Discussão durante a 123ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 10/08/2016 - Página 104
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, LEGALIDADE, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, REGULARIDADE, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Para discutir. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, estamos realmente diante de um momento importante, Sr. Presidente, um momento tão importante que muitos não compreendem a dimensão do que estão fazendo nesta Casa. Estamos exatamente no momento intermediário de um processo que este Congresso Nacional, iniciado na Câmara, aceitou, de admissibilidade do processo de impedimento da Presidente da República.

    Como disse no início desta sessão, não sou dilmista, nem petista, nem tucanista; sou socialista, sou democrata. E é nessa condição que ocupo esta tribuna para reafirmar a defesa da democracia.

    Ouso citar Marx, que já ensinava que "a história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa". Nada mais preciso para definir o atual momento da cena política brasileira. Vivemos hoje, Sr. Presidente, Srs. Senadores, uma grande farsa, em que as elites políticas, econômicas e midiáticas deste País montaram um cenário para usurpar o poder de quem recebeu o voto de 54.499.901 brasileiros e brasileiras.

    Para haver um golpe não é preciso, obrigatoriamente, que existam tanques nas ruas, como alguns ingenuamente argumentam. Não havia tanques nas ruas quando da instituição do parlamentarismo, em 1961, um golpe do Parlamento para impedir a posse de Jango. Aquelas ações nos levaram à tragédia do Golpe de 1964, esse sim com tanques nas ruas, prisões, tortura, assassinatos.

    Hoje, a farsa do impeachment sem crime de responsabilidade comprovado igualmente é um golpe, por mais que fira o ouvido de alguns, e nos oferece um futuro de incerteza e de instabilidade política. Farsa essa irremediavelmente maculada pelo pecado original de ter sido iniciada num evidente gesto de vendeta - para usar um termo típico da máfia siciliana - do ex-Presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, este comprovadamente corrupto, que até hoje não foi cassado pelos seus pares, apesar da sanha anticorrupção que tomou conta daquela Casa. Pelo menos se propagava assim. Empolgou esse senhor uma base de Deputados conservadores e fundamentalistas; paralisou o País com suas pautas bombas e a promoção de uma política anacrônica e demagógica para impedir a continuidade do Governo.

    O impeachment não é a panaceia milagrosa que vai resolver, num passe de mágica, os problemas políticos e econômicos do Brasil, como sustentam muitos dos seus defensores.

    Até porque tanto o Presidente interino como vários dos que hoje compõem o seu ministério já faziam parte do governo da Presidente Dilma e são, da mesma forma, responsáveis pela crise em que vivemos.

    A atual crise econômica é grave, é profunda e não deveria ser razão de brincadeiras; deveria ser enfrentada com a união de todos os brasileiros e um programa de ajuste fiscal que preservasse as conquistas e os direitos sociais obtidos nos últimos 12 anos, e não jogando o ônus e o preço dessa crise nos trabalhadores, como querem os atuais ocupantes do poder.

    Como dissemos antes, desde o primeiro momento o impeachment é opção pelo confronto político mais radical, que parece oferecer aos agentes econômicos a porta de saída da crise, mas, na verdade, oferece um atalho frágil, perigoso e de enorme imprevisibilidade.

    Machado de Assis, o grande romancista brasileiro, em sua crônica "Ao acaso", dizia, em 1864:

É uma santa coisa a democracia - não a democracia que faz viver os espertos, a democracia do papel e da palavra, mas a democracia praticada honestamente, regularmente, sinceramente. Quando ela deixa de ser sentimento para ser simplesmente forma, quando deixa de ser ideia para ser simplesmente feitio, nunca será democracia, será espertocracia, que é sempre o governo de todos os feitios e de todas as formas.

    Tem razão Machado de Assis. O que vivemos hoje é um golpe da espertocracia política brasileira na democracia e no respeito à soberania popular.

    Tenta-se emprestar legitimidade a um processo ilegítimo. Respeito rigoroso aos prazos - fala-se aqui no plenário -, às formalidades processuais, aos ritos e à presença honrosa e honrada do Exmo Presidente do Supremo Tribunal Federal na condução desta sessão, como se todos os elementos formais fossem suficientes para esconder o verdadeiro espírito que anima e compromete toda a ilegitimidade nas intenções do que aqui está se cometendo.

    Dizer que o Governo interino é antídoto contra o aparelhamento do Estado, como foi dito aqui desta tribuna hoje à tarde, é patético, por tentar desconhecer que o Governo interino transformou o Palácio do Planalto num balcão de negócios, liberando cargos, emendas parlamentares, obras, apoio de Deputados e Senadores para garantir o impeachment.

    Num país cujo sistema político se revela absolutamente comprometido em toda a sua representação, em crise terminal por sucessivos escândalos que desnudam para a opinião pública nacional que o nosso sistema eleitoral e de governança exige uma profunda reforma política, assistimos às declarações de uma pretensa devoção ao rigor das contas públicas absolutamente incompatível com a prática pretérita e presente daqueles que as proferem.

    Em todo este processo, em nenhum momento, ficou juridicamente provado que a Presidente Dilma Rousseff cometeu crime de responsabilidade para justificar constitucionalmente o seu impedimento - nem pela auditoria do Senado Federal, nem pelo Ministério Público Federal.

    Mas isso, como já foi dito aqui e repetido, pouco importa. Vale, como disseram aqui inúmeras vezes, o conjunto da obra, e o conjunto da obra vai desde razões econômicas, as mais importantes possíveis, às razões que nós acabamos de ouvir, aqui desta tribuna do plenário, do orador que me antecedeu. É o conjunto da obra. Essa farsa que, ilegitimamente, deu o poder à pior parte do Governo da Presidente Dilma, com vários dos seus integrantes envolvidos...

(Soa a campainha.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - ... em denúncias e citados em delações da Operação Lava Jato, a começar pelo próprio Vice-Presidente, o Presidente interino, que está jogando o País num retrocesso político, inaugurando um período de obscurantismo e ameaçando direitos sociais.

    A cada ato deste Governo interino, vislumbra-se seu caráter reacionário: fim da CLT com a prevalência do acordado sobre o legislado; precarização das relações de trabalho; reforma da Previdência; fim do SUS e do piso salarial dos professores, com programas como a Escola sem Partido, que promete nos remeter aos tempos sombrios da guerra fria. Uma verdadeira contrarreforma da Constituição cidadã de 1988.

    A saída para a crise exige a ampla participação popular e só se dará nos marcos efetivamente democráticos. Por isso, defendemos a realização de um plebiscito...

(Interrupção do som.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Fora do microfone.) - ...sobre a antecipação das eleições presidenciais que o povo já exige nas ruas.

    Os mesmos que hoje bradaram com um exemplo da Constituição Federal nas mãos dizendo que votam em defesa da Constituição do País são aqueles que voltam a rasgar a Constituição cidadã, que garante o direito dos trabalhadores neste País.

    Certamente Ulysses Guimarães estaria se revolvendo no túmulo contra aqueles que estão tentando...

(Interrupção do som.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Fora do microfone.) - Sr. Presidente, as forças que hoje flertam com a extrema direita para chegar ao poder sem votos rapidamente vão se arrepender de ter maculado suas biografias. Não farei isso. Eu respeito a minha...

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ. Fora do microfone.) - Muito bem, Lídice.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Senadora...

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Fora do microfone.) - ... da qual não serei coveira, Sr. Presidente.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - ... a senhora tem meio minuto para terminar.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Fora do microfone.) - E o meu compromisso com a democracia...

(Soa a campainha.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - ... me obriga a me pronunciar contra o impedimento da Presidente Dilma Rousseff e o relatório do Senador Anastasia e a favor da democracia, contra a ilegitimidade e farsa desse processo de impeachment no Brasil.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/08/2016 - Página 104