Pronunciamento de Pedro Simon em 31/03/2014
Discurso durante a 41ª Sessão Especial, no Senado Federal
Destinada a lembrar os 50 anos do golpe civil e militar de 1964, nos termos do Requerimento nº 56/2014, de autoria do Senador João Capiberibe e outros Senadores.
- Autor
- Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
- Nome completo: Pedro Jorge Simon
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SISTEMA DE GOVERNO, FORÇAS ARMADAS, ESTADO DEMOCRATICO.:
- Destinada a lembrar os 50 anos do golpe civil e militar de 1964, nos termos do Requerimento nº 56/2014, de autoria do Senador João Capiberibe e outros Senadores.
- Publicação
- Publicação no DSF de 01/04/2014 - Página 9
- Assunto
- Outros > SISTEMA DE GOVERNO, FORÇAS ARMADAS, ESTADO DEMOCRATICO.
- Indexação
-
- CUMPRIMENTO, REALIZAÇÃO, SESSÃO ESPECIAL, CINQUENTENARIO, REGIME MILITAR, BRASIL, DEFESA, ANULAÇÃO, SESSÃO, CONGRESSO NACIONAL, CASSAÇÃO, MANDATO, JOÃO GOULART, PRESIDENTE, ALTERAÇÃO, HISTORIA, LIVRO DIDATICO, ENFASE, PERIGO, CRISE, DEMOCRACIA, NECESSIDADE, APOIO, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS, MELHORIA, ESTADO DEMOCRATICO.
O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Meu querido companheiro Senador João Capiberibe, feliz responsável pela realização desta reunião; querida Deputada Janete Capiberibe; prezado Líder do PSB; Sr. José Maria Rabelo; brilhante jornalista Luiz Cláudio Cunha; meu amigo, meu irmão, chefe, orientador, Ministro, líder e, hoje, Vereador Waldir Pires; Sr. Marcos Magalhães; senhoras e senhores.
A singeleza desta sessão, segunda-feira, meio-dia, não seria o que se poderia imaginar, depois de tudo o que se passou, que seria uma sessão não monstruosa, com aplausos e foguetes. Mas eu acho que é bom assim: singela, simples, mas com um enorme significado, o significado de que estamos aqui, 50 anos depois, para trazermos a nossa palavra sobre um movimento que não é a revolução de 31 de março, mas é o golpe de 1º de abril.
Eu fico impressionado como o tempo passou e quando, de repente, estamos analisando os 50 anos de um dia que parece que foi ontem, aqueles dramáticos momentos que nós vivemos neste País. De um lado, um Presidente, duas vezes eleito Vice sempre com mais votos que o Presidente, que, depois de um plebiscito, teve uma esmagadora maioria de 70 e tantos por cento favoráveis a lhe devolverem os direitos de Presidente executivo e não parlamentarista. Era um Presidente que debatia ideias, apresentava propostas.
Nós, Parlamentares, entramos aqui, adaptando as propostas que o Presidente João Goulart apresentou à Nação, no dia 13 de agosto, para ver o que o povo pensava sobre esta matéria, porque a grande verdade é que, sobre aquelas reformas de base que se defendiam, a ditadura silenciou, calou; e nenhuma proposta, nenhuma votação. Pelo contrário, algumas regrediram, mas nada aconteceu. Por outro lado, os militares.
Eu acho que nunca o Brasil teve tanta gente junto, na mesma causa. As igrejas, todas elas, invocando o santo nome de Deus, invocando a família e a democracia; a grande imprensa, na mais brutal campanha, de todos os jeitos e de todas as formas. Um massacre, quando o Brasil viveu uma triste história.
Nós votamos aqui, meu amigo Waldir, um ato que tem significado e vale para a história. Nós anulamos, no Congresso Nacional, aquela sessão que foi feita cassando o mandato do Presidente. Além de todos os fatos reais e normais da sua anulação, a realidade: não houve convocação do Congresso, não tinha presença.
Foi lida aqui - lá estavam V. Exª e o Chefe da Casa Civil, o Darcy, que mandaram a esta Casa - a comunicação oficial: o Presidente da República, neste momento, está em Porto Alegre, na casa do Ministro do Exército, que ele tinha promovido, como Comandante do Terceiro Exército, a Ministro da Guerra -, à disposição. Ou telefone para ele e, dentro de três horas, ele estará aqui.
E a triste figura do Sr. Auro de Moura Andrade não tomou conhecimento daquela declaração, não votou - não houve votação, não houve nada. Ele leu que o Presidente estava fora, declarou vaga a Presidência da República, empossou o Sr. Mazzilli e encerrou a sessão.
Aquela sessão foi anulada, não vale. E é bom que o Ministério da Educação determine a mudança nos livros de História, para que isso não apareça, porque hoje ainda está a revolução de 31 de março, que cassou o mandato do Presidente. Lá estão ainda as eleições feitas pelos generais ditadores.
Olha, você, Waldir, estava no Palácio do Planalto, a pedido do Jango, junto com o Darcy, enquanto ele ia para Porto Alegre. E eu estava lá em Porto Alegre, no aeroporto, junto com o comandante do Terceiro Exército, nomeado ministro, esperando João Goulart, vindo daqui. Foi uma longa espera, e do aeroporto fomos para a casa do comandante do Terceiro Exército.
Foi uma longa discussão. O Brizola, insistentemente, queria a resistência e que Jango o nomeasse Ministro da Fazenda. O comandante do Terceiro Exército Jango já tinha nomeado Ministro da Guerra. Foi um longo debate.
Jango, quando soube que as tropas de Mourão vinham de Juiz de Fora rumo ao Rio de Janeiro, falou com o General Kruel na expectativa de que o General Kruel, seu amigo, fosse em direção às tropas de Mourão. O General Kruel exigiu de Jango um manifesto anticomunista, contra os sindicatos e uma caça às bruxas.
E João Goulart estava ali. E disse o General Amaury que ele não podia ir, porque o movimento era imenso contra o Jango, uma generalidade de que era o comunismo, e que ele, para poder fazer alguma coisa, tinha que ter essa nota do Jango. E o Jango não deu. Jango disse: “Eu não posso passar para a história, na tentativa de permanecer, fazer um ato de traição dessa natureza.”
E disse mais, Jango. Antes, o Comandante do 3º Exército deu solidariedade total ao Presidente, estava à disposição para fazer o que o Presidente queria, mas era obrigado a informar que ele não tinha a firmeza total do 3º Exército. Havia sedições em algumas cidades do interior - e houve época em que o Rio Grande do Sul tinha metade do Exército Brasileiro. E ele dizia que, se a ordem fosse avançar, ele avançaria, mas ele tinha que reconhecer que ele não saberia como ficaria o Sul; se, ele indo, não se rebelariam no Rio Grande do Sul. Aí o Jango deu o argumento final pelo qual ele não aceitava lutar.
A informação que ele tinha é absolutamente certa, de que não só o americano estava querendo intervir e estava patrocinando, mas a frota americana, os navios já tinham saído da América Central e estavam se dirigindo ao Rio de Janeiro. O medo de Jango era de que não apenas seria a guerra civil, mas que os americanos queriam entrar no Brasil. E a ideia era que nem a Coréia do Norte, Coréia do Sul; Vietnã do Norte, Vietnã do Sul; Brasil do Norte, Brasil do Sul.
Essa foi a causa determinante de o Jango não ter resistido. Dizia ele que não tinha condições e não podia entrar em uma luta que ele sabia que era absolutamente injusta e desavisada.
O Jango estava firme, estava lúcido, estava sereno, mas se via que era um homem amargurado. Era um homem que, de certa forma, eu diria, morreu um pouco naquele momento.
Ele viveu um momento dramático. E digo mais: ele tinha vontade de avançar, tinha vontade de resistir, mas os números que lhe foram apresentados o levaram a não aceitar. E ele foi para o Uruguai.
E a história nós conhecemos.
Primeiro, quiseram dar um golpe dentro do golpe. Assumiu o Mazzilli, que nomeou o governo dele, nomeou os três ministros militares, e a vida continuou. Foi quando os que estavam preparando o golpe mesmo viram que haviam sido golpeados.
Então, no dia 1º de abril, houve um golpe do Congresso Nacional, porque foi o Congresso que fez tudo: derrubou, nomeou um presidente, e o presidente escolheu o seu Ministério.
Oito dias depois, houve uma revolução. Oito dias depois houve uma revolução no papel: ato institucional sem número, cassando, prendendo, matando, transformando o Congresso em Colégio Eleitoral e elegendo o Sr. Castelo Branco.
O resto nós conhecemos - triste história e triste memória!
Foi uma página de terror. E o americano deve isso ao mundo: foi o Brasil, foi a Argentina, foi o Chile, foi o Uruguai, foi o Cone Sul que viveu uma página dramática. Não dá para dizer que os americanos não nos ensinaram nada, nunca. Sim, eles ensinaram os brasileiros a torturar, ensinaram os brasileiros a fazer, a manter-se no ódio como o Brasil se manteve.
E a resistência foi heróica. Sim, temos de homenagear, elogiar e dar o merecimento aos homens - homens como o Valdir, como o Rabelo -, às gerações que foram cassadas, às gerações que morreram, que foram torturadas e que desapareceram; às lutas as mais variadas, das fórmulas mais diferentes, para resistir; e o mérito à capacidade do povo brasileiro.
O pior momento político da época da ditadura, quando, nas eleições, o voto em branco entrou quase que em primeiro lugar - Arena e, depois, o voto em branco. Havia uma resistência aos políticos. O povo queria: vamos para casa, fecha o Congresso; saia do Congresso - uns com luta armada; outros, guerra civil; outros, resistência aqui e acolá. O povo ser organizou.
Lembro que o povo se organizou e estabeleceu as metas: Diretas Já, fim da tortura, fim da censura, Assembleia Nacional Constituinte e anistia.
E começou, de saída, a primeira tese: Diretas Já. E aí povo se uniu, impressionantemente, em torno dessa tese e foi para as ruas. Era tudo contra: o Ato Institucional nº 5, o pior de todos. Mas deu certo. O povo foi para a rua aos poucos - meia dúzia, uma dúzia -, com medo, e aumentou, aumentou, e, quando o governo foi ver, eram milhões que estavam nas ruas. E fizemos o que parecia impossível: ganhamos no Colégio Eleitoral e restabelecemos a democracia.
Tancredo morreu. Mas, justiça seja feita, com o Sarney, aquelas normas que havíamos fixado de anistia, de diretas, de fim da tortura, de liberdade de imprensa aconteceram. E estamos no momento de hoje. Um momento importante, muito importante, mas um momento em que nós todos temos que analisar e refletir.
Estamos vivendo, desde a ditadura, o momento mais difícil na democracia brasileira, agora, um problema sério. Acho que nada poderia atingir mais o âmago do povo brasileiro do que uma crise na Petrobras.
Mas nós vamos ter que ter a capacidade e a competência de analisar, de buscar a verdade, mas manter o clima da democracia e da liberdade.
Nós temos de aproveitar, exatamente, este momento, quando do cinquentenário do golpe e dos 21 anos da democracia, nós temos de dar o máximo de nós: a oposição combatendo, criticando; o Governo defendendo. Mas tudo isso na base do debate, da discussão; nem um nem outro querendo colocar em risco a hora que estamos vivendo.
É um grande momento da responsabilidade do Congresso Nacional, e acho que, dessa vez, nós estamos preparados. Estamos preparados para continuar. Sim, continuar, melhorando um pouco esta Casa: como foi bem salientado aqui, no Ficha Limpa, que é um projeto que determina que quem é ladrão, vigarista não pode ser candidato; no Mensalão, que o Supremo tomou um novo rumo no seu futuro em relação à realidade brasileira. Nós vamos melhorar!
Sinto, nos meus 84 anos, que vivi esse tumulto, essa agitação, essa luta com homens extraordinários, os que já faleceram e os que estão aí: Dr. Ulysses, Tancredo, Teotônio - gente excepcional; outros, como o Waldir, que estão aí, continuando a caminhada.
Valeu a pena!
Sinceramente, valeu a pena!
Mas temos de nos esforçar no sentido de darmos uma esperança para o povo brasileiro, uma expectativa para a nossa mocidade. Não é possível que a esta altura estejamos pensando em nós, no nosso candidato, no nosso partido, na nossa vaga, na nossa vantagem.
Nesta altura, o debate é necessário, mas com respeito à dignidade humana, com a responsabilidade com o momento que estamos vivendo. Que seja um passo rumo à democracia, e não uma tentativa de retrocesso, essa é a maior obrigação de todos nós, a mais importante de todas.
Vamos à luta, mas vamos responder sim à democracia e à verdade!
Muito obrigado. (Palmas.)