Pronunciamento de Paulo Paim em 04/07/2017
Discurso durante a 99ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Críticas ao projeto de reforma trabalhista em debate no Senado.
- Autor
- Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
- Nome completo: Paulo Renato Paim
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
TRABALHO:
- Críticas ao projeto de reforma trabalhista em debate no Senado.
- Publicação
- Publicação no DSF de 05/07/2017 - Página 103
- Assunto
- Outros > TRABALHO
- Indexação
-
- CRITICA, DELIBERAÇÃO, SENADO, ASSUNTO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, PROPOSTA, AUTORIA, GOVERNO FEDERAL, MEMBROS, OBJETO, DENUNCIA, CRIME, ENFASE, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REPUDIO, PREJUIZO, GESTANTE, ATIVIDADE INSALUBRE, ESTRUTURA, JUSTIÇA DO TRABALHO, SINDICATO, ARRECADAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Senador José Pimentel, Senadores, Senadoras, se iniciou hoje, aqui no plenário, o debate da reforma trabalhista. Foi votado o requerimento de urgência, contra a nossa vontade, porque todos nós gostaríamos que essa matéria fosse debatida, discutida, com a profundidade que o momento exige.
Ora, para os mais novos, eu diria, e os mais velhos já conhecem a história, mas os novos também leram muito sobre isso. Da era Getúlio Vargas até hoje, nós conquistamos, com muita peleia, no bom combate, com muita negociação, inúmeros direitos que estão hoje na CLT.
Infelizmente, neste momento tão turbulento da vida nacional, de tanto conflito, de tanto embate em todas as áreas, no momento em que um Presidente da República é denunciado, por três vezes, por crime no exercício do mandato – e está aqui na Câmara já a primeira denúncia –, no momento em que os seus assessores mais diretos, como é o último caso agora de um deles, que era um dos seus conselheiros, e foi preso. Mas, não diria que especificamente é deste ou daquele partido. As denúncias surgem para todo lado.
É claro que aqui estou me referindo ao Presidente em exercício, tenho que dizer, porque não sabemos se ele fica uma semana, duas, quinze dias ou um mês. Encaminha para cá uma reforma cruel como essa. Olha, naqueles cinco minutos que tive hoje para defender contra a urgência, eu dizia e repito agora: da era militar até hoje, ninguém construiu algo tão truculento, tão pesado, tão desproporcional, na relação capital e trabalho, só para um lado, só para o lado dos empreendedores e contra os interesses dos trabalhadores.
Todos nós sabemos quem fez o relatório: foram os assessores da Fiesp e da CNI. E que o relator assinou, na íntegra, porque ele tinha sete artigos, quando chegou na sua mão, e entregou no plenário depois, com 117.
Eu tenho certeza de que os Deputados, quando aprovaram essa matéria, não leram; mas tenho certeza ainda de que, mesmo aqui no Senado, a ampla maioria dos Senadores não leu, não leu as maldades que há nesse projeto.
E lamento que tenham aprovado a urgência, quando o bom senso mostraria: vamos ler o que é jornada intermitente; o que é mexer no horário de almoço do trabalhador; o que é permitir que uma mulher gestante atue e trabalhe em área insalubre; vamos ver o que é, depois de trabalhar o dia todo, tirar os 15 minutos que ela tem para iniciar o período de hora extra.
Vamos ler para ver como fica a Justiça do Trabalho. Ela é arrasada, praticamente é aniquilada. Vamos ler para ver que ali diz que, se você entrar com uma ação na Justiça e você perder, poderá chegar a ter que pagar 50% daquilo que você pleiteou. Vamos ler para ver que hoje, quando você entra na Justiça, você tem cinco para trás e dois para frente (são cinco retroativos, mais dois anos para você depois que foi demitido, porque se entrar quando está na empresa vai ser demitido), e agora ficaram dois anos.
Vamos ali ver que as entidades sindicais não poderão mais nem sequer acompanhar a rescisão de contrato. A quem interessa isso? Vamos ver ali, naquele projeto, que o trabalhador e a trabalhadora passam a ser excluídos, pelo projeto que está ali, como é na Nissan – eu recebi uma carta-denúncia nesta semana ainda –, lá no Mississipi... É uma política contra você se organizar, conhecer os seus direitos, porque há um artigo que diz que a lei não vale mais para você, é o tal do negociado acima do legislado.
Nenhum país do mundo adota isso. O que é lei é lei. E o princípio mínimo do Direito diz na dúvida pro misero. A lei vem para quem? Para proteger principalmente a parte mais fraca nos conflitos, e por isso, na dúvida, pro misero.
Agora, não. Ele diz o seguinte: a lei vale para o empresário em todos os seus contratos, em todas as relações que o mercado exige. Mas para o trabalhador, não. Para ele, não vale mais a lei. Vale a negociação que pode anular a lei. É isto: anular a lei.
Eu chego a me perguntar: para que Congresso Nacional se aqui é a Casa de fazer as leis? Será que este Congresso será só para fazer leis para os poderosos, em detrimento dos mais fracos?
Senador Pimentel, são 200 mudanças. Nem que eu quisesse poderia aqui lembrar todas de cabeça. São 117 artigos. V. Exª é advogado, economista, é conhecedor desse tema todo.
Mas o que mais me surpreende é essa vontade do Senado... Eu nunca vi isso, nunca vi. Estou há 32 anos aqui: 16 como Deputado e mais 16, praticamente, como Senador. Nem quando eu era Deputado, que eu vinha para cá – eu era curioso e vinha olhar os trabalhos aqui –, eu nunca vi um Senado como este. Por que eu falo isso? Não é ataque pessoal a ninguém, porque eu estou aqui dentro. O Senado está abrindo mão do seu papel de Casa revisora. O Senado está abrindo mão de legislar.
Olha, com todas as críticas que eu faço à Câmara, e faço críticas fortes – porque recebeu sete artigos, apresentou 117 –, mas eles trabalharam. Mal ou bem, do seu jeito, na calada da noite ou não, com o apoio da Fiesp e da CNI, apresentaram um trabalharam e fizeram. E o que fez o Senado? O Senado não fez nada. E não fará nada. O Senado não diz que é certo nem que é errado: se omite. Por isso que eu disse aqui e repito que o Senado deu uma de Pôncio Pilatos. "Não sei, não li, não vi, mas voto a favor". É mais ou menos isso, porque é impossível que, em um projeto dessa grandeza, os Senadores não possam mudar uma vírgula, um ponto. E dizem: "O outro lado da rua mandou, nós temos que votar". É essa a impressão que passa para a sociedade.
Esta minha fala vai na linha de tentar ajudar os Senadores a refletir. Qual é o problema de nós pegarmos 20 pontos principais? – já que um dos Relatores diz que tem que mudar oito pontos e o outro fala que são cinco... Oito mais cinco já dá treze. Eu não queria dizer que é treze, mas é. Coincidiu. Oito mais cinco, treze. E eu botaria, para chegarmos a vinte... Eu dizia hoje para um Senador da Base governista, e ele concordava comigo: eu sinto que o Senadores estão constrangidos, mas estão votando porque alguém está pedindo para eles votarem de qualquer jeito. O que custaria – o que custaria? – nós pegarmos esses 20 pontos mais cruéis, alterarmos, mandarmos para a Câmara...? A Câmara vota numa semana, se quiser. Vota numa semana. Já aconteceu aqui de votarmos emenda constitucional numa noite, rompendo todos os interstícios. Aí, essa força oculta é que surpreende todos.
Senador Pimentel, do momento da votação até agora eu recebi, pelas redes sociais, mais de 100 mil comunicados. E o maior questionamento é este: "Se é tão perverso, se é tão ruim, porque o Senado não altera, Senador? Por que não delibera onde estão os maiores problemas e resolve?" Eu respondo: "Porque não quer". "Por que não quer?" Respondo: "Eu é que sei?" – eu chego a dizer que não sei o que sei. No fundo, nós sabemos: é porque o Palácio fez dos dois projetos seu cavalo de Troia. Ele vende como se fosse uma coisa razoável – como boa ele não pode vender porque ninguém acredita –, mas quer sinalizar para o mercado que está tudo bem e que a base é sólida – sólida! –, crucificando o povo trabalhador deste País, porque pega da classe média para baixo... Pega todo mundo da classe média para baixo. É bom?
O tal do avulso exclusivo. Você que está na classe média e, digamos, que ganhe dez ou quinze salários mínimos, você vai entrar agora no avulso exclusivo. Como é que fica seu décimo terceiro? Eles dizem que não tocam no décimo terceiro. Avulso exclusivo, quem é avulso sabe. Avulso e autônomo exclusivo para mim são a mesma bagunça, da forma que chegou ali.
Autônomo exclusivo. Quem é autônomo sabe. Tu tens décimo terceiro? Se és autônomo, tu és autônomo. Tu tens férias? Tu tens hora extra? A empresa paga a tua previdência ou é tu que pagas? Quais os direitos do autônomo exclusivo? Ele é autônomo, o chamado PJ, em outras palavras. Ele é autônomo. Qual é o direito dele? Nenhum.
E o tal de trabalho intermitente? Tu trabalhas uma hora aqui, outra hora naquela outra empresa, mais cinco numa outra empresa, porque é salário por hora. No fim do mês, tu estás sujeito a receber menos que o salário mínimo.
E quem vai conseguir controlar? Os auditores fiscais do trabalho, da Previdência e da Receita dizem que eles precisavam no mínimo de três vezes mais o número de profissionais para acompanhar como é hoje. Não conseguem acompanhar. E, agora, que vai ser tipo bico? Trabalha uma hora aqui, duas ali, três lá, quatro ali, quem vai fiscalizar para ver se pagaram para a Previdência, depositaram seu fundo de garantia, proporcionalmente o seu décimo terceiro, proporcionalmente as suas férias? Ninguém!
Aí, Senador Pimentel, pergunto a V. Exª, que é um especialista em inúmeras áreas, mas destaco mais a Previdência aqui neste meu pronunciamento: o que vai acontecer com a Previdência? A arrecadação vai despencar! Vai cair muito mais do que caiu até hoje. Aí, sim, tenho medo de que a gente inviabilize a Previdência pública, que hoje é superavitária.
Se hoje, Senador Pimentel – e, nesses cinco minutos, eu termino...
Nós temos lá na Previdência aquele depoimento dos profissionais da auditoria. Um certo setor do empresariado desconta R$25 bi por ano – por ano, R$25 bi – do salário do trabalhador e não repassa para a Previdência. Isso porque há um certo controle, não é? Por isso, a gente descobriu isso. Como vai ser o controle com o chamado salário por hora somente – acabou e pronto –, sem ter nenhum vínculo mais? Vai ser sonegação. Vão estar burlando dia e noite, desviando. E quem vai pagar é a sociedade.
Se esse projeto for aprovado como está, vocês vão ter de responder perante a história, e eu quero estar vivo para acompanhar como vai se dar essa bagunça, essa lambança, essa irresponsabilidade que vocês – refiro-me ao Congresso – estão fazendo se isso acontecer.
Eles falam: "Não, mas vai combater o desemprego". Por amor de Deus, nós temos estudos de todos os países que adotaram metodologia semelhante a essa: não gerou um emprego.
Eu me lembro, Senador Pimentel, porque cuidei muito da terceirização, de que diziam para mim que aquilo iria gerar milhares de empregos – nem vou falar em milhões. O projeto nosso, que estava em debate, não deixaram votar: votarem um que havia na Câmara. Quantos empregos geraram? Nenhum – nenhum. Aumentou o desemprego. Eu me lembro: devia estar em 12 milhões; hoje está em 14 milhões. Depois que aprovaram a tal da terceirização. Aumentaram os PJs – o que já podia, é verdade – e ainda as terceirizadas se multiplicaram. A maioria é de gatos, todo mundo sabe.
Aqui nesta Casa há oito empresas que não pagaram os seus trabalhadores e foram embora. A última foi uma tal de Qualitécnica, de um vagabundo aí, que foi embora e não pagou os trabalhadores. Tem de chamar assim mesmo. Como é que você dá um golpe desse no salário, no décimo terceiro, nas férias, na Previdência do trabalhador? Qualitécnica é o nome da empresa. Fiz de tudo. Fui chamado aqui pelos terceirizados para interagir. Interagi, e até hoje não conseguem descobrir nem o nome desses tais empresários da Qualitécnica. É isso o que a gente não consegue aceitar nem entender. Por isso, a indignação e a revolta.
Esse debate a gente vai continuar amanhã. Espero que amanhã, sinceramente, a gente tenha aqui quem faça a defesa desse projeto. Até o momento ninguém fez, nem os Relatores. Eu hoje, na minha fala aqui, citei os dois Relatores porque achava que eles iam responder, mas não responderam. Se eles concordassem com esse projeto, não estavam propondo: um, oito alterações; o outro, cinco alterações. Todas em pontos que são, para aqueles que montaram o projeto, fundamentais. É a exploração total do povo trabalhador.
Vamos fazer o contraditório amanhã, vamos lá. Isso é bom. É só falar a verdade e mais nada. Achei que ia começar hoje, mas não começou. Estarei aqui amanhã de manhã, de tarde, de noite, até às 10h da noite. Estarei aqui. Vamos pegar os pontos e debater.
Sr. Presidente, agradeço muito a V. Exª. Esse tema ainda vai rolar muito. Não são só as votações da terça e da quarta-feira. Mesmo depois da terça e da quarta esse debate vai continuar nos Estados – e como vai continuar. A vida é assim: ninguém vai conseguir apagar o que foi feito, principalmente em cima do projeto que veio da Câmara dos Deputados. Só espero que na terça ou na quarta, quando vão acontecer as votações, os Senadores que perceberem que como está não dá concordem em fazer as alterações, e que o projeto volte para a Câmara. É assim, é bicameral. Não é unicameral. Acho que todos sabem que é bicameral. Pode ser que alguns não saibam, mas a maioria tem de saber. Aprovou lá, vem para cá. A gente revisa, altera e termina lá. Pode ser no sentido contrário, quando começa aqui.
Senador Pimentel, estaremos aqui amanhã novamente para aprofundar esse debate, na certeza de que o povo brasileiro está acompanhando o passo a passo dessa reforma da previdência, cruel, tão cruel quanto a reforma trabalhista. As duas se complementam – essa, a trabalhista, e a previdenciária, que lá parada na Câmara dos Deputados.
Eu disse que terminava nos cinco minutos, faltam 30 segundos, e eu encerro.
Agradeço a tolerância dos meus amigos que estão aqui para usar a palavra ainda, mas se for preciso eu fico presidindo para os senhores.
Um abraço a todos.