Discurso durante a 60ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Destaque aos quinze anos de vigência da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Autor
José Agripino (DEM - Democratas/RN)
Nome completo: José Agripino Maia
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Destaque aos quinze anos de vigência da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Publicação
Publicação no DSF de 05/05/2015 - Página 236
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • REGISTRO, COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO, VIGENCIA, LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL, CRITICA, AUSENCIA, LEGISLAÇÃO, DISPOSITIVOS, SANÇÃO, SITUAÇÃO, EXCESSO, ENDIVIDAMENTO, UNIÃO FEDERAL, ENFASE, FALTA, APRESENTAÇÃO, RELATORIO, OBJETIVO, REGIME FISCAL, CONTROLE, RECEITA, DESPESA, DIVIDA PUBLICA.

O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Oposição/DEM - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do ora-

dor) - Obrigado, Sr. Presidente.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, eu quero fazer uma avaliação sobre um tema que já foi abordado aqui pelo Senador Romero Jucá e, agora, recentemente, pelo Senador Wellington.

    Eu reputo o assunto da maior importância, que é o balanço desses quinze anos de vigência da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), a Lei Complementar nº 101/2000.

    Eu quero fazer o registro, Presidente, Senador José Medeiros, de que eu presidia a Comissão de Constitui- ção e Justiça naquela época, quando a discussão da Lei de Responsabilidade Fiscal se processava. Era Ministro do Planejamento o Dr. Martus Tavares, um brasileiro de muito boa qualidade, que lamentavelmente deixou o serviço público e, hoje, se dedica à atividade privada. Mas prestou grandes serviços ao Brasil quando exerceu funções públicas, principalmente quando Fernando Henrique foi Presidente da República, e ele exerceu a fun- ção ou o cargo de Ministro do Planejamento.

    O idealizador da Lei de Responsabilidade Fiscal - é preciso que se faça aqui o devido registro - foi o Dr. Martus Tavares, o Ministro Martus Tavares, que lutou durante meses, semana a semana, pelo andamento, pelos ajustes, pelas correções e pela formulação da Lei de Responsabilidade Fiscal.

    Presidente José Medeiros, eu fui prefeito, fui governador e sei por experiência vivida que o administra- dor público passa por muitas provocações. Se é da índole do administrador a prática da correção, talvez nem houvesse necessidade da LRF. Mas em cada cabeça uma sentença. Existem gestores corretos e gestores que são meio estroinas e que não são exatamente corretos no trato do recurso público. E a Lei de Responsabilidade Fiscal foi feita para colocar ordem numa desordem que estava posta e que tinha escalada ascendente.

    O que significa a Lei de Responsabilidade Fiscal? A moralização da atividade e das gestões públicas. É a normatização. Fazendo o quê? Por exemplo, limitando os gastos com pessoal - 50% da receita corrente lí- quida para a União, 60% para Estados e Municípios, da receita corrente líquida. Passou disso, vem sanção, e as sanções estão previstas na lei.

As sanções são para as unidades federadas, que, se ultrapassarem esses limites, perdem a condição de receber as transferências correntes ou fazer convênios com quem quer que seja. Antes da LRF, você podia che- gar a limites inimagináveis de comprometimento da receita corrente líquida com pagamento de pessoal e deixava a maioria da população entregue à inexistência de recursos para fazer investimento na educação, na

saúde, na infraestrutura, na assistência social. Quem era prejudicada era a população.

    Daí a LRF, que veio disciplinar o comprometimento de gastos com pessoal na Administração Pública, porque existe muito gestor - tanto existia como existe - que adora dar emprego. Eu gosto. Agora, dar emprego quando pode pagar, quando há recurso público e necessidade de serviço para que o emprego seja oferecido.

    Essa matéria foi disciplinada pela LRF, e o gestor público que atravessasse ou que ultrapassasse - no caso da União, 50%; no caso dos Estados e Municípios, 70% - ficava sujeito à perda do cargo, à inabilitação para o emprego público, à multa e até à prisão. Os Estados e Municípios que transgredissem a Lei de Responsabilidade Fiscal ficavam impedidos de receber transferências voluntárias da União e de contratar operações de crédito. Isso vem vigorando para Estados e Municípios religiosamente.

    Outra coisa: era muito comum administrador público, prefeito, governador, que, no último ano da ad- ministração do seu mandato, exorbitava nas operações de crédito, fazia as famosas AROs (Antecipações de Receitas Orçamentárias) e deixava a conta para ser paga por uma administração inteira a seguir. Isso, pela LRF, ficou disciplinado e proibido. O gestor público, no último ano do seu mandato, o que tomar de compromisso, tem que pagar até o último dia do seu mandato, sob pena de, se for o caso, ir até para a cadeia. Isso é um dos pontos da Lei de Responsabilidade Fiscal.

    Na questão da gestão, eu me lembro muito bem, Martus Tavares se batia muito pela qualidade da gestão, obrigando os administradores - e isso está no texto da lei - a divulgar relatórios e demonstrativos dos gastos, é a famosa transparência, bem como a incluir no orçamento o chamado anexo de metas fiscais, com as metas de receitas, despesas, resultados nominal e primário, o montante da dívida pública e outros dados essenciais ao planejamento financeiro eficaz, ou seja, prefeitos e governadores são obrigados a fazer o relatório, as metas. E tudo isso é feito, e quem não faz se submete à sanção.

    Apenas a União não faz. E porque não faz é que nós estamos pagando o preço que estamos pagando. Os Estados colocam nos seus orçamentos as suas previsões de quanto vão arrecadar, quanto vão gastar, quais são as suas metas fiscais. Colocado no orçamento, aquilo tem que ser obrigado, e a sanção acontece.

    No limite de endividamento, antes de entrar na apreciação do que está ocorrendo com a União, está es- crito na Lei de Responsabilidade Fiscal que os Estados podem tomar até 2 vezes a sua receita corrente líquida, e os Municípios podem tomar até 1,2 vezes a sua receita corrente líquida; no caso da União, o limite seria de 3,5 vezes a receita corrente líquida. Mas esse assunto, até hoje, não foi nem regulamento, nem foi aprovado. Razão pela qual, por exemplo, em 2014, a União apresentou a meta de superávit primário de R$100 bilhões - para ser mais preciso: R$99 bilhões. Comprometeu-se publicamente. Em vez de um superávit para pagar juros, teve um déficit de R$30 bilhões, que, somados aos juros da dívida que já chegam hoje a R$2,4 trilhões, ascendeu, em 2014, a uma despesa de R$340 bilhões. Anunciou um superávit de R$100 bilhões: em vez de um superávit, teve um déficit de R$30 bilhões; e, com os juros da dívida que acumulou, gastou R$340 bilhões sem recursos.

    O que aconteceu com o gestor federal? Absolutamente nada. Se um prefeito ou se um governador ti- vesse cometido desatino semelhante estava na cadeia, estava com o terreno do quintal de sua casa salgado, estaria processado. Porque não se regulamentou limite de endividamento para a União, sanções para gestor federal, tudo isso acontece impunemente.

    Só que, na hora em que se faz esse balanço, é preciso que se faça a avaliação sobre as lacunas que têm que ser preenchidas. E existem duas coisas: primeiro de tudo, é preciso definir a falta de limite para endivida- mento da União, porque essa falta de limite de endividamento, que está previsto 3,5 vezes a receita corrente líquida, é uma exigência do que está escrito nos art. 48, inciso XIV, e art. 52, inciso VI, da Constituição de 1988.

    Na hora em que se comemoram os 15 anos da Lei de Responsabilidade Fiscal, Presidente José Medeiros, estamos assistindo, em função da não geração de superávit e, sim, de um déficit daquilo que o Governo está gastando, da qualidade do gasto público, à produção de uma taxa de juros que está em 13,25%; taxa de juros que deprime a economia e joga na lata do lixo a capacidade de gerar emprego; que gera a inquietação de que o brasileiro é tomado hoje, pela perspectiva do desemprego, que é crescente, em função do não cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, pela União, por uma lacuna que existe e que tem que ser preenchida.

    Primeiro de tudo, quanto é que a União pode tomar de endividamento? Qual o seu limite? Estados e Municípios estão regulamentados. A União não tem limite. Na hora em que se comemoram os 15 anos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), da Lei Complementar nº 101, de 2000, é preciso que o Congresso acorde para essa realidade dura.

    E uma segunda, aquilo que está escrito na Lei de Responsabilidade Fiscal e nunca foi implementado, que é o Conselho de Gestão Fiscal. Vi hoje que o Ministro Levy está pensando em acompanhar a qualidade do gasto público, previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada e sancionada no ano 2000. O PT assumiu o Governo logo em 2002. O PT não votou a Lei de Responsabilidade Fiscal, votou contra e tinha a obrigação de, em tendo encontrado esse diploma votado e aprovado pela Câmara e pelo Senado, ter completado a obra, ter

    regulamentado a capacidade de endividamento da União e ter criado o Conselho de Gestão Fiscal, que está previsto no art. 67, que existe para fiscalizar e acompanhar o gasto público. Aquilo que o Ministro Levy está lembrando é uma exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal.

    E cabe a nós, na hora em que se registram os 15 anos de existência e bons serviços prestados à sociedade brasileira, da Lei de Responsabilidade Fiscal, colocar esses dois itens na pauta prioritária do Congresso. Um, o estabelecimento dos limites de endividamento da União, para evitar que aconteça o que está ocorrendo agora, pela irresponsabilidade da Administração Pública, da administração financeira, que está levando a que a União tome muito mais compromisso do que possa e, em consequência, tenha que elevar a taxa de juros como úni- co remédio para combater a inflação, que produz um efeito colateral terrível, da depressão da economia e da geração do desemprego. É preciso que isso seja regulamentado em benefício da sociedade.

    O PT não votou a Lei de Responsabilidade Fiscal, mas está no Governo e tem a obrigação de proteger a sociedade. Espero que a intenção do Ministro Levy seja ouvida e que se implante o conselho de gestão fis- cal, que já está previsto. Poderia ter sido implantado há muitos anos, desde 2002, 2003, 2004, os governos do PT inteiros. Seguramente, se estivesse funcionando, a qualidade do gasto público não seria ruim, como o é, e quem teria ganhado seria o País.

    Esses, portanto, Sr. Presidente, Srs. Senadores, eram os registros que gostaria de fazer e os faço neste momento.

    A Lei de Responsabilidade Fiscal, uma ideia que surgiu, repito, quando eu era, no mandato anterior, Presi- dente da Comissão de Constituição e Justiça, foi sancionada no ano 2000, numa solenidade da qual me lembro bem porque fui convidado e compus a Mesa Diretora da sanção, à época Presidente da República Fernando Henrique Cardoso. O Ministro do Planejamento era o Dr. Marcos Tavares, um brasileiro de qualidade que, neste momento, merece a homenagem que presto como cidadão e como brasileiro.

    Obrigado, Presidente.

    O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Parabéns pelo pronun- ciamento, Senador José Agripino. Eu não tenho dúvida de que esse é um dos assuntos mais sérios.

    As nossas mazelas passam justamente por esse tema: a qualidade dos nossos gastos, a gestão fiscal. Hoje, tudo que fazemos é pagar juros, tudo que fazemos é para pagar a dívida, que já tem tamanho exorbi- tante, passa da casa dos trilhões.

    Eu não tenho dúvida de que, no momento em que o Brasil levar a sério essa questão, tiver o mesmo pen- samento que V. Exª está colocando, este País tomará outro rumo.

    Nós tivemos, aqui no Congresso, a CPI da Dívida Pública. Dali, foram tiradas lições e grandes esclareci- mentos que, infelizmente, não foram tocados para frente. Na época, falou-se que boa parte dessa dívida, se nós tivéssemos boa gestão, nem teríamos que pagar porque ela foi prescrita. Mas o certo é que estamos aí e essa dívida cada vez se acumula mais, juro sobre juro. Nós precisamos, com certeza, como País, mudar essa forma de pensar.

    Eu não tenho dúvida, apesar de eu achar difícil que algum governo vá sancionar a regulamentação dessa lei. Agora, seria imprescindível, porque é inconcebível que um prefeito vá para a cadeia por tomar uma medida e o Presidente não responda pelo mesmo ato, seguindo um pensamento de isonomia entre as outras esferas da Federação. É a mesma coisa o que está acontecendo na legislação eleitoral: seguindo o princípio da igual- dade, parece que temos alguns mais iguais que outros. Porque, na esfera federal, um candidato a Presidente

    - eu não estou falando só da Presidente Dilma aqui - pode quase tudo. Um vereador, um prefeito ou até um governador, a gente vê ser cassado aí pelos mais banais motivos. Nós precisamos avançar nisso, porque não podemos conceber essas discrepâncias em um Estado democrático de direito.

    Parabéns pelo seu pronunciamento. Com a sabedoria que tem e a experiência acumulada nesta Casa, V. Exª sempre traz aqui uma contribuição imensa para a República brasileira.

    O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Oposição/DEM - RN) - Obrigado, Presidente, José Medeiros. Como V. Exª me aparteou, foi um aparte honroso da Presidência, eu queria só fazer um complemento: os órgãos que se en- carregam de fazer a fiscalização das contas dos Estados, dos Municípios e da União são os tribunais de contas da União, dos Estados e dos Municípios.

    Veja, mesmo diante de duas lacunas - de não estar disciplinado o limite de endividamento federal, quando o estadual e o municipal estão; e o seu conselho gestor estar já disciplinado, ou estar implementado, porque na lei ele já consta, o que ele não está é implementado, porque os governos de 2002 para cá não se interessaram -, com base no art. 36 da Lei 101/2000, que é a Lei de Responsabilidade Fiscal, que proíbe que bancos que têm o controle de uma esfera de poder emprestem a esta esfera de poder, com base nesse art. 36 da LRF, o Tribunal de Contas da União está questionando as pedaladas fiscais que o governo central praticou e está analisando essas contas, com a perspectiva de, amparado no artigo da lei, aplicar sanções, mesmo sem

    essas regulamentações.

    Os tribunais de contas dos Municípios, dos Estados e, no caso, da União têm, de forma exemplar, de- sempenhado o papel de não existe lei se ela não for cumprida, e o cumprimento da lei existe na medida em que, se ela não for cumprida, houver a sanção, e a sanção é imposta pelos tribunais de contas, que têm feito um trabalho esmerado no sentido de fazer com que uma lei que existe e que é boa para o País seja cumprida.

    E, neste momento, o Tribunal de Contas da União está analisando uma questão à luz do interesse da so- ciedade e, se verificar que houve culpa ou dolo por parte da União, das pedaladas fiscais, o Tribunal de Contas da União, que é um órgão auxiliar do Parlamento nacional, vai nos apontar os caminhos.

    Mas, de qualquer maneira, aqui fica a minha lembrança e o meu alerta para a necessidade de - quem é governo hoje amanhã é oposição; quem é oposição hoje pode ser governo amanhã - estabelecermos os limites de endividamento da União, para evitar que aconteça o que está ocorrendo agora. Estamos com um problema seriíssimo de taxas de juros estratosférica, de inflação fora de controle e de perda de postos de trabalho, tudo por conta de uma dívida interna que chega a R$2,4 trilhões, que foge a tudo o que se possa considerar razoá- vel em matéria da Administração Pública.

    Aqui fica, portanto, o meu alerta e os meus cumprimentos renovados àqueles que tiveram, no passado, a feliz ideia de elaborar, batalhar e aprovar a Lei de Responsabilidade Fiscal.

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/05/2015 - Página 236