Discurso durante a 131ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a baixa qualidade do ensino público brasileiro e com a falta de propostas por parte dos candidatos à Presidência da República para mudar esse quadro; e outro assunto.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, CORRUPÇÃO. EDUCAÇÃO.:
  • Preocupação com a baixa qualidade do ensino público brasileiro e com a falta de propostas por parte dos candidatos à Presidência da República para mudar esse quadro; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 10/09/2014 - Página 145
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, CORRUPÇÃO. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, ADMINISTRAÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), GOVERNO FEDERAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • CRITICA, ABANDONO, EDUCAÇÃO, BRASIL, IMPORTANCIA, FUTURO, ENFASE, REDUÇÃO, INDICE, DESENVOLVIMENTO, EDUCAÇÃO BASICA, AUSENCIA, AUMENTO, SALARIO, PROFESSOR, COMPARAÇÃO, PAIS, ANALISE, ORGANIZAÇÃO, COOPERAÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, DEMONSTRAÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, REALIDADE, ANTAGONISMO, LEGISLAÇÃO, APLICAÇÃO, ROYALTIES, PRE-SAL.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, estudantes e professoras do ensino fundamental da Escola Classe Rua do Mato, de Sobradinho, Senador Randolfe, eu quero falar aqui sobre três palavras que, aparentemente, coincidem, mas que não são iguais. O dicionário é muito rico. Cada palavra tem alguma sutileza que se diferencia das outras, mesmo quando parecem sinônimos. Eu quero falar de surpresa, espanto e escândalo.

            Nesta semana, a revista Veja publicou uma matéria, com uma capa muito enfática, que provocou espanto, mas não provocou surpresa, porque já se sabia que isso estava em andamento, já se sabia a maior parte do que foi dito pelo senhor que decidiu fazer delação premiada. Eram fatos já conhecidos, ainda que não provados - e não basta uma matéria na revista para considerar que os fatos estão comprovados. As suspeitas estão levantadas. Houve um espanto. A dimensão do que foi dito, de acordo com a revista, espantou, mas não surpreendeu.

            O que espanta, sem nos surpreender mais, é a maneira como tem sido tratada uma empresa sagrada para o Brasil como a Petrobras. Uma empresa que, ao longo dos seus 60 anos, virou um símbolo do poder e da competência do Brasil: o poder na economia e a competência técnica de explorar petróleo em lugares onde nem se via, nem se imaginava existir, e de conseguir uma empresa do tamanho que ela alcançou, das maiores de todo o mundo, com a produção e a rentabilidade que ela tem tido.

            O que nos espanta, sem nos surpreender, é como esse patrimônio histórico está hoje ameaçado. Talvez, não em sua substância mais profunda, a da infraestrutura, que é capaz de atravessar crises - e vai continuar a Petrobras -, mas, do ponto de vista da imagem que se passou dela, não por culpa dos seus 60 mil servidores, que eu imagino que tenha, mas por conta dos maus tratos, como alguns diretores fizeram com essa empresa. O que espanta é que esses maus tratos, feitos por alguns dos seus diretores, tem a ver com a maneira como o atual Governo e o anterior administram a Petrobras. O que nos espanta - no começo surpreendia, já não nos surpreende - é que o Governo foi capaz de usar a Petrobras como se fosse uma propriedade do Governo, e não da Nação brasileira; e o Governo como se fosse propriedade do Partido, e não do Estado brasileiro. O que nós vemos - e nos espanta - é o que se costuma chamar de aparelhamento da Petrobras, como o de outras instituições que ainda não estão surpreendendo pelos escândalos, mas que já se sabe que também foram aparelhadas. O que nos espanta é que hoje nós temos uma empresa sob suspeição, com diretor preso e denunciando coisas que, se forem comprovadas, como falamos aqui entre nós, como tudo indica, vai gerar uma crise profunda no processo brasileiro.

            Mas o que me espanta também é o que não espanta, Senador Randolfe. O que me espanta é que nós não nos espantamos, por exemplo, com os resultados da educação brasileira no ano de 2013. Não surpreendeu ninguém saber que o chamado Ideb - Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, ou seja, o indicador da nota... Imaginem vocês um termômetro que mede a febre. Um termômetro que indica se a escola vai bem ou mal é uma nota de zero a dez chamada Ideb. Esse é o termômetro. Diferentemente da febre, que quanto maior pior a saúde, no caso da educação, quanto maior o Ideb, melhor. Esse Ideb vai de zero a dez, como as notas dos nossos alunos, das nossas crianças.

            Pois bem, a educação brasileira está sendo reprovada, e isso não causa espanto. As denúncias sobre a Petrobras não surpreenderam, mas espantam. As notícias sobre a educação não surpreendem e nem espantam.

            As notas que eu posso dizer para vocês mostram que, no ensino médio, sobretudo, o Ideb de todas as escolas brasileiras, a média, é 3,7. Algum de vocês ficaria feliz se o filho de vocês tivesse nota 3,7? Pois essa é a nota do conjunto das crianças brasileiras. É a nota da escola que nós estamos oferecendo aos nossos brasileiros, e isso parece que não espantou o Brasil, nem surpreendeu, porque se sabe dessa realidade.

            Essa nota, 3,7, é ainda menor se a gente considera as escolas públicas estaduais e municipais, que fica em 3,4 apenas. Melhora quando se tem a escola privada, mesmo assim, ao custo altíssimo delas, é 5,4. E melhora um pouquinho mais - por isso eu defendo tanto a federalização - quando a gente considera as escolas federais de ensino médio, em que a nota vai para 5,6. Mesmo assim, passando de raspão. Nota medíocre. Não é a nota boa que se quer para um filho da gente.

            Essa é a realidade do ensino médio.

            Quando a gente vai para o ensino fundamental, que se divide em primeiros anos e, depois, anos finais, a média é 5,2, ou seja, raspando. Mesmo assim, quando a gente analisa as públicas, estaduais e municipais, a nota fica em 5,4 e 4,9. Essa é a nota da gente. É verdade que, quando olhamos as públicas federais, nos primeiros anos, a nota vai a 7, uma nota que já podemos chamar de satisfatória. Já não é mais uma nota de reprovação. Não é ainda o que a gente deveria querer, como querem, para os nossos filhos, um 8, um 9, já que 10 é tão difícil; mas é 7 e, nas particulares, 6,7. Eu lembro aqui que as públicas federais têm desempenho melhor do que a média das particulares, tão caras como elas são.

            Mas isso, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, não nos espanta. Não nos espanta que 61% dos Municípios não batem metas no fim do ensino médio, porque o Governo definiu metas, aonde nós queríamos chegar com o Ideb. Notas medíocres, notas baixas. Ninguém colocou a nota 8 como meta. Ninguém colocou 7 como meta. É uma nota vergonhosinha, ali, perto do 6, e nem assim a gente consegue chegar lá.

            Dos mais de 5 mil Municípios, apenas 2.125 conseguiram alcançar as metas que, como diz o jornal que estou vendo, já são pouco audaciosas. Eu não diria nem pouco audaciosas. Eu diria vergonhosamente medíocres! Metas vergonhosamente medíocres! E nós não as atingimos.

            Eu quero ver um Ministro, eu quero ver um Deputado, eu quero ver um Senador colocar seus filhos em escolas que tenham esse Ideb baixo. Eu desafio. Quero ver. Nós somos os responsáveis por essas escolas reprovadas, mas nós nos protegemos colocando os nossos filhos nas escolas particulares mais caras de todas, porque o Ideb vai lá para cima.

            Essa é uma das vergonhas brasileiras, e isso não espanta. Não espanta o Brasil o fato de que nós, que somos os responsáveis pela escola pública, usamos a escola privada para proteger o futuro das nossas crianças. Nem surpreende também. Ao contrário, o que causou surpresa, o que causou até risos, foi quando eu coloquei aqui um projeto de lei que diz que é falta de decoro os responsáveis pelas escolas públicas colocarem seus filhos nas escolas particulares. Ou seja, é o espanto do que deveria ser o normal. É o espanto do que deveria ser o comum, o usual, o banal. O banal é o que não espanta. Nós estamos em uma situação tão grave que não nos espantamos com aquilo que não deveria ser banal, porque virou banal.

            Mas eu disse que iria falar também de escândalos. Esse é um escândalo, o fato da nossa realidade educacional. Esse escândalo está aqui. Srs. Senadores. Aqui há uma lista de muitos países. O pior salário pago a um professor é o do Brasil. Eu não vou dizer um dos piores. É o pior aqui, em letrinha vermelha! É o pior salário de todos os países que a OCDE analisa. Claro que devem existir países africanos muito pobres, que pagam menos ainda. Claro que devem existir tribos indígenas que nem professor têm, mas, no caso do Brasil, das nações grandes, das nações com poder - e nós somos a quinta, a sexta potência econômica no mundo -, nenhuma paga tão pouco ao professor. Mas não é só isso. Quanto ao investimento de onde está professor, onde estão os custos, onde estão os funcionários, onde estão a energia elétrica e a manutenção, nós somos o penúltimo por aluno.

            Isso que não espanta - o Brasil pagar tão mal os seus professores - é o que permite que não espantem as notas ruins das nossas escolas, porque essas duas coisas se somam, essas duas coisas se complementam. Isto aqui é que explica isso, e as coisas que se explicam não espantam, não surpreendem. Está explicado, logo não há surpresa, logo não há espanto, mas está na hora de a gente se espantar com isso.

            Nós nos espantamos nesse fim de semana com as notícias da corrupção sem haver surpresa, porque já sabíamos, mas a gente não se espanta pelo fato de que a pior, a maior de todas as corrupções deste País é o abandono da educação das nossas crianças. Junto ou comparado com as consequências para o futuro do Brasil pelo fato de não educarmos bem nossas crianças, esse fato, quando comparado com o “roubinho”, entre aspas, obviamente, de R$10 bilhões da Petrobras, esses R$10 bilhões são nada diante dos trilhões que o Brasil está perdendo daqui para frente por não investir na educação das suas crianças. Dez bilhões de reais de roubo é muito dinheiro. É algo que deveria nos espantar realmente, mesmo que não surpreenda, porque já se imaginava. Mas é preciso espantar também com os trilhões que nós perdemos por não investirmos bem na educação, mas o pior é que não são só os trilhões da produção que deixa de existir porque o Brasil não é um País educado, dos trilhões que deixamos de ganhar porque o Brasil não tem competitividade com as altas tecnologias da economia dos tempos de hoje.

            Igualmente grave, ou mais grave, é a desarmonia social que o Brasil tem por não investir igualmente na educação de todas as nossas crianças. Porque até alguns já se lembram que a educação, na média, vai mal - o tal do Ideb.

            Mas, o que as pessoas não imaginam é a desigualdade: quando se diz - e eu mostrei, aqui - que o Ideb do Brasil é baixo, eu não disse que esse baixo é a média de uma desigualdade muito grande entre quem pode pagar uma escola cara e quem não pode pagar. Quando a gente vê a média das particulares, que fica em 6,7 nos anos iniciais, a gente não está vendo que, entre essas particulares, algumas são muito pobrezinhas, são baratinhas, que é para onde estão levando seus filhos as classes médias, baixas e pobres, para fugirem das greves nas escolas. Se a gente for olhar as particulares mais ricas e as particulares mais pobres, ou as federais e as escolas dos pobres, a nossa desigualdade, do Brasil, deve ser a maior - eu não disse uma das maiores, mas a maior. Por uma razão muito simples: nos países africanos, a média está lá embaixo; então, não há tanta desigualdade. Os países europeus estão lá em cima, mas já superaram a desigualdade. Nós estamos aqui e a nossa desigualdade é grande.

            E isso não nos espanta! Não nos espanta porque a gente não consegue antecipar as consequências disso daqui a dez, quinze, vinte anos. Mas não seria difícil antecipar, basta ver como é que nós estamos: a violência nas ruas; a economia que não cresce; a saúde que não funciona; a civilidade nas ruas deste País, que não é caracterizada apenas pela violência, mas pelo comportamento geral; a falta de entendimento que nós sofremos hoje. Tudo isso é resultado do que nós não fizemos vinte, trinta anos atrás, para ter as consequências agora. Imagine daqui a vinte, trinta anos.

            É fácil imaginar o futuro, Senador Randolfe, basta olhar a cara das escolas do presente: o futuro de um país tem a cara das suas escolas do presente. Olhe uma escola de hoje, pública, do povo, e você vê a cara do Brasil do futuro. E essas escolas de hoje são escolas cujos professores são os piores remunerados no mundo. Essas escolas de hoje são aquelas que têm o Fundeb, que não permite dizer que as escolas foram aprovadas. Essas escolas até visualmente são prédios degradados. São escolas violentas, como a gente tem visto nos noticiários desta semana. E a gente não se espanta.

            A gente se espanta com o roubo de R$10 bilhões da Petrobras. Isso, felizmente, nos espanta, embora não surpreenda. Mas, na educação, esse roubo muito maior, que é o roubo do futuro, a gente não se espanta. Como não estamos nos espantando, também, pelo vazio do debate dos presidenciáveis em relação à educação.

            De um lado, a candidata Dilma, que está no Governo há doze anos, coloca a educação como se fosse uma maravilha. Coloca coisas verdadeiras, que foram feitas, mas que são apenas pequenos pontos de uma realidade trágica, vergonhosa.

            E os outros até dizem que vão fazer horário integral, mas não dizem como. Não se lembram, por exemplo, que as escolas são municipais. São apenas 517, se eu não me engano, federais, das 200 mil que o Brasil tem. Como é que o Governo Federal vai implantar horário integral se as escolas são municipais? Simplesmente jogando dinheiro lá, não vão conseguir.

            É preciso algo mais radical, mais organizado, mais planejado, que eu gosto de chamar de federalização, mas que podemos chamar diferentemente, podemos chamar de adoção das escolas municipais pelo Governo Federal. A gente não vê candidatos falando isso.

            Minha sensação é que o candidato Eduardo Campos caminhava para dizer: “No meu governo, eu adotarei as escolas das cidades, cujas prefeituras não tiverem dinheiro para manter uma boa educação para suas crianças”. Por que eu imagino que ele ia dizer? Porque ele vivia dizendo que o futuro do Brasil será como nós queremos quando o filho dos pobres estudarem na mesma escola do filho dos ricos. Ele começava a dizer isso. 

            Senador, o senhor estava comigo no enterro dele. Lembra aquela faixa? Fizemos foto daquela faixa. Uma faixa, Senador Anibal, bem grande, carregada por um pessoal que tinha na camisa escrito: “Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Timbaúba”, cidade da Zona da Mata.

            Pois bem, aquela faixa dele dizia isso. Dito de outra maneira, a mesma coisa, invertendo a ordem: “Quando os filhos do pobre estudarem nas mesmas escolas dos filhos do rico, o Brasil começará a ser como nós queremos”. Ele estava dizendo isso. Não ia demorar e eu acho que ele ia dizer: Para isso as escolas têm que ser federais, porque, se deixarmos nas mãos das prefeituras, elas não têm dinheiro e são desiguais. Não há como ser igual. Eu acho que ele ia dizer: “Nós” - o governo dele - “adotaremos as escolas das cidades cujas prefeituras não tiverem recursos para dar uma educação de qualidade para suas crianças”. A gente não vê ninguém falando coisa desse tipo.

            O pior, e isto que deveria espantar: o tema da educação passou a ser vinculado ao pré-sal, Senador Randolfe, como se o futuro do Brasil fosse ser resolvido pelo pré-sal, um grande mito que estão passando para o Brasil. Veja bem: não é mito que o petróleo existe; isso é resultado de pesquisas geológicas que hoje carregam uma grande segurança. Não é mito que a Petrobras será capaz de tirar petróleo 7 mil metros abaixo do nível do mar. A Petrobras já mostrou que é competente. Não é mito, é possível que o preço do petróleo, daqui a dez, quinze, vinte anos, ainda compense os imensos gastos para tirar o petróleo daquelas profundezas. Isso não é mito.

            O que é mito é dizer que isso vai resolver o problema do Brasil, porque quem diz isso não fez as contas, comparando a dimensão de postos de petróleo com o tamanho do Brasil. Nós não somos um pequeno país do Golfo Pérsico, cujo petróleo proporcionou à população uma imensa riqueza; nós somos um país cujo PIB se mede em mais de R$4 trilhões por ano. Daqui a vinte anos, vai chegar a R$6,6 trilhões. Toda riqueza do pré-sal, que é imensa, é deste tamanhinho quando comparada com o tamanho do Brasil.

            Daqui a vinte anos, para ter uma educação razoável no Brasil, nós vamos precisar gastar R$9,5 mil por ano por aluno, mesmo levando em conta que o número de crianças vai diminuir daqui para frente no Brasil, pela mudança do perfil demográfico, nós vamos precisar de R$441 bilhões daqui a vinte anos!

            Pois bem, se tudo der certo no pré-sal, nós vamos conseguir R$35 bilhões de royalties, ou seja, 7%. E a gente diz que vai resolver a educação do Brasil com o pré-sal! Não. O pré-sal vai ajudar, mas vai ajudar com uma pequena proporção dos recursos necessários.

            Os recursos terão de vir dessa riqueza imensa que o Brasil tem na superfície, na produção que nós temos, e não dessa riqueza que é imensa, quando comparada com um país pequeno, mas reduzida, quando comparada com a nossa dimensão.

            Estão vendendo uma ilusão, e isso não espanta porque as pessoas não fazem as contas. As pessoas não fazem as contas do que significa o imenso potencial do petróleo, petróleo do pré-sal, mas não comparam com o muito mais imenso tamanho do nosso querido Brasil.

            Para nós, muito ainda é pouco, porque somos grandes demais. Estão vendendo ilusão. E a prova de que estão vendendo ilusão, Senador Randolfe, é que faz um ano hoje, Senador Randolfe, que foi sancionada a lei que destina 100% dos royalties do petróleo para saúde e educação, sendo 75% para educação e 25% para saúde.

            Sabe quanto foi colocado até hoje, desde que foi feita? R$900 milhões! Sabe quanto estava previsto? R$4,4 bilhões! O Governo não quis investir. O Governo não está cumprindo aquilo que está dizendo na televisão. Os 100% dos royalties do petróleo, ou 75% disso, não estão indo para a educação, estão ficando no Tesouro.

            Não se está cumprindo. Ou seja, está se vendendo uma ilusão sem ao menos fazer a sua parte. Se cumpríssemos, seriam R$4,5 bilhões, e colocamos R$900 milhões! Ou seja, uma proporção - eu fiz as contas - que é de apenas treze por cento do que estava previsto. Treze por cento!

            Imagine se continuar desse jeito. Daqui a vinte anos, quando deveríamos ter R$35 bilhões, colocássemos só 13%. Então, colocaríamos R$3,5 bilhões ou R$4 bilhões. E precisamos R$441 bilhões!

            E a gente diz que o pré-sal vai resolver os problemas da educação brasileira, e concentramos o debate sobre educação no pré-sal.

            Ninguém disse até aqui, os candidatos a Presidente, quanto vão pagar aos professores brasileiros. Eu não vi um dizer que, no seu governo, o salário dos professores brasileiros começará a se aproximar dos outros salários. E eu nem falo, Senador, do salário de Luxemburgo, que é um valor muito mais alto e que não se compara com a nossa realidade: um salário de US$76 mil.

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - O do Brasil é de US$10 mil, por ano, obviamente. Eu falo em se aproximar, por exemplo, ao da Hungria, ou da Estônia, ou da Polônia, ou da Grécia. Todo mundo fala na crise da Grécia, a Grécia acabou. O salário do professor na Grécia é bem maior que o do Brasil.

            Nenhum candidato a Presidente está dizendo o que vai fazer para que se pague bem aos professores e, claro, ainda menos, nenhum tem coragem de dizer que a gente vai exigir muito do professor também. Que vai criar mecanismos para que eles não precisem paralisar - greve - deixando as nossas crianças sem aulas. Por um lado, não diz quanto vai pagar e, por outro lado, não diz o que vai exigir. Ou seja, não se fala de educação, fala-se de pré-sal.

            Isso é que devia espantar a gente, mas não espanta porque ficou banal, e o que é banal não surpreende. E aí nós vivemos um momento em que a gente fica falando das coisas do dia a dia, das coisas simples, das coisas que não trazem grandes mudanças. Nós falamos do que escandaliza. Nós falamos do que surpreende. Nós falamos daquilo que espanta. Nós não falamos daquilo que é banal. E, no Brasil, a péssima educação é banal. E, no Brasil, professor ganhar pouco é banal. E por isso não espanta, por isso não surpreende, por isso os candidatos a Presidente não falam, calam-se. Ou falam genericamente que vai haver horário integral nas escolas do Brasil. Não dizem como. Não dizem quanto custa. Não dizem quanto o professor vai ganhar. Não dizem que exigência a gente vai fazer aos professores. Não dizem com que equipamentos eles vão contar para que a aula seja compatível com a realidade desse tempo, cujos alunos exigem muito mais do que quadro negro.

            Eu vim aqui pensando em falar muito pouquinho, Senadores, para falar do meu espanto diante do fato de que a corrupção mostrada nesse fim de semana não surpreendeu, já se sabia. E diante do fato que ele trouxe, pela maneira como foi divulgado, espanta o roubo de 10 bilhões, enquanto, no Brasil, pela banalização da nossa tragédia educacional, nós não nos surpreendemos mais, e os nossos candidatos a Presidente não estão nem aí para propor uma mudança, uma revolução, uma transformação social por meio da educação.

            É uma pena que o espanto que, felizmente, a gente sente com a corrupção no comportamento de políticos e dirigentes de empresas não chegue à corrupção nas prioridades, como nós definimos os investimentos de hoje para mudar o futuro do Brasil. Nós não nos surpreendemos, nós banalizamos a tragédia da educação.

            Eu lamento muito que, faltando apenas um mês para o primeiro turno, ainda não se viu um candidato ou uma candidata que traga uma mensagem nova, de esperança para o futuro do Brasil, graças à educação das nossas crianças. É uma pena, mas ainda temos um mês. Esperemos que, neste um mês, surja uma proposta capaz de mudar o discurso dos candidatos. Quem sabe, aí, teremos um espanto positivo que, na verdade, já que estamos falando de dicionário, a palavra boa é...

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... deslumbramento. Deslumbramento é o espanto bonito com as coisas belas, com as coisas boas. Quem sabe ainda não há tempo para nos deslumbrarmos com os discursos dos candidatos a Presidente? Esperemos.

            Era isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/09/2014 - Página 145