Discurso durante a 221ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação de apoio ao Sr. José Genoino Neto; e outro assunto.

Autor
Inácio Arruda (PCdoB - Partido Comunista do Brasil/CE)
Nome completo: Inácio Francisco de Assis Nunes Arruda
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CORRUPÇÃO. HOMENAGEM.:
  • Manifestação de apoio ao Sr. José Genoino Neto; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 04/12/2013 - Página 90073
Assunto
Outros > CORRUPÇÃO. HOMENAGEM.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, EX-DEPUTADO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), CONDENADO, CORRUPÇÃO, PAGAMENTO, MESADA, CONGRESSISTA, TROCA, APOIO, GOVERNO FEDERAL, ELOGIO, VIDA PUBLICA, CARREIRA, POLITICA, LUTA, DIREITOS SOCIAIS, RENUNCIA, MANDATO PARLAMENTAR, VITIMA, INJUSTIÇA.
  • PESAMES, MORTE, EX GOVERNADOR, ESTADO DE SERGIPE (SE).

            O SR. INÁCIO ARRUDA (Bloco Apoio Governo/PCdoB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, também quero reafirmar, uma vez mais, essa trajetória do Déda. É uma notícia sempre muito dura para a família, para todos nós. Ele era muito vibrante.

            Nós nos encontramos várias vezes. Eu me lembro de que estivemos juntos - eu, na campanha dele, e, depois, ele nas nossas -, lá no Estado do Ceará, fazendo uma movimentação popular. E depois saímos para outras campanhas, no Pará. No segundo turno, sempre a gente se juntava para fazer campanha em conjunto, em nome dos candidatos do campo da esquerda, do campo popular, pelo nosso País afora. Uma figura que teve essa visão também sempre nacional da atuação política, um registro adicional para colocarmos aqui nesta noite, mostrando esse papel tão importante que ele desenvolveu também no nosso País.

            Mas quero fazer outro registro, porque diz respeito a minha terra, ao meu Estado, embora se trate de um militante político que atua em outro Estado do País.

            Quero começar com uma breve citação sobre o autor de uma grande obra, que começou com o nome de comédia. Depois, foi chamada de Divina Comédia. O autor da Divina Comédia foi um homem que viveu em Florença, ligado à área da saúde, dos farmacêuticos, dos médicos, que era a sua área de atuação profissional, e à literatura, muito respeitado.

            Resolveu, ao lado dos artesãos... Florença, naquela época em que vivia Dante, já era uma cidade, digamos assim, de pequenas unidades produtivas industriais, artesanais, de florescimento cultural, artístico também extraordinário, e Dante era figura central, já como literato, respeitadíssimo, e profissional da área de saúde.

            E Florença tinha uma atuação política muito forte, e um parlamento também já existia naquela época em Florença, uma representação popular, política; os conselhos já funcionavam em Florença.

            E Dante, para enfrentar os poderosos, aliás, os cardeais, poderosos da política de Florença, resolve se inscrever como candidato pelo bloco dos profissionais de saúde, que era um bloco, digamos assim, quase que operário e popular. Inscreve-se e se elege. E o seu papel, a sua atuação, naquela comuna de Florença, é exatamente enfrentar os poderosos, na busca de instituir um poder mais avançado, democrático, popular, que levasse progresso a todo o povo de Florença e das cidades próximas a Florença.

            Não custou muito tempo para que se encontrassem, numa promotoria qualquer, indícios de que Dante teria se envolvido com atividades ilícitas, com algum tipo de desvio de recursos públicos. Foi uma montagem dos poderosos da época, e cassaram o mandato de Dante. O autor da Divina Comédia foi cassado, e foi exilado, perseguido duramente pelos cardeais de então que mandavam na política de Florença.

            Ainda tentou não só provar a sua inocência, porque ele era absolutamente inocente, mas não tinha como, porque o poder de então jamais permitiria que ele provasse a sua inocência; os cardeais já o condenaram; ele já estava condenado; não havia nenhuma maneira, porque também esse mesmo instrumento, para não usar uma palavra forte, jurídica, essa invencionice, essa “marketagem” jurídica chamada chamada domínio do fato, uma invencionice sem nenhuma vergonha, uma coisa meio cínica que se cria para condenar alguém.

            E assim foi condenado Dante. Morreu no exílio; tentou voltar à sua cidade e não teve êxito. Morreu Dante no exílio. Esse exemplo é importante porque Dante morreu no exílio, mas ele não precisou ser absolvido para estar presente na história da Humanidade até hoje como uma figura das mais respeitadas do mundo da literatura, das artes, do conhecimento, do saber e da luta por uma nação mais progressista, mais avançada, que atenda melhor ao seu povo.

            Faço-o não para comparar, porque são fatos distintos. Não quero fazer essa comparação, mas não posso deixar de fazer o registro do que ocorre hoje com um conterrâneo nosso, cearense, lá do Encantado, da cidade de Quixeramobim, e que muitos deixam de olhar, porque falta às vezes coragem suficiente para enfrentar uma espécie de senso comum, montado para servir a interesse que não é o interesse maior do nosso País. Nós não podemos nos calar diante desses fatos.

            Quero registrar, primeiro, a atitude digna de José Genoino Neto, o Genoino, um estudante que desde secundarista se dedicou a lutar, primeiro, contra a ditadura, depois pela luta democrática, que colocou a sua vida nessa causa. Foi guerrilheiro, primeiro dirigente do Centro Acadêmico do Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal do Ceará; depois foi para a guerrilha, enfrentar a ditadura naquele terreno, preso, torturado, como todos os que foram para as masmorras da ditadura. Ajudou a construir outro partido, foi militante do meu Partido durante muitos anos; militante do PT, ajudou a construir o Partido dos Trabalhadores; elegeu-se deputado federal por seguidos mandatos, e, sobretudo, dirigindo o Partido dos Trabalhadores, ajudou a construir este momento que vive o Brasil, um dos momentos mais importantes talvez da nossa Nação desde a luta de Bonifácio, que completou 250 anos este ano, em 15 de junho. Desde José Bonifácio, claro, e tantos outros para trás, desde a Revolução, da Guerra dos Guararapes, da Batalha de Tiradentes, até José Bonifácio, com a Independência, a República de 30, a Coluna Prestes, a Revolta dos 18 do Forte.

            Desde esse período todo, talvez o período mais largo da democracia, o período em que mais se está procurando distribuir a riqueza produzida neste capitalismo brasileiro, que não é diferente dos outros, uma força política, um campo político da esquerda brasileira chegou ao Governo e, entre esses, está José Genoino como também um artífice deste momento político do Brasil. Talvez a sua condenação esteja ligada a esse atrevimento do povo, que teve a capacidade de colocar um operário para governar o Brasil. Talvez esta seja a questão central: um operário se elegeu. Claro que não foi só, teve todo um movimento.

            O meu partido, o PCdoB, participou da sua campanha, da campanha de Lula desde o seu primeiro mandato, da sua primeira campanha em 89. Depois, 94, 98, eleição em 2002, apoio para sustentar o governo. Em situações difíceis, lembro que quem presidia a Câmara dos Deputados era Aldo Rebelo. Tivemos a coragem de enfrentar aquele momento. Alguns Senadores aqui, nós podemos citar o Senador Sarney, foi um dos que sustentou e enfrentou a tentativa de levar o Presidente Lula ao impeachment, porque todo o cenário estava armado para isso. Nós enfrentamos tudo isso. Posso dizer que o José Genoino enfrentou tudo isso. Mas ele é dos construtores desse momento que levou Lula a dois mandatos e que levou a Presidente Dilma ao seu primeiro mandato e a ter uma condição e uma capacidade de juntar forças para manter um Governo de cunho democrático, de viés popular, que abraça causas sociais significativas, que jamais a elite rica, poderosa e, sobretudo, dona dos principais veículos de comunicação do País, teve condições de fazer, porque não seria da sua natureza.

            Só um conjunto de forças, como esse que temos hoje no País, tem condições de distribuir melhor a riqueza, de usar os recursos públicos para garantir mais universidades, mais escolas profissionais, mais institutos federais, para dar mais recursos e mandar mais recursos para a educação infantil, para a construção de escolas de mais qualidade.

            Só um Governo dessa natureza tem condições de compreender a necessidade de um programa social como o Bolsa Família, para que ele não seja oferecido como esmola, mas como porta de entrada para melhorar a condição de vida geral do povo e oferecer a oportunidade que sempre faltou à maioria esmagadora da população brasileira.

            É esse conjunto de forças que tem condições de fazer esses programas, porque a natureza do sistema que nós vivemos no Brasil, que é o sistema capitalista, é da concentração brutal, é da concentração absoluta. Basta ver o que está ocorrendo nos Estados Unidos, na Europa, com as conquistas sociais, com as conquistas trabalhistas, enquanto em nosso País, claro, nós tínhamos um déficit muito maior, comparado com a Europa, com os Estados Unidos.

            Mas o que ocorre é que, nesse canto do mundo, no Brasil e na América do Sul, esses governos têm ampliado os direitos sociais, têm reforçado os direitos sociais, têm melhorado a qualidade de vida, têm garantido meios adequados ou melhores, senão os mais adequados, para que a qualidade de vida aumente em nosso País.

            Eu tenho a impressão de que a condenação de Genoino tem este sentido de punir a ousadia do povo, de punir aqueles que enfrentam os poderosos. Claro, o conjunto de forças que nós reunimos ainda é pequeno. Há muito mais coisa para se fazer no Brasil, e é preciso juntar muito mais força do campo social, do campo popular, para enfrentar os desafios da nossa Nação. Nós, que realizamos um congresso agora, fizemos um conjunto de proposições, de reformas mais profundas, reforma urbana onde, está explodindo a revolta popular pelas condições indignas de vida ainda nas grandes metrópoles.

            Não é em Fortaleza, não. É em São Paulo, é no Rio de Janeiro, é em Belo Horizonte, é em Brasília e também na minha cidade, que exigem investimentos ainda gigantescos. Para serem feitos, esses investimentos, muitas vezes, entram numa cantilena da ideia de que há gastança quando se coloca mais pobre na universidade, quando se melhora a assistência à saúde. Chama-se isso de gastança, porque tem que contratar mais, tem que pagar mais. Tudo isso são conquistas pequenas. Na nossa língua, podemos dizer muito pequenas.

            É preciso avançar mais, é preciso ir mais longe o nosso País. Mesmo na produção agropecuária, precisamos avançar mais. Melhoramos bastante os investimentos na chamada agricultura familiar, que nada mais é do que a pequena produção no campo. São os pequenos produtores que produzem muito quando têm a oportunidade de ter meios, de ter recursos. E, mesmo na média produção, nas médias propriedades e até, podemos dizer, nas grandes propriedades, precisamos ainda fazer muito no nosso Brasil.

            Há muita infraestrutura para ser feita. Um País que largou a estrada de ferro, que abandonou os investimentos nos portos, que abandonou a construção de navios, e só um soco na mesa dado pelo Lula teve condições de mostrar aos funcionários da Petrobras que nós não íamos mais comprar plataforma lá fora e, muito menos, navios. Íamos ter que fazer aqui, soerguendo a indústria naval, que tinha sido liquidada completamente no nosso País.

            Eu quero fazer este registro porque o nosso companheiro José Genoino, acho que numa atitude também de coragem, renunciou para, digamos assim, fortalecer a instituição Congresso Nacional. Não queria ou não quis trazer para o âmbito do Congresso Nacional a sua dor, a dor que ele está sofrendo com a sua família e com muitos no Brasil inteiro. Não quis transferir para as Deputadas, para os Deputados, em última instância, para o Congresso Nacional, e, corajosamente, deixou o Parlamento, momentaneamente, para não levar o Parlamento a uma situação que ele deve ter considerado de alguma dificuldade. Por isso que ele teve a coragem de dizer: “Não. Vou me ausentar porque isso também vai ajudar a fortalecer o Congresso Nacional”. E, ao fortalecer, fortalece também a sua causa e fortalece a causa que nós construímos em conjunto.

            Nós precisamos, Sr. Presidente, fazer este registro para dar o nosso apoio político, porque considero também essa questão uma batalha política, que precisa de gente que tenha coragem de apoiar, de enfrentar o senso comum formado, montado, construído para constranger figuras como a do José Genoino Neto.

            Então, ele tem o nosso apoio, o apoio do meu Partido, que já foi transmitido através do nosso XIII Congresso, quando, enfaticamente, denunciamos no nosso Congresso a armação do tal domínio do fato. Pelo amor de Deus! Domínio do fato! Haja invencionice para querer condenar as pessoas no nosso País.

            Talvez os tribunais brasileiros precisem de um conteúdo mais de classe. Talvez esteja faltando isso ali nos tribunais brasileiros. Talvez estejamos precisando de uma reforma do Judiciário mais profunda no nosso País, para que a justiça seja, de fato, algo que a gente possa garantir ao nosso povo.

            Então, eu faço este registro, Sr. Presidente. Não há igualdade, evidentemente, entre Dante e Genoino, mas as causas que eles abraçaram estavam próximas, e são condenados pelas causas que abraçaram, com certeza.

            Agradeço a V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/12/2013 - Página 90073