Discurso durante a 125ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre pesquisa de opinião que abordou diversos assuntos.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Reflexão sobre pesquisa de opinião que abordou diversos assuntos.
Aparteantes
Mário Couto, Sergio Souza.
Publicação
Publicação no DSF de 08/08/2013 - Página 51747
Assunto
Outros > MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • COMENTARIO, RESULTADO, PESQUISA, ASSUNTO, OPINIÃO, JUVENTUDE, PARTICIPANTE, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, REGISTRO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, SAUDE, SEGURANÇA, EDUCAÇÃO, DEFESA, CONVITE, PESSOA FISICA, PARTICIPAÇÃO, SESSÃO, SENADO, OBJETIVO, APRESENTAÇÃO, REIVINDICAÇÃO.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Eu quero é um Diap pela população. Eu acho que nós hoje, todos, estamos com dificuldades de sermos reconhecidos pela população como somos por alguns órgãos.

            Mas, Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, eu tomei conhecimento nesses dias de uma pesquisa muito extensa, cuidadosa, detalhada sobre a situação do que pensam os jovens, e adultos também, que estão nas ruas.

            Sr. Presidente Jorge Viana, essa pesquisa mereceria uma análise cuidadosa, desde qual é o perfil dos manifestantes por renda, sobre os protestos. Eu devo dizer que essa pesquisa foi feita pela Data Popular, pelo Ibope e Datafolha. Sobre os protestos, o que é que pensam. E é preciso dizer que 81% dos que foram ouvidos são favoráveis aos protestos. Mostra quem deve ser o responsável pela educação brasileira, se o Estado ou a população; quem deve ser o responsável pela saúde do brasileiro, o Estado ou a população: 70% da população consideram que o Estado é responsável pela educação. E quando eles dizem Estado não quer dizer o Estado Unidade da Federação; Estado quer dizer o conjunto, portanto, a União; 75% dizem que é a saúde.

            Aqui tem um indicador, Senador: para cada dez brasileiros, nove consideram que a melhoria de sua vida foi um mérito pessoal - 87%; Deus, segundo lugar; família em terceiro; a sorte em quarto; o governo em quinto; e o patrão em sexto. Tem uma pergunta muito interessante: se as pessoas melhoraram de vida, Senador. E isso merece uma reflexão de todos nós e muito dos mais próximos ao governo: sete, Senador Jorge Viana - o senhor vai gostar disso - em cada dez, pensam que de um ano para cá a vida melhorou. E, apesar disso, nós temos o descontentamento geral. Algo mais profundo do que aparece, portanto, é o que causa todas essas dificuldades. Agora, aqui entra o que eu gostaria de discutir: os serviços públicos. A nota dada à saúde pública é 3,78. Ou seja, nenhum aluno chega nem perto da aprovação. A nota dada à educação é 4,69 - reprovado também. A nota dada à segurança pública é 3,89; a média da nota aos serviços públicos é de quatro pontos, ou seja, reprovados.

            Nós somos responsáveis por todo isto. Alguns que estão no Governo, outros que estão na oposição, mas nós somos os líderes deste País, nós somos responsáveis.

            E aqui o que eu queria - e depois vou fazer uma proposta, Senador Jorge Viana, e acho que o senhor é o Presidente mais indicado para ouvir esta proposta e encaminhá-la - fazer uma pequena análise diferente dessas pesquisas: chamar a atenção que quando a gente dá nota baixa à segurança significa que nós estamos nos matando. A gente esquece porque vê tudo vinculado a uma imagem do Estado em si que não dá segurança. Mas, há uma coisa mais profunda.

            O Brasil é um país onde nós estamos nos matando, como na Síria, só que outra forma; em uma guerra civil, só que é de outro tipo. Nós nos esquecemos disso. Costumamos dar nota baixa à segurança, mas esquecemos que este é um país que hoje está se matando. Nenhum exército invadiu o Brasil e nós, entre nós, estamos nos matando.

            Quando a gente fala que a educação está ruim, a gente lembra a escola. Mas não é só isso.

            Quando a educação é reprovada, Senador, o Brasil é reprovado no seu futuro. Nós, ao reprovarmos a educação dizendo que ela está ruim e reconhecendo que ela está ruim, e é verdade que ela está ruim, é muito mais grave do que apenas dizer que a educação está ruim, é dizer que o nosso futuro está obscuro, está ruim, porque o futuro é construído pelas escolas.

            Eu costumo dizer que quem quiser pode ver o futuro de um país, basta olhar a cara da escola pública hoje. O futuro de um país tem a mesma cara da escola de hoje. O nosso futuro é ruim, significa que a nossa economia vai continuar baseada em bens primários e que o País continuará sendo uma grande montadora de produtos inventados no exterior. Os automóveis nossos, não tem um inventado ou criado no Brasil. Nós somos capazes de colocar made in Brazil como se diz lá na hora de exportar, fabricado no Brasil, mas seria mentira dizer criado no Brasil, salvo uma ou outra coisa, como os aviões da Embraer.

            Nós, ao darmos uma nota ruim à educação, estamos demonstrando que não trabalhamos como deveríamos para construir o país que precisamos e, ao mesmo tempo, para não construir a vida de cada um, cada indivíduo deste País como deveria. Porque, daqui para frente, o futuro é baseado muito mais na educação do que na sorte. Até pode haver um pequeno conteúdo de sorte no futuro do País. Mas uma pessoa que não estuda, só se tirar na Loteria Esportiva, numa Mega-Sena. Até porque, antigamente, dava-se o golpe do baú. Atualmente, não tem mais isso, sabe por que, Senador? Porque, hoje, os ricos só estudam com ricos; então, só casam com ricos. Não há mais como um pobre encontrar uma rica nem uma rica encontrar um pobre. Acabaram-se os pontos de encontro interclasses. Então, nem golpe do baú é mais uma chance.

            A sorte é uma em muitos milhões. Só tem um jeito: a educação.

            Quando a gente diz que a saúde está reprovada, tem uma coisa mais profunda do que isso. A saúde reprovada quer dizer que nós estamos deixando pessoas sofrendo de doenças que poderíamos resolver se déssemos o mínimo cuidado. A gente às vezes esquece, porque vê os números, visualiza o hospital, Senador. O hospital está ruim, mas é mais profundo. Não é o hospital que está ruim; são as pessoas que estão morrendo porque o hospital está ruim.

            Quando a gente não dá creche para todas as crianças, sejam conveniadas, sejam pelo Estado, o que nós estamos fazendo é abandonando as crianças. Não são as creches que estão ruins apenas; as crianças estão abandonadas. Este é um país que abandona as suas crianças. Isso é o que indicam as pesquisas ao darmos notas baixas à situação do serviço público da educação e da pré-escola.

            Senador, o que está levando esse povo para a rua é talvez eles estejam percebendo mais do que nós que as coisas não estão boas. Quando eles dão nota baixa à educação, eles estão sentindo que o futuro do Brasil está ameaçado. Quando eles dão nota baixa à segurança, eles estão percebendo que estamos nos matando entre nós. Quando eles dão nota baixa à saúde, significa que nós estamos morrendo, nós estamos sofrendo, porque não são dados os serviços médicos. Quando eles dizem que o transporte público tem essa nota é porque eles estão dizendo que não aguentam mais perder três horas por dia para ir de casa para o trabalho. É muito mais do que o transporte físico que a gente visualiza que está ruim. Não é só o ônibus estar ruim, é a vida que está sendo consumida por causa do transporte público, que não consegue avançar. Não é mais nem só o problema do conforto; não é só o problema da espera. É também o problema da demora, e que toca também os que andam de carro privado.

             O problema do transporte, hoje, não é só um problema do transporte público; é um problema do transporte urbano em si, roubando vidas de cada um de nós, porque, para manter a indústria automobilística dinâmica, nós sacrificamos a vida de cada pessoa que mora em uma cidade grande.

            Tudo isso, Senador - e vou lhe dar a palavra, Senador Sérgio -, faz com que esse documento seja refletido entre nós, não no seu aspecto estatístico, mas no seu aspecto social e moral. E isso a gente não está conseguindo fazer ainda, Senador.

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Governo/PDT - DF) - E aí que quero fazer uma proposta: Senador Jorge Vieira, gostaria que V. Exª levasse para a Mesa a proposta de que este Senado precisa, em um desses dias, abrir as suas portas e trazer para a tribuna esses meninos que estão nas ruas se manifestando contra nós. Estou fazendo uma proposta concreta, mas se for preciso escrever, eu escrevo.

            Não vamos deixar que todos invadam isso aqui e ocupem o Senado. Não, não estou defendendo isso. Estou defendendo que um grupo deles venha aqui falar para nós. Como escolher? Sorteio. Cada um se inscreve na Internet e por aí a gente vê quem é que vem. Eles escolham, se for o caso, embora hoje eles não tenham líderes, mas precisamos ouvir o que esses meninos têm a dizer. Não precisamos ouvir apenas uma pesquisa, como estou falando, muito bem feita aparentemente. Precisamos, sim, trazê-los fisicamente aqui para falar para nós.

(Interrupção do som.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Governo/PDT - DF) - Não controlei o meu tempo porque achava que eram 20 minutos, mas se são apenas 10 minutos, vou fechar.

            Gostaria de elaborar mais essa ideia. De qualquer maneira, quero deixar registrado que faço uma proposta. Não é uma ideia solta. Trazermos aqui, Senador Sérgio, para serem ouvidos por nós, alguns dos jovens que estão nas ruas. Eles não poderão ser escolhidos cada um deles por mim, ou pelo Senador Capiberibe, ou pelo Presidente do Senado, porque aí vamos criar um viés.

            Descubramos como, mas vamos ouvi-los. Não dá mais para ter o diálogo tradicional, como se tem com o presidente do sindicato, como se tem com o presidente da UNE. Acabou esse tempo. A Internet matou a representatividade plena desses órgãos. Eles ainda têm representatividade, não podemos negar, mas é uma representatividade menor. Não é trazer o Presidente da UNE para falar para a gente, nem o da CUT para falar para a gente, é trazer representantes diretos que saiam da própria massa que está nas ruas querendo falar conosco (...)

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Governo/PDT - DF) - (...) dando recado e que a gente termina ouvindo pelas pesquisas, sem levar em conta o sofrimento que cada um deles tem para dizer para nós.

            Essa é a proposta que peço a V. Exª que leve à Mesa. Se for necessário colocá-la por escrito, eu o farei.

            Antes de terminar, quero dar a palavra ao Senador Sérgio Souza.

            O Sr. Sérgio Souza (Bloco Maioria/PMDB - PR) - Meu caro Senador Cristovam Buarque, como sempre, V. Exª sobe à tribuna e profere pronunciamentos que tocam a consciência, o coração dos brasileiros. Eu gostaria de abrir um parêntese com relação à segurança pública. O cidadão brasileiro tem ido às ruas, tem buscado uma vida mais igual, uma vida mais humana, mais ética, uma moral mais elevada. Na verdade, ele quer mais cidadania. Ontem, eu subi à tribuna para fazer um pronunciamento sobre a segurança pública e sobre os homicídios na capital do meu Estado, o Estado do Paraná. Em 10 anos, foram 5.806 homicídios. Somente 23% desses viraram processos judiciais. A morosidade na justiça, no inquérito policial, dá conta de que 77% dos homicídios cometidos na capital do Estado do Paraná não são averiguados profundamente. Imagine, então, o restante dos crimes. Imagine uma mãe que vê seu filho saindo à noite para estudar, pegando esse transporte coletivo que V. Exª mencionou, levando horas para chegar à escola, com o mesmo tempo de retorno, e ainda padece do temor de não saber se chega de volta nas mesmas condições físicas que saiu. Então nós temos que rever, de fato, o nosso papel no Congresso Nacional para buscarmos entender o que é bom para a sociedade, porque a nossa função aqui, no Congresso, é regular o convívio, os costumes da sociedade. Muito obrigado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Governo/PDT - DF) - Obrigado, Senador Sérgio Souza.

            O Sr. Mário Couto (Bloco Minoria/PSDB - PA) - Eu acho que...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Governo/PDT - DF) - O Senador Mário Couto pediu a palavra.

            Com muito prazer.

            O Sr. Mário Couto (Bloco Minoria/PSDB - PA) - Eu acho que o tema é muito sério; é profundo. Assim, eu acho que por um minuto vale a pena falar sobre esta matéria que V. Exª traz à tribuna com grande brilhantismo na tarde de hoje. Senador Cristovam, o Brasil cobra imposto dos seus filhos. Talvez a Nação que mais cobre de seus filhos seja esta pátria chamada Brasil. V. Exª percebe que, neste ano, vamos chegar a quase R$1,5 trilhão. Olha o número: R$1,5 trilhão! Esses jovens devem pensar o seguinte: se a Nação cobra tanto imposto para melhorar a educação, a saúde, a segurança, por que não melhora?

(Soa a campainha.)

            O Sr. Mário Couto (Bloco Minoria/PSDB - PA) - Então, o jovem brasileiro não pode mais ficar alheio a tudo isso. Ele foi às ruas e disse “Basta!”. Se eles não pagassem tantos impostos, não tinham tanto direito de cobrar. Mas se paga muito. E, aí, a resposta é a seguinte, Senador: na saúde, resolve-se o problema contratando médicos estrangeiros. Olha que absurdo, Senador! Está tudo errado nesta Pátria. Está tudo errado, Senador! Eu vejo o seu esforço, com tanto brilhantismo, com tanta sapiência a respeito da educação, e ninguém o ouve nesta Pátria. Ninguém ouve ninguém que quer o bem; ninguém é ouvido, apesar de alguns ainda terem a credibilidade do povo. Não são todos os políticos, não, Senador. Não se inclua. Não se inclua nesse rol. Não são todos os políticos que perderam a credibilidade.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Mário Couto (Bloco Minoria/PSDB - PA) - Muitos políticos desta Pátria ainda têm credibilidade, como V. Exª tem, só não são ouvidos, porque o governo não quer ouvi-los. Se o governo o tivesse ouvido, desde que chegou aqui; se ele tivesse considerado as suas propostas, desde que chegou aqui - e a todas elas tenho prestado bastante atenção, todas brilhantes, todas com grande sabedoria -, a educação do País não estava assim. Mas não querem ouvi-las. Deixam de ouvi-las. Eu não sei o que fazem com tanto dinheiro. Não sei. A Pátria não pode se conformar com tanta cobrança e ficar à espera do bem social, que não vem nunca. E não vem mais! Não vem mais, porque não se tem essa condição e essa possibilidade de vir agora. A Pátria tem de mudar...

(Interrupção do som)

            O Sr. Mário Couto (Bloco Minoria/PSDB - PA) - ... e mudar muito. (Fora do Microfone.) Eu lhe agradeço, Senador.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Governo/PDT - DF) - Senador Mário Couto, eu que lhe agradeço, primeiramente pelo seu reconhecimento, pois realmente o senhor é um dos que presta atenção quando a gente fala; em segundo lugar, pela sua colocação de que a Nação não está ouvindo. Talvez seja essa uma das coisas que está faltando. Daí a minha proposta. A minha proposta é que aproveitemos uma segunda-feira, Senador Collor, em que a gente presta homenagem a pessoas, a entidades - e toda segunda-feira há uma sessão de homenagem aqui - e escolhamos uma sessão dessas para trazer aqui os jovens que estão fazendo manifestação, para que eles nos digam o que eles querem.

            Eu diria até que é quase como prestar uma homenagem a eles. Mas não quero prestar-lhes homenagem; eles não precisam dela. Eu quero ouvi-los, como V. Exª disse, Senador Mário Couto. Nós não os estamos ouvindo; o governo não nos ouve, e não estamos ouvindo, claramente, plenamente, a voz que vem da rua, até porque é difícil de saber o que eles querem. Então, fica aqui a minha proposta.

            E concluo dizendo que, dessa pesquisa que analisei aqui, uma coisa é muito positiva: 65% ainda acredita que a saída é pela democracia. Temos que aproveitar essa crença que ainda têm e, para isso, temos que fazer o dever de casa, mostrando como é que estarmos à altura deste momento. E, às vezes, eu me pergunto se estamos à altura do momento. Os momentos exigem de cada político algo diferente, conforme os desafios que se colocam. E tenho minhas dúvidas se, hoje, a gente está á altura do desafio que o Brasil coloca, com todas as dificuldades a que me referi aqui.

            É isso, Sr. Presidente. Espero que V. Exª leve essa proposta de uma sessão de homenagem para ouvir aqueles que estão se manifestando nas ruas.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/08/2013 - Página 51747