Discurso durante a 60ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do início do ciclo de debates sobre a democracia na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa; comentário sobre a história e a importância da democracia brasileira, e defesa da realização de novas eleições gerais.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Registro do início do ciclo de debates sobre a democracia na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa; comentário sobre a história e a importância da democracia brasileira, e defesa da realização de novas eleições gerais.
Publicação
Publicação no DSF de 28/04/2016 - Página 90
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • REGISTRO, INICIO, PERIODO, DEBATE, ASSUNTO, DEMOCRACIA, LOCAL, COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS (CDH), COMENTARIO, HISTORIA, IMPORTANCIA, ESTADO DEMOCRATICO, BRASIL, DEFESA, REALIZAÇÃO, ELEIÇÃO DIRETA, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Telmário Mota, nós aprovamos, na Comissão de Direitos Humanos, o que chamamos de um ciclo de debates sobre a democracia. Realizamos a primeira reunião hoje, pela manhã, em que aprofundamos o debate sobre a democracia brasileira com juristas e também com líderes dos movimentos sociais.

    Sr. Presidente, para mim, a democracia é a mãe de todas as causas. Quando você ataca a democracia, você está atacando os principais direitos da cidadania.

    Eu escrevi um livro, Sr. Presidente, entre tantos que escrevi, em que eu já dizia que o martelo, a pedra e o fogo foram instrumentos usados no longo das nossas vidas na construção da cidadania. Lá eu digo que o martelo é presente em todas as culturas, assumindo nos povos antigos que se dedicaram à metalurgia - e, casualmente, depois, eu me tornei metalúrgico - importante símbolo do domínio da ferramenta sobre o metal. Nos tempos modernos, o martelo tornou-se o símbolo do operariado urbano. O martelo tem, sim, uma simbologia com a democracia, o direito do voto, a liberdade, a justiça, a igualdade, a fraternidade, a solidariedade, o Estado democrático de direito, a Constituição cidadã de 1988, de que eu participei, uma das Cartas mais avançadas de todos os tempos no Brasil.

    Sr. Presidente Telmário Mota, temos que estar atentos e vigilantes para que, com tudo isso que eu falo sobre a democracia, a nossa Constituição não seja respeitada, atacada, rasgada.

    O Dicionário Aurélio traz a palavra democracia com os seguintes significados: governo do povo; soberania popular; doutrina ou regime político baseado nos princípios da soberania popular e da distribuição equitativa do poder.

    Quem tem medo do voto? Quem tem medo da democracia? Não é preciso repetir aqui, Sr. Presidente, que a Constituição cidadã garante que todo poder emana do povo e que a ele seja assegurado.

    Lembro, Sr. Presidente, que há outra descrição que diz que democracia é: sistema em que cada cidadão participa do governo; democratismo; a influência do povo no governo de um Estado; a política ou a doutrina democrática; o povo e as classes populares.

    Homens vêm, há séculos, tratando desse tema, expondo os seus entendimentos e suas reflexões, porque ninguém inventou no mundo um sistema melhor que a democracia. Os mais conhecidos são os de Atenas. Para Platão, a democracia é uma constituição agradável, anárquica e variada, distribuidora de igualdade indiferentemente a iguais e a desiguais. Aristóteles dizia que a democracia surgiu quando, devido ao fato de que todos são iguais em certo sentido, acreditou-se que todos fossem absolutamente iguais, sim, entre si.

    O conceito de democracia tem sido construído por milênios e, por isso, deveria ser acalantado, acariciado, embalado e não maculado, e não atingido. Nossa democracia tão jovem está, sim, Sr. Presidente, sendo atacada mais uma vez na história deste País.

    Desde a democracia direta dos atenienses, passando pela democracia representativa contemporânea, até a democracia participativa que, cada vez mais, tem tomado espaço no debate público, seu significado permanece o mesmo. Democracia é o símbolo do governo do povo.

    Modernamente, Sr. Presidente, podemos dizer que há outras definições e comentários, como os de Abraham Lincoln, Nelson Mandela, José Saramago. Uma das mais respeitadas é a do pensador político e ex-Senador italiano Norberto Bobbio. Ele diz: "A democracia é, no essencial, um método de governo, um conjunto de regras de procedimento para a formação das decisões coletivas, no qual está prevista e facilitada a ampla participação dos interessados", ou seja, o povo.

    Nenhuma nação ou país aprende democracia tão somente com estudos, mas na prática. É claro que são fundamentais o princípio, a base teórica, a educação, mas a prática de respeitar a democracia. A democracia só tem sentido se for posta em prática, e isso predispõe povo esclarecido, que, muitas vezes, é chamado a ser cada vez mais combativo para defendê-la do quê? Os ataques à democracia.

    Sr. Presidente, nós Parlamentares, políticos, trabalhadores, empresários, cidadãos, mulheres e homens ativistas sociais temos e vemos a obrigação de defender a democracia.

    Aqui voltamos a Norberto Bobbio que disse: "O respeito às normas e às instituições da democracia é o primeiro passo para a renovação progressiva da sociedade".

    Sr. Presidente, desde a nossa redemocratização, na década de 1980, temos testemunhado processos eleitorais regulares. Já passamos por sete eleições diretas para Presidente do Brasil, sendo seis delas também acompanhadas de eleições legislativas para o nível federal. Também temos mantido eleições regulares nos níveis regionais e locais.

    A democracia resulta da vontade do povo, de todo o povo. Por que ter medo do voto e do povo? Como ensina um de nossos princípios, devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades. Ban Ki-moon, Secretário-Geral da ONU, disse que a democracia não é apenas um fim em si, é também um poderoso vetor de progresso econômico e social, de paz, de segurança, de solidariedade, de respeito pelos direitos e liberdades fundamentais. Mas democracia resulta em uma história de povos com mais dignidade e direitos humanos, com muito menos corrupção, mais justiça e melhor partilha do poder político.

    Tenho a convicção, Sr. Presidente, de que é na maior participação popular, na democracia mais direta possível, no diálogo e na convergência, que alcançaremos o objetivo comum a todos nós. Devemos fortalecer ainda mais nossas instituições, devemos garantir ainda mais os direitos e as liberdades do nosso povo, devemos buscar ainda mais a igualdade econômica, social e política dos brasileiros.

    Sr. Presidente, tenho certeza de que a democracia é o melhor meio para esses objetivos. Se estamos atravessando uma crise política, social, econômica e ética, que envolve, queiramos ou não, os Poderes da República... E aqui não há como não dizer que envolve principalmente o Executivo, o Legislativo e os setores privados, é só ver a Operação Zelotes.

    Num momento como este, em que a nossa jovem democracia, não por ela, mas pelos homens e mulheres, acaba sendo atingida, Sr. Presidente, por que não temos a grandeza política de concordar que o poder popular resolva a questão para que não fique uma luta de homens e mulheres, uma luta até insana do poder pelo poder sem o apoio popular? O apoio popular, Sr. Presidente, só virá se conseguirmos chegar a um grande entendimento e caminharmos para as eleições diretas.

    As pesquisas todas mostram, primeiro, que mesmo aqueles que são favoráveis ao impeachment da Presidenta reconhecem... E vi uma declaração, hoje ainda, do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, em que diz que não há dúvida de que a Presidenta é uma pessoa honesta e séria.

    Se esse é o quadro e o impeachment é apenas um gesto político em cima das tais pedaladas, que todos aqui que estão no plenário, que foram governadores, se fizer um levantamento, com precisão, vamos ver que inúmeros fizeram, com volume maior até do que o da própria Presidenta. Vamos aplicar o impeachment em todos os governadores que assim o fizeram? Porque é isso que está em debate, essa é a questão. Ou são os decretos?

    Em nome da democracia, Sr. Presidente, é que encerro a minha fala e voltarei tantas vezes, como faremos o debate na comissão, ouvindo a sociedade brasileira sobre este tema. Se todos realmente defendessem com alma, coração e vida, como alguém já disse, a democracia, com certeza, ela não seria atacada da forma como está sendo no Brasil e que aconteceu já em outros países de uma forma semelhante.

    Não vamos ter medo do voto. A melhor arma da paz, com a sua simbologia da defesa da democracia, é o voto. Por que não assegurar à democracia que ela seja defendida pelo voto popular e que o povo diga quem deve governar o nosso País? Fica aqui, mais uma vez, esse apelo no sentido de que aqueles que querem chegar ao poder de qualquer jeito, não importa por que via, cheguem ao entendimento de que a democracia é o melhor caminho, Sr. Presidente. Com a democracia é tudo e sem a democracia não chegaremos a lugar nenhum.

    Tenho uma enorme preocupação, confesso, Senador Valdir Raupp e Senador Telmário. Eu tenho uma enorme preocupação. Independente do resultado do dia 11 e mesmo o resultado daqui a seis meses, teremos um quadro muito, muito delicado no País. A campanha das diretas vai para as ruas, não tem como. Ela vai para as ruas de forma natural, a partir do dia 11. Por que não procuramos construir um entendimento para não ficarmos mais seis meses? E depois da última votação de quem tiver dois terços, porque quem tiver dois terços é que vai decidir... Tenho dito que hoje ninguém tem 54 e ninguém tem 28, mas tudo pode acontecer ao longo desses seis meses, porque muitos Senadores que votarão pela admissibilidade... Não dou a lista, mas mais de dez me disseram: "Voto agora. Não tenho voto definido lá na frente na hora do mérito."

    Cheguei a fazer a leitura - e vou concluir - de dois cenários bem práticos. Cenário nº 1: daqui seis meses, a Presidente volta. Digamos que ela seja afastada pela admissibilidade. O que vai acontecer? O chamado inimigo nº 1, que é o Deputado Eduardo Cunha - que não comparo a nenhum Deputado ou Senador, porque ele é o inimigo nº 1 da democracia, e não vou avançar mais na análise dele - já disse que tem mais nove processos e que vai instalar os nove. E ele instala. Ele tem mais da metade da Câmara sob o seu controle, nós sabemos disso. Por isso, a Comissão de Ética não avança. Ele instala mais nove processos. Ficaremos todo o ano de 2017 discutindo, de novo, o impeachment.

    Cenário nº 2, Sr. Presidente: a Presidenta é afastada definitivamente daqui a seis meses. O que vai acontecer? Um Presidente, no caso ele, que é o Vice hoje, se caso assumir, com aceitação de 8% da população, a campanha vai para as ruas naturalmente. Voltaríamos a ter os cavaleiros da esperança, lembrando o falecido Teotônio Vilela, pelo País, buscando que tenhamos um Presidente eleito pelo voto direto, reconhecido pela população. Quem é que se sustenta com 8% ou com 5%? Porque vai terminar com 8% ou 5%. Não se sustenta, Sr. Presidente. Não se sustenta.

    Por isso, neste momento, para mim, a grandeza política seria fazermos um acordo com a Presidente e com o Vice, no sentido de irmos para as urnas agora, no dia 2 de outubro, e, pelo voto direto, a população decidir se deve ser um candidato do PMDB, um candidato do PSDB, um candidato da Rede, um candidato do PDT - todos já têm candidato -, um candidato do Partido Comunista, que sei que tem candidato aqui, no Plenário. Vou dizer que é o Senador Cristovam, que se filiou recentemente e poderá ser candidato. Temos o Ciro, pelo PDT; temos o Michel, provavelmente, pelo PMDB; e temos outros nomes. Só estou me lembrando de nomes.

    A população vai analisar não somente os nomes, mas quem tem o melhor programa, quem tem a melhor proposta. Se for um mandato de dois anos, meus queridos dois Senadores que estão no plenário, que, nesses dois anos, façamos uma reforma política, partidária e eleitoral verdadeira.

    Há dois caminhos. Um diz que convocaríamos grandes figuras eleitas pelo voto direito, nesses dois anos, que seria uma assembleia revisional temática para discutir isso. Aqueles que fossem eleitos - e eu defendo que fosse um quarto, o que dá em torno de 122, baseado nos 513 Deputados hoje - ficariam somente fazendo esse debate. Concluída a reforma, eles não poderiam concorrer. Senão, seria legislar em causa própria. E nós teríamos outro marco regulatório para as grandes eleições de 2018.

    São ideias, são caminhos. Nós, na tribuna, temos a obrigação de apontar caminhos e não ficar mais no ataque pessoal a esse ou àquele político, embora haja uma unanimidade hoje no País, que é aquele que poderá ser o Vice-Presidente da República, o Deputado Eduardo Cunha. Isso é unanimidade. Todos nós sabemos, pelo menos eu não ouvi ninguém, na tribuna do Senado, até hoje, fazer uma defesa do atual Presidente da Câmara. Já vi do Michel, o atual Vice-Presidente da República, mas não ouvi ninguém fazer uma defesa do Deputado Eduardo Cunha.

    Se esse é o quadro, por que não caminhamos para um grande entendimento? Voltaremos amanhã. Que Deus ilumine a todos nós, mas não em nome de pai, de filho, disso ou daquilo, mas em nome do povo brasileiro. Não estou falando em nome do povo brasileiro, mas que trabalhemos para melhorar a qualidade de vida do conjunto do povo brasileiro, que são 210 milhões de pessoas.

    Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/04/2016 - Página 90