Pela Liderança durante a 40ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da biodiversidade e do desenvolvimento sustentável como diretrizes para o debate sobre o Projeto de Lei da Câmara nº 2/2015, Marco Regulatório da Biodiversidade.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
MEIO AMBIENTE:
  • Defesa da biodiversidade e do desenvolvimento sustentável como diretrizes para o debate sobre o Projeto de Lei da Câmara nº 2/2015, Marco Regulatório da Biodiversidade.
MEIO AMBIENTE:
MEIO AMBIENTE:
Publicação
Publicação no DSF de 31/03/2015 - Página 34
Assunto
Outros > MEIO AMBIENTE
Indexação
  • REGISTRO, ATUAÇÃO, ORADOR, REFERENCIA, LUTA, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, PROTEÇÃO, BIODIVERSIDADE, MOTIVO, NECESSIDADE, EQUILIBRIO ECOLOGICO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO.
  • REGISTRO, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, CAMARA DOS DEPUTADOS, ASSUNTO, CRIAÇÃO, MARCO REGULATORIO, BIODIVERSIDADE, COMENTARIO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, TEXTO, MOTIVO, POSSIBILIDADE, AMEAÇA, MEIO AMBIENTE, DOCUMENTO ORIGINAL.
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, OBJETIVO, ALTERAÇÃO, TEXTO, MARCO REGULATORIO, BIODIVERSIDADE.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, pouco tempo antes de ser assassinado, Chico Mendes, o patrono do meio ambiente brasileiro, andando pela floresta do Acre, para em frente a uma árvore de copaíba e explica ao meu amigo Elson Martins, que o acompanhava - abro aspas:

Veja isso aqui. Para o que não a conhecem, trata-se de mais uma árvore a ser abatida em benefício da indústria madeireira. Mas, para quem pensa de outro jeito, essa árvore pode oferecer muitos empregos, basta extrair sua seiva sem derrubá-la. Claro! Pense num bálsamo poderoso! Plantas iguais a essa existem às centenas nessas matas, várias certamente terão, um dia, grande importância industrial, médica ou nutricional, só precisamos estudá-las. É por isso que luto para não permitir a destruição da floresta, sem que se saiba o tamanho da riqueza que nela existe.

            Fecho aspas.

            Esse foi o comentário de Chico Mendes ao meu amigo Elson Martins, jornalista acriano.

            Esse alerta de Chico Mendes tornou-se um norte para este amazônida, que viu na sustentabilidade e na biodiversidade uma saída para transformar o jovem Estado do Amapá.

            No final de 1992, concluí o mandato de Prefeito de Macapá.

            Durante dois anos, preguei pelo Amapá a importância da biodiversidade e do desenvolvimento sustentável. Pelos rincões do Amapá, falava que a política, a economia e a ecologia deveriam caminhar obrigatoriamente juntas.

            Didaticamente, ensinava que o ambiente podia e devia ser aproveitado em benefício das populações que nele habitam, mas tendo o cuidado necessário para não causar os estragos irreparáveis do modelo vigente de produção e consumo capitalista.

            Foi então que, juntando o legado de Chico Mendes, a Carta da Terra, a Agenda 21 e os documentos resultantes da ECO 92, foi formado um grupo de reflexão que reuniu os ingredientes para pensar um programa de governo baseado na biodiversidade e na sustentabilidade.

            Assim nasceu o Programa de Desenvolvimento Sustentável do Amapá, com ênfase na biodiversidade.

            Em paralelo, continuamos a nossa caminhada.

            Lembro que, em visita aos ribeirinhos do Rio Iratapuru, que sobreviviam do extrativismo da castanha, conheci um menino e disse-lhe que sua vida iria melhorar no futuro, pois iríamos libertar o seu pai da tutela do barracão, onde ele e os outros castanheiros trocavam 100 litros de castanha por uma lata de leite em pó de 454 gramas.

            A ousadia do PDSA (Programa de Desenvolvimento Sustentável do Amapá) venceu a política patrimonialista.

            Em 1º de janeiro de 1995, tomei posse como Governador do Amapá.

            Como Governador, voltei ao Iratapuru para reafirmar a promessa de transformação da vida daqueles extrativistas. O menino estava lá, atento às falas.

            Em 10 de dezembro de 1997, sancionei a Lei nº 388, de autoria da Deputada Estadual Janete Capiberibe, dispondo sobre os instrumentos de controle e acesso à biodiversidade do Estado do Amapá.

            Tive a honra de apor minha assinatura na primeira lei de biodiversidade do País, considerada como um verdadeiro marco na história da defesa ambiental, pois até a data da sanção inexistia uma lei similar no Brasil.

            Em seguida, com 806.184 hectares, foi criada, por meio da Lei Estadual nº 392, de 11 de dezembro de 1997, um dia após a sanção da Lei da Biodiversidade, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Iratapuru.

            A reserva se situa nos Municípios de Laranjal do Jari, Mazagão e Pedra Branca do Amapari. Ela promove a conservação e o uso sustentável da rica biodiversidade de que é guardiã. A reserva possui como limites a Terra Indígena Waiãpi, ao Norte; o curso do Rio Jari, a Oeste, e parte da Estação Ecológica do Jari, ao Sul.

            A próxima etapa e a mais difícil era regulamentar a Lei nº 388/97, um árduo trabalho, que durou um ano e meio.

            Finalmente, em 25 de junho de 1999, assinei o Decreto 1.624/99, regulamentando a Lei nº 388/97, dispondo sobre os instrumentos de controle e acesso à biodiversidade do Estado do Amapá.

            A castanha da Amazônia, Castanha do Brasil, por exemplo, um produto não madeireiro da floresta, ganhou uma política pública específica.

            Organizados em cooperativas, com assistência técnica e crédito, os castanheiros passaram a industrializar e comercializar sua produção, colocando no mercado produtos de maior valor agregado, como a castanha e a amêndoa seca embalada a vácuo, o azeite fino de mesa, a farinha e o biscoito de castanha.

            O mesmo aconteceu com o açaí, que há 20 anos era absolutamente desconhecido do resto do País. Em vez da exploração predatória do palmito, o que estava destruindo os açaizais, o Governo estimulou a pesquisa, o manejo e a comercialização da polpa, que passou a ser exportada para todo o Brasil e para o exterior. Hoje, o açaí é o segundo item na pauta de exportação do Amapá, e nós fomos o primeiro Estado a financiar o manejo do açaizal.

            No caso da castanha, a Cooperativa Mista dos Produtores e Extrativistas do Rio Iratapuru, que têm na coleta e processamento da castanha sua principal atividade econômica, iniciou, em 2000, um relacionamento comercial com a Natura. As castanhas que abastecem a linha da empresa Natura denominada Ekos, voltada à sustentabilidade e carro-chefe da empresa de cosméticos, são colhidas nos castanhais da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Iratapuru.

            Em 22 de julho de 2004, formalizou-se o primeiro contrato de acesso de utilização do patrimônio genético e repartição de benefícios, tendo como contratantes a empresa Natura e a cooperativa de castanheiros do Rio Iratapuru, para obtenção de autorização de acesso ao patrimônio genético do Estado, a saber, Protium pallidum, também conhecido como breu-branco, para fins de bioprospecção e desenvolvimento tecnológico.

            Pelo contrato, a Comaru, a cooperativa dos castanheiros do Iratapuru, recebe 0,5% da receita líquida aferida pelas vendas dos produtos que contenham a resina do breu-branco, pelo período em que ocorreu seu fornecimento pela comunidade.

            Hoje, o presidente da cooperativa é aquele menino a quem prometi um futuro melhor. Aliás, Eudimar Viana, o menino em tela, foi um dos que assinaram o contrato com a Natura.

            Para nós, partidários e defensores da ideia do desenvolvimento aliado à sustentabilidade, é fundamental provar que, mesmo neste mundo globalizado, é possível se alcançar o desenvolvimento econômico que também garanta a equidade social, a preservação ambiental, a descentralização política, a participação popular e o respeito às diferenças étnicas e culturais.

            Essa narrativa que fiz até aqui é a de um militante político e a de um gestor público que respeita a sustentabilidade, a biodiversidade e, sobretudo, o convívio com as diferenças, o que é essencial à democracia, e, por conta disso, tem o dever de alertar o Senado para a tramitação do PLC 2, de 2015, conhecido como Marco Regulatório da Biodiversidade, pela Câmara.

            Esse PLC veio da Câmara dos Deputados com inúmeros equívocos graves, que colocavam o Brasil na iminência de um forte retrocesso na área ambiental, em relação às regras e aos mecanismos de acesso ao conhecimento tradicional, associado ao Patrimônio Genético Nacional.

            Caso aquele texto original do PLC 2 prosperasse no Senado, o patrimônio e o conhecimento estariam sendo profundamente ameaçados pelo Poder Executivo e pelo Congresso Nacional.

            Aliás, a gente precisa esclarecer que o poder não está concentrado no Presidente da República. O poder, no Brasil, é um misto de presidencialismo e parlamentarismo. O Congresso tem um enorme poder no Brasil. Tem tanto poder, Sr. Presidente, que atrasa a aprovação do Orçamento, e sem Orçamento não se faz política. O Orçamento é a peça essencial da política, e o Congresso só aprovou o Orçamento agora, no mês de março, em meados de março, quase três meses depois do início do ano fiscal. Então, o Congresso divide o poder com a Presidência da República.

            Felizmente, as entidades de movimentos sociais e ambientalistas, comunidades tradicionais, povos indígenas e instituições de pesquisa perceberam o risco a que o projeto submetia o Brasil e fizeram uma série de considerações ao Relator da matéria, o eminente Senador Jorge Viana, que acatou várias mudanças sugeridas. Extremamente habilidoso, o Senador Jorge Viana conversou com todos, dos indígenas até os grandes empresários, para chegar a um relatório de consenso, que foi aprovado na Comissão de Meio Ambiente.

            Eu também recebi diversas lideranças que me solicitaram apresentar um substitutivo ao PLC nº 2, incorporando suas mudanças. Dessa forma, apresentei o PLS nº 29, que teve alguns pontos incorporados pelo Relator Jorge Viana. Nossa missão agora é acompanhar a votação da matéria, no plenário do Senado, para que não haja retrocessos em relação ao texto aprovado na Comissão de Meio Ambiente. Tudo indica que vamos votar, amanhã, o Marco da Biodiversidade, e eu peço aos meus pares, os Srs. Senadores e as Srªs Senadoras, que aprovemos o relatório do Senador Jorge Viana tal qual foi aprovado na Comissão de Meio Ambiente.

            Depois de amanhã, promoveremos aqui, no Senado, no Interlegis, um seminário sobre o Marco Legal da Biodiversidade, reunindo todos os atores sociais envolvidos no tema - Poder Público, sociedade e setor privado -, buscando a consolidação de uma boa legislação sobre esse tema fundamental para o desenvolvimento da ciência, da pesquisa e também da indústria, da produção de inúmeros produtos de consumo originários da biodiversidade brasileira. O Brasil não pode abrir mão de sua principal vantagem comparativa no mundo, que é a sua biodiversidade e o conhecimento sobre ela, exatamente o que temos pouco.

            Enfim, tenho uma vida em defesa da biodiversidade e do que é correto, na Amazônia e no Brasil, e continuarei dedicando essa história ao atendimento dos povos indígenas e comunidades tradicionais e ao desenvolvimento da pesquisa científica aplicada, usando a biodiversidade com responsabilidade e repartindo, obrigatoriamente, os benefícios gerados pelo acesso aos recursos genéticos associados ao conhecimento tradicional.

            Acredito que o PLC nº 2, ao incorporar muitas das mudanças reivindicadas pelas comunidades - sem prejudicar a pesquisa e a indústria - muitas delas apresentadas por mim no PLS nº 29, que apresentei a pedido de organizações da sociedade civil, pode contribuir bastante para o bem do Brasil e para a solução dos principais problemas desta matéria. Tenho certeza de que o bom senso prevalecerá.

            Nós estamos colocando a nossa experiência pioneira na construção de uma sociedade sustentável, a serviço e em apoio desse relatório do Senador Jorge Viana.

            E por último, Sr. Presidente, amanhã nós teremos uma audiência pública, na Comissão de Direitos Humanos, chamada “Ditadura Jamais”, onde nós vamos debater os 51 anos da passagem da ditadura civil militar de 1964. E convidamos para essa audiência pública o professor e escritor Cid Benjamin; Dulce Pandolfi; Domingos Leonelli, ex-Deputado Federal constituinte; Deputado Chico Alencar; jornalista Luiz Cláudio Cunha; e a Deputada Federal Janete Capiberibe.

            No dia 1º de abril, nós vamos realizar o seminário Marco Legal sobre a Biodiversidade, lá no Interlegis. Amanhã começa às 9h lá na Comissão de Direitos Humanos. E, no dia 1º, o seminário vai das 9h até as 16h, e eu quero convidar os Srs. e Srªs Senadores para participar dos dois eventos: “Ditadura Jamais”, na Comissão de Direitos Humanos, amanhã, e, também, a discussão sobre o marco legal da biodiversidade, em que nós vamos debater, mais profundamente, com uma diversidade de atores, toda a questão envolvendo esse projeto de lei que nós devemos aprovar, ainda amanhã aqui, no plenário do Senado, para voltar para a Câmara.

            Espero que a Câmara acate as mudanças propostas pelo Relator e pelo Senado da República.

            Muito Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/03/2015 - Página 34