Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Pesar pelo falecimento de Carlos Alberto Caó, ex-deputado federal.

Críticas ao Governo Federal pelas reformas trabalhista e previdenciária.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Pesar pelo falecimento de Carlos Alberto Caó, ex-deputado federal.
GOVERNO FEDERAL:
  • Críticas ao Governo Federal pelas reformas trabalhista e previdenciária.
Publicação
Publicação no DSF de 06/02/2018 - Página 30
Assuntos
Outros > HOMENAGEM
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, MORTE, CARLOS ALBERTO CAO, EX-DEPUTADO, ATIVISTA, APOIO, NEGRO, APRESENTAÇÃO, PESAMES, FAMILIA, ELOGIO, VIDA PUBLICA.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, GESTÃO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AUTOR, PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA, OBJETO, ALTERAÇÃO, REGIME FISCAL, REFORMA, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, LEGISLAÇÃO PREVIDENCIARIA, RESULTADO, PREJUIZO, POPULAÇÃO.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PSB - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não posso iniciar este pronunciamento sem parabenizar o extraordinário discurso do Senador Requião, que, aliás, tem marcado a sua participação neste Parlamento, neste momento tão grave do nosso País, com seus ensinamentos, com sua capacidade de argumentação, de estudar a realidade do nosso País e apresentar um caminho que não seja este caminho que, lamentavelmente, estamos há dois anos, de forma mais específica, enfrentando no Brasil.

    Mas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, além de parabenizar este grande brasileiro, o Senador Roberto Requião, quero também aqui marcar, neste início de trabalho, em primeiro lugar, o meu pesar. No dia de ontem, faleceu o ex-Deputado Carlos Alberto Caó, aos 76 anos. Baiano, jornalista, advogado, militante da luta contra a ditadura militar neste País e militante histórico do movimento negro. Caó mudou a Lei Afonso Arinos tornando contravenção penal o preconceito de raça, cor e sexo e foi um dos Constituintes que apresentou, com destaque, a emenda que torna o racismo, que tornou o racismo crime inafiançável.

    Também Caó esteve com uma comitiva na África do Sul, representando a Câmara dos Deputados naquele momento, o Congresso Nacional Constituinte reunido, para convidar Mandela para visitar o Brasil, acompanhado do nosso Senador Paulo Paim; do Deputado, também baiano, Domingos Leonelli, do Deputado pelo Rio de Janeiro Edmilson Valentim.

    Caó foi um Deputado extremamente competente, um militante dedicado, um homem inteligente. Eu tive a oportunidade não apenas de ser sua colega constituinte mas de conviver com sua família, seu núcleo familiar central, sua mãe e algumas de suas irmãs, sobrinhas suas, porque, na pequena comunidade do Bairro da Federação, em uma localidade simples, humilde, negra, da cidade negra da Bahia, de Salvador, Bahia, ali, naquele pequeno lugar do Binóculo, morou a sua família.

    Humilde foi, humilde sempre, negro orgulhoso da sua condição e lutador contra o preconceito racial no nosso País. Vai Caó, sem dúvida, iluminado, e fica a política necessitando de políticos com a sua qualidade.

    Mas, Sr. Presidente, eu estou aqui hoje para participar, como todos os outros Deputados e Senadores que estão nesta sessão, da abertura do trabalho legislativo e também aqui não posso deixar de registrar a minha decepção. Após um ano, um mês – melhor dizendo, corrigindo-me – de recesso parlamentar, em que pude visitar diversos cantos e recantos da Bahia, de trabalho intensivo, intenso, acompanhando o Governador Rui Costa, fazendo entregas importantes para o nosso povo na saúde, na educação, especialmente na saúde, mas também na educação, na infraestrutura do nosso Estado, vim para o Senado Federal, para o Congresso Nacional, com a expectativa de que nós pudéssemos anunciar boas novas para o povo brasileiro, alimentar a esperança do povo num futuro melhor – um povo que já vinha enfrentando uma crise econômica, que se agravou como crise política, crise moral, crise econômica também, com o afastamento da Presidenta Dilma Rousseff e que viu, nesse golpe parlamentar, a sua vida piorar bastante.

    E chegamos aqui para ouvir uma mensagem – lida em voz baixa por um Deputado, talvez envergonhado com aquilo que estava lendo para a Nação brasileira – que tenta capitalizar medíocres números, Senador Requião, números medíocres que eles consideram vitória da economia nacional, principalmente, como já foi dito aqui, dizendo que foi um ano de vitórias para o povo brasileiro.

    Certamente essas pessoas desconhecem, têm uma espécie de dissociação psiquiátrica entre as suas vidas e a vida da Nação, a vida do povo brasileiro que constrói esta Nação no campo e nas cidades, porque este ano foi o ano em que eles aprovaram aqui, comemorando, uma reforma trabalhista extremamente prejudicial à vida do trabalhador brasileiro. Foi um ano, como V. Exª ressaltou aqui, em que aprovaram uma PEC que impede, por 20 anos, o crescimento do investimento no Brasil. Foi o ano em que eles se colocaram, de forma raivosa, contra a conquista dos trabalhadores e anunciaram, como grande medida desta mensagem do Governo do Presidente da República, um Presidente com 70% de rejeição popular, anunciam, como grande panaceia de salvação da economia nacional, votarmos a reforma da previdência – que tem mais desaprovação do que o Presidente da República, por incrível que pareça! -, usando dinheiro público para anunciá-la. Já foram até condenados pelo Judiciário! Mas, pior ainda, anunciando que vão gastar bilhões de reais para garantir os votos da previdência, para efetivar essa proposta, que visa muito mais os interesses das previdências privadas no Brasil do que qualquer medida de proteção do Erário público.

    E que homens fazem isso? Que homens, com que moral apresentam essa proposta para o Brasil? Aqueles que se aposentaram, em geral, em média, com 50 anos de idade, ganhando salários grandes, altos: o Presidente Michel Temer, do Governo do Estado de São Paulo; e outros de outros governos ou mesmo do governo da Nação.

     E dizem a você, trabalhador brasileiro; você, que passa sua vida buscando emprego, trabalhando em média 9 meses por ano; você, que vai ter que crescer agora o seu tempo de contribuição para ter o direito de chegar a conquistar a sua previdência integral. Dizem a você, mulher brasileira, a você, para quem eles não têm leis nem políticas de respeito ao seu trabalho, num país em que as mulheres continuam ganhando menos, às vezes 50% menos que os homens para desempenhar as mesmas funções, sem qualquer proteção do Estado; num país onde as creches públicas são raras, para garantir que a mulher trabalhadora possa com dignidade exercer também a sua função de mãe; onde o machismo é eleito todo dia, cantado em prosa e verso até pelos Deputados que ameaçam violentar as mulheres. É nessa cultura machista, violenta contra as mulheres brasileiras, num país onde cresce a violência do estupro, a violência do ataque frontal à mulher, do espancamento, da morte, onde cresce o número, a cada dia, de assassinatos de mulheres, que eles anunciam, como grande medida para salvar a economia nacional, aumentar o tempo de trabalho da mulher. E usam isso citando países desenvolvidos, países onde as mulheres têm proteção no trabalho, como um exemplo de que isso é o que deve ser feito no Brasil.

    Ora, nós não podemos aceitar que a grande novidade e a grande notícia que o Presidente da República apresenta ao Congresso Nacional seja reiterar o seu compromisso com uma reforma que prejudica a maioria da população do nosso País e ouvir, mais uma vez, o Presidente da Câmara dos Deputados, com o seu discurso sem nenhuma energia, dizer que o seu Estado está vivendo uma falência fiscal, como se fosse também resultado da Previdência Social e não de tudo por que passou aquele Estado, de tudo o que aquele Estado viveu, de que ele e o seu Partido participaram bastante tempo, do que foi feito naquele Estado, para dizer que é preciso criar um sistema da previdência entre iguais no Brasil.

    Para você, trabalhador, que pensa, quando eles falam – porque eles falam, na demagogia, eu vejo lá no meu Estado isso acontecer, até na televisão –, Deputados ricos dizerem que é preciso, que aí vai se igualar também a aposentadoria dos políticos. Porque eles sabem que se criminalizou tanto a política que a população hoje não quer ouvir falar de político, não quer ouvir falar de política, e eles estimulam essa história de que todo político é igual. E você, que está me ouvindo, sabe que não é. Você sabe que não é, porque você viu o resultado da reforma trabalhista, quem votou contra e quem votou a favor. Você sabe quem votou a seu lado. Mas eles querem passar a ideia de que, fazendo isso, vão acabar com aposentadoria dos "privilegiados", entre aspas. É mentira deles. A maioria deles é milionária, está e chegou a este Congresso com muito dinheiro seu ou de quem os financiou e já tem as suas aposentadorias privadas polpudas para se proteger disso que eles chamam da reforma que vai igualar os desiguais no Brasil.

     Mentirosos e cínicos! Mentirosos e cínicos, porque alguns podem até ingenuamente acreditar que isso é verdade, mas a maioria deles sabe o crime que está fazendo contra a maior parte da população deste País, que não conseguirá receber uma previdência nas condições de exigência que cada vez mais eles fazem. Mudaram a reforma, reconheceram que ela era um absurdo. Não! Não reconheceram. Apenas reconheceram que não têm votos para conseguir fazer isso, que a perversidade era muito grande, que a maldade era muito grande e que se aproximava o tempo da eleição e Deputado quer voto, tem medo de votar agora e perder o voto amanhã.

    Por isso, eles anunciam bilhões de reais em emenda para fazer com que os Deputados sejam comprados e possam votar na sua reforma, mas, ainda assim, sabem que, mesmo com esses bilhões gastos, eles não conseguirão passar essa reforma antes do processo eleitoral, porque o povo está na rua e está dizendo: Deputado que votar não volta. E não volta porque não receberá o voto do povo. E não receberá o voto do povo porque o povo sabe que os países desenvolvidos fazem reforma da previdência, mas fazem paulatinamente, não fazem da maneira como se quis fazer no Brasil, como se quer fazer agora no Brasil, que é principalmente colocando o peso de toda a crise do Estado brasileiro nos seus ombros, trabalhador e trabalhadora rural e urbano desta Nação: você, que está sendo desempregado para ser recontratado, com uma situação de precariedade e de perdas de direitos que não tinha antes. Você sabe do que nós estamos falando.

    Portanto, infelizmente, eu tenho que dizer que este dia de abertura quase desmoralizante, porque havia tão poucos Deputados na Câmara dos Deputados e Senadores naquele espaço que até um protesto feito pelo PSOL, que recolheu milhares de assinaturas da sociedade brasileira dizendo que não aceita a reforma da previdência, eles queriam considerar como um ato de impertinência, porque pertinente, na cabeça deles, é impor ao povo brasileiro a agenda do mercado, do FMI e daqueles que enchem a boca em falar, como disse Rodrigo Maia: "A Câmara votará aquilo que for importante para o mercado". Já se foi o tempo em que no Brasil se votava alguma coisa que fosse interesse do povo.

    Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu volto com muita disposição de luta e de trabalho, confiante no chamado que fez aqui o Senador Requião. É hora de resistir, de resistir à entrega do patrimônio nacional. É hora de resistir, de resistir à entrega da economia nacional para as grandes financiadoras de previdência privada.

    É hora de resistir contra a mediocridade, contra o preconceito que se instala neste País contra o povo pobre e trabalhador. E é hora de fazer avançar a luta do povo brasileiro para que possamos ter dias melhores. E, em 2018, um ano tão importante porque é um ano eleitoral, o povo brasileiro não pode esquecer quais são os Deputados e Senadores que permanentemente têm se preocupado mais em agradar governos em troca de cargos e votar contra o seu interesse.

    Eu confio no Brasil, confio neste povo brasileiro que lutou para construir tudo o que esta Nação tem, e não nesses entreguistas de plantão que estão, após o golpe parlamentar midiático, ocupando o espaço do Planalto federal.

    Nós haveremos de ter um ano de muito debate, de muito debate e de muita luta. E eu confio que, nas ruas e no voto, o povo brasileiro saberá escolher um caminho melhor.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/02/2018 - Página 30