Discurso durante a 127ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com denúncia feita pela Controladoria Geral da União sobre possíveis desvios de verbas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CORRUPÇÃO, EDUCAÇÃO.:
  • Preocupação com denúncia feita pela Controladoria Geral da União sobre possíveis desvios de verbas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
Publicação
Publicação no DSF de 10/08/2013 - Página 52890
Assunto
Outros > CORRUPÇÃO, EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO DO POVO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), O LIBERAL, ESTADO DO PARA (PA), O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ASSUNTO, DENUNCIA, CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO (CGU), DESVIO, VERBA, FUNDO DE MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BASICA E DE VALORIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO (FUNDEB), EDUCAÇÃO BASICA, RESPONSAVEL, MUNICIPIOS, DEFESA, NECESSIDADE, AUMENTO, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, REGISTRO, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFERENCIA, PREVISÃO, RESPONSABILIDADE, UNIÃO, EDUCAÇÃO INFANTIL.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente; Srªs e Srs. Senadores, diante de tantos fatos que vêm acontecendo no Brasil: manifestações, assassinatos brutais, como os que temos visto; futebol intenso, Copa por aí, passou quase despercebida uma notícia que, a meu ver, é de extrema importância, que é a denúncia feita pela Controladoria-Geral da União sobre o desvio de dinheiro da educação básica; desvio de dinheiro que sai do Fundeb e vai para a educação nos Estados e Municípios.

            Senadora Vânia, essa é uma denúncia que deveria ser analisada sob a ótica do crime contra a humanidade, porque creio que todo o crime contra a criança é um crime contra a humanidade. Agora nós só falamos em crime da corrupção, mas tirar dinheiro de criança é mais grave, ainda, que tirar dinheiro genericamente.

            O que a gente vê nesses diferentes editorais e nessas diferentes matérias? Que 73,7, então, 74% dos Municípios fiscalizados pela Controladoria... Entre 2011/12, em 73 Municípios foram constatados desvios. Setenta e três.

            Ou eles escolheram errado os Municípios - e esses Municípios, como se costuma dizer por aí, estão fora da curva, são Municípios mais corruptos que a média -, ou é muito grave para o País.

            Esses gastos foram considerados graves desvios. Veja bem: desvio em que sentido? Gastos perdulários, falhas administrativas, contratos irregulares, superfaturamentos, fraudes em processos de licitação para compra de materiais e contratação de serviços pela rede pública do ensino fundamental. Dinheiro roubado de crianças abaixo de 15 anos.

            Além disso, em 69,3% dos Municípios fiscalizados foram detectados gastos incompatíveis com os objetivos do Fundeb, como, por exemplo - pasmem -, aquisição de automóveis de luxo e tratores. Em vários casos, o dinheiro desviado por prefeitos foi utilizado para financiar campanhas eleitorais, para pagar bebidas alcoólicas, despesas pessoais e - pasmem outra vez - comprar lanchas, chácaras e gado.

            Estou lendo um editorial de O Estado de S. Paulo do dia 04 deste mês.

            Ao mesmo tempo, tem surgido e sido divulgado bastante uma notícia de um documento do Tesouro Nacional de que isso provaria como se gasta muito dinheiro com a educação no Brasil.

            Eu quero dizer o seguinte: o Fundeb transfere 10 bilhões por ano. Desses 10 bilhões, uma parte é roubada. Isso é grave.

            Aí, alguns dizem: “Está vendo como tem dinheiro? Não se usa bem.” Dez bilhões significam R$1,00 por dia para cada criança na escola. Senador Viana, R$1,00 por dia é o que o Governo Federal transfere, e uma parte disso é roubada. Não chega nada às crianças.

            Nós precisamos aumentar substancialmente os gastos.

            O gasto total - aí, somando os gastos da União e os gastos dos Municípios e dos Estados com a criança - chega, no máximo, a R$10,00 por dia; R$10,00 por dia é muito, muito, muito menos do que a diária de qualquer servidor público de nível superior, como nós próprios aqui. Quando viajamos, nós gastamos R$10,00 por dia, há diárias, neste País, de R$700,00 por dia, R$400,00, R$500,00 por dia, gastamos R$10,00 com as crianças. Desses R$10,00, R$1,00 é do Governo Federal. Nós temos que aumentar os recursos. Agora, temos que aumentar, fazendo com que se analise, se gaste bem, e bem significa duas coisas: uma que não haja roubo e outro que seja eficiente no resultado obtido.

            Não haver roubo de dinheiro, que seja tirado da escola, para essas lanchas, gado e o que for, é fundamental do ponto de vista ético, mas fazer com que o dinheiro que chegue lá dê resultado, que não seja aplicado numa educação que não dá resultados, que ele dê resultados é uma condição também necessária à ética; a ética que vem da eficiência, dos resultados obtidos, a ética nas prioridades.

            Nós estamos desprezando a ética no comportamento dos que roubam e a ética nas prioridades daqueles que não exercem com rigor, com cuidado, com carinho a ação de educar nossas crianças.

            Eu só vejo uma solução, e hoje em dia - e é correto -, todas as vezes que se diz: “Você critica, qual é a sua proposta?” A minha proposta é a federalização da educação de base. Se esses 10 bilhões que o Governo Federal gasta - e é pouquíssimo - fossem direto para a conta do professor, para o contracheque do professor, não tinha como ter desvio.

            Se o dinheiro vai para conta do professor, vai para o contracheque do professor, se for gasto em bebida é porque ele quis beber com o dinheiro dele, diferente do prefeito, segundo este estudo, que compra bebidas com dinheiro da educação de base. Eu não vou dizer da merenda porque a merenda não é ele que compra, a merenda já vai.

            Pois bem. Nós temos que fazer com que a União assuma sua responsabilidade na educação de cada criança que nasceu neste País como brasileira, depois é que ela é recifense, como eu. Primeiro, uma criança quando nasce é brasileira, ela tem que ser tratada como brasileira, logo ela tem que ser tratada igualmente, não importa a cidade onde nasceu nem a classe social da sua família. Diferenciar uma criança conforme a renda dos pais, na hora de oferecer uma educação, é um crime; diferenciar uma criança na hora de oferecer educação, conforme a cidade, é um crime também. Temos que dar uma unidade na qualidade.

            Olho aqui: não é a igualdade no conteúdo, não é a igualdade no método pedagógico. Nisso, tem que ter total liberdade cada uma das 200 mil escolas. Mas é a igualdade no conceito da qualidade; é a igualdade que diz que qualquer criança, quando terminar o ensino médio, vai estar preparada ou para entrar na universidade, ou para exercer uma função, que não exija universidade, mas em que ela possa cumprir satisfatoriamente. Além disso, que ela seja capaz de entender o mundo onde está; que seja capaz de deslumbrar-se com o mundo onde está e suas belezas; de indignar-se com as injustiças neste mundo onde ela está; de falar os idiomas que este mundo hoje exige. Isso é educação de base.

            Não há como fazer isso sem colocar na União a responsabilidade pela educação. Os prefeitos são pobres, não é porque alguns roubam, porque aí a gente podia até dizer que a União também não está avessa a esse vício da corrupção. É porque eles são pobres, eles não têm dinheiro, e também porque o instrumento de transferir dinheiro para as prefeituras leva a facilitar a corrupção. Volto a insistir: se, em vez de transferir dinheiro aos prefeitos, ele fosse transferido, diretamente, ao contracheque do professor, não haveria esse tipo de desvio.

            É por isso, Senador Jorge Viana, que trago estas denúncias que aqui estão, como forma de mostrar, mais uma vez, que o caminho para a nossa educação ser de qualidade, e de qualidade igual para todas as crianças - qualidade igual, não é educação igual; a educação é diferente, conforme o gosto da criança, conforme a história da sua cidade, conforme as exigências técnicas da sua região. Ela não é igual no conteúdo. O conteúdo tem que ser adaptado ao gosto do menino, tem que ser adaptado às necessidades do seu Estado, da sua cidade. Agora, a qualidade nisso que nós oferecemos - para cada um, um tipo de educação, mas com a mesma qualidade - só é possível com a União assumindo o seu papel.

            Dei entrada na PEC 32, que coloca sobre a União a responsabilidade pela educação das crianças nascidas sob a Bandeira do Brasil. A União pela Educação! Este é o slogan que a gente precisa começar a usar neste Brasil. Este é um slogan que eu gostaria de ver nas manifestações, Senadora Lúcia Vânia: União pela Educação. União, nos dois sentidos: união de nós todos juntos, do Brasil; e união no sentido do instituto que nos representa a todos, que é a união da Federação brasileira, por meio do Governo Federal.

            Concluo, portanto, Senador, dizendo que espero que esses editoriais de O Estado de S. Paulo, de O Liberal - Pará -, do Correio do Povo - do Rio Grande do Sul - e de outros que saíram e que não trouxe aqui sirvam para despertar não apenas a indignação da gente com o roubo de dinheiro que estão fazendo, que deveria ir para a educação, como também uma indignação quanto gasta este Governo Federal, gasta apenas R$10 bilhões do Fundeb, R$1 por dia, por criança, ou seja, é como se a gente tivesse dando menos que um sorvete por dia a cada criança.

            E a percepção - espero que isso ajude - de que o caminho é uma união pela educação; união no sentido de dar prioridade; união de todos juntos estarmos dispostos a abrir mão de investimentos em outros setores para poder investir em educação, e união no sentido da organização do Estado, a união que quer dizer a Presidência da República; o Governo Federal, todos os Ministérios, todos os órgãos públicos, voltados para que não haja mais roubo de dinheiro que vai para a educação, mas que haja muito dinheiro para a educação chegando lá na ponta. Não é nem só no contracheque do professor. Sabe onde o dinheiro tem que chegar? Na cabeça das crianças.

            Todo o dinheiro que vai para a educação e é desviado, como aqui mostra, é corrompido moralmente. Todo o dinheiro que vai para o professor - e aí não há roubo -, mas não chega à cabeça da criança, porque o professor não vai dar aula, porque o professor não se preparou, porque o professor é relapso, também é uma forma de corrupção.

            O destino do dinheiro gasto com educação é a cabeça de cada criança do Brasil. E, se a criança é do Brasil, é o Brasil que tem que cuidar delas. Lembro-me aqui da Senadora Heloísa Helena quando dizia: “Se adotássemos uma geração de brasileiros, essa geração, depois, adotaria o Brasil inteiro.”. Nós precisamos adotar uma geração de brasileiros para que essa geração adote o Brasil, e a maneira de adotar uma geração de brasileiros é o Brasil adotar essa geração e não deixar ao pobre do prefeito a responsabilidade e nem colocar na mão de prefeito, além de não ter a responsabilidade com a educação, desvio de dinheiro. Grandes denúncias essas, mas não servirão a muitos se não tirarmos as lições.

            Tentei vir aqui, Senador Jorge Viana, passar o meu sentimento de indignação e de esperança que uma notícia como essa possa nos despertar para a importância da federalização da educação de base.

            Era isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/08/2013 - Página 52890