ela tinha decidido. Nem ela deveria ter decidido, porque isso é coisa do Banco Central, nem deveria procurar justificar isso.

            Mas não é só o problema do crescimento e dos indicadores de inflação. Nós temos um problema sério no balanço de pagamentos; nós sempre tivemos um grande superávit em nossas exportações para compensar os déficits em outras balanças, como serviços, por exemplo. Nós estamos tendo uma redução constante de nosso saldo na balança comercial. Isso levará a uma situação grave no câmbio. E quando o câmbio subir para equilibrar exportações com importações, aí a inflação vai subir de novo. E vai subir mais. Mas não é só isso. O nosso crescimento é baixo e ruim. Existe crescimento com qualidade e crescimento sem qualidade, crescimento bom e crescimento que não é bom.

            Crescimento não é só crescimento; há um bom e um ruim. O crescimento ruim é o que polui; o ruim é o que é baseado em bens primários e não em bens de alta tecnologia. O nosso crescimento está sendo baseado no crescimento ruim e pequeno.

            Mas não é só isso que nos assusta e que faz com que eu tenha feito esse documento de alertas que distribuí ontem na Comissão de Economia - e, para quem quiser pedir em casa, a gente manda isso, ou encontra fácil no site do Senado. Nós temos um problema sério nas finanças públicas, devido, em parte, às...

(Interrupção do som.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - ... devido às desonerações. Todos queremos desonerações, como todos queremos juros baixos, mas há um limite. Economia você não faz só com o que você deseja, e o Senador sabe bem e tem falado sobre isso. Economia não existe de esquerda ou de direita; economia existe a certa e a errada. O que existe de direita e de esquerda é política social, política social é de esquerda ou de direita. Em economia já houve um tempo em que era de esquerda ou de direita. Com a globalização, não podemos fechar o País. Com o sistema financeiro integrado mundialmente, não podemos manipular a taxa de juros, como a gente quer. Acabou a possibilidade de a gente ter uma economia dirigida ideologicamente. É o social, é o sistema de saúde funcionar bem; é o sistema de educação colocar na mesma escola o filho do patrão e o filho do trabalhador. Isso é ser de esquerda!

            A taxa de juros é um problema que tem que ser analisado tecnicamente.

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - A certa e a errada.

            Senador, nós temos um problema sério de finanças; as desonerações vão, sim, criar um problema de finanças federal, estadual e municipal, porque a gente esquece que o Governo desonera dos impostos federais, mas o Governo transfere para os Estados e Municípios conforme a sua renda. A renda da União caindo, cai a dos Municípios.

            Então, não vai dar tempo, em dez minutos, de analisar tudo isso, mas eu só quero dizer que é com surpresa negativa que eu vejo a taxa de inflação estourar a meta antes até do prazo que o Banco Central já pensava com certa leniência, palavra que vem sendo usada ultimamente no Brasil.

            Mas o Senador Inácio Arruda pediu um aparte. Eu gostaria muito que fosse possível, porque eu queria ter feito a ele, mas ele falou pela liderança.

            Senador Inácio.

            O Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - Na verdade, eu quero ir na linha de V. Exª, que é o quê? Nós temos...

(Interrupção do som.)

            O Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE. Fora do microfone.) - ... poucas alternativas.

            O SR. PRESIDENTE (Jayme Campos. Bloco/DEM - MT) - Concedo mais dois minutos para conclusão do aparte e do senhor orador.

            O Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - Nós não dependemos só dessa pressão de rentistas, porque isso rende o País inteiro. Esse que é o problema. Há uma cantilena de que: “olha, há inflação, é taxa de juros, só temos essa alternativa”. Nós não podemos trabalhar com aumento de poupança, nós não podemos trabalhar com ampliação dos investimentos públicos, que são possíveis de acontecer, quer dizer, há uma séria de alternativas, há uma série de outras variáveis antes de você chegar e dizer: “Bom, a única alternativa que eu tenho é aumentar a taxa de juros”. Digo isso porque taxa de juros, taxa de câmbio, todos esses mecanismos da política econômica são chave: o preço do seu dinheiro. Então, imagina: os americanos podem injetar três trilhões na economia mundial....Assim, vum! O que decide isso? É a política. Eles decidiram politicamente. Os europeus jogaram um trilhão de euros na economia mundial.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - Dane-se a economia mundial! Eles jogaram. E isso causa inflação. Aqui também repercute na nossa inflação intensamente. É a crise deles transferida para nós. Então, nós temos o nosso dever de casa. Temos de estar atentos ao cenário que V. Exª identificou muito bem: mexeu lá, mexeu aqui. Mas taxa de câmbio, inflação, juros, esses mecanismos todos dependem da decisão política. Se o Governo tem sustentação política suficiente, no debate econômico, para tomar medidas que não sejam apenas essas. Por isso que eu digo: é bom colocar a Presidente na roda, pelo menos com a sua base, para nós dizermos também para a Presidente: “Presidente, existem alternativas. Não entre nessa cantilena única, que é muito parecida com a que já vimos lá atrás”. E V. Exª diz exatamente isso. Nós temos alternativas; nós temos outros caminhos, para podermos enfrentar...

(Interrupção do som.)

            O Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - Agradeço a V. Exª. Estamos no mesmo curso (Fora do microfone.), estamos no mesmo leito. Podemos ter pequenas diferenças, mas o nosso leito é o mesmo.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Bem, nós estamos de acordo em um ponto: não é só juros.

            E até pode ser uma maneira sem juros, sem manipular, mas vai ter de levar em conta salários, como eles crescem - e aí tem um custo social alto. Vai ter de levar em conta como nós trabalhamos para induzir a poupança, sem aumentar juros. É um processo muito mais complexo, para o qual não vejo esse debate sendo feito hoje.

            Nós estamos com a nossa energia mental canalizada para a Copa do Mundo, e não para discutir como conseguir equilibrar os preços sem necessidade de aumentar juros, por exemplo.

            Então, eu fico satisfeito porque o Senador Cyro e o Senador Inácio trouxeram o tema. Eu gostaria que outros Senadores aqui também o discutissem.

            Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/04/2013 - Página 16948