Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Inquirição do Sr. Nelson Barbosa sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Inquirição do Sr. Nelson Barbosa sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/2016 - Página 26
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, TESTEMUNHA, NELSON BARBOSA, ASSUNTO, CRIME DE RESPONSABILIDADE, AUTORIA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. Cumprimento também a testemunha, o ex-Ministro Nelson Barbosa.

    Talvez, Ministro Nelson Barbosa, aqui fosse mais útil à compreensão da sociedade brasileira - eu queria o apoio dos Senadores, para podermos entender o que o senhor vai me responder -, talvez fosse mais útil à compreensão da população do que se trata tudo isso e a consequência para o cotidiano das pessoas, sobretudo o que aconteceu. Porque, ao falar sobre pedalada fiscal, sobre decretos, todas essas coisas, as pessoas não têm o domínio técnico do que isso significa no dispositivo constitucional, no art. 85 da Constituição, na Lei de Responsabilidade Fiscal, mas é preciso dizer à população quais as consequências, ou para os bancos oficiais, em relação às famosas pedaladas fiscais. Mas isso talvez não seja possível porque estamos aqui num tribunal, num julgamento, que está definido na Constituição brasileira, e esse rito está sendo seguido plenamente e rigorosamente sob o comando do Ministro Ricardo Lewandowski.

    Então, como acompanhei muito o Dr. Nelson Barbosa, na Comissão Especial, o trabalho feito, e também especialmente quando acompanhei a análise técnica dos laudos periciais, também avaliando o conjunto probatório, estou convencida sinceramente de que os atrasos deliberados, sistemáticos e reiterados, as famosas pedaladas, foram, sim, operações de crédito, conforme o conceito, aliás, estabelecido na própria Lei de Responsabilidade Fiscal.

    Para fundamentar essa minha afirmação e a minha convicção, lembro que o conceito de operação de crédito está no Item 3.2.1 do Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público, reproduzido no laudo da junta pericial, na p. 162. Segundo esse dispositivo, o conceito de crédito foi estabelecido de forma exemplificativa na Lei de Responsabilidade Fiscal e equipara-se ao reconhecimento ou à confissão de dívida pelo ente da Federação. 

    Então, as quantias foram muito grandes. Foram valores em atraso, totalizando cerca de R$50 bilhões em 2015, só em 2015, melhor dizendo. Foram 50 bilhões, em 2014; e, em 2015, 15 bilhões só no Banco do Brasil. Então, essas quantias são suficientes para caracterizar a responsabilidade da Presidente ou de quem também teve colaboração nisso, não importando se isso é ato omissivo ou comissivo.

    Então, eu queria um comentário de V. Exª, para me convencer talvez a mudar a minha opinião sobre esse conceito e essa convicção.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - O depoente, com a palavra.

    O SR. NELSON BARBOSA - Perfeitamente, Senadora Ana Amélia. Agradeço a sua pergunta.

    Não considero que isso foi operação de crédito, juntamente com os pareceres técnicos das principais áreas envolvidas.

    Para traduzir ao senso comum ou para ser uma operação de crédito, isso requereria que os bancos tivessem adiantado os recursos para a União, que os bancos tivessem depositado dinheiro na conta única da União e, depois, a União tivesse, então, ressarcido os bancos, sacando dinheiro da conta única, pagando o principal e os juros. Para que haja uma operação de crédito, é preciso que o emprestador abra mão de um recurso, depositando este recurso na conta do devedor. Nesse caso, não houve; houve um inadimplemento de uma obrigação.

    Não há um contrato de operação de crédito. Há um contrato de operacionalização de pagamento de uma subvenção. Então, não há contrato de operação de crédito. Não há adiantamento de recurso. Não há nenhum depósito por parte dos bancos públicos na conta da União, no caso das equalizações de taxas de juros, tanto é que os próprios técnicos do TCU falam que, nesse caso, não há que se falar sobre operação de crédito. Poder-se-ia falar de operação de crédito naqueles atrasos referentes ao Bolsa Família, ao seguro-desemprego, mas isso é questão de 2014. Não é objeto desse procedimento.

    E sobre prazo, um atraso de um pagamento, de uma obrigação contratual, não pode ser transformado numa operação de crédito pela sua magnitude? Se um real, pode; dois reais viram operação de crédito? Não pode. Operação de crédito é definida legalmente. Não pode ser também transformada em operação de crédito pelo prazo. "Ah, pode atrasar dois dias. Se eu atrasar três dias, vira operação de crédito."

    Isso cria uma insegurança jurídica tremenda. Não é por acaso que não se define operação de crédito por prazo e por valor. Define-se operação de crédito pelo contrato. Se há o adiantamento de recurso do emprestador para o devedor, é uma operação de crédito. Se há atraso no pagamento...

(Soa a campainha.)

    O SR. NELSON BARBOSA - ... é simplesmente um atraso que pode até ser objeto de multa, objeto de pagamento de juros moratórios.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Agradeço ao depoente.

    Senadora Ana Amélia, V. Exª tem mais três minutos para réplica.

    A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Caro Dr. Nelson Barbosa, agradeço-lhe a resposta.

    De qualquer maneira, caso esses atrasos tenham sido determinados pela Presidente ou por V. Exª, Ministro da Fazenda, que tem também essa responsabilidade, de qualquer modo existe, no meu entendimento, gravidade na conduta do gestor público. Por outro lado, se esses atrasos não fossem do conhecimento da Senhora Presidente Dilma Rousseff, trata-se de uma omissão que é grave na condução das finanças públicas do País, porque nós não vivemos num regime monárquico, em que a rainha reina, mas não governa. Então, temos que ver isso.

    Também levanto aqui a questão relacionada à dúvida que tenho em relação à sua condição de testemunha, porque o senhor, como Ministro, atuou solidariamente na edição de decretos e pode também ser responsabilizado, como já explicou antes numa resposta a um colega Senador. Isso, por força do art. 52, inciso I, da Constituição Federal.

    Eu quero, antes de terminar esta réplica, cumprimentá-lo pela sua ação republicana como agente público, porque foi mostrada para o Brasil uma conversa do ex-Presidente Lula com V. Exª, em que o ex-Presidente aborda V. Exª numa solicitação de interferência para beneficiar ou proteger alguns aliados políticos numa operação de investigação na Receita Federal. E V. Exª, laconicamente, como se requer de um servidor público comprometido e responsável, não respondeu, não disse sim a respeito daquilo que foi solicitado pelo ex-Presidente. Então, eu quero renovar, porque já fiz isso na Comissão Especial em relação à conduta de V. Exª.

    Muito obrigada.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Agradeço à Senadora Ana Amélia.

    O depoente certamente saberá responder à questão, dado o seu elevado preparo.

    A palavra com o depoente.

    O SR. NELSON BARBOSA - Obrigado pelas suas considerações, Senadora.

    Creio que sobre o fato mencionado pela senhora, da ligação, isso já foi mais do que esclarecido pelo próprio Poder Judiciário, pelo próprio Juiz Sérgio Moro.

    Sobre a questão dos atrasos - vamos tratar como atrasos -, são atrasos que têm que ser regularizados. E esses atrasos, na minha atuação como Ministro, eu sempre defendi que esses atrasos fossem regularizados o mais rápido possível. E, no momento em que eu assumi o Ministério da Fazenda, assim o fiz, em uma semana. Defendi junto ao então Ministro Levy que, a partir da decisão do TCU, que nós incorporássemos um pedido de aumento do déficit para poder pagar esses atrasados e resolver esse problema em 2015, para que, daqui para a frente, a sociedade brasileira discuta somente questões futuras, que nós não fiquemos, em 2016, discutindo problemas de 2014, 2015 e 2013. Isso foi feito em 2015.

    Sobre a sua pergunta de conhecimento, essa questão - aí eu volto à linha do tempo - aparece em janeiro de 2015, a partir de um vazamento ou divulgação - não sei se é documento privado ou não - de um parecer do TCU sobre os atrasos de 2014. Isso é objeto de um julgamento no TCU em abril de 2015. E, naquele momento, só são pedidos esclarecimentos para as autoridades envolvidas, nunca à Presidente da República. Somente em junho, quando o então Ministro Nardes apresenta a sua análise das contas de 2014, ele coloca esses atrasos - na minha opinião, atrasos, não operações de crédito - como item a ser explicado pela Presidente.

    A partir desse momento, então, que se envolve na defesa da Presidente, há reuniões com Parlamentares para se explicar isso. Então, essa é uma ação de responsabilidade dos Ministros, dos Secretários, pois só foi arguido contra a Presidente da República...

(Soa a campainha.)

    O SR. NELSON BARBOSA - ...a partir de junho de 2017. De junho de 2015, desculpem-me. A partir disso, então, a Presidente se envolve nessa explicação. Houve várias reuniões com Senadores, vários estão aqui para responder, para explicar quais eram as acusações que estavam sendo feitas. E foram apresentadas as explicações dentro do prazo previsto pelo TCU.

    Então, o fato de essas questões, essas acusações, essas respostas serem do conhecimento da Presidente da República a partir do momento em que o TCU as manifesta não significa que os atos nelas questionados são de responsabilidade da Presidente. Sobre isso eu quero até citar os pareceristas, os especialistas da Comissão Especial do Impeachment, que chegaram à conclusão de que, no caso dos pagamentos atrasados aos bancos públicos, sequer há ato da Presidente. É ato do Ministério da Fazenda sobre o qual as autoridades do Ministério da Fazenda, nas quais eu me incluo, estão respondendo devidamente nos fóruns adequados.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/2016 - Página 26