Discurso durante a 85ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com eventuais repercussões negativas decorrentes das medidas do ajuste fiscal aprovadas pelo Congresso Nacional .

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Preocupação com eventuais repercussões negativas decorrentes das medidas do ajuste fiscal aprovadas pelo Congresso Nacional .
Aparteantes
Edison Lobão, Paulo Paim, Randolfe Rodrigues.
Publicação
Publicação no DSF de 29/05/2015 - Página 106
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • REGISTRO, APROVAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ASSUNTO, ABONO SALARIAL, SEGURO-DESEMPREGO, OBJETIVO, MELHORIA, FINANÇAS, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, COMENTARIO, PREJUIZO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, CRITICA, VOTAÇÃO, AGRUPAMENTO, ATO, AJUSTE FISCAL, AUTORIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ENFASE, EXCLUSÃO, FATOR PREVIDENCIARIO, AUMENTO, ALIQUOTA, PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO SOCIAL E PROGRAMA DE FORMAÇÃO DO PATRIMONIO DO SERVIDOR PUBLICO (PIS-PASEP), PRODUTO IMPORTADO, CONSTRUÇÃO, CENTRO COMERCIAL, LOCAL, CAMARA DOS DEPUTADOS.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, quero dizer primeiro que, do seu ponto de vista, esta é uma semana que merece ser comemorada. Do ponto de vista da agilidade do Senado, da rapidez com que aprovamos as medidas provisórias, dentro do prazo, está correto. Mas eu discordo quando vejo alguns Senadores dizendo que esta é uma semana para comemorar do ponto de vista do Brasil. Vou dizer por quê. É como se um médico comemorasse o número de receitas que passou naquele dia, e não o número de pessoas curadas naquele dia; muito menos os resultados positivos do ponto de vista da gestão.

            As Medidas Provisórias nºs 664 e 665 permitiram um cuidado positivo: 14 bilhões, mais ou menos, de poupança - ou seja, de redução de gastos. Mas o nosso déficit é de mais de 300 bilhões! Então, não dá para dizer que estamos curando o doente das finanças públicas brasileiras - não estamos.

            Com essas medidas, a gente melhorou, mas foi uma melhora muito pequena. E a que custo? Ao custo de sacrificar alguns direitos de trabalhadores; ao custo de fazermos com que pessoas doentes não recebam seguro, outras não recebam abonos. Então, foram medidas que trouxeram um alívio muito pequeno na manifestação mais clara da doença, que é o desajuste fiscal, mas que provocaram outras doenças.

            E aí vem a minha maior preocupação, Senador Dário: nós estamos aprovando medidas de um ajuste, mas de uma forma atabalhoada, que é a velha tática dos pacotes: faz um pacote, depois faz outro, aí esse provoca a criação de mais um... Isso foi tão alertado aqui, no ano passado, quando a Presidenta Dilma, através do Ministro Mantega, vivia fazendo pacotes, e pacotes, e pacotes. Os pacotes geram problemas sempre. E a gente vê, agora, por exemplo, os problemas que vêm dos chamados contrabandos nas medidas provisórias, Senador Lobão.

            Tomemos um contrabando que foi elogiado, reconhecido, positivo, que foi o contrabando do fim do fator previdenciário. O fim do fator previdenciário, que traz vantagens, inclusive na receita, no primeiro momento, Senador Randolfe, vai trazer problemas em poucos anos, problemas seriíssimos. Nós tomamos, vamos dizer, um bom contrabando para melhorar a situação dos que têm mais de 45 anos, mas vamos causar um problema para os que têm menos de 45 anos, na hora em que forem se aposentar. Nós esquecemos isso.

            Por que fazemos isso? Porque a gente diz, como ouvi aqui: depois a gente resolve. Mas, na hora de resolver, vai ter que tirar dinheiro do Tesouro e, portanto, vai tirar dinheiro da educação, da saúde e de outros setores, ou vai provocar inflação, ou vai fazer como se está fazendo agora com o Fundo Postalis. O Fundo não tem condições de pagar aposentadoria. O que vai se fazer? Os atuais trabalhadores vão ter que ter um desconto na sua folha para cobrir o déficit que aconteceu.

            Hoje, aprovamos mais uma medida provisória, que traz algumas vantagens: reduz a alíquota, aliás, eleva a alíquota sobre produtos importados. É bom, mas vai gerar inflação, vai pressionar a inflação porque vai aumentar os preços dos produtos importados. Isso é bom para a indústria nacional, é uma medida positiva, e eu teria votado favoravelmente, se tivesse havido votação, mas traz os outros problemas. Mais uma vez, é aquela ideia que falei aqui, Senador Paim, do médico que comemora o número de receitas que fez, sem considerar se curou ou não os doentes e sem olhar os efeitos colaterais que provocou.

            A elevação das alíquotas PIS/Pasep vai ser boa para a indústria, mas vai ser ruim para a inflação.

            Pior: colocaram esse estupro - porque não dá para chamar de contrabando - que é a construção de um shopping na Câmara, que tem mais de um problema. Primeiro, um problema simbólico, porque eu já ouvi dizer que não vai custar nada aos cofres públicos, que será uma parceria público-privada, mas custa na imagem do Parlamento diante da opinião pública. E nós temos que olhar isso também, Senador Lobão. Nós não vivemos só de não provocar gastos; nós vivemos também de não provocar dano na nossa imagem. E vai criar um dano na nossa imagem. Já criou!

            É um estupro que se coloca, um escárnio, como disse o Senador Randolfe - eu gosto de dizer que é um deboche conosco -, entrosado aí dentro. Por isso eu creio que, embora a gente tenha o que comemorar do ponto de vista burocrático da produção do Senado na semana, não temos o que comemorar do ponto de vista da saúde do doente brasileiro, que é um organismo em crise, como estão as finanças públicas, como está a economia. A economia, em recessão; e as finanças públicas, num tremendo déficit. Nós vamos precisar de algo muito mais profundo do que isso, mas muito melhor organizado. Não pode ser atabalhoado desse jeito.

            Veja o outro problema: essa medida vai permitir uma melhor competitividade do Brasil, mas, no mesmo momento em que esse Governo faz isso para melhorar a competitividade, tira dinheiro das universidades, que deveria ser a mãe da competitividade, se ela tivesse uma boa relação com o setor industrial, e não está tendo. Nem os industriais gostam da universidade, nem a universidade gosta dos industriais. Logo, eles não estão provocando a melhoria na competitividade, porque só um casamento do setor produtivo com o setor universitário é que permite a criação de inovações.

            Então, esta semana, a meu ver, não foi negativa do ponto de vista dos resultados. Foi positiva muito do ponto de vista burocrático, de mostrar serviço; no número de receitas aviadas - é assim que se diz, não é Senador? -, mas não na cura do organismo.

            Espero que trabalhemos não apenas mais, trabalhemos melhor. Isso é que é uma diferença. Não basta trabalhar mais, é preciso trabalhar melhor.

            Por exemplo, o fator previdenciário. A gente precisa estudar o problema da Previdência com cuidado. Não é apenas aqui e ali.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senador Cristovam, eu estou me segurando para não lhe fazer aparte nessa questão do fator, mas se V. Exª permitir, no momento adequado eu falo.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu gostaria muito. Eu adoraria debater, porque o senhor sabe do meu respeito pelo senhor e do senhor por mim, e nesse ponto a gente tem preocupação... Não é nem divergência, Senador Paim, são preocupações diferentes.

            Eu tenho uma profunda preocupação com os futuros aposentados. O senhor tem uma preocupação extremada, correta, com os atuais aposentados ou os que estão em véspera de aposentadoria. É uma questão de onde colocar a ênfase, e é capaz de eu estar errado.

            Por isso, eu acho que a gente devia fazer um debate sobre os dois: os que estão aposentados, os que vão se aposentar este ano e nos próximos, e aqueles que só vão se aposentar daqui a 10, 15, 20, 30 anos. Até porque são esses que vão pagar, nos próximos 20, 30 anos, a aposentadoria da gente que já se aposentou. São eles que vão pagar. E eles vão pagar se sacrificando ou sem sacrifícios? Essa é a questão. E talvez eu esteja errado, quando eu acho que pode haver sacrifício deles, como no Postalis está havendo, como em outros setores começa a haver, como outros países têm tido: quebra estrutural do sistema ou quebra apenas financeira, provisória do sistema.

            É uma questão de análise e de ver onde é que está a correção. Não é no sentido da preocupação central; é com quem a gente se preocupa em cada momento.

            Mas o que eu vim falar aqui - esse assunto eu acho bom a gente debater...

            O Sr. Edison Lobão (Bloco Maioria/PMDB - MA) - Se V. Exª me permitisse, eu faria uma ligeira intervenção, como, aliás, recomenda o Regimento.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu só pergunto se eu passo primeiro ao Senador Paim ou se eu passo primeiro ao senhor.

            O Sr. Edison Lobão (Bloco Maioria/PMDB - MA) - A minha tem três palavras.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O Senador Edison Lobão sempre tem preferência.

            O Sr. Edison Lobão (Bloco Maioria/PMDB - MA) - No coração generoso o do Senador Paim.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Então, vamos lá. Senador Lobão.

            O Sr. Edison Lobão (Bloco Maioria/PMDB - MA) - Só para dizer a V. Exª que, na França, houve um estudo profundo de uma reforma na Previdência, e os legisladores levaram 20 anos para resolver esse problema, exatamente por conta desta preocupação de V. Exª. É preciso cuidar dos atuais, sem esquecer os futuros.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - É isso aí. Obrigado, Senador.

            Senador Paim, agora, então, vamos já para o debate.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senador Cristovam, V. Exª sabe que eu tenho me debruçado sobre este tema, eu diria, durante décadas. Criou-se neste País uma falácia, permitindo que os ladrões da Previdência continuem roubando o dinheiro do trabalhador. Ou alguém tem dúvida de que a Previdência brasileira sempre foi superavitária? Sabe quanto foi o superávit do ano passado, com toda a roubalheira que houve, inclusive desonerando a folha e tirando 70 bi? Foi 50 bi, assim mesmo. Dados da Anfip! Não são dados da CUT, do Paim ou do Dieese; são da Anfip. Então, a nossa Previdência vai muito bem, obrigado. Pergunte ao Ministro da Previdência, o Ministro Gabas, se a Previdência brasileira não é superavitária. É claro que nós temos preocupação com o presente e também com o futuro. É só parar de deixar de desonerar a folha, por exemplo. O empregador pagava 20% e agora está pagando 1,5%, 2%, e está essa novela tremenda, porque querem que volte a pagar ou que não volte a pagar. É o dinheiro do trabalhador. Eu fui constituinte, e na Constituinte nós colocamos lá inclusive recursos, no texto constitucional, para sustentar a Previdência. Só que o dinheiro não está ficando na Previdência. E assim mesmo dá superávit.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador Paim, para onde está indo o dinheiro? Os que roubam?

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Eu vou começar a colocar. Primeiro, há mais de 500 bilhões de sonegação. Os fiscais, os auditores fiscais dizem o seguinte: “Dêem-nos mais cem fiscais, e a gente bota mais 100 bi aqui já.” Só combatendo a sonegação. E tirar dinheiro do trabalhador e não querer pagar nem o fator? O fator, que é garantido aqui dentro desta Casa, e o salário é 33 mil. Aí pode não ter fator? E ninguém reclama! O salário aqui dentro é trinta e... Estou falando do teto; não estou falando do nosso salário, não. Não é nem isso, porque não estou fazendo demagogia dizendo que tem que diminuir o salário de Senador ou Deputado. Não é nada disso. Só estou dizendo: o teto no serviço público é 33 mil. Faz o mesmo cálculo que faz para o peão da construção civil, que faz para um professor; só que depois, para esses se aplica o fator, que corta pela metade o salário. Não há como eu concordar, não há como concordar. E a entrada agora do fator, como nós aprovamos ontem aqui, graças a Deus - e eu espero que a Presidenta não vete, porque seria um erro histórico ela fazer isso -, significa o quê? Que não vai aumentar o déficit; pelo contrário! Nos próximos oito ou dez anos...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Isso.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - ... se deixarem o dinheiro entrar e não jogarem para outros fins, aumenta o superávit. Nos próximos dez anos, basta os auditores fiscais trabalharem como eles querem trabalhar; basta nós começarmos a tributar, por exemplo, as lanchas, que não pagam nada; basta tributar os aviões de passeio dos bilionários, que não pagam nada; tributar grandes fortunas, por exemplo. Tudo isso é olhar para o futuro. Agora, tirar o dinheiro do trabalhador da construção civil, do metalúrgico, no ato em que ele vai se aposentar? Cortar pela metade aquele que ganha R$2 mil? É assim que a Previdência vai sobreviver? Claro que não, meu querido Senador - e sabe o respeito que eu tenho por V. Exª. Olha, se a Presidenta vetar esse projeto - eu gravei agora -, o povo vai vetar a Presidenta, porque esse projeto é unanimidade. Não há ninguém de bom senso no País que consiga ser contra dizer: se o fator não se aplica no Judiciário, não se aplica no Executivo, não se aplica no Legislativo, por que se aplica só para o trabalhador?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Totalmente de acordo com o senhor. Totalmente de acordo!

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - E vou lhe dizer mais, Senador: se depender de mim, eu estou disposto a apresentar um projetinho aqui para parar com essa história de que gente na estatal fatura R$70 mil por mês, não tem limite nenhum.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Assinaremos embaixo.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Conselheiros que vão trabalhar uma vez em cada seis meses faturam trinta paus por mês.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Aliás, não adianta falar: vamos trazer segunda-feira esse projeto.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Não... Vamos trazer o projeto. Se eu estou falando em público é porque vou assinar o projeto.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Pronto. Está bom. Vou colocar gente para trabalhar hoje nisso.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O pessoal vai trabalhar em cima disso. Os cargos na Caixa Econômico Federal: estão até agora brigando sobre quem vão ser os 20 Vice-Presidentes! Quanto ganha um cidadão desses?!

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Isso. Muito bem!

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - E porque não dão espaço para o servidor público concursado? É nessas coisas neste País que nós temos de mexer! E na impunidade e na corrupção que são uma vergonha! Esse escândalo agora da própria Receita Federal em que meia dúzia de fiscais - e aqui não ataco todos, não ataco ninguém... Olha, há empresários que deviam R$15 bilhões ou R$10 bilhões - e são grandes empresários, inclusive do meu Rio Grande - que fizeram o quê? Deram R$10 milhões para esse fiscal que deu anistia fraudulenta a esse povo todo. Então, tirar de quem não ganha nada e achar que, com isso... Por amor a Deus - não é com V. Exª, porque eu sei da sensibilidade de V. Exª -, o mínimo de justiça! No momento destes, mexeram no pescador? Claro que mexeram! Mexeram em uma porcaria, mas mexeram - e porcaria para quem ganha muito! Para quem não ganha nada, não receber o Bolsa Família, porque agora vai ter de optar por Bolsa Família ou por seguro-defeso, é muito! Agora, não querer dar a eles... E mais: o fator. Alguém disse: “Ah, mas a viúva...” Eu sei que a viúva... Só que a viúva, nesse projeto que está aí, voltou a ganhar 100%. E sabe quem é que vai ser beneficiado mesmo - se se fala tanto nas mulheres - com o fim do fator? Serão principalmente as mulheres. As mulheres que ganham R$2 mil se aposentam e vão ganhar R$1 mil - e pagaram sobre R$2 mil! O homem ainda perde 40%. Então, é uma questão de um mínimo de justiça.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito bem, Senador!

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - E aí eu termino, Senador. Eu já disse esta frase: eu considero que esse projeto do fator previdenciário é a lei mais maldita, mais covarde, mais sacana que houve neste País depois da ditadura. E a Presidenta agora vai ter a oportunidade de vetar. Qualquer pessoa de bom senso... São os Ministros da Previdência que vão...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - E por que o Lula vetou?

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O Lula vetou, porque, na época, foi mal-assessorado. Eu briguei para não vetar. Eu votei aqui por unanimidade...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador, não dá para botar culpa em assessor quando um Presidente assina. A culpa é do Presidente que assinou, não do assessor!

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - É do Presidente e daqueles que foram fazer lobby para ele vetar. E muita gente foi.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Não. Ele aceitou o lobby.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Claro! À época, havia duas propostas, e eu trabalhei em cima das duas: ajudei a aprovar o fator aqui e na Câmara, e foi para o Presidente; e aprovei também o reajuste de 80% dos aposentados. Eu vou lhe falar já como é que foi a história. O Presidente reuniu todos. Eu acompanho isso como V. Exa acompanha a educação, dia e noite. Houve uma reunião com todas as centrais sindicais. O Lula disse o seguinte: “Vocês têm acordo no 85/95?”. Houve uma central - uma! - que disse “não, não há acordo, nós somos contra, queremos que volte à fórmula antiga”. E 85/95 é o meio-termo já. Falam que tem que ter a idade. Está ali a idade! A mulher não vai se aposentar com menos de 55 e o homem, com menos de 60. O Lula disse: “Olha, se não há acordo, não tem acordo, estou vetando”. Esse foi o debate que houve na época, com as centrais e confederações, porque não houve acordo. Agora é unanimidade. Não há uma entidade de caráter nacional - nem vou falar em central e confederação - que não seja a favor do fim do fator! Não há uma entidade! A Anfip, a Fenafisp... O próprio Ministro da Previdência. Não vamos achar que o Ministro Gabas seria tão irresponsável de dizer - e disse para a Folha de S.Paulo, disse para o Estado de S. Paulo, disse em uma reunião com oito Senadores - que o fator fez todas as maldades que podia ter feito. Daqui para frente, ele é um retrocesso. Só essa partezinha, Senador.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito bem.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Sabe por que é um retrocesso? Aqui eu vou terminar. Se eu estou na fábrica, sabe o que eu faria? Eu ganhava dez salários mínimos. Eu me aposentava - podiam cortar pela metade -, eu ia continuar trabalhando, ganhando o meu salário mais a metade, eu aumentava o meu salário e, ali na frente, eu entrava com o instituto da desaposentadoria. A Previdência perde muito mais do que se aceitando a discussão e o não veto do fator. Ela perde muito mais! As pessoas estão se aposentando hoje devido ao fator com 50 anos de idade, porque para elas é vantagem, em vez ficar esperando, esperando, esperando, para não ter uma solução. Com essa resposta, sim. Aí eles vão esperar completar o tempo, e o dinheiro fica na Previdência. É só ajustar a contribuição e combater a sonegação que a Previdência não vai ter problema. Não precisa se preocupar, porque não é da Previdência que nós vamos tirar o dinheiro para resolver o problema da educação e da saúde.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador, eu fiz questão que o senhor falasse o maior tempo possível, porque eu acho que esta é a melhor parte do meu discurso: a sua denúncia ao Presidente Lula, que vetou; a sua crítica aos 12 anos do Governo nosso - fiz parte dele durante um ano - que não mudou tudo isso; a sua crítica ao fato de que tem gente ganhando muito neste País e gente que não ganha; a sua crítica à sonegação, que se deixou continuar ao longo desses 12 anos de Governo; a sua crítica a esse pessoal que não paga imposto, porque tem avião e navio. Eu deixei, porque essa sua crítica merece ficar na história do Senado. Agora...

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Eu espero que fique mesmo, Senador (Fora do microfone.), até porque o próprio Presidente Lula, nesta semana, disse que, se há alguma coisa de que ele se arrependeu na vida, essa coisa foi ter vetado o fator previdenciário.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Mas vetou.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Eu acho um gesto de grandeza dele.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu também acho.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Porque os que criaram não se arrependeram e aqui votaram contra, inclusive.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - De grandeza e de fragilidade à época.

            Agora, veja bem. Eu achei fundamental essa sua fala. Eu quero que ela fique registrada e vai fazer parte do meu discurso.

            Longe de mim aqui vir dizer que o fator previdenciário deve continuar. Agora, o que eu quero dizer é que os próximos aposentados do futuro têm de ter o mesmo direito.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Mas vão ter...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Isso.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - É uma lei permanente.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Por isso, nós precisamos levar mais a sério o problema previdenciário. O senhor, por exemplo, coloca, com uma ênfase grande, que há um saldo de 500 bilhões... São 50 bilhões... São 500 bilhões por causa...

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - São 500 bilhões mesmo. Só da sonegação.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - É, muito bem.

            Outros vêm e dizem que há déficit...

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Mentem. Eles mentem.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador, espere aí. Agora, deixe-me falar.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Eles mentem. Não o senhor, Senador, mas eles mentem.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Então, deixe-me falar agora.

            Há alguns que mentem, mas a gente ouve a mentira. E é gente séria que está mentindo. Mas há um terceiro grupo...

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Quem mente não é sério.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Mas para nós...

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Eu desafiei a qualquer um deles vir aqui no Senado debater comigo que eu provo que eles estão mentindo.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Deixe-me retirar a palavra sérios. Competentes nos números.

            Agora, há um terceiro grupo que diz que é superavitário, mas que se tira dinheiro para outras finalidades sociais. Aí, eu pergunto: vamos parar as finalidades sociais para colocar na Previdência? Tem que ser uma escolha clara, o povo tem que saber.

            O que eu venho aqui criticar, Senador, é que, em vez de nós discutirmos com a seriedade que devemos o assunto, levando em conta os futuros aposentados, que hoje são jovens, nós recebemos um - como é? - um contrabando da Câmara. Não estamos levando a sério - já que o senhor gostou da palavra seriedade - o assunto da demografia brasileira. Nós vivendo mais, felizmente, do que antes e, portanto, ficamos mais tempo aposentados. Portanto, o que nós contribuímos talvez não seja suficiente para cobrir - talvez. Não estamos levando a sério e ficamos com posições diferentes.

            Além disso, o senhor mesmo disse que, durante oito a dez anos, vamos ter um superávit graças a isso. E depois dos dez anos?

(Intervenção fora do microfone.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Um momento, Senador. Um momento, um momento.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Não pode usar as minhas palavras pela metade, Senador, com todo respeito que eu tenho por V. Exª.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Mas eu não ouvi só do senhor. Então, esqueça. Eu ouvi aqui. Aliás...

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Só vou lhe dizer: eu não vou fazer aparte. Vou falar em seguida e dizer exatamente como eu penso a respeito da questão do fator e do que está acontecendo.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu nem vou querer discutir o fator. Estou discutindo aqui um conjunto de medidas de ajuste atabalhoadas, cheia de contrabandos. Gente, o Brasil está numa situação crítica, pelos desajustes fiscais do passado e pelos desajustes estruturais históricos. Era isso o que deveríamos estar discutindo, e não estamos! Estamos pegando medidas pontuais do Governo, cheias de contrabandos - algumas boas, outras ruins -, e deixando passar tudo isso, e comemorando como sendo uma grande semana. Não foi uma grande semana, apesar de o fator ter sido uma coisa boa.

            Agora, veja bem, eu ouvi, aqui, análises... Aliás, eu vi a tabela que mostra que, durante oito anos, o fim do fator vai ajudar nas contas públicas. Eu perguntei: “E depois de oito?” E: “Depois, a gente muda, de novo, tudo”.

            Não podemos continuar desse jeito! A gente tem que saber que este País continuará por mais 50, 100, 200 anos.

            Temos que trazer para aqui o debate sobre a demografia brasileira, sobre a Previdência, sobre a necessidade de melhorar a escolaridade para que os salários cresçam e, com isso, a contribuição previdenciária cresça e haja superávit realmente. Aliás, superávit, não. A Previdência não tem que ter superávit, tem que ter equilíbrio, ou podemos assumir tirar de outro lugar para isso. Pode ser, também, mas com clareza.

            Eu não vim aqui para falar do fator. Quanto ao fator, eu lhe confesso que tenho dúvidas: não tenho a sua certeza, mas também não tenho a certeza contrária, não, porque eu também tenho dúvidas quanto aos números que me passam, das pessoas que eu disse que são sérias. Eu tenho dúvidas, muitas dúvidas, até porque, quando se trata de futuro, sempre tem que ter uma margem para dúvida. Eu vim falar que esta semana merece ser comemorada sob o ponto de vista burocrático, não sob o ponto de vista do conteúdo. Nós não avançamos para fazer o organismo da economia brasileira ficar mais saudável. Nós comemoramos, aqui, a quantidade de receitas que foram prescritas, não os resultados delas.

            Por isso, eu volto a insistir: o Senado precisa assumir a sua responsabilidade, Senador Randolfe, tentando formular um plano claro de como enfrentar o desajuste fiscal criado pela Presidenta Dilma e de como enfrentar o déficit e o desajuste histórico de um País que não prestigiou a educação, que fez uma educação desigual, além de ruim, que não prestigiou os velhos, que o Senador Paim defende tanto, que têm uma aposentadoria miserável. Temos que enfrentar, aqui, um desajuste mais grave, Senadores Randolfe e Paim: a política salarial do Poder Público brasileiro, em que alguns de nós ganhamos tanto e outros ganham tão pouco.

            O que faz com que, hoje, não se consigam os melhores quadros da sociedade para serem professores não é só o salário é baixo, mas os salários muitos altos em outras categorias. E aí as pessoas escolhem aquelas outras categorias.

            Todos esses erros, esses desajustes estruturais, não estão sendo enfrentados. A Previdência tem uma questão estrutural - vejam que eu tirei a palavra desajuste, porque há contradições, como o senhor mesmo fala, e outros falam outra coisa. Mas há questões estruturais que vêm do aumento na nossa longevidade: vamos viver mais tempo com aposentadoria, e, portanto, o tempo de contribuição tem que aumentar. Senão, não equilibra! Não existe jeito de equilibrar, porque isso se chama cálculo atuarial. Não existe jeito, isso é aritmética.

            Eu tenho dito muito por aí que nossos economistas, Senador Dário, dividem-se em dois, assim como nossos políticos: os que não têm ética e não olham para os pobres, e os que não gostam de aritmética e não percebem os limites. Estadista é aquele que é capaz de ter o sentimento ético de olhar para os pobres e o respeito à aritmética de ver em quanto tempo vai fazer com que as coisas sejam viáveis e possíveis.

            E, quando um não bate com o outro, vem a inflação, que é uma maneira de mentir, dizendo que dá aumento, mas rouba, porque o dinheiro vale menos. Você pagava 100 e agora paga 120, mas só vale 90. E a gente viveu assim, a gente viveu essa história assim, enganando e mentindo, para que a aritmética continuasse - não há jeito de fugir dela -, mas fazendo de conta que ela não existia. A inflação faz como? O dinheiro está aqui, e a gente faz o dinheiro ficar deste tamanho, mas continua dando aquele valor, até aumentando, aumentando, aumentando.

            Creio que esses dias foram de avanços superficiais, epidérmicos, na pele, ao invés de serem profundos, como a crise está exigindo, em todos os assuntos, inclusive na Previdência. Eu gostaria muito que nós tivéssemos aqui como vai ser a Previdência dos meus netos, e não apenas a minha, embora a minha me toque mais diretamente e seja mais urgente.

            E aí, Senador Paim, quando é que a gente vai resolver o problema de ter uma aposentadoria para o setor público e outra para o setor privado? Isso a gente tem que resolver.

            E há também a manipulação que se faz. Como não se quer pagar bem a professor, o que fez? Aposenta-se mais cedo. Esse foi um truque que se usou para seduzir as pessoas serem professores e ganhando pouco: se aposenta cedo. Alguns se aposentam quando estariam no melhor momento da sua carreira. Nós não quisemos melhorar a condições da sala de aula, e aí se diz: não se preocupe não, você vai se aposentar rápido. Então, aguente essa sala de aula aí ruim. Mas o certo era melhorar as condições da sala de aula, era melhorar tanto o salário que ninguém quisesse se aposentar cedo de tão feliz que estivesse na sua atividade. Mas isso nem passa pela cabeça de ninguém, nem passa. Era possível, sim, se o Brasil fizesse as escolhas certas.

            Lamentavelmente, nós temos 500 anos de escolhas erradas. Aliás, desde a primeira, quando nós, em vez de ficarmos independentes com uma República, inventamos de ficar independentes com o Império. Foi a primeira escolha errada nossa. Aí, veio a escolha de continuar com escravidão, uma escolha errada que atrasou este País. Depois, proclamar a Abolição sem abolir de fato, porque os negros continuaram excluídos e porque criamos uma escravidão de brancos e negros, que são os pobres. E sucessivamente fomos fazendo escolhas erradas.

            Aqui, esta semana, fizemos escolhas incompletas, superficiais, sem analisar com a profundidade necessária. Aí, daqui a alguns anos, a gente se arrepende de novo, começa ajustar tudo de novo, fazendo de conta que não errou, que está apenas criando problemas. É preciso, um dia, este País parar de fazer pacotes e ter políticas claras de médio e longo prazo que sirvam à geração de hoje e às gerações futuras.

            É isso, Sr. Presidente.

            O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - Senador Cristovam, o senhor é um mestre, um professor.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Mestre, eu não sei; professor, sou, com muito orgulho.

            O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - E dá uma demonstração disso aqui. Eu quero dizer que, a cada dia, a cada pronunciamento de V. Exª, aumenta o meu respeito e a minha admiração pelo senhor. V. Exª engrandece, eleva e dignifica os debates desta Casa. Parabenizo V. Exª pelo seu pronunciamento.

            Quero, também, mencionar que votei as medidas provisórias, mas não gostaria de votar na sua plenitude. Acho que alguns tópicos eram relevantes e importantes e já deveriam ter sido corrigidos há muito tempo. Deveriam ter sido corrigidos no momento em que o País estava com a economia dinamizada, vamos dizer assim. E que daí poderíamos trazer um problema como o seguro-desemprego, por exemplo, alertar a população, de forma geral, de que o Brasil estava gastando R$48 bilhões, quase R$50 bilhões, com o seguro-desemprego, quando, na verdade, estávamos com uma taxa de desemprego muito baixa. Ora, Senador Cristovam Buarque, é só analisar o número para ver que alguma coisa está errada. Uma distorção dessa natureza, um dispêndio desse montante precisaria ser corrigido, o senhor há de convir comigo.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Denunciei muito isso aqui.

            O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - Pois então. Mas, é num momento de crise que, efetivamente, se colocam essas medidas e, agregadas a elas, outras medidas que ferem direitos dos trabalhadores, e no afogadilho, e não tem mais tempo, tem que votar, tem que votar e tem que votar. E aí nós sofremos um revés, um desgaste político, um desgaste social de ter que, goela abaixo, votar essas medidas porque, supostamente, essas medidas são fundamentais para que o Brasil possa voltar a crescer, recuperar a sua economia e dar dignidade às populações mais carentes, que é o objetivo de todos nós. 

            Eu acho que nós temos muitas responsabilidades, eu tenho dito isso. Mas uma das responsabilidades que não pode fugir da nossa consciência, permanentemente, é a luta obstinada pela redução das diferenças e das desigualdades sociais no Brasil. Essa questão que o senhor e o Senador Paim abordam, que a previdência pública é diferente da previdência privada, isso é um absurdo. Isso chega a ser, nas palavras de V. Exª, um deboche também com o povo brasileiro.

            E para concluir o exagero, eu peço desculpas para V. Exª, mas eu também sou um homem apaixonado pela educação e acho que a melhor forma, a maior independência de uma nação é conquistada pela educação; a maior independência de um ser humano é conquistada também através da educação. Quanto mais preparado ele estiver, quanto mais ele estudou, mais bem preparado para enfrentar o mercado de trabalho, constituir a sua família e seguir em frente. E isso o senhor sabe que não é muito difícil de conquistar, basta que sigamos uma receita simples: valorizar o professor, valorizar o mestre, para garantir o futuro do aluno. Nós só vamos valorizar o professor na medida em que a gente conceda a ele uma remuneração, eu não digo digna, mas razoável, porque hoje, em muitos Estados, em muitos Municípios brasileiros, nem sequer nós conseguimos ainda pagar o piso nacional. Que absurdo!

            Veja bem a responsabilidade que nós temos, as distorções que existem, que o senhor alerta todo dia aqui, nesta tribuna. Infelizmente, não avançamos como gostaríamos de avançar. Mas, de qualquer forma, reitero a minha admiração e o meu apreço por V. Exª.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito obrigado, mas eu não fujo de dizer aqui algumas coisas. Veja bem: nós não estamos fazendo o dever de casa com a educação. Todos dizem que a educação é o caminho, mas a gente não está fazendo o dever. Ainda agora, cortaram, se eu não me engano, R$9 bilhões da educação. E vou dizer uma coisa, olhe bem: vai ser cortado, sobretudo, da educação de base, porque as universidades fazem greve, se mobilizam, têm entidades. Não há jeito de resolver isso deixando nas mãos dos prefeitos, não têm dinheiro e são desiguais.

            Quando é que a gente vai ter coragem de dizer que educação é federal? Que é a Nação que tem que ter responsabilidade? Nós não estamos fazendo isso, porque não damos valor à educação, mas também porque gastamos tanto dinheiro em outras coisas, com desonerações fiscais, como o senhor falou, com uma porção de coisas para atender as gerações de hoje, que não atendemos as gerações infantis, as crianças, porque não votam. Como é que vamos fazer coisas para criança se ela não vota? Aí, deixamos de lado e fazemos coisas como, por exemplo: o Brasil é como se fosse um barco ou um navio. Nós estamos dentro do navio, e uma porção de gente jogada no mar. Durante algum tempo, deixava-se afogar, agora, pelo menos, a gente joga uma boia, que é, por exemplo, o Bolsa Família.

            Mas não queremos trazê-los para dentro do barco, e a escada para dentro do barco é a escola, Senado Randolfe. É a escola que faz você subir socialmente, da mesma maneira que, fisicamente, é uma escada de tijolo. Nós não damos a escada, nós jogamos a boia. Já é uma coisa, já melhoramos, saímos daquele desprezo total aos que estavam no mar, mas ainda não aceitamos a ideia de fazer o sacrifício necessário para colocar uma escada, para que subam. E uma das razões é porque desprezamos a educação. Achamos que o caminho é a indústria, que o caminho é a economia, que o caminho é o salário, que é o emprego. Não vai haver emprego mais para quem não tiver educação.

            Além disso, não temos o dinheiro para fazer as escadas, porque estamos tão preocupados em gastar dinheiro na melhoria dos compartimentos dentro do navio, para nós, que aí não sobra dinheiro para fazer escada para trazer os outros. E alguns, mais conspiradores, dizem: “se eu botar a escada e eles entrarem, terei que dividir o meu quarto com eles”, e aí não joga a escada. Acho que são poucos os que têm essa cabeça perversa de não querer dar educação. A maioria é pelas outras duas razões: ou porque não veem isso como escada para entrar no barco, ou porque não querem gastar dinheiro para fazer a escada. E os terceiros, malditos, é porque não querem que se suba mesmo.

            Senador Randolfe.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - Senador Cristovam, no sentido que V. Exª está colocando - e V. Exª lembrou algo importante -, qual das razões do ajuste fiscal que estamos tendo agora? Nesta semana, votamos uma série de medidas penalizando os mais fracos. É a desoneração de quase 100 bilhões que foi concedida, durante o primeiro período do Governo da Presidente Dilma, ao grande capital.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - É isso mesmo.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - Essa é uma das razões desse déficit de 6,7% das contas públicas que nos obriga a essas medidas de ajuste. Agora, veja, Senador Cristovam, V. Exª, quando falou da educação, sempre gosto de lembrar aqui um número que já debatemos. Segundo o IBGE, ainda temos 9,6% da população brasileira analfabeta, sem acesso à alfabetização. Esse número tem uma alteração, mas uma alteração vegetativa, porque os analfabetos estão morrendo. Não há nenhuma ação do Estado em relação a isso. Veja quanto custaria resolver - só para dar um exemplo na área da educação - esse dilema. Com certeza, menos que os 100 bilhões de desoneração dados no ano passado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - R$4 bilhões e ao longo de cinco anos.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - Veja, agora, o ministro propõe 19 bilhões, retirando direito dos trabalhadores, e tira nove bilhões agora, nos cortes que ocorreram, como V. Exª já assinalou, da educação. Se tivesse sido estabelecida uma meta, Senador Cristovam -, eu sei, V. Exª já me contou a história que dialogou como Presidente Lula, temos 13 anos de um governo de centro-esquerda no Brasil - essa deveria ser a meta número um de qualquer projeto de governo, de qualquer partido que se propõe ou que teve, na sua história, uma trajetória de partido educador. Eu quero lembrar isso porque eu sempre faço referência ao Partido dos Trabalhadores por causa das referências históricas que tiveram - Moacir Gadotti, Paulo Freire -, um partido que, na sua trajetória política, teve um papel de partido transformador e educador. O problema foi a opção política feita nesses doze anos de governo, nos oito do Presidente Lula e nos quatro da Presidente Dilma. Foi uma opção política, Senador Cristovam, de ascensão somente pelo consumo. Essa ascensão pelo consumo não traz o que é importante, fundamental e indispensável - o papel que um governo de centro-esquerda tem que cumprir, uma tradição histórica, inclusive, do Partido dos Trabalhadores, que é ser também um partido transformador. Vira um projeto só de poder, deixa de ser um projeto de sociedade. Uma das metas primeiras que eu acho que tinha que ser do início do Governo devia ser: “Olha, nós vamos chegar a 2015, a 2016, a 2018 com o analfabetismo erradicado, com esse problema resolvido.” Ou com outra meta que V. Exª sempre aponta aqui: “Olha, vamos resolver o problema da educação básica. Vamos tomar uma medida, uma iniciativa.” O que eu lamento é o seguinte: nós temos um grande Ministro da Educação agora, um filósofo, Renato Janine Ribeiro, mas ainda não vejo apontar para medidas nesse sentido. Não vejo nada mais do que o mesmo, nada mais do que a inclusão na educação, do ponto de vista técnico, mas sem medidas transformadoras, que eu considero estarem na origem e na ideia de ser de esquerda, de ser progressista. Eu acho que esta é a grande derrota desses anos: ter promovido uma ascensão, que é reconhecida por nós, de uma parcela da sociedade. Constituiu uma nova classe média, mas boa parte dessa classe média está agora nas ruas contra o PT, criminalizando o próprio PT, e alguns deles com bandeiras das mais conservadoras porque não houve uma ascensão transformadora. Eu queria só cumprimentar V. Exª e fazer este registro. Acho que a grande derrota desse período é um grande ensinamento para um projeto de Brasil para o futuro.

            A ascensão só do ponto de vista do consumo não é educador e transformador para um projeto que eu considero fundamental, que é um projeto de sociedade.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Mas é bom eleitoralmente.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - Ah, claro. Programas como o Bolsa-Família...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - É o que dá voto.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - Exatamente.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Não só esse, porque esse aí é uma questão até de generosidade.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - É uma questão de inclusão, que temos que reconhecer.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - É garantir que você vai comprar um carro, é garantir que você vai...

            Nós, indivíduo e eleitor indivíduo, queremos é o consumo.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - Claro...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Agora, o povo quer bem-estar. Esse é o problema. Nós perdemos a perspectiva de povo e trabalhamos hoje com a perspectiva do eleitor.

            Por isso que quem define o que diz o candidato hoje é quem faz pesquisa de opinião. Não é o líder que sente o que o povo quer, que é o papel do estadista. Perdemos isso. A gente manda fazer uma pesquisa de opinião, e aí ouve: eles querem isso. Aí diz isso. E, além disso - e nisso o Presidente Lula realmente é gênio -, compor os interesses corporativos contraditórios. Nós perdemos a perspectiva de povo e passamos a usar a perspectiva da soma das corporações que têm o poder de pressionar, de vetar, lobby. A democracia passou a ser feita com base no lobismo: lobismo de banqueiros, de trabalhadores nos sindicatos, como nós vimos aqui, inclusive.

            Não é só isso a política. A política não é só a soma dos lobbies, é o sentimento do povo, e aí tem que botar o longo prazo, tem que botar o futuro. E aí são as crianças, são elas que deveriam definir o que a gente faz. Lamentavelmente, elas estão em último lugar no Brasil.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/05/2015 - Página 106