Discurso durante a 119ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Pesar pelo falecimento de Eduardo Campos e considerações sobre sua trajetória política.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Pesar pelo falecimento de Eduardo Campos e considerações sobre sua trajetória política.
Publicação
Publicação no DSF de 14/08/2014 - Página 148
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, APRESENTAÇÃO, VOTO DE PESAR, MORTE, EDUARDO CAMPOS, EX GOVERNADOR, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), CANDIDATO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELOGIO, VIDA PUBLICA.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, hoje eu creio posso dizer que falo pelos brasileiros, que estão perplexos com as notícias. E quero dizer, Senador, que mais uma vez agosto prega uma peça com a história do Brasil.

            Daqui a sete dias, lembraremos os 60 anos da morte de Getúlio Vargas. Hoje estamos lembrando que, nove anos atrás, faleceu Miguel Arraes, o avô de Eduardo Campos, neste mesmo dia de agosto, neste mesmo 13 de agosto -Getúlio faleceu dia 20 de agosto. E outros fatos marcantes também aconteceram em agosto na história do Brasil.

            Acontece que tanto Arraes quanto Getúlio já tinham dado a contribuição que podiam para o País. Miguel Arraes tinha 88 anos, Getúlio tinha 73, já havia ficado quase 20 anos no poder. Sua morte foi inclusive o gesto que ele pôde fazer de mais significativo. Não tinha mais nada a fazer.

            Eduardo Campos estava no início do que podia fazer pelo Brasil inteiro, como ele já fez pelo meu Estado de Pernambuco. De repente, um vento de agosto apaga uma chama que tentava contaminar o Brasil com uma proposta alternativa ao modelo dos últimos 20 anos. Uma chama é apagada!

            Eduardo representava uma esperança de fazer uma virada na história de que o Brasil está precisando depois de 20 anos de um modelo que foi bom, mas se esgotou. Um modelo que a gente sabe que conseguiu combater a maldade da inflação, essa coisa trágica que o Brasil enfrentou. Vinte anos de um modelo que conseguiu consolidar a democracia, que o Brasil nem sempre conheceu. Vinte anos em que se conseguiu manter um razoável crescimento econômico. E, por último, mas não menos importante, 20 anos de um programa generoso de transferência de renda para os mais pobres, que o Brasil se negava a fazer ao longo da sua história.

            Quatro pilastras que sustentaram o modelo durante 20 anos. Mas quatro pilastras que estão em crise, enferrujaram, estão danificadas.

            Quem não vê que a inflação ameaça voltar? Quem não vê que a base de sustentação da estabilidade econômica foi ferida?

            Quem não vê que a democracia não está funcionando como deveria, no caos partidário, no oportunismo, no custo das campanhas, na falta de esperança de os jovens participarem do processo político?

            Crescimento econômico: quem não vê que, neste ano, vai ser menor, segundo os prognósticos, do que a taxa de crescimento demográfico? Isso significa que, mesmo que o País fique 0,8% mais rico, cada brasileiro vai ficar um pouquinho mais pobre, porque o crescimento da população vai ser maior do que o crescimento do PIB, coisa raríssima na história do Brasil.

            Mas igualmente grave não é a taxa de crescimento, Senador Mozarildo: é a cara do PIB. É um PIB feio, antiquado, velho. Não é o PIB novo, dos bens da alta tecnologia.

            Quem não vê, portanto, que nossas quatro pilastras estão em crise? E que Eduardo Campos representava uma alternância para frente, uma alternância inflexiva, mudando, reorientando o projeto? E, de repente, um vento de agosto apaga essa chama.

            Eduardo é aquele que tinha falado que erradicaria o analfabetismo durante seu Governo. Eduardo é quem falava que, no seu Governo, implantaria horário integral, educação, que é a base para a gente superar esse esgotamento. Eduardo Campos, junto com Marina Silva, representava a esperança de uma nova maneira de fazer política, para voltarmos a ter uma pilastra sustentável.

            Como ex-Ministro da Ciência e Tecnologia, ele falava que o modelo econômico deveria produzir bens de alta tecnologia, que este País não podia ficar para trás, nem no tamanho do PIB, nem na cara do PIB, nem na quantidade de reais que caracteriza a nossa produção, nem no tipo de produto que nós fabricamos, para mostrar ao mundo que somos capazes, sem ficarmos com os produtos antigos, Senador Raupp, que continuamos produzindo.

            Amanhã, Eduardo Campos estava programado para estar aqui em Brasília. Ele ia inaugurar o comitê que levaria o nome de Ariano Suassuna - outro que nós perdemos há poucas semanas. Nessa inauguração, para a qual eu estava convidado, eu ia ter a chance de conversar com ele sobre a proposta que eu venho fazendo, sobre como fazê-la, e não apenas conversar sobre a intenção de erradicar o analfabetismo. Como? Já se sabe como, já se sabe o quanto custa. E outra coisa a tratar seria como implantar o horário integral.

            Ia falar para ele não da ideia da federalização da educação, que pode parecer demasiado ousada para um processo eleitoral, mas da ideia, Senador Raupp - o senhor, como líder, quero chamá-lo para o meu lado -, de termos um candidato a Presidente que diga no seu programa: “Meu governo vai adotar as escolas das cidades que não tenham condições de dar uma boa educação para os seus filhos!”

            Por que deixar nas mãos dos pobres prefeitos a educação das crianças cuja prefeitura não tem dinheiro nem para pagar o piso salarial? Falta, faltava, e a minha esperança era que Eduardo ia encarnar a ideia e ia dizer bem forte: “Meu governo adotará todas as escolas das cidades cujas prefeituras não puderem manter educação de qualidade e cujo prefeito pedir” - ou seja, voluntariamente -, “no ritmo que eu decidir”. Eu o imaginava dizendo isso.

            Lamentavelmente, esse encontro não vai ser mais possível. Eu fico sem interlocutor.

            Um político se faz de duas formas, Senador Mozarildo. Uma estando na frente para levar as suas propostas, suas ideias, em uma disputa eleitoral. O destino não me permite isso. Passou meu tempo. Tentei uma vez, em 2006, e passou meu tempo. A outra forma de um político fazer política é se aliando a quem carrega a esperança que esse político quer levar para o seu País.

            Para mim, quem carregava essa esperança, o portador dessa esperança era Eduardo Campos. E hoje estamos nós aqui, para surpresa de todos, para perplexidade de todo o Brasil, para homenageá-lo! Não mais para esperá-lo, mas para homenageá-lo. Não mais o tratando como o futuro do Brasil, mas como o passado da história!

            É muito triste, mas sobretudo é muito perplexo. Deixa a gente sem saber o que fazer. É como se se puxasse o tapete onde a gente estava caminhando, e, de repente, nós perdêssemos o equilíbrio.

            Eu me sinto hoje em um processo de desequilíbrio político. Não sei quanto tempo vai durar. Espero que pouco, espero que volte rápido a chance de eu me aliar a uma alternativa que traga a esperança. E que nem o vento de agosto, nem de setembro, nem de outubro, nenhum vento apague a chama! Que essa chama sirva para orientar o futuro do Brasil.

            A bola agora, a chance agora está com aqueles que são candidatos, ou quem for candidato no lugar do Eduardo Campos - que eu espero o PSB tenha firmeza de escolher e tenha lucidez de escolher. Está com eles agora a vez, não mais com Eduardo Campos, que representava a nossa esperança.

            É com profunda tristeza que eu venho aqui falar isso. Mas tão forte quanto a tristeza é a minha perplexidade, a perda da capacidade de pensar lucidamente por algum tempo, que eu espero que seja curto, porque o Brasil continua, e a necessidade de esperança aumentou. Aumentou. A necessidade da esperança aumenta mais quando a esperança diminui. A esperança hoje diminuiu, mas a necessidade de esperança é maior ainda.

            Esperemos que nós que sobrevivemos, nós que ainda estamos aqui, nós que somos os líderes deste País saibamos enfrentar essa terrível notícia, essa terrível tragédia que se abateu sobre nós por conta de um vento de agosto, mais uma vez apagando uma chama de esperança no Brasil.

            Sr. Presidente, eu não tenho mais nada a dizer, a não ser isso, manifestando meu sentimento de pessoa que conhecia o Eduardo, que deu seu primeiro voto ao avô dele, e que tem até uma foto dele na sala, como um daqueles líderes deste País que serviram de orientação e guia para o que eu penso.

            Eu só tenho a dizer essa tristeza e manifestar a minha perplexidade diante do que está acontecendo hoje. É isso, Sr. Presidente.

            Eu não posso deixar de fazer uma pequena manifestação de solidariedade, por fora da história, para a sua família, sua esposa, seus cinco filhos, um recém-nascido, com pouquíssimos meses; sua mãe, que eu conheço também; e para todo o povo pernambucano, que teve um governo de oito anos por ele, que soube reconhecer nele o melhor governador que Pernambuco teve. Para vocês, minha simpatia; e, para o povo brasileiro, como político, eu digo minha tristeza e minha perplexidade.

            É isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/08/2014 - Página 148