Discurso durante a 101ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Congratulações ao Governo Federal pela edição da Medida Provisória 671, a qual institui o Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro; e outro assunto.

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Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESPORTO E LAZER:
  • Congratulações ao Governo Federal pela edição da Medida Provisória 671, a qual institui o Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro; e outro assunto.
EDUCAÇÃO:
  • .
Aparteantes
Cristovam Buarque, Wellington Fagundes.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/2015 - Página 208
Assuntos
Outros > DESPORTO E LAZER
Outros > EDUCAÇÃO
Indexação
  • ELOGIO, APROVAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ASSUNTO, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA, CLUBE, FUTEBOL, REFORMULAÇÃO, GESTÃO, ENFASE, PAGAMENTO, SALARIO, ATLETA PROFISSIONAL, DIVULGAÇÃO, DESPESA, LIMITAÇÃO, REELEIÇÃO, DIRIGENTE, DEFESA, NECESSIDADE, EXTINÇÃO, CORRUPÇÃO, CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL (CBF), AUMENTO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.
  • DEFESA, NECESSIDADE, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, CRISTOVAM BUARQUE, SENADOR, ASSUNTO, FEDERALIZAÇÃO, EDUCAÇÃO, OBJETIVO, IGUALDADE, ESTADOS, ENFASE, CESSAÇÃO, ANALFABETISMO.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, telespectadores que nos assistem pela TV Senado e ouvintes da Rádio Senado, estamos concluindo os trabalhos de uma medida provisória que pode ser a redenção para o futebol brasileiro.

            Essa medida provisória, que já teve constituída sua Comissão Mista aqui, foi apresentada pela Presidente da República há 25 dias e tem tramitado, apesar dos boicotes protagonizados pela bancada patrocinada pela Confederação Brasileira de Futebol.

            Essa medida provisória foi uma iniciativa dialogada com o Bom Senso Futebol Clube. E bom senso penso que é o que falta ao futebol brasileiro, Sr. Presidente, para fazer jus aos títulos e honrarias que já alcançou ao longo de sua história e para preservar o respeito da mais exigente torcida do Brasil, que é a torcida dos nossos clubes e a torcida da nossa seleção.

            A melhor coisa que surgiu no futebol, nos últimos trinta anos, foi a Democracia Corinthiana, entre 1980 e 1983, e agora esse movimento de jogadores de futebol denominado Bom Senso Futebol Clube reúne os atletas mais conscientes e militantes do nosso país.

            Bom, o bom senso que está surgindo nos atletas é o bom senso que falta à cartolagem do futebol brasileiro. Essa cartolagem, um time de dirigentes e executivos brasileiros, entre uma canelada e outra, escalou seus pernas de pau mais importantes na seleção mundial de corruptos da FIFA.

            Seus dirigentes, recentemente, foram presos em fragrante pelo FBI e respondem a diferentes crimes na justiça americana. Outros dois ex-presidentes da CBF, Ricardo Teixeira e José Maria Marin, estão entre os investigados.

            Teixeira, por sua vez, se manteve exilado, por muito tempo, em Miami. Marin, hoje, está em uma cela especial da Suíça, com uma meia dúzia de altos dirigentes da FIFA. O atual presidente da Confederação Brasileira de Futebol, o Sr. Marco Polo Del Nero, não se envergonha em dizer que é pupilo e afilhado político de Teixeira e Marin, e é citado diariamente na imprensa como um provável alvo de investigação, que fecha o cerco sobre ele e sobre o chefe de todos os chefes desse esquema corrupto mundial do futebol, que é o Sr. Joseph Blatter.

            Em 2 de junho passado, três dias após ser reeleito para um quinto mandato, o Senhor Presidente da FIFA vergonhosamente renunciou. Essa entidade, a FIFA, que tem uma dimensão mundial, tem 209 membros, e tem entrado repetidas vezes num círculo vicioso de corrupção.

            Esse esquema foi revelado através de delações premiadas, gravações, documentos, que mostram a que nível de vergonha o futebol mundial chegou. Esse nível de vergonha do futebol mundial demonstra que a Copa do Mundo, principal evento do futebol mundial, que ocorre a cada quatro anos, foi também corrompido.

            Sabemos, agora, que a África do Sul só ganhou para ser sede da Copa de 2010 contra o Marrocos porque demonstrou mais bola, ou melhor, mais dinheiro do que o seu coirmão africano.

            Marrocos perdeu a indicação, mesmo tendo pagado propina aos cartolas para ser sede daquela Copa do Mundo. Esse é o lamaçal, Sr. Presidente, por onde patinam também os brasileiros Del Nero, Teixeira e Marin. E esse lamaçal exige a intervenção firme das autoridades que devem zelar pelo jogo limpo e decente.

            Por isso, Sr. Presidente, eu saúdo a boa iniciativa que o Governo teve em propor a Medida Provisória nº 671, que, ao contrário das outras medidas provisórias, que parcelavam a dívida dos clubes, esta impõe obrigações aos clubes. Ela oferece ajuda os clubes endividados do País. É bom que se diga isso, porque, às vezes, procuram inverter. Os clubes se endividaram porque não cumpriram com as suas obrigações que todo brasileiro e empresa brasileira têm ou com o fisco ou obrigações trabalhistas com o Ministério do Trabalho e para com os seus trabalhadores.

            Os clubes, até agora, sempre exigiam, mesmo sendo devedores. É um dos raros casos do mundo em que o devedor se arvora à condição de credor, mesmo sendo devedor. Essa medida provisória, diferentemente das outras negociações que ocorreram até agora, propõe que as dívidas dos clubes sejam renegociadas, mas impõe contrapartidas de moralização da relação entre clubes, as federações e o Poder Público.

            Essa medida provisória impõe, inclusive, um dispositivo em que as confederações e federações de futebol têm que ter regras de transparência para os seus associados. E, não tendo essas regras, os clubes podem delas se afastar e montar ligas, como, por exemplo, existe hoje no futebol europeu. No futebol europeu, a confederação ou a federação de futebol só é responsável pelo selecionado nacional. Os clubes se organizam em associação comum, em ligas, e passam a gerir os seus campeonatos.

            A MP exige dos clubes e das entidades a reformulação de sua obsoleta gestão interna, para abrir espaço a executivos modernos, capazes de combater o crônico endividamento, que gera a diáspora dos principais craques do futebol brasileiro.

            São medidas básicas, triviais que são exigidas dos clubes: pagamento em dia dos salários dos atletas; divulgação pública do seu balanço de receitas e despesas; limitação de endividamento; e, talvez a mais importante delas, a democracia interna nos clubes, nas federações e na Confederação Brasileira de Futebol, com limite de reeleições, uma regra democrática básica que deveria haver em qualquer associação.

            O Sr. João Havelange, Sr. Presidente, presidiu o futebol brasileiro entre 1958 a 1973 e só deixou o posto após assumir a Presidência da FIFA, onde dominou, onde reinou de 1974 a 1988, um tempo maior do que a ditadura de 21 anos dos generais brasileiros que o cartola apoiou com o ardor de um radical torcedor hooligan. Veja, essa é uma regra básica que não poderia e não pode continuar na trajetória do futebol brasileiro.

            O Sr. João Havelange saiu da direção da CBF e entregou o comando para quem, quase em uma monarquia hereditária? Ao seu genro, Ricardo Teixeira, que presidiu a entidade de 1989 a 2012.

            Teixeira e seu Vice-Presidente Marin agasalharam Marco Polo Del Nero, desde 2003, na Federação Paulista de Futebol, preparando uma transição segura na CBF para preservar os anéis e salvar os dedos.

            No último dia 9 de junho, na Comissão de Esportes da Câmara dos Deputados, o Sr. Del Nero foi claro em classificar o Sr. Marin, um contraventor, um criminoso, preso hoje, como um grande companheiro. Veja, Sr. Presidente, que eles claramente se conhecem, e eles, obviamente, se merecem.

            O vexame pode ainda ser maior na CPI da CBF, aprovada aqui com um requerimento do Senador Romário, que eu e outros Senadores subscrevemos. Na CPI, entre outras coisas, temos que fazer a convocação daquelas pessoas íntimas de Del Nero.

            E temos que saber como ele conseguia recursos para distribuir presentes de luxo, como carros importados, cirurgias plásticas para pessoas com as quais tinha relação. Enfim, a CPI tem que ser instalada logo. Essa CPI tem que ter um relatório isento. O futebol em nosso País não é só paixão, aliás, o futebol faz parte da cultura nacional.

            Se esta Medida Provisória nº 671 não for aprovada, ou se a CPI da CBF, montada aqui no Senado, não resultar em investigação concreta, o preço a ser pago será altíssimo, é a continuação das vergonhas de 7 a 1 em copas do mundo que tivemos na última Copa, ou ontem, que estamos prestes a seguir na Copa América, no Chile.

            Há um obsceno processo hereditário na cartolagem nacional, Presidente, e por isso precisamos fazer um processo sanitário aprovando a medida provisória 671.

            Quero só citar o artigo 5º do texto original dessa medida provisória: exclui do refinanciamento dos clubes aqueles que insistirem na manutenção dessa aristocracia futebolística.

            Entidades que não limitem a reeleição por uma única vez, que não tenham conselho fiscal autônomo, que não deem direito de voz e voto aos seus atletas, que não publiquem regularmente seus relatórios contábeis, ficarão afastadas e banidas, de acordo com o texto da Medida Provisória.

            Ocorre, Sr. Presidente, como eu já disse, na semana passada, três reuniões da Comissão Mista foram boicotadas pela Bancada da Bola, ou melhor, como diz meu colega Senador Romário, pela Bancada da CBF. Esta semana conseguimos, finalmente, ler o relatório do Deputado Otávio Leite. Mas eu espero que, semana que vem, nós consigamos aprovar este relatório, apesar das pressões e boicotes feitos por aqueles Deputados ou aqueles Parlamentares que são patrocinados pela CBF.

            Essa medida provisória, além da limitação do mandato do presidente a uma única relação, ela, como sugerido pelo Bom Senso, pede a democratização das instâncias de decisão da CBF, o que inclui o seu colégio eleitoral, a assembleia geral e os conselhos técnicos.

            Isso é mais uma das reivindicações do Bom Senso Futebol Clube, que também sugere diminuir a cláusula de barreira para inscrição de chapas de candidato à Presidência da CBF e abrir a Confederação Brasileira de Futebol a quem deve ser seus verdadeiros donos: os clubes de futebol do Brasil e os atletas profissionais.

            Além disso, a adoção de medidas de fair play financeiro, previsto na MP, os companheiros do Bom Senso F.C. pregam o banimento do esporte de todos os envolvidos em escândalos de corrupção. A julgar isso, o atual Presidente da CBF já deveria, por dignidade, há muito ter renunciado da direção dessa entidade.

            Sr. Presidente, nós estamos a assistir, nos campos de futebol, ao vexame do nosso escrete nacional. Há muito tempo que nós não desacreditávamos tanto como agora. Isso tem uma relação direta com o lamaçal, com o festival de lodo e corrupção que se tornaram as entidades do nosso futebol. Por isso - este que é o principal esporte de nosso País, que, eu repito, é marca indelével não só como esporte, mas marca indelével da nossa cultura -, é fundamental que se tenha a pressão necessária para adoção das medidas de moralização do nosso principal esporte.

            E essas medidas só virão com a aprovação dessa Medida Provisória nº 671, o texto original que veio aqui para o Congresso Nacional e com a instalação isenta da CPI que está sendo proposta aqui no Senado.

            Senador Cristovam, tenho o maior prazer em ouvir V. Exª.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador Randolfe, ainda bem que alguns de nós se preocupam com isso, que é a corrupção no futebol, além do Romário, que tem trazido isso, e de outros de nós que assinamos a CPI. É lamentável que até no futebol - e o pior é que a gente sabe que principalmente no futebol - a corrupção está dominando a prática da política, porque há política no futebol, Senador. Isso vem, em parte, da reeleição sucessiva dos dirigentes, porque a sucessão sucessiva de dirigentes termina sendo a base para a criação de máfias. Ninguém é reeleito muitas vezes, em um cargo executivo, sem terminar criando em torno, assim, uma máfia daqueles que recebem as benesses. Isso está acontecendo também, e a gente não pode fechar os olhos, nos sindicatos. Hoje, em alguns sindicatos centrais, depois de sucessivas reeleições, reeleições e reeleições dos mesmos dirigentes, cria-se um apego tal ao poder que o grupo termina virando máfia, com consequências, inclusive, do uso da violência, como já aconteceu em outros países. O Brasil não ficará avesso. Nós precisamos ter regras. Eu, há tempos, já propus aqui que ninguém em cargo executivo possa ser reeleito mais de uma vez, nem em entidades privadas, a não ser aquelas que são propriedades, porque proprietário não se reelege, ele é proprietário até perder a propriedade. Mas até dirigente de condomínio, que é eleito, líder sindical, que é eleito, clube de futebol, que é eleito, tudo o que for um processo de escolha em uma reeleição. E agora, felizmente, estão acabando com a reeleição para Presidente, Governador e Prefeito. Essa é a realidade. E o senhor está trazendo aqui, porque o futebol é uma das coisas sagradas deste País. A corrupção na política cria uma consciência muito negativa na juventude em relação à política. Eles estão fugindo da política. Agora, quando os jovens e as crianças percebem que o futebol, essa coisa sagrada deles, é palco de corrupção, eles passam a desacreditar até no futebol. Por enquanto, o que se tem notícia é de que receberam um dinheiro para a escolha da sede de Copa do Mundo. Quanto tempo vai levar para descobrir que houve também dinheiro para decidir quem vai ser o campeão? Quanto tempo se vai levar para descobrir que teve gente ganhando dinheiro para levar gol e outro para fazer o gol? Ou será que a gente tem certeza que nunca aconteceu isso? O dinheiro correu frouxo para escolher quem vai sediar. Quem garante que não correu frouxo, em algumas copas, para escolher quem vai ser o campeão ou escolher quem vai perder? Pode ter acontecido. Imaginem as nossas crianças como ficam quando começarem a desconfiar que seus times perderam o campeonato por corrupção, por compra, Senador, e não porque o outro tipo foi mais qualificado? Por isso, a importância de a gente tratar o assunto da corrupção do futebol aqui. É algo mais profundo do que apenas corrupção. É parte do processo de deseducação do Brasil, partindo das crianças, criando essa desconfiança das crianças em relação às coisas. Isso é uma tragédia que muitos não estão percebendo! Agora, eu aproveito isso para dizer que o que me entristece, nesse assunto do futebol, é porque o futebol para mim tem sido sempre o grande exemplo que eu dou de como é possível, em um país, haver democracia social em um setor. Veja bem, se a gente olhar bem as fotos das nossas seleções brasileiras de futebol, a gente quase não vê branco, a gente não vê rico. Diga um filho de rico que chegou à Seleção Brasileira de Futebol. Por que isso? Não têm pernas boas os filhos de ricos? Não. Sabe por que é? Porque a bola é redonda para pobre também. A bola é redonda para todos. Como a bola é redonda para todos, todos podem jogar. Como todos podem jogar, quem chega lá em cima são os melhores mesmo. Na educação, não. Na educação, há as escolas redondas e as escolas quadradas. A parcela rica estuda em escolas redondas. A parcela pobre, salvo uma ou outra exceção, estuda em escolas quadradas. Então, lá em cima, na seleção brasileira de cientistas, de doutores, é tudo branco e rico, salvo exceções. É o contrário do futebol, porque a bola é redonda no futebol, e a escola é quadrada para os pobres. Eu nem sei como a elite brasileira não descobriu nem teve a ideia de fazer com que pobre só jogasse com bola quadrada, para que os filhos dos ricos chegassem à seleção. Agora, veja bem, não inventaram a bola quadrada, mas, no começo, até os anos 20 e 30, só jogavam futebol profissional brancos e ricos. Se eu não me engano, é por isso que chamam o Fluminense de pó de arroz.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - Pó de arroz, exatamente.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Porque os jogadores mais escurinhos tinham que botar pó de arroz para parecer que cada um deles era branco. Mas houve a democratização. Aí os negros foram aceitos e tomaram conta os pobres e os negros, porque eles são a maioria. E, sendo a maioria e a bola sendo redonda para eles também, eles terminam chegando lá em cima. Imaginem se fosse ainda proibido negro e pobre jogar futebol. Vocês acham que o Brasil seria campeão mundial de futebol se só branco ou rico jogasse? Não seria. É o que acontece com a ciência. É o que acontece com a competitividade industrial. Como a gente não deixa que os pobres cheguem lá em cima, a gente está jogando fora milhões, milhões, milhões de cérebros. Felizmente não jogamos fora milhões de pernas, até porque, como para pessoas são duas pernas para cada uma e a cabeça é só uma por cada pessoa, o número de pernas que iríamos jogar fora seria ainda maior. Este País não desperdiçou pernas para o futebol, mas desperdiçou cérebros para a ciência, porque o campo de futebol trabalha com as pernas e a escola trabalha com os cérebros. No campo de futebol, as regras são as mesmas, mas na escola a regra é diferente. A escola privada, dos ricos, não tem greve, tem giz, tem equipamento, tem aula integral, porque, se não for na própria escola, o inglês, francês, caratê, ginástica, tem um outro espaço. Então, as regras são de um tipo para a parcela rica. A regra da parcela pobre na educação é diferente. No futebol, é a mesma. Não tem regra de futebol para branco e regra de futebol para preto; não tem regra de futebol para rico e regra de futebol para pobre. Mas a escola tem. O futebol é o exemplo do ponto de vista da democratização dos talentos. O talento de um jogador de futebol nada tem a ver com a renda dos pais. O talento, na ciência, tem a ver com a renda dos pais, não porque filho de rico é mais inteligente, mas porque filho de rico tem escola melhor. Por isso, o grande desafio da gente é tratar a educação como tratamos o futebol: redondear todas as escolas do País, como todas as bolas de futebol são redondinhas - até as de meia, mas são redondas. O material pode ser diferente, a forma é a mesma. Temos que redondear. E não há outra forma de redondear - e aqui agradeço ao Senador Randolfe pelo parecer que deu ao meu projeto -, não há outra forma de redondear as escolas se não for o Governo Federal adotando as escolas. Se deixarmos 5,6 mil sisteminhas educacionais, um para cada cidade e Estado, dá quase 5,6 mil, não vamos redondear. São 5,6 mil formas. Nem dá mais para ser quadrada e redonda. Tem que ser quadrada, losângulo, retangular, tudo. São 5,6 mil sistemas escolares que nós temos na rede pública. Tem que ser um só! Agora, respeitando a especificidade na hora de definir o currículo, dando liberdade pedagógica dentro da sala de aula ao professor - não é nem ao prefeito, como alguns querem, é ao professor -, descentralizando, para que quem mande na escola sejam os pais, os alunos maiores, professores, servidores, e não o prefeito. Eu defendo a descentralização. Agora, a carreira do professor tem que ser uma, como é a carreira dos funcionários do Banco do Brasil, da Caixa Econômica, do Ministério Público, das escolas federais, que são as melhores do Brasil na educação de base, na média - nossas 520, com 250 mil alunos. Nós temos 250 mil alunos que têm escola pública gratuita da maior qualidade. Por que os outros 50 milhões ficam de fora disso? Por quê? Qual é a justificativa para federalizar para 250 mil e não federalizar para os outros? Quando eu vejo um prefeito dizer que é contra a federalização, eu pergunto: “O senhor não quer uma escola federal na sua cidade?” Ele: “Quero”. Então, por que não quer que todas sejam federais? Qual é a lógica disso? Então, o futebol é um exemplo de democratização do talento, de respeito ao talento, e a gente não vê, na educação, respeito ao talento. A gente vê respeito ao dinheiro e à cidade. É como se, na educação, toda criança que nasce a gente põe um carimbo aqui: CEP da cidade onde mora. E outro: CPF do pai e da mãe. Aí, ele é marcado por aquilo. No futebol, não tem carimbo na testa, tem é competência nas pernas. Porque as regras são as mesmas, porque a bola é redonda para todos. A gente tem que redondear as escolas do Brasil, mas, para isso, precisa acabar com a corrupção também na CBF. Porque a corrupção é capaz, eu não diria de fazer quadrada a bola, mas escolher quem ganha. Quem garante que não está havendo corrupção na hora de definir os jogadores da seleção brasileira de futebol?

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - É uma das suspeitas, inclusive, que deve ser motivo de investigação da CPI.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - É uma das suspeitas. Ou seja, a democratização que a gente vê do talento sendo ferida pelos interesses monetários dos dirigentes. Daí a importância da CPI e a importância de Senadores como o senhor estarem aqui trazendo esse assunto para esta Casa. Esse é um assunto muito importante para o Brasil, embora alguns digam que nem tanto. Parabéns por trazer esse problema.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - Senador Cristovam, eu lhe agradeço e só reitero dois aspectos do que V. Exa aqui destacou.

            Primeiro, que o futebol em nosso País fez parte da cultura nacional, ele é incorporado à cultura e à identidade nacional por uma circunstância, Presidente. Ele nasceu no País como um esporte da elite. Era, até o começo do século XX, football. Os nomes de cada uma das posições no campo eram denominações inglesas, porque de lá foi importado: back, centre-half, e assim por diante.

            O futebol abrasileirado, vou dizer assim, Senador Cristovam, foi uma conquista do povo brasileiro. Foram exatamente os mais pobres que insistiram em praticar aquele esporte da elite e que tornaram aquele esporte da elite o mais popular esporte do nosso País. Foram os mais pobres, os negros - e não é à toa que o maior jogador da história do futebol brasileiro é um negro -, foram os mais pobres que elevaram o futebol brasileiro à condição de identidade nacional e a ser, por muito tempo, o melhor futebol do mundo. E por muito tempo, porque, hoje, da forma como está organizado e com a ausência de espaço para craques, esse posto, temos de admitir, nós o perdemos.

            Outro aspecto, Senador Cristovam: eu é que fico honrado em ter sido o Relator do Projeto de Lei de V. Exª que propõe a federalização da educação. É, sem dúvida alguma, a alternativa para buscarmos universalizar. Nós temos números no Brasil que são inaceitáveis. E eu sempre destaco como o pior deles ainda termos 9% de analfabetos em nossa população. São 15 milhões de brasileiros! E como enfrentar dilemas como esse? É a União assumir a responsabilidade estratégica pela educação, que é, Senador Cristovam, o que busca o projeto de V. Exª. Por isso, a honra foi minha em relatá-lo.

            Espero que possamos aprovar o projeto de V. Exª na terça-feira, na Comissão de Educação, para que ele siga logo para a Câmara.

            Veja, V. Exª fez uma comparação: a carreira de professor tem que ser uma carreira como é a carreira de um membro do Ministério Público, como é a carreira de um membro do Judiciário. Ela tem que ser tratada dessa forma, como até é tratada em outros países.

            Pois bem, eu diria a mesma coisa: a União tem que definir a educação como um objetivo estratégico e com metas concretas a serem cumpridas. Só resolveremos problemas como o analfabetismo se a União assumir a responsabilidade por isso, assumir a responsabilidade pelo tratamento de todos igualitariamente - de todos! As escolas do Maranhão, onde 1/3 da população é analfabeta, serem tratadas como as escolas de São Paulo, onde o índice de analfabetismo é praticamente insignificante.

            É isso o que diz o projeto de V. Exª.

            Por fim, Sr. Presidente, espero que nesta semana aprovemos na Comissão Mista o relatório da Medida Provisória nº 671. Eu repito: ao trazer o futebol para cá, eu não estou trazendo um esporte. Estou trazendo algo que faz parte da identidade do brasileiro, este brasileiro que tem sofrido tanto e não sabe as causas do sofrimento em relação a uma das poucas paixões que tinha. E a causa do sofrimento é que onde há corrupção e onde se montam esquemas corruptos sempre redunda o que está acontecendo hoje com o futebol brasileiro. É corrupção, em âmbito mundial, na definição da sede de Copa do Mundo. É corrupção na contratação de jogadores. É corrupção, sim, Senador Cristovam, até na escalação.

            Por isso, chegou o momento de o Estado brasileiro, através do Parlamento, cumprir a sua responsabilidade, porque nós não podemos tratar a corrupção no futebol, que é a corrupção de um valor nacional, de forma e de maneira menor, como é tratada a corrupção no Poder Público. Ambas são danosas à sociedade brasileira.

            A corrupção no futebol sequestra sonhos. Todos nós, desde criança, crescemos admirando e aprendendo a jogar futebol. A corrupção no futebol sequestra sonhos de gerações de brasileiros.

            Por isso é necessário, neste momento, ter uma medida por parte do Estado brasileiro através do seu Parlamento, porque, quando o nosso principal esporte é representado na escala internacional, os símbolos que para lá são levados são a bandeira e o Hino Nacional. É por isso que esse esquema corrupto tem que ter um basta. E eu espero que o Parlamento brasileiro, com essa CPI que montou, esteja à altura de responder a essa necessidade.

            O Sr. Wellington Fagundes (Bloco União e Força/PR - MT) - Senador Randolfe.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - Senador Wellington, com o maior prazer.

            O Sr. Wellington Fagundes (Bloco União e Força/PR - MT) - Senador Randolfe, eu também faço parte dessa CPI, fui indicado também pelo meu partido, o Bloco. Creio que V. Exª coloca aqui o mais básico de tudo, exatamente a corrupção, que acaba com a expectativa de uma geração. Quantas crianças nasceram pensando nos Pelés, pensando em todos os astros que as motivaram inclusive a ir para o esporte e para a educação, como disse aqui o Senador Cristovam. Ontem eu estava conversando com o nosso companheiro conterrâneo de Mato Grosso, Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, que é um pelezista. Inclusive, lá no gabinete, ele tem as camisas. Ele dizia da sua decepção como Ministro com o que está acontecendo com o futebol brasileiro. Era exatamente nesse ponto que ele tocava. E ele, como pelezista, falou: “Mas naquela época, nós tínhamos uma geração de grandes astros”. E o Brasil hoje até nisso está carente. Nós temos o Neymar, que se destaca hoje na Seleção Brasileira. Tirou o Neymar da Seleção, foi aquela tragédia do 7 a 1, que deixou todos nós, brasileiros, estarrecidos, nos estádios, todo mundo chorando e sem saber o que significava aquilo. Talvez hoje, com o que está acontecendo, começamos a entender esse processo da corrupção, que, realmente, faz com que tenhamos que despertar. E V. Exª coloca também que temos que encontrar solução, inclusive legislativa. Eu apresentei, na Câmara dos Deputados, um projeto de lei que proibia mais do que uma reeleição em todas as entidades sociais. Foi considerado inconstitucional. Mas eu creio que uma CBF, que representa todo o patrimônio do Brasil, mesmo que não tenha recurso público direto, ela tem recurso indireto. Por isso eu acredito que permitir que federações, confederações possam ter reeleição ad eternum, por 20, 30 anos o mesmo presidente, com sucessão familiar, isso também tem sido uma grande causa de corrupção. Agora a FIFA já tomou a decisão de não permitir mais a reeleição, a CBF está tomando essa decisão, mas eu creio que esse é um aspecto que precisamos discutir até em outras entidades, em outras instituições brasileiras, para não ter a situação, já comprovada, que estamos vivendo no mundo do futebol, no mundo das esperanças das crianças de que o Senador Cristovam tanto fala, porque o esporte tem a ver diretamente com a educação, é o estímulo para que a criança, a juventude não vá para a droga. Mas essa decepção pode fazer com que o Brasil, que é o país tão famoso mundialmente pelo futebol, essa questão, essa situação poderá também castrar a nova geração que está aí, como foi a ditadura na questão da política, porque hoje nós temos dificuldade para encontrar lideranças. Então eu quero parabenizar V. Exª e quero me somar na CPI, para que encontrar caminhos para fazer com que a criatividade e a arte do brasileiro possam ser enaltecidas, principalmente com estímulos, porque ele está ali competindo com verdade e não competindo com mentira desde a escalação e até quem tem que marcar o gol ou o goleiro que tem que deixar a bola entrar. Muito obrigado.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP) - Senador Wellington, fico feliz com a sua presença na CPI. A sua missão e a dos membros da CPI é árdua. Eu lhe digo que não há solução quando alguma instituição chega ao fundo do poço na crise, como é o caso do futebol brasileiro e da Confederação Brasileira de Futebol. Não há solução que não seja uma reforma profunda.

            As instituições do futebol brasileiro, acredito que não há mais dúvida de que estejam no fundo do poço na crise. É uma crise que ataca a Confederação Brasileira de Futebol e as federações de futebol. Via de regra, algumas existem só para corruptamente manter o esquema que domina a Confederação Brasileira de Futebol e os clubes.

            Quanto aos clubes, quero reiterar que a Medida Provisória nº 671, que iremos apreciar agora, a novidade dela é impor condições de cláusula de transparência para os clubes e a necessidade de participação de atletas e de outros atores na vida social dos clubes. Por isso, os clubes têm que ter a compreensão de que são devedores. E a medida provisória é o Estado brasileiro dizendo quais são os mecanismos para que eles quitem essas dívidas. Não podem se posicionar e se portar como credores.

            Sr. Presidente, quero agradecer o espaço e o tempo dedicados por V. Exª. Espero, sinceramente, que esta Casa aprove a Medida Provisória nº 671 e em seguida a CPI da CBF possa cumprir o papel histórico de moralizar o futebol brasileiro.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/2015 - Página 208