Discurso durante a 211ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas ao Governo Federal e à base aliada pelo arquivamento de projeto de lei que reduz a dívida de estados e municípios com a União; e outro assunto.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA. POLITICA AGRICOLA.:
  • Críticas ao Governo Federal e à base aliada pelo arquivamento de projeto de lei que reduz a dívida de estados e municípios com a União; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2013 - Página 84354
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA. POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • CRITICA, DECISÃO, GOVERNO FEDERAL, REFERENCIA, ARQUIVAMENTO, PROJETO DE LEI, REDUÇÃO, DIVIDA, ESTADOS, MUNICIPIOS, CREDOR, UNIÃO FEDERAL, DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, OBJETIVO, AUMENTO, REPASSE, IMPOSTO DE RENDA, IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS (IPI), BENEFICIARIO, MUNICIPIO, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICIPIOS (FPM).
  • CRITICA, CASSAÇÃO, LIMINAR, DECISÃO JUDICIAL, TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL (TRF), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), REFERENCIA, AÇÃO POPULAR, OBJETIVO, GARANTIA, TITULO, INSTITUIÇÃO BENEFICENTE, BENEFICIARIO, ASSOCIAÇÃO AGROPECUARIA, ASSISTENCIA TECNICA, ZONA RURAL, EMPRESA DE ASSISTENCIA TECNICA E EXTENSÃO RURAL (EMATER).

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caro Presidente desta sessão, Senador Mozarildo Cavalcanti; Senador Paim, telespectadores da TV Senado e ouvintes da Rádio Senado, o que me traz à tribuna hoje é uma questão federativa preocupante para qualquer gestor público, seja governador, seja prefeito - especialmente prefeito.

            A decisão do Governo Federal de arquivar o projeto de lei que reduz a dívida de Estados e Municípios com a União (PLC nº 99/2013), em reunião com a base aliada, realizada nessa semana, é um gesto que, aparentemente, menospreza o trabalho intenso feito pelo Congresso Nacional no sentido de equilibrar a desequilibrada relação entre União, Estados e Municípios.

            A proposta, já aprovada na Câmara dos Deputados e em tramitação nesta Casa, faz parte dos debates sobre o novo e necessário Pacto Federativo, importante e abrangente tema que deveria ser tratado com atenção e prioridade pelo Governo Federal e, sobretudo, por esta Casa legislativa. Inclusive, essa foi a principal justificativa para a realização, no último dia 24 de outubro, da terceira Sessão Temática do Senado, com a participação do Ministro da Fazenda, Guido Mantega, outros representantes do Executivo e muitos de nós, Senadores.

            Aqui, no Legislativo, o acordo foi fechado, com o aval do governo, para que a troca do indexador da dívida também fosse retroativa ao momento da contratação dos empréstimos firmados no final dos anos 90. É importante destacar que o texto original, encaminhado pelo governo, previa, inicialmente, a troca do indexador usado para corrigir, apenas, os pagamentos das dívidas a vencer de Estados e Municípios.

            Não foi o formato mais adequado, mas garantiria um socorro financeiro importante para os elos mais fracos da Federação, como é o caso de Estados e Municípios. Vale destacar, ainda, que muitas prefeituras estão em situação de penúria financeira, resultante das indefinições sobre os repasses de recursos aos demais entes federados. É preciso que se encontre, urgentemente, uma alternativa para que os recursos nas mãos da prima rica, a União, cheguem, de fato, a Estados e Municípios. Fazer andar projetos prioritários e concluí-los no tempo certo tem de ser uma prioridade, uma escolha de governo!

            É lamentável que o governo tome essa decisão a esta altura do jogo ou do campeonato.

            Agora, de modo repentino, o governo recua e só aceitará mudanças do indexador para as dívidas à frente, sem efeitos retroativos. Em resumo: o projeto de lei, que poderia melhorar as contas de Estados e Municípios, está, simplesmente, sendo abandonado pelo governo e pela própria base.

            Eu gostaria, até, de saber como ficam as declarações dos governadores que festejaram essa iniciativa como histórica e como um avanço extraordinário. Agora, talvez, tenham que ser revistas declarações dessa natureza.

            Mais uma vez, o governo prefere abandonar os temas que dizem respeito ao Pacto Federativo, colocando o assunto para escanteio, quando o mais recomendado seria apresentar avanços que pudessem contribuir, sim, para melhorias reais nas nossas cidades.

            Sem ajustes nessa relação entre os entes federados, fica, ao meu juízo, muito difícil promover resultados concretos, sobretudo nas cidades, onde vivem as pessoas, como mais saúde, mais educação e melhoria na infraestrutura, principalmente em relação à mobilidade urbana, com transporte público mais eficiente, o que, aliás, foi tema tão reclamado pelas ruas nos movimentos que houve no meio do ano.

            Tratamos, Senador Mozarildo Cavalcanti, inúmeras vezes, dessa complexa matéria, que envolve indexador das dívidas estaduais, guerra fiscal, Fundo de Participação dos Estados (FPE), receitas do comércio eletrônico e outros temas de interesse. São, como disse, questões já debatidas exaustivamente nesta Casa, nos últimos anos, que têm objetivos claros: acabar com a guerra fiscal e votar, preferencialmente até o final de novembro, propostas estruturantes e reformadoras nesse processo federativo.

            Recentemente, o grupo O Estado de S. Paulo promoveu uma série de debates envolvendo representantes de Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo. A principal constatação do debate foi a seguinte: câmbio, guerra fiscal e falta de investimentos do Governo Federal são fatores que inibem o crescimento nacional e regional.

            A Secretária de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais, Dorothea Werneck, afirmou que a guerra fiscal entre os Estados não traz benefícios às unidades da Federação. A Secretária criticou, inclusive, o fato de o Conselho Nacional de Política Fazendária, o famoso Confaz, exigir consenso entre as 27 unidades da Federação para aprovar propostas, sugerindo a necessidade de alterações por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição, uma atribuição nossa, do Legislativo.

            Concordo com os especialistas quando afirmam que é preciso repensar o Estado brasileiro como uma República Federativa. Resolver as questões que envolvem a guerra fiscal é um passo importante para os avanços econômicos.

            Para que essas melhorias ocorram, é preciso, obviamente, disposição de todos os parlamentares, independentemente da orientação política: base, independentes - como é o meu caso - ou de oposição. O Governo Federal, contudo, é peça-chave para que esse processo se desdobre de modo bem sucedido!

            É necessário olhar a realidade dos 5.568 Municípios brasileiros, "espinha dorsal" dessa importante relação entre Entes federados!

            Por isso, como Presidente da Subcomissão Permanente de Assuntos Municipais, vinculada à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) desta Casa, tenho como prioridade avançar, ao menos, com outras pospostas que tenham efeitos positivos sobre as contas de Estados e Municípios.

            Esse é o caso da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 39/2013, de minha autoria, que prevê aumento de 2% no repasse dos Impostos de Renda (IR) e sobre Produtos Industrializados (IPI) para o Fundo de Participação dos Municípios, o famoso FPM, que é a principal receita para a maioria dos municípios em relação as suas necessidades de arrecadação.

            Como é sabido de todos, as reduções frequentes nos repasses do FPM e as limitações da União para repassar os chamados “restos a pagar” às prefeituras distorcem, e muito, o atual modelo federativo.

            Um detalhado estudo, feito em janeiro desse ano por economistas brasileiros, entre os quais, José Roberto Rodrigues Afonso, Julia Morais Soares e Kleber Pacheco de Castro, em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), mostrou que os Municípios continuam penalizados com a atual estrutura do sistema tributário brasileiro.

            A pesquisa mostra que, enquanto a União ficou com 56,62% das receitas disponíveis em 2010, Estados ficaram com 25,09%, e aos Municípios, os primos pobres da federação, restaram apenas 18,29% do bolo tributário. Na prática, isso significa que os Municípios, principalmente os 3.895 de menor porte, que são a maioria, não conseguem bancar a totalidade dos serviços relativos às demandas básicas da população, como educação, saúde, saneamento básico e infraestrutura.

            É preciso lembrar que muitos dos serviços públicos de responsabilidade da União, são, em muitos casos, repassados às prefeituras, já prejudicadas financeiramente por esse descompasso nas relações federativas. São inúmeras as dificuldades que têm forçado os Municípios, inclusive do meu estado, o Rio Grande do Sul, a buscarem soluções alternativas.

            Cito, por exemplo, a redução dos custos das dívidas municipais, alteração dos indexadores, modernização da Lei de Licitações, atualização das normas que tratam do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) e criação de programas de ajuste fiscal para possibilitar operações de crédito. Não há dúvida, portanto, que um novo Pacto Federativo é o caminho para reorganizar as finanças públicas.

            Como foi acordado, em março deste ano, entre os governadores de todo o País e os Presidentes desta Casa, Renan Calheiros, e da Câmara Federal, Henrique Eduardo Alves, é preciso votar propostas que resultem na proteção e no equilíbrio federativo! Essa é uma responsabilidade que cabe ao Congresso. Que aquela iniciativa dos dois Líderes do Congresso Nacional não sejam em vão.

            Por entender a importância de tudo isso, apresentei, inclusive, outra proposta (PEC nº 70), que tramita nesta Casa, obrigando a União a conceder benefícios fiscais a Estados e Municípios, nos casos de redução de tributos de forma unilateral feitas pela União, como é o caso que citei há pouco, da redução do IPI e do Imposto de Renda para compor a receita do FPM. Isso é para evitar prejuízos financeiros às prefeituras quando a União diminuir a cobrança de parte de alguns impostos, incidente sobre a venda de carros e geladeiras, o que, claro, diretamente impacta negativamente, com a redução da receita das prefeituras via Fundo de Participação dos Municípios, já que esse fundo é integrado exatamente por esses dois impostos, o IPI e o Imposto de Renda.

            É preciso lembrar ainda que, ao reduzir as alíquotas do IPI, o Governo Federal cria problemas aos Municípios, pois os repasses de recursos às prefeituras são reduzidos unilateralmente, o que sobrecarrega as contas municipais, obrigando prefeitos a descumprirem a moralizadora e necessária Lei de Responsabilidade Fiscal. Muitos prefeitos estão descumprindo a lei porque a União não faz os repasses dos recursos a tempo para que as prefeituras organizem as suas contas.

            É a situação de penúria financeira dos Municípios que comprova a falência do nosso modelo federativo, que está ultrapassado e completamente esgotado! Como se sabe, o cobertor é curto, mas é preciso cautela na hora de descobrir os pés para proteger a cabeça. Cabe lembrar que a arrecadação de impostos e contribuições federais, só no mês de outubro, somou mais de R$100 bilhões. É um recorde para o Governo Federal! Foi o melhor outubro da história no quesito "arrecadação". Enquanto isso, os pobres Municípios e Estados estão à míngua, Senador Mozarildo.

            Por isso, avançar com essas reformas é aumentar as chances reais para que as políticas públicas resultem em melhorias à população, com mais saúde, educação e infraestrutura. É um processo com efeitos duradouros que precisa começar, progredir.

            Não podemos nos deixar abater por dificuldades impostas, seja por parte da União, inclusive com reflexos no Poder Judiciário.

            Lembro, por exemplo, o caso da ação popular, da qual sou apoiadora e signatária, juntamente com o Senador Pedro Simon e outros representantes gaúchos, Senador Paulo Paim, além de toda a Bancada do Rio Grande do Sul, porque uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região extinguiu essa ação popular ajuizada em novembro de 2011 e cassou a liminar da Justiça Federal que garantia o título de filantropia à Associação Sulina de Crédito e Assistência Rural e Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Sul (Ascar/Emater-RS), presidida por Lino de David. Veja só, é um ato, de novo, unilateral.

            Por causa de inúmeras dificuldades impostas pela União, no julgamento da ação na Justiça, esta entidade - veja só, Senador Mozarildo -, Ascar/Emater, que atende 250 mil famílias de pequenos agricultores e também criadores de gado no meu Estado, pode ter um prejuízo de aproximadamente R$2 bilhões, inviabilizando seu funcionamento. E ela é disseminadora do conhecimento e da assistência rural. Isso está acontecendo no exato momento em que o Governo cria uma empresa de nível federal para exatamente dar a assistência rural. Nós já temos essa estrutura pronta e extingui-la não é um ato adequado.

            Com a derrubada dessa liminar, a Associação volta a ficar fragilizada diante de ações de execução fiscal que podem, até mesmo, determinar a liquidação da instituição e o encerramento do serviço prestado. Assentados da reforma agrária, pescadores artesanais, indígenas e quilombolas também serão atingidos, indevidamente, por esse litígio, o que é inconcebível, uma vez que, unilateralmente, de uma hora para a outra, a Previdência Social retira a condição de filantropia de uma entidade e a deixa, eu diria, com o pincel na mão, sem condições de continuar prestando esse serviço.

            Há mais de 20 anos, a entidade tenta obter a declaração de nulidade por ilegalidade e imoralidade de dois atos administrativos praticados pela União contra a Ascar: um que revogou o direito à imunidade da entidade em relação à contribuição previdenciária, a questão filantrópica; e o outro que cancelou o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social. O litígio entre a Ascar e a União se refere à contribuição previdenciária.

            O problema começou em 1992, quando a Ascar perdeu o direito de isenção tributária do pagamento da contribuição previdenciária, deixando, assim, a condição de entidade beneficente, adquirida em 1975. Em resumo: nem as entidades filantrópicas estão livres de pagar contribuição patronal ao Caixa da Previdência Social, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). É muita, eu diria, até, intransigência e um ato de força. Por isso, a importância de ficarmos atentos às decisões da União, que estão atrasando os avanços sociais relevantes de que o País precisa, especialmente esse a que fiz referência agora, que é o da extensão rural.

            Não é coerente que, na hora em que a Casa tem aprovada a criação de uma empresa federal para a extensão rural, se elimine a possibilidade do trabalho feito há muitos anos pela Ascar/Emater e que, agora, está nesse conflito jurídico dessa discussão.

            Não houve sequer uma análise do mérito dessa decisão unilateral da Previdência, exatamente por isso, e o Governo é parte desse processo nos conselhos da própria Ascar. Então, não conseguimos entender, porque é uma empresa pública, o que presta é assistência direta aos pequenos agricultores e os Municípios que têm como referência o trabalho da Ascar/Emater, no Rio Grande do Sul, estão, agora, ameaçados de perder, também, esse serviço.

            No que depender dos Parlamentares gaúchos, nós lutaremos até o fim para manter as condições de trabalho da Ascar/Emater, lamentando que o litígio jurídico possa atrapalhar as condições de trabalho dessa importante instituição.

            Agradeço, Sr. Presidente, a concessão do tempo e vou para uma audiência pública que requeri na Comissão de Relações Exteriores, para tratar de direitos trabalhistas dos servidores das embaixadas do Brasil que não pertencem ao quadro do Ministério das Relações Exteriores, no caso, da diplomacia, não são da carreira, mas são residentes nos lugares onde prestam serviço.

            É uma matéria relevante, é um projeto do ex-Presidente José Sarney, nosso colega Senador, e que já teve exame na Comissão de Assuntos Sociais, com Relatoria do Senador Paulo Bauer, e, agora, está submetido à Comissão de Relações Exteriores, em que o Relator é o próprio Presidente, Senador Ricardo Ferraço.

            A audiência vai ser muito importante para esclarecimentos em relação a esse tema.

            Obrigada, Senador.

            Bom fim de semana a todos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2013 - Página 84354