Discurso durante a 78ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Leitura de artigo de Fernão Lara Mesquita em homenagem ao pai, o jornalista Ruy Mesquita, falecido ontem.

Autor
Luiz Henrique (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Luiz Henrique da Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Leitura de artigo de Fernão Lara Mesquita em homenagem ao pai, o jornalista Ruy Mesquita, falecido ontem.
Publicação
Publicação no DSF de 23/05/2013 - Página 28404
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • LEITURA, TEXTO, HOMENAGEM POSTUMA, JORNALISTA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, FILHO, MORTO.

            O SR. LUIZ HENRIQUE (Bloco/PMDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Jorge Viana; Srªs e Srs. Senadores, ocupo esta tribuna para lamentar a morte do jornalista Ruy Mesquita.

            Ruy Mesquita manteve uma trajetória de jornalismo democrático, de trincheira da democracia, iniciada por seu pai, Júlio Mesquita, e sucedida por seu irmão que tem o mesmo nome de seu pai.

            O Estado de S. Paulo pontificou na luta contra a ditadura do Estado Novo e foi a fronteira de comunicação nacional pela legalidade democrática durante o regime autoritário, combatendo tenazmente os atos de exceção, sobretudo a censura, que impedia a circulação de opiniões contrárias ao regime.

            Meu pai, Sr. Presidente, teve uma longa vida. Faleceu perto de completar 90 anos. E, mesmo já tendo ultrapassado 80 anos de idade, como Ruy Mesquita, continuou na sua luta de correspondente em Santa Catarina do jornal O Estado de S. Paulo, função que desempenhou por mais de 50 anos.

            Ele tinha a mesma característica de Ruy Mesquita. Era dedicado à notícia. Era dedicado à comunicação. Lia, estava sempre atento aos acontecimentos nacionais e internacionais, sobretudo aos acontecimentos estaduais, que passava para a redação em São Paulo.

            Eu poderia falar do meu pai o que escreve, em um artigo magnífico hoje, Fernão Lara Mesquita, filho de Ruy. E como é extraordinariamente fortalecedor para nós ver como um filho pode falar do pai. O orgulho que o filho tem do pai. A ternura, o carinho que o filho tem pelo pai.

            Quero, pois, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, transpor, para os Anais desta Casa, esta demonstração filial de admiração, de apreço, de amizade, de carinho e de ternura do filho Fernão para o pai Ruy.

            O texto é o seguinte:

Haverá sempre moicanos.

Nada na vida do “Dr. Ruy” foi fácil [Ruy Mesquita era chamado por Dr. Ruy, como o nosso Ulisses, todos o chamavam respeitosamente de Dr. Ulisses].

Até aí, nada de mais. Nada na vida de ninguém é fácil.

A diferença estava no modo como ele lidava com essa circunstância.

Seja porque tenha tido de se haver com a dor física mais cedo do que esse aprendizado se impõe à maioria dos mortais, seja porque já nasceu navegando longe da costa, exposto aos ventos e às tempestades do mar sem fim da História sem nunca ter posto os pés em terra muito firme, o fato é que jamais se manifestaram nele nem o medo da instabilidade nem a ânsia das vitórias pequenas que atormentam os que acreditam ter sempre algo de muito importante a perder.

O “eu” nunca foi sua referência.

“Dr. Ruy” foi abençoado com aquilo que a ninguém é dado escolher. Não enxergava o que era (moralmente) pequeno. Não olhava para a vida de dentro de si mesmo; olhava para si mesmo de dentro do vasto todo que é a vida e com a serenidade de quem tem a consciência exata da proporção relativa das coisas.

Seu território era o dos grandes coletivos: “O Mundo”, “A Humanidade”, “O Brasil”.

Dava aos outros mais do que tinha para si. O altruísmo - rebelião antideterminista contra a lei da selva, construção artificial da inteligência, renúncia à força física, pressuposto da civilização e da ética - nele era natural, quase inconsciente.

O lado mais próximo é que lhe era estranho.

Quando instado a fazer por si, então, sim, perdia a naturalidade, mostrava-se troncho, desajeitado e, sobretudo, aborrecido por ver-se arrastado a obrigação tão desinteressante.

Tinha o gosto pelas lutas que não se podem vencer, mas não era assim que se via. Cantava a canção do infinito lá na sua capoeira porque não conhecia outra.

Pouco lhe interessava se fosse num bote ou num navio, o importante era estar no mar enfrentando as ondas, cheirando o vento, imaginando o que é que nadava lá embaixo. Navegando. Levando a bandeira adiante.

Só se voltava para dentro de si transportado.

O gesto de gallantry real ou imaginado, um verso, um personagem, a estrofe de um samba. Os abandonos românticos da boemia, sua segunda natureza. Eram essas as frestas para dentro que se permitia entreabrir... para seduzir, para comover, para encantar.

Enterrava na força as suas fraquezas sem premeditação nem heroísmo; naturalmente, porque foi nessa ordem que a vida lhe ensinou as coisas: primeiro a enfrentar a dor, depois a organizar o pensamento.

Amou seus pais. Amou sua mulher. Amou seus filhos e seus netos.

Amou o Brasil e amou sua profissão.

Foi amado por todos eles. Não perdeu a ternura jamais.

Agora, na partida, volto-me para o poente para reeditar Chingachgook:

Ó Grande Espírito! Ó Grande Criador da Vida!

Um guerreiro está indo para os seus braços rápido e direto como uma flecha atirada em direção ao sol.

Ele é Ruy, meu pai, meu amigo.

Dê-lhe as boas-vindas e conduza-o até o lugar que lhe está reservado no conselho dos grandes homens.

Tranquilize-o!

Sem ele torna-se muito mais árida a solidão desta travessia. Mas nós seguimos demandando o mar. A bandeira será sempre levada adiante, qualquer que seja o barco.

            Fiz questão, Sr. Presidente, de trazer para os Anais desta Casa essa comovente e extraordinária homenagem que o filho Fernão faz ao pai, Ruy Mesquita.

            Que Deus o tenha e o que o jornalismo brasileiro se inspire na sua obra e no seu exemplo!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/05/2013 - Página 28404