Discurso durante a 55ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à direção nacional do PDT pela condução desastrada do partido.

Autor
Lasier Martins (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Lasier Costa Martins
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES E PARTIDOS POLITICOS:
  • Críticas à direção nacional do PDT pela condução desastrada do partido.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 21/04/2016 - Página 62
Assunto
Outros > ELEIÇÕES E PARTIDOS POLITICOS
Indexação
  • CRITICA, DIREÇÃO, PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA (PDT), PARTIDO POLITICO, SUBORDINAÇÃO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), SUGESTÃO, INDEPENDENCIA, POLITICA.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Zeze Perrella, Srs. Senadores, Senadoras, telespectadores, ouvintes da Rádio Senado, eu venho à tribuna falar sobre o trabalhismo, algo que V. Exª bem conhece, porque até há pouco tempo estava no Partido Trabalhista, o PDT, e de lá saiu inconformado com os rumos.

    Falo sobre isso, Sr. Presidente, em razão do momento crítico e desastrado que vive o meu Partido, o Partido Democrático Trabalhista, de um passado de glórias e de respeito pelos serviços prestados ao Brasil, partido de uma doutrina que conquistou multidões de eleitores, elegeu governantes, incontáveis Parlamentares de respeito. Hoje, no entanto, o meu Partido está transformado em um Partido inexpressivo nacionalmente, embora ainda muito grande no meu Rio Grande do Sul, onde se projetou o trabalhismo, onde é inclusive o Partido com maior número de filiados entre todos. O PDT é muito grande no Rio Grande do Sul, mas nacionalmente decaiu demais. Por quê? Por ser malconduzido nacionalmente, distante de seus ideais programáticos, hoje um PDT sem ideias, sem propostas, sem iniciativas e com descumprimento doutrinário; mas um PDT de divisões, discórdias e enfraquecimento, porque, em vez de ser um Partido independente e altivo, se tornou um Partido secundário, satélite dos outros, amarrado, servil, no caso de hoje, ao PT, e um partido fisiológico a um Governo que fracassou, que levou a economia nacional ao caos, que faz proliferar o desemprego em todo o País, conivente com a ruína de nossas empresas estatais, entre elas aquela que foi criada pelo trabalhismo - a Petrobras -, um PDT atrelado a uma sigla que se viciou em servir-se ilegalmente de vultosas verbas públicas para se perpetuar no poder, que presta maus serviços à saúde, à educação, à infraestrutura, ao saneamento e que vem se caracterizando, isso sim, em pela elevação estratosférica dos tributos e notáveis desestímulos ao empreendedorismo.

    É a este Governo que se entregou o nosso honrado Partido Democrático Trabalhista. Por isso, quero recordar, aqui desta tribuna, o que era e como deverá ser - e um dia haverá de voltar a ser - o Partido do trabalhismo, hoje ignorado e enxovalhado pela cúpula do meu Partido.

    O trabalhismo, Senador Cristovam Buarque - V. Exª, que também até bem pouco tempo integrava esse Partido, e que, lastimavelmente, por discordância com a condução, se afastou, sabe o que é o trabalhismo -, que talvez seja uma das construções mais importantes da história política moderna, foi responsável pelo equilíbrio de forças do pós-guerra e pela criação de modelos de Estado que ajudaram a humanidade a encontrar elementos agregadores e complementares, em especial na Europa.

    Foi com essa força que o trabalhismo se expandiu e chegou ao Brasil. Encontrou, primeiramente, as mãos do nosso maior arquiteto, Alberto Pasqualini. Sob sua orientação, foram desenvolvidos os princípios norteadores da doutrina trabalhista no Brasil.

    Em nossa história, situam-se figuras memoráveis, como Getúlio Vargas, Jango, Brizola. Partidos trabalhistas nasceram: surgiu o PTB, depois o nosso PDT, Partido do qual tenho enorme orgulho de ser filiado e militante.

    Como todas as ideias, nossa doutrina precisa estar adaptada ao tempo. Na Europa, primeiro, sob os auspícios de Felipe González, vimos a Espanha florescer durante a década de 80, encontrando equilíbrio interno, via trabalhismo. Essa arquitetura política trouxe unidade para um país que mergulhava na experiência democrática logo após os anos da era franquista.

    Na década de 90, víamos o trabalhismo passar por reformas importantes que acabaram por adaptar os nossos princípios à evolução dos tempos. Tony Blair, inspirado nos escritos de Anthony Giddens, propôs uma reforma profunda no trabalhismo inglês. O advento do New Labour levou nossos pares ao governo britânico, imprimindo um modelo de governo que entendeu o mercado e conciliou este aos preceitos sociais de nossa doutrina.

    O Brasil, que passou por avanços importantes na década de 90, com a estabilização da moeda mediante o Plano Real, encontrou no trabalhismo também um ponto de apoio. Enxergamos as reformas bem conduzidas pelos social-democratas, com atenção para que os pilares trabalhistas não fossem comprometidos. Aí encontramos o equilíbrio, e o Brasil caminhou com a certeza de que estávamos em direção da paz social.

    Foi com estranheza, portanto, que enxergamos a corrupção se aninhar em um Governo popular que recém tinha chegado ao poder. Cito nosso líder Brizola, que tinha esta impressão e escrevia, na época, em 2004:

A cada dia, por toda a parte, surgem mais e mais sinais de que o governo Lula vai se desintegrando. Apenas um mês do escândalo Waldomiro foi o suficiente para que ficasse evidente e dramática a crise de uma administração incapaz de tomar decisões que o povo esperava e que só se preocupa com seu projeto político-eleitoral. O atual Presidente [dizia Brizola, pouco antes de morrer] revelou-se um inepto e um fraco de ideias e de comando.

    O ano era 2004, e as garras da corrupção começavam a se mostrar afiadas. Como trabalhistas, não podíamos coadunar com esse estado de coisas. Nas palavras de Brizola, estão as razões: o trabalhismo não poderia enxergar a destruição da paz social alcançada com as reformas social-democratas, que mantiveram garantidos os direitos sociais.

    Naquele momento, nosso Partido dava passos importantes, depois esquecidos, e, hoje, tão esquecidos - importantes, repito sempre -: o trabalhismo se modernizou, passou por transformações na Europa que desaguaram no Brasil. O novo trabalhismo inglês, por exemplo, aceita as reformas realizadas pelos conservadores, assim como seus preceitos da economia de mercado. Esse trabalhismo que emerge especialmente desse período é o chamado "caminho do meio" ou "terceira via", ou seja, um ponto de equilíbrio entre os direitos sociais e a economia de mercado.

    Assim, no Brasil, o trabalhismo moderno deve aceitar as reformas realizadas pelos governos social-democratas, entendendo os benefícios advindos do processo de desestatização, que, mediante iniciativas de concessão, privatização e permissão, geraram empregos, diversificaram a economia, e geraram um auspicioso aumento da renda, do emprego e da qualidade dos serviços públicos. Esse é o trabalhismo inglês, que nós queríamos ter aqui, mas a atual direção do PDT não deixa.

    Foi assim também na Espanha, Alemanha e Reino Unido.

    Não podemos estar alinhados simplesmente com o mercado, deixando parcela da população desassistida de amparo do Estado. O trabalhismo busca esse equilíbrio. Sempre foi a palavra de Alberto Pasqualini: o equilíbrio entre o capitalismo e o socialismo. Devemos nos inspirar em modelos de governo que saibam balancear ambos os lados com sensatez e sensibilidade humana e social.

    Para atingir esse trabalhismo orgânico e vitorioso, precisamos de um Partido forte e ideais arejados, modernos e alinhados à boa governança que enxergamos em administrações irmãs ao redor do mundo. Um partido não é feito de somente uma pessoa, mas de líderes. Caso contrário, cairemos na armadilha do caudilhismo, como muito bem posto por Alberto Pasqualini em seus escritos ainda na década de 40: "O caudilhismo, na América do Sul, é a forma organizada da criminalidade política". Não há espaço para o totalitarismo ou autoritarismo partidário, pois se temos isso, não temos um verdadeiro e autêntico partido trabalhista.

    Como lembrava antes - mudou depois - o atual Presidente do PDT, Carlos Lupi, durante um rasgo de sensatez, em discurso realizado em 2005, tão mudado hoje, quando dizia: "Na ditadura de um modelo único, uma visão única da economia, a mesma que está falindo o mundo". E aí seguia Carlos Lupi, escrevendo em 2005: "O Governo Lula possui um comprometimento com um modelo econômico falido, que não soluciona a miséria, o desemprego e leva à falência das políticas sociais em nosso País". Lá estava certo ele com relação ao conceito do Governo Lula. E repito aqui desta tribuna: o mesmo se aplica na sua continuidade, no Governo Dilma.

    Não há dúvida de que o trabalhismo não se confunde com o que vemos hoje no Brasil. Bem diferente disso, por isso não é admissível que o PDT esteja agarrado a este Governo.

    Meu caminho é lutar pelas nossas ideias. Minha missão de trabalhista é defender os princípios, seguindo a trilha do caminho trabalhista, inspirado no ideal de Pasqualini e adaptado ao mundo moderno em que vivemos, inspirado nas experiências trabalhistas reformistas inglesas, alemãs, espanholas e americanas.

    Nosso Partido precisa de unidade, liderança, inspiração, democracia e modernidade e precisa estar livre da subserviência de hoje. Não pode estar entregue a governos, como este, que nós estamos vendo e a que o nosso PDT não poderia continuar aliado há muito tempo. Somente assim estaremos preparados para os desafios que se desenham.

    Meu desejo - concluindo, Sr. Presidente Hélio José - não é vencer a qualquer custo, mas deixar uma marca, lutar pelo que é digno e justo. Inspirado por Pasqualini, termino dizendo que vencer por processos escusos não é vencer. Esse é o problema do PDT de hoje. Há vitórias que são ignomínias, como há derrotas que são triunfos imortais. Estou aqui, nesta Casa, para encontrar consenso e, quando necessário, travar o bom combate: honesto, direto e programático.

    Fiz este pronunciamento, porque, ainda ontem, vi uma entrevista do atual Presidente do PDT dizendo que eu não era trabalhista. Dei aqui a minha demonstração, Sr. Presidente. Sou tão ou muito mais trabalhista que S. Exª, que estagnou, que arruinou, que divide o nosso Partido.

    Era o que tinha a dizer.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Permite-me?

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Sim, Senador Cristovam Buarque.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Senador Lasier, eu não poderia deixar de fazer um aparte. Primeiro, para dizer que fico feliz ao ouvir uma frase como a sua: "Meu caminho é lutar por meus princípios, por minhas propostas, pelos sonhos que eu tenho para o meu País." O senhor falou nessa linha. Segundo, para dizer que minha convivência com o senhor mostrou o seu trabalhismo intrínseco, que, aliás, vem de família, como já escutei o senhor falar uma vez. E, terceiro, para dizer como o trabalhismo, hoje, seria a saída para o Brasil. O trabalhismo, primeiro, possibilita a convivência do Estado com o setor privado, coisa que, quando ele surgiu, era vista como algo anômalo, porque havia o comunismo do Estado e o capitalismo do setor privado. Pasqualini e os outros disseram: "Não. A gente pode conviver e servir ao público." Hoje, já se entende isso. Hoje, pelo fracasso do estadismo, já se percebe que é possível haver público sem ser estatal, e estatal que não serve ao público. É possível, sim, a cooperação público-privada servir ao público. Segundo, esse trabalhismo, naquela época, era ridicularizado. A educação como motor do progresso. O progresso era visto com base no capital, na infraestrutura física. Brizola já dizia, no começo, que o motor do progresso é a educação. O socialismo não é tomar as fábricas para os operários, mas colocar os operários nas fábricas dos filhos dos patrões. Não faz mal que as fábricas pertençam aos patrões. O problema que nos deixou para trás na injustiça é que os filhos dos patrões estudavam em escolas diferentes das dos filhos dos trabalhadores. Colocar junto, como os CIEPs faziam. Então, agora que o trabalhismo chegou, do ponto de vista de estar, como dizem por aí, no espírito do tempo - o espírito do tempo é favorável a isso -, lamentavelmente o PDT não consegue agarrar a responsabilidade que tem de servir ao País conduzindo o trabalhismo. Preferiu se associar, virar um "puxadinho", como diz o Pedro Taques, que foi do PDT; virar um "puxadinho" do PT, um "puxadinho" do Planalto, e terminou se afogando com esses dois. É uma pena que o Presidente do PDT, por um ministério - porque até 2005 ele dizia isso contra o Governo e contra o PT ...

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Exato.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Quando, no ano seguinte, o Lula ofereceu o ministério, pronto; virou Deus.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Exato.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - O PT virou o céu. E se agarrou de tal maneira que agora está afogando e, no final, nos estertores do afogamento, expulsando personalidades, como ele faz, ao impor o voto sobre coisas nas quais não deveria haver...

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Autoritarismo.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - ... autoritarismo, e em coisas de princípio. Votar se a Presidente deve ou não sair não é uma questão de política, é uma questão de princípio, de entendimento de cada um. Fechou questão. Então, muitos erros. É uma pena que esses erros estão levando para o fundo não apenas um grande partido, mas um partido que tem tudo, ou tinha, para estar a favor do espírito do tempo, ou seja, condizente com o que o mundo precisa. Mas, aparentemente, perdeu-se. E muitas décadas ou anos vamos levar para recuperar isso. E seu discurso ajudará muito nessa recuperação, pela crítica e pela formulação que faz.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Muito obrigado, Senador.

    Em conclusão, vejam os trabalhistas, vejam os filiados, os simpatizantes do PDT, os homens que o atual Presidente jogou fora; a inteligência, a cultura, o preparo de um Cristovam Buarque, que saiu do PDT por discordância dos rumos que o PDT vem tomando. É uma pena, mas haverá de ser reconstruído. Mas não com Carlos Lupi.

    Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/04/2016 - Página 62