Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre os recentes desdobramentos da “Operação Lava Jato” em que os nomes de dezenas de políticos foram enviados ao STF a fim de serem investigados; e outro assunto.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Reflexões sobre os recentes desdobramentos da “Operação Lava Jato” em que os nomes de dezenas de políticos foram enviados ao STF a fim de serem investigados; e outro assunto.
Aparteantes
Omar Aziz.
Publicação
Publicação no DSF de 13/03/2015 - Página 175
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEMONSTRAÇÃO, APREENSÃO, MOTIVO, CRESCIMENTO, NUMERO, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL, COMENTARIO, OPERAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, HIPOTESE, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, minha obrigação como Líder do Partido Socialista Brasileiro, do PSB, no Senado é expressar o pensamento da Bancada por consenso ou por maioria. No entanto, como Senador, tenho me perguntado, desde sexta-feira passada: “Será que estamos vivendo uma fase de cleptocracia?”.

            Desculpem a palavra, mas não encontrei outra para expressar, para resumir esta fase da vida pública nacional. Mas eu explico: a fase cleptocrática de um Estado acontece quando a maior parte do sistema público é capturada pela corrupção política, institucionalizando-a.

            Na sexta-feira passada, mais de duas dezenas de inquéritos foram abertos no âmbito da Operação Lava Jato, que atinge a Petrobras, envolvendo mais de cinco dezenas de políticos de grande importância em nosso País.

            Não quero crer que estejamos vivendo uma cleptocracia, mas sim um Estado dominado pelo patrimonialismo, clientelismo, parasitismo, fisiologismo e corrupção, que vem desde os tempos de Cabral.

            E aqui lembro da carta de Pero Vaz de Caminha a Dom Manuel, O Venturoso, em que ele descreve o Brasil que encontrou no século XVI e, no final da carta, Sr. Presidente, ele pede um emprego para o genro. Daí nasce o Brasil que atravessou os tempos.

            O aprofundamento das investigações, no caso da Petrobras, servirá para apurar quem são os cleptocratas do nosso País. Estima o Ministro Cid Gomes, em declaração pública, que esteja em torno de uns 400 Deputados, que, ainda, segundo Cid, querem um governo frágil para achacá-lo.

            As declarações de Cid Gomes ecoam outra, pronunciada tempos atrás, em 1993, que ficou famosa, abre aspas: “Há no Congresso uma minoria que se preocupa e trabalha pelo País, mas há uma maioria de uns 300 picaretas que defendem apenas seus interesses”, fecha aspas.

            Eleito Presidente, Lula, em nome da governabilidade, formou um governo de coalizão, abrindo a porteira para o patrimonialismo, o clientelismo, o parasitismo, o fisiologismo e a corrupção, infelizmente. Uma repetição do que disse um outro Presidente. O Presidente Fernando Henrique Cardoso, em uma de suas entrevistas, disse: “Esqueçam o que eu escrever”. É o que Lula fez: “Esqueça o que eu disse”.

            A corrupção da Lava Jato se alinha historicamente à nossa origem no patrimonialismo ibérico. E nós conhecemos muito bem da chegada da Família Real no Brasil, que desalojou pessoas, no Rio de Janeiro, do dia para a noite, para que ocupasse suas casas. Mas se acentua depois da redemocratização. Nós tivemos muitos acertos. A democracia fez um bem enorme ao nosso País, mas tivemos também erros graves, entre eles é que no processo de redemocratização tivemos graves erros, e estamos pagando por isso.

            Esta crise tem haver com os erros que cometemos. O uso abusivo da propaganda eleitoral elevou a um custo estratosférico as campanhas. O maior custo da campanha hoje é a contratação dos marqueteiros e de todo o aparato para a produção de programas de rádio e televisão.

            Ora, se a campanha é cara, ela exige muito mais dinheiro. E é ai que entram em ação os financiadores empresariais de campanha, que superfaturam obras, serviços e compras para saciar a sede dos candidatos em troca de reciprocidade. É o famoso dito de São Francisco de Assis: “É dando que se recebe”, popularizado pelo toma lá da cá. As empresas só contribuem se tiverem a certeza de que não estão colocando a mão no bolso, mas usando dinheiro público através de superfaturamento.

            Aqui se impõe uma pergunta: é o empresário que corrompe o agente público ou é este que achaca o empresário? Se o objetivo das empresas é o lucro, por que reparti-lo com agentes públicos? É ai que entra o superfaturamento, cujo produto final serve para o financiamento de partidos e políticos. A Operação Lava Jato tem sido didática neste ponto, mostrando que todo o dinheiro repassado é fruto de superfaturamento. A lista dos políticos envolvidos na Operação Lava Jato não será a primeira e nem a última. Pelo visto, outros virão.

            Explica-se: essa fornada é baseada nas delações premiadas do doleiro Alberto Youssef e do ex-Diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa. Novos nomes de políticos podem surgir e serão submetidos ao Supremo Tribunal Federal no decorrer das demais delações premiadas da Lava Jato. Fala-se em pelo menos mais oito ou dez delações premiadas. E como estão vinculadas ao superfaturamento de serviços e obras para a Petrobras, então, nós teremos uma segunda fornada.

            O Sr. Omar Aziz (Bloco Maioria/PSD - AM) - V. Exª me concede um aparte?

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Pois não, Senador.

            Nós teremos uma segunda fornada de nomes de políticos vinculados a essas ações criminosas trazidas a público pela Operação Lava Jato.

            Senador Omar, com muito prazer.

            O Sr. Omar Aziz (Bloco Maioria/PSD - AM) - Eu já vi vários Parlamentares no Congresso se manifestarem sobre essa questão. V. Exª faz um apanhado com muita cautela, com muito cuidado, mas indo a fundo sobre uma questão que me preocupa. Quem financia as campanhas no Brasil são as grandes empreiteiras. De todos os partidos, à exceção de um ou de outro. Se formos pegar, nos diretórios nacionais dos partidos, veremos que todos os partidos, inclusive o meu, recebem doações dessas empreiteiras. Agora, nesse momento, não dá para dizer: “Olha, esse dinheiro aqui é honesto e esse não é honesto”. Não podemos dizer isso. Estão todos sob suspeita, independentemente de partido político. O dinheiro que uma empreiteira envolvida no petrolão, na Operação Lava Jato, deu a um partido, quem disse que o mesmo dinheiro da Petrobras não foi para outro partido? Quem pode nos garantir isso? Quem pode dizer: “Não, esse dinheiro foi honestamente ganho e esse outro não foi honestamente ganho”? Eles são bondosos conosco, Senador! As empreiteiras dão muito dinheiro para as campanhas, mas não as vejo ajudarem uma entidade filantrópica neste País. Se elas fossem dar dinheiro a uma Apae no Sergipe ou no Amapá... Será que essas grandes empreiteiras doaram algum recurso à Apae do Amapá? Não acredito. Lá no Amazonas com certeza não. Mas eles nos acham tão bonitos que nos dão dinheiro, para os partidos políticos. E aqui não há de tirar ninguém. Nós temos que investigar mesmo. Por isso que esse sistema de financiamento de campanha que existe hoje induz à corrupção. Quem tem mais dinheiro tem mais facilidade de ganhar. Por isso, para tratarmos de operações, de investigações, temos que fazer o dever de casa, temos que fazer a reforma política. Reforma política! Não adianta discutirmos aqui depois que as coisas acontecem. Temos que nos antecipar. Nós temos que dar o exemplo e dizer: “A partir de agora, a empreiteira que der dinheiro a um político, saberemos que ela está querendo obter benefícios”. Porque, ao fazer a indicação do partido, indica por quê? Será que a Presidenta da República não tem capacidade de escolher seus assessores, seus técnicos, seus diretores? É necessário um partido indicar para fazer parte de uma coalizão? Não vejo necessidade. Eu - daqui a pouco, vou falar - estive com o Ministro da Indústria e do Comércio, e é preocupante a economia do Brasil. E nós passamos, ontem, mais de 12 horas em uma sessão do Congresso. Depois de 12 horas, eu vi o esforço dos Parlamentares, mas o que nós contribuímos para o País, realmente, de fato, passando 12, 13, 14 horas dentro do Congresso debatendo? O que o povo brasileiro tirou de proveito daquilo, ganhou com aquilo? Melhorou a vida dos brasileiros com aquilo? Então, nós temos que repensar, sim, mas não é repensar a investigação só, agora, não. Quando eu falo sob suspeita, falo de todos os partidos e não de A, B, ou C, não. Qualquer partido que recebeu recursos das empresas que estão sendo acusadas agora nessa Operação Lava Jato, para mim, está sob suspeita, porque não é possível que um partido receba R$60 milhões, R$70 milhões de uma empreiteira ou de várias empreiteiras - o outro, também, R$60 milhões - e distribua esse dinheiro por diretórios regionais para ganhar eleição. É por isso que os partidos fazem o maior número de Deputados, o maior número de Deputados Federais, de Senadores. Eles se fortalecem com o quê? Com recursos públicos! Tirando dinheiro do povo brasileiro! Aí o partido fica grande! Então, vamos mudar. Por isso, quando defendo “não às coligações”, quando defendo que quem tem mais voto é que deve ser eleito, é para que se dê igualdade de disputa. Fazendo parte de uma coligação que tenha as benesses dessas grandes empreiteiras, é muito mais fácil disputar uma eleição contra uma coligação que não tem recurso nenhum para disputar igualmente uma eleição. É isso que eu queria colocar, meu querido Capiberibe, Senador do Amapá.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Muito obrigado, Senador Omar. Eu queria acrescentar às suas palavras que nós perdemos as eleições no Amapá por uma única e simples razão: o Governador não se aceitou se submeter a esse tipo de negociata para levantar fundos de campanha. É evidente que, em um Estado pequeno como o Amapá, se o Governador tivesse aceitado, ele teria arrecadado entre R$15 milhões e R$20 milhões. Com isso, dava para ganhar a eleição no primeiro turno ou no segundo turno, mas ele se recusou terminantemente. E eu liguei ontem para ele para parabenizá-lo, porque essa atitude, que não o reconheceu na eleição do ano passado, vai garantir o seu legado para muitos anos naquele Estado.

            A Operação Lava Jato - eu vou entrar aqui num outro tema, Senador Omar - segue os passos do mensalão, que pela primeira vez encarcerou corruptos e corruptores. As condenações de empresários e dirigentes de estatais, no caso do mensalão, pelo visto serviram de exemplo. Estou convencido do que estou falando. Daí a grande quantidade de delações premiadas, o que nós não houve no mensalão, em que os empresários se mantiveram fechados. É que os depoentes da Lava Jato não querem ter penas semelhantes às dos empresários condenados no mensalão. Vale lembrar que as penas dos empresários estão sendo cumpridas em regime fechado, enquanto todos os agentes públicos cumprem a pena em regime semiaberto.

            Não podemos transformar uma ação policial em ação política e muito menos deixar que haja uma polarização entre situação e oposição em relação à Lava Jato. Quem investiga é a Polícia Federal. Portanto, não é que alguém tenha colocado o nome de A, B, ou C ou tenha tirado o nome de E, J ou Y. Não é possível. Senão, seria a podridão das nossas instituições. Trata-se, de fato, de uma questão policial. Ela, portanto, assim deve ser tratada. Os suspeitos estão sendo investigados no inquérito policial, no enorme inquérito policial, mas não estão ainda sendo processados e podem nem vir a ser, desde que inocentados. Dito isso, vale lembrar que o inquérito policial não é processo. O que ocorre a partir de agora é um procedimento de natureza administrativa, para que o Ministério Público possa formar sua opinião sobre os investigados.

            Ademais, vale recordar que a abertura de inquérito não representa juízo antecipado sobre autoria - isso, do ponto de vista legal, mas, do ponto de vista político, já é uma condenação - tampouco é uma comprovação de materialidade do delito, mormente quando fundada em depoimentos colhidos em delação premiada. Tais depoimentos não constituem por si só meios de prova. Portanto, caldo de galinha e cautela, neste momento, são fundamentais!

            Por isso, vale sugerir aos investigados com assento no Congresso Nacional ou em outros organismos governamentais que se licenciem dos cargos até o final das investigações. Acho que seria uma atitude sensata e prudente. Isso é importante para a lisura dos procedimentos investigativos, pois elimina qualquer indício de que os suspeitos possam estar se locupletando dos mandatos em prol de suas defesas. Em sábia decisão...

(Soa a campainha.)

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - ... o Ministro Teori Zavascki acatou solicitação do Procurador Rodrigo Janot e colocou um fim ao sigilo dos procedimentos judiciais da Operação Lava Jato. Enfim, está tudo transparente. A imprensa, que sempre cobrou a transparência na Administração Pública sob a alegação de que o que é público precisa ser transparente, terá agora a oportunidade de mostrar legalmente o que antes fazia através de vazamentos do sigilo, que, às vezes, tinha objetivos escusos. Com a transparência, fica mais fácil o controle social, o que fará com que a sociedade possa cobrar mais agilidade no processo de investigação. Com a transparência, fica mais fácil e mais visível, as pessoas podem acompanhar. Eu mesmo estou levantando os depoimentos de Alberto Youssef, que são quase uma centena - não sei se terei tempo suficiente, mas farei uma leitura desses depoimentos -, para tentar entender de fato a dimensão desse saque feito à Petrobras.

            Não vale aqui dizer que há uma tentativa de desestatização ou de privatização da Petrobras, até porque - sou Senador e participo de todas as atividades - não há lobby nesse sentido, não há lobby no sentido de mudança do sistema de partilha, tampouco.

            O volume de recursos desviados que o Ministério Público e a Polícia Federal calculam está na ordem de R$10 bilhões. Quando um dos participantes, como é o caso do Sr. Barusco, assume a responsabilidade de devolver US$300 milhões e...

(Soa a campainha.)

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - ... já devolveu US$128 milhões, é possível, sim, acreditar que o saque à Petrobras vai acima de R$10 bilhões, o que é uma fortuna.

            Nós temos que ter cuidado. É um momento de crise? Sim. Nós sabemos que há uma crise, mas nós não podemos debitar nas costas dos mais humildes, do povo trabalhador o pagamento por mais uma crise que o País está sofrendo. Há alternativas que precisam ser rapidamente estudadas e propostas. Eu digo que só de contrabando o País perde R$100 bilhões por ano. Vamos aprimorar os mecanismos de controle para que possamos coibir e fazer com que esse recurso seja distribuído com o conjunto da sociedade brasileira.

(Interrupção do som.)

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Mais uma vez, minha solidariedade ao povo do Acre pelos (Fora do microfone.) transtornos que as chuvas estão causando a todo aquele povo ordeiro, tranquilo e fantástico que eu conheço muito bem.

            Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/03/2015 - Página 175