Discurso durante a 111ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à proposta do Governo Federal, de realizar plebiscito para a reforma política; e outros assuntos.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO, REFORMA POLITICA. EDUCAÇÃO.:
  • Críticas à proposta do Governo Federal, de realizar plebiscito para a reforma política; e outros assuntos.
Aparteantes
Casildo Maldaner, Ricardo Ferraço.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2013 - Página 43380
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO, REFORMA POLITICA. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, REALIZAÇÃO, PLEBISCITO, OBJETIVO, CONSULTA, POPULAÇÃO, ASSUNTO, REFORMA POLITICA.
  • CRITICA, PROJETO DE LEI, REFERENCIA, DESTINAÇÃO, RECURSOS, ORIGEM, ROYALTIES, PETROLEO, SETOR, EDUCAÇÃO.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, a mídia, ontem à noite, deu um grande destaque ao fato de que a Presidenta da República disse que o povo tem inteligência para votar no plebiscito, Senador Maldaner; contudo, ela esqueceu de dizer que a pessoa só é inteligente quando decide com base nas informações completas. Quem escolhe sem ter as informações não é inteligente, não está usando a inteligência; pode até estar usando o extinto, o que, às vezes, até funciona.

            A Presidenta não foi, portanto, correta. O que ela tentou foi jogar no Congresso a pecha de que não respeitaríamos a inteligência do povo. Eu respeito a inteligência do povo! O povo sabe votar! Agora, o povo precisa ter as informações. O que faz o povo votar em tanta gente que a gente considera errada não é falta de inteligência, mas de falta de conhecimento de quem é o candidato, e isso a gente não pode fazer no plebiscito. O plebiscito tem que ter clareza, nitidez e passar todas as informações, Senador Maldaner, e essa proposta da Presidenta não passa as informações.

            Tomemos um exemplo: fundo público ou fundo privado? Faço parte daqueles que não se sentem suficientemente informados com base nessa pergunta, porque não se diz de onde vem o dinheiro do governo para financiar campanha eleitoral. Só posso aprovar fundo público se me disserem que esse dinheiro não sai da educação, da saúde, da segurança. Vai sair do dinheiro recuperado dos corruptos? Aí eu começo a ser favorável ao fundo público de campanha. Agora, num fundo público de campanha sem dizer de onde sai o dinheiro, não consigo votar nele.

            Tem mais: só posso votar no fundo público se eu souber quem vai receber. Vai ser distribuído igualmente para todos os candidatos, conforme o cargo que disputa? Vai ser por partido? Um partido vai receber mais do que outro, porque tem mais parlamentares? Como vou votar -- e sou eleitor também --, no dia do plebiscito, sem ter essas informações? Eu não tenho as informações! Acho que tenho o discernimento, mas não tenho as informações.

            Tomemos o caso do voto distrital ou voto majoritário, ou outras formas de voto. Como serão distribuídos os distritos e qual o número de deputados por distrito?

            Na França, durante décadas, os partidos conservadores se mantinham no poder mesmo com menos votos, porque, num distrito do partido conservador, com poucos votos o deputado era eleito. Já os partidos operários, na periferia de Paris, para elegerem um deputado eram precisos muitos votos. Assim, os conservadores se mantiveram no poder por muitos anos, até que houve uma reforma desse sistema.

            Quem não se lembra -- e faz poucos anos -- de que um presidente americano foi empossado com menos votos do que o outro candidato? Pois o Presidente Bush, mesmo tendo menos votos que o seu opositor, ganhou as eleições. E por quê? Porque a contabilidade dos votos por distrito, colégio eleitoral no caso, não reflete o numero de eleitores.

            Então, eu quero saber, antes de optar pelo voto distrital, como serão constituídos os distritos, porque, senão, pode ser uma solução autoritária, manipuladora em vez de ser uma solução que caminha para a democracia.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - Senador Cristovam, V. Exª me permite um aparte?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Um minutinho Senador.

            O povo é inteligente! O povo sabe votar, mas a inteligência trabalha em cima de informações. E eu acho que o povo é tão inteligente que está entendo que a proposta do plebiscito, como está aí, é manipuladora; não é uma proposta democrática, querendo mudar; é apenas para dar satisfação a um ativismo. A prova disso: se a Presidenta quer realmente atender aos anseios da população, por que não parou o trem bala? Por que não aceitou uma CPI para analisar os gastos da Copa? Por que não reduzir o número de Ministérios e fez uma reforma ministerial? Por que ela não propôs, como tópico no plebiscito, a perda automática de mandato para aqueles que forem condenados, sem precisar consultar o Congresso? Por que não colocou a PEC do Senador Jarbas Vasconcelos, que impede ocupar cargos ou mesmo ser eleito para órgãos legislativos quem houver sido condenado? Por que ela não colocou o tema da reeleição? Aí eu pergunto: se é para valer, Senador Sérgio, já na próxima eleição e se o plebiscito feito -- vamos supor que fosse março -- fosse contra a reeleição, os candidatos a reeleição como governador e ela própria abririam mão da candidatura? Por que não colocar a reeleição? Por quê? O povo quer saber se deve haver reeleição ou não. E, se for aprovado em agosto, ela sai do páreo? Nossos governadores por aí saem do páreo?

            Tudo isso demonstra uma coisa que eu mostrar que nós também estamos fazendo: nós estamos cometendo o erro do açodamento. Nós votamos, aqui, na quinta-feira, um projeto que destina, Senador Ricardo Ferraço, R$349 bilhões: os royalties do petróleo. Quantas horas nós debatemos aqui o destino dos royalties do petróleo? E aí fazemos uma lei como aquela que saiu.

            Por exemplo, na nossa lei, que nós aprovamos aqui, para prestar contas ao povo, erradamente, às pressas, está escrito que o dinheiro vai prioritariamente para a educação de base. Eu não conheço lei que traga a ideia de fazer algo prioritariamente. “Prioritariamente” quer dizer o quê? Nada. Eu coloquei uma emenda que dizia que, em vez do “prioritariamente”, 75% iriam para a educação de base e 25% para o ensino superior. O Relator não considerou, preferiu o “prioritariamente”. Tinha que ser debatido aqui. É 75% e 25%, como eu propus, ou é 100% para a educação de base? Ou é 50% para cada? Ou mesmo debater o tal do “prioritariamente”. Por que não se discutiu aqui o uso do termo “prioritariamente” num processo, numa lei? Imaginem uma lei que diga que, prioritariamente, você não deve roubar. Imaginem isso. Mas é o que está.

            O fundo, a maneira como é distribuído o dinheiro. Nós votamos em uma proposta pela qual o dinheiro vai para o fundo. Cinquenta por cento do fundo ficam ali. Dos outros 50%, a gente usa a rentabilidade para a educação. Mas por que não é 100% para o fundo, como, inclusive, prevê um projeto meu e do Senador Aloysio temos um projeto, e usar apenas a rentabilidade? E por que a rentabilidade, pela maneira como ficou no Projeto de Lei, é aplicando, talvez, na caderneta de poupança e em fundos do Tesouro, e não numa grande capitalização, como fazem outros países, com os chamados fundos soberanos, que geram muito mais dinheiro? Não discutimos aqui. Nós não debatemos o que quer dizer o fundo.

            E aí alguns dizem que já foi muito debatido na Câmara. Então, aqui temos que debater outra coisa, se o Senado merece ou não continuar, porque se a gente apena balançar a cabeça para tudo que foi bem debatido na Câmara, para que esta Casa? Não se diz que nós somos os revisores? Como é que a gente revisa um projeto que é de 2007, circulando por aí, em duas ou três horas? Não conseguimos! Da mesma maneira que a Presidenta manda -- e a gente não sabe se hoje ela mantém ou não mantém mais, depende da hora -- o plebiscito, açodadamente, com perguntas sem a informação necessária para o povo inteligente escolher. Não é inteligente quem escolhe, Senador Wellington, sem as informações devidas. Não existe inteligência sem contar com as informações. Pode existir instinto, pode existir faro, mas não inteligência. A inteligência exige a informação.

            Por que nós estamos votando tão apressadamente aqui? Para dar satisfação ao povo. Mas por que não damos satisfação com a seriedade necessária, estudando caso a caso? E por que a Presidenta não dá satisfação fazendo aquilo que é preciso e que o povo está carregando nas ruas? Isso ela não fez e nós não estamos fazendo. E, olhe, essa fatura vai ser cobrada!

            Eu anotei, Senador Sérgio. O Senador Eduardo, desta tribuna, disse que, no próximo ano, há R$4 bilhões em royalties para a educação. Eu anotei. Está lá, num quadrinho de cobrança que eu tenho, e eu venho aqui cobrar dele os R$4 bilhões de royalties em 2014, porque nós votamos sem saber de onde vêm esses R$4 bilhões! Não estamos levando a sério, e isso vai acirrar a raiva do povo. Num primeiro momento, podem dizer “Olha aí! Estão querendo trabalhar! Nós conseguimos empurrar esse povo para o trabalho!”. Tanto isso é verdade que estamos em sessão deliberativa ordinária numa sexta-feira. Mas o povo vai perceber que não é assim.

            Confesso -- e vou passar para os apartes -- que eu estava querendo que a gente suspendesse o recesso. Cheguei a pensar isto no começo. Mas, depois, eu pensei que isso é uma falsa maneira de atender ao que o povo diz que quer. Sabem por quê? Porque o povo quer mudanças profundas, Senadora Ana Amélia, e isso exige reflexão. Eu vou usar o meu reflexo para refletir sobre o meu papel, os meus erros, a crise na rua e o que eu posso propor. Eu vou usar o meu recesso para refletir. Seria um erro, como eu pensei, propor o fim do recesso. Seria querer dar uma satisfação sem fazer a ação. Não basta satisfação, é preciso a ação correta. E nós não estamos fazendo da maneira correta, assim como a Presidenta, talvez até, eu diria, muito menos a Presidenta.

            Passo a palavra ao Senador Maldaner.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - Eu sei que o tempo de V. Exª está praticamente se esgotando, mas, Senador Cristovam Buarque, eu não poderia deixar de cumprimentá-lo e me associar às reflexões que V. Exª faz na manhã de uma sexta-feira, as quais nos deixa -- pelo menos a mim e acho que a milhares de brasileiros -- para reflexão. V. Exª começa cedo, numa sexta-feira, a nos provocar, no bom sentido, para fazermos uma meditação. Será que o plebiscito não é alguma coisa para desviar? Será que não é algo para…? E aí mexeu numa coisa: se fôssemos decidir e jogar para a comunidade brasileira decidir se continua ou não a reeleição? Porque a tese, em princípio, é para já valer, para já entrar em vigor nas próximas eleições, no ano que vem, e para procurar exercitar para que, um ano antes das eleições, já decidamos alguns caminhos. E se isso entrar? E se for um plebiscito ou um referendo? E se nós vamos decidir, até outubro, que a reeleição cai e vai ser não de quatro, mas de cinco anos? Vamos decidir isso e colocar no referendo para comunidade nacional. Isso está no debate.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Claro.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - Na hora em que acordar, será que o Planalto vai concordar com isso? Quer dizer, eu acho que V. Exª está com razão quanto a nós refletirmos, a nós analisarmos, a procurarmos exercitar a função que nós temos aqui, no Congresso Nacional, para tentarmos avançar e tentarmos responder ao que o clamor está pedindo. Querem soluções agora no campo da educação, em que V. Exª é mestre, e da saúde, que está nas filas. Vamos pôr em prática agora o que as pessoas querem, o que as pessoas sentem. Elas querem ver alguma coisa acontecer. Vamos exercitar aquele nosso dever, e não ficar sonhando se isso vai ser bom, se vamos colocar na mídia para ficar.. Será que não tem um fundo para desviar?

(Soa a campainha.)

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - Por isso, eu quero, nesta manhã de sexta-feira, V. Exª provocando, no bom sentido, para passar o fim de semana refletindo como se já fosse o início de alguma coisa, para fazer com que se medite melhor. Muito obrigado a V. Exª.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Senador Ricardo.

            O Sr. Ricardo Ferraço (Bloco/PMDB - ES) - Senador Ministro Professor Cristovam Buarque, V. Exª tem razão, e nós precisamos repensar essa questão, como prerrogativa constitucional, de Casa Revisora, porque isso tem se repetido nesta Casa, e V. Exª traz para debate um tema da maior relevância, que é o tema da utilização desses recursos, que são sagrados, que, mundialmente, onde foram bem empregados e onde produziram desenvolvimento muito mais que crescimento, foram empregados com a visão de que…

(Interrupção do som.)

            O Sr. Ricardo Ferraço (Bloco/PMDB - ES) - … o petróleo é um recurso natural finito e cujo consumo, até por um compromisso ético e cristão, nós não temos o direito de esgotar, pois precisa ser preservado dentro de uma visão para outras gerações, intergeracional. Na prática, nós deveríamos ter aprofundado esse debate com relação aos royalties ainda mais. Mas eu quero convidar V. Exª para, juntos, trabalharmos uma proposta que talvez possa nos levar nessa direção. Agora, no mês de outubro, o Governo brasileiro estará licitando, pelo modelo de partilha, o Campo de Libra, que é a joia do tesouro do pré-sal brasileira. Estimam-se 10 bilhões, 12 bilhões de barris.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Ricardo Ferraço (Bloco/PMDB - ES) - E, no sistema de partilha, há o bônus de assinatura. E a estimativa definida ontem pelo Ministério de Minas de Energia é que o bônus de assinatura do Campo de Libra esteja estimado em até R$15 bilhões e que esse recurso poderá ser usado para superávit primário. Nós precisamos apresentar um projeto com urgência -- aí, sim, esse com urgência -- para que os recursos do bônus de assinatura devam ser direcionados para a educação e para a saúde e na linha daquilo que V. Exª, por mérito e conhecimento e reputação defende, que é a aplicação precisa, cirúrgica, específica na educação básica brasileira. Não se constrói uma casa sem uma boa estrutura, sem um bom alicerce. E esse alicerce passa pela educação básica, sobretudo para a pré-escola. Portanto, ao cumprimentá-lo, eu queria convidá-lo para que, juntos, pudéssemos debater e apresentar um projeto visando à destinação do bônus de assinatura nessa visão que V. Exª está defendendo, direcionando os recursos precisamente, cirurgicamente, para a educação básica. Agradeço a V. Exª o aparte.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Eu agradeço, Senador, por ter trazido o assunto e me comprometo a trazer na segunda-feira alguma ideia para conversar com o senhor sobre isso, sobre como podemos fazer.

            Sr. Presidente, já tomei muito tempo, mas quero resumir dizendo que eu, como qualquer brasileiro, me sinto preparado, com a inteligência necessária para votar num plebiscito, mas eu, como a maioria dos brasileiros, eu não me sinto suficientemente informado para usar a inteligência na hora de escolher, como eu disse, no caso do fundo, entre público e privado. De onde vem o dinheiro para o público? E como é distribuído? De onde vem o dinheiro para o privado? Se o fundo privado for apenas dos militantes, eu sou favorável ao fundo privado, e não ao fundo público. Se vier de grandes empresas ou pequenas empresas, de maneira ilimitada, eu sou contra a contribuição privada.

            Por isso, não vamos precipitar cometendo mais erros que nos desmoralizarão ainda mais, colocando o povo na rua por causa de gotinhas e gotinhas de inconsequências cometidas aqui. Eu não vou citá-las aqui porque elas são muitas.

            Vamos parar com essas gotinhas de inconsequência, porque o povo já percebeu, a ficha já caiu na cabeça do povo; falta cair, talvez, na cabeça…

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - … da gente. A ficha ainda não caiu para nós dirigentes do setor Executivo e do setor Legislativo.

            Era isto, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2013 - Página 43380