Discurso durante a 95ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com as oportunidades de desenvolvimento e políticas públicas que são oferecidas aos jovens no Brasil.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL:
  • Preocupação com as oportunidades de desenvolvimento e políticas públicas que são oferecidas aos jovens no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/2018 - Página 37
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL
Indexação
  • APREENSÃO, DESENVOLVIMENTO, POLITICA PUBLICA, FAVORECIMENTO, JUVENTUDE, MOTIVO, QUANTIDADE, PESSOAS, IDADE, NECESSIDADE, PLANEJAMENTO, SAUDE, EDUCAÇÃO, EMPREGO, MELHORIA, ENSINO, COMPARAÇÃO, AMBITO INTERNACIONAL, OPORTUNIDADE, TRABALHO, COMENTARIO, SITUAÇÃO, UTILIZAÇÃO, DROGA, CRIME, PRISÃO, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, CONGELAMENTO, INVESTIMENTO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, TERCEIRIZAÇÃO, PROPOSTA, REVISÃO, LEGISLAÇÃO PREVIDENCIARIA.

  SENADO FEDERAL SF -

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COORDENAÇÃO DE REDAÇÃO E MONTAGEM - COREM

18/06/2018


    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há uns anos atrás, a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, a SAE, com apoio do Instituto de Pesquisa Económica Aplicada, o IPEA, divulgou um relatório sobre a juventude brasileira, o "Juventude levada em conta".

    No capítulo sobre demografia, o relatório abre com uma metáfora instigante: a de que até 2022 o Brasil viveria uma "pororoca jovem".

    A pororoca, nós sabemos, é um fenómeno comum no Norte do País. É o encontro do mar, em maré cheia, com a foz de um rio.

    O resultado é um verdadeiro maremoto, com aquelas ondas gigantescas que avançam quilômetros sobre as correntezas dos rios, para a alegria de surfistas de todo o mundo.

    O termo conota profusão, abundância. A "pororoca jovem" a que se refere o relatório da SAE trata justamente disso: do pico na população absoluta de jovens no Brasil (considerando-se "jovens" todos aqueles entre 15 e 29 anos completos, como estabelece o Estatuto da Juventude).

    Segundo as estatísticas, esse pico foi alcançado em 2008 e há de manter-se relativamente estável pelos próximos anos.

    Concluída a transição demográfica, o contingente de jovens brasileiros entrará em acentuado declínio, à medida que a população envelhece. Na verdade, então, trata-se antes de um platô do que um pico.

    Senhoras e Senhores, esse fenômeno tem sucedido em maior ou menor medida no mundo todo, ainda que em décadas distintas.

    O que isso significa na prática é que, nos dias atuais, nós no Brasil temos a maior juventude da nossa história.

    São 50 milhões de pessoas pensando novas ideias, sonhando novos sonhos, buscando novos projetos de vida.

    Agora, cabe a pergunta: o que nós, como sociedade, oferecemos a eles?

    A "geração da pororoca" tem uma jornada difícil pela frente. Os obstáculos são muitos.

    A educação - o veículo por excelência do desenvolvimento pessoal - ainda tem diversos problemas.

    Uma medida que se usa para avaliar o sistema educacional de um país são as comparações entre países.

    O Programa para Avaliação Internacional de Estudantes (PISA), promovido pela Organização pela Cooperação e Desenvolvimento Económico - a OCDE -, é um exemplo disso.

    O PISA consiste em um exame que se aplica a jovens de 15 anos, independentemente do ano escolar. Nele, o Brasil figura, ano após ano, entre as últimas posições.

    No exame mais recente, o País ficou em 63º lugar entre 72 países, com desempenho estudantil bastante abaixo da média tanto em ciências quanto em matemática quanto em leitura.

    Ficou abaixo da média, igualmente, no índice de sensação de pertencimento ao ambiente escolar.

    Por outro lado, ficou no topo da escala em um quesito: o de ansiedade relacionada às demandas educacionais. Em outras palavras, os alunos brasileiros rendem pouco nos estudos e se sentem pouco à vontade na escola, comparados com o resto do mundo. Que dizer disso?

    Claro que a comparação internacional não pode ser a única medida do progresso do nosso sistema.

    A maior parte da OCDE não é composta de países em desenvolvimento como o nosso; são países ricos, cuja prosperidade remonta a fatores históricos que não vem ao caso discutir agora. Mas nós devemos, sem dúvida, comparar constantemente com nós mesmos.

    A esse respeito, é bom ressaltar que, mesmo no contexto do PISA, a educação pública tem um abismo muito grande: é aquele entre as escolas federais -colégios militares, colégios de aplicação, o Colégio Dom Pedro II, no Rio de Janeiro - e as demais escolas públicas.

    Disso os detratores da educação pública pouco falam, mas no PISA as escolas federais tiveram desempenho superior às da Coreia do Sul, país que há décadas tem na educação uma prioridade nacional.

    E por que isso acontece?

    Ora, é muito simples: porque as escolas federais valorizam os professores, com plano de carreira, com salários justos, com incentivos à qualificação académica.

    Vejam, então, que a receita para o sucesso está aqui no Brasil também. Não é preciso reinventar a roda na educação; é preciso redescobrir o fogo.

    Sr. Presidente, outra barreira no caminho dos nossos jovens é a do desemprego.

    A taxa de desemprego entre os jovens de 18 a 24 anos é de mais de 25%, mais que o dobro daquela entre a população em geral. A taxa de desemprego entre os menores de 18 chega a 39%.

    Sem falar, claro, no subemprego, talvez um dos piores males do nosso tempo.

    Os subempregados - assim considerados os que trabalham menos de 40 horas semanais - passavam, em fins do ano passado, dos 26 milhões de trabalhadores, quase um quarto da população economicamente ativa do País, segundo o IBGE.

    Em grande parte, o que há por aí são postos com altíssima rotatividade; contratos de "aprendiz" em que não se aprende nada, ou quase nada; ou parcas fontes de renda sem qualquer segurança ou estabilidade - as miragens do Uber e de trabalhos afins.

    Nesse contexto, muitos jovens da classe trabalhadora não conseguem sequer sustentar um período de estudos prolongado no ensino superior.

    Muitos são os jovens que se convencionou chamar de "geração nem-nem": a que "nem trabalha, nem estuda". Jovens de futuro incerto, marcados pelo desalento, acostumados à decepção - e tão cedo na vida!

    Senhoras e Senhores, essa trajetória assume diferentes formas e cores, conforme a região do País. Por exemplo, no Estado do Rio Grande do Sul, meu pago querido, esse processo é marcado por duas tendências.

    Primeiro, o êxodo rural. Em doze anos, entre 2003 e 2015, o campo gaúcho perdeu quase quatrocentas mil pessoas, conforme dados do IBGE. Em trinta anos, essa queda foi de 37% da população rural.

    A grande maioria dessas pessoas é de jovens, jovens sem oportunidade, jovens sem opção, excluídos de políticas públicas.

    Jovens que o braço curto do Estado não alcança, e a quem o dedo seletivo do mercado não aponta.

    Na cidade, esses jovens terminam encontrando a realidade que descrevi aqui: desemprego, biscates, duras penas para terminar - ou mesmo começar! - os estudos.

    Quem pode, se salva. Quem não pode é consumido pela tão comum espiral de degeneração das drogas e da criminalidade.

    Um indicador eloquente desse fenômeno é a concentração de jovens na população carcerária.

    Segundo o mais recente Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias - Infopen -, 55% dos 726 mil presidiários brasileiros têm entre 18 e 29 anos. Quase 400 mil jovens presos!

    E, nós sabemos, as prisões brasileiras estão longe de constituir centros efetivos de reabilitação. Então podemos intuir qual será o destino desses jovens.

    Novamente, o meu Estado do Rio Grande do Sul é um caso paradigmático. A taxa de retorno ao sistema prisional é de 71% para os homens e quase 60% para as mulheres.

    Em outras palavras, a maior parte dos internos são jovens, e a maioria desses jovens volta às penitenciárias.

    Entre os adolescentes, há mais de 55 mil internados no País, segundo o Conselho Nacional de Justiça, e pelo menos 1.300 destes são adolescentes gaúchos.

    Srªs e Srs. Senadores, o relatório da SAE menciona, como desafios da "pororoca jovem", o "congestionamento".

    A lógica é bastante simples: mais gente, mais concorrência, menos oportunidades. Mas será que nós mesmos, da classe política, não estamos provocando essa situação?

    As recentes medidas de austeridade fiscal ilustram bem o que estou falando.

    A PEC do Teto de Gastos, em vez de estabelecer algum elemento demográfico como fator de correção dos gastos públicos, definiu que o reajuste será de acordo com a inflação.

    Como o crescimento populacional não estagnou, a verba per capita para educação, saúde e outros serviços sociais tende a cair. O impulso do Governo à geração de emprego e renda se dilui.

    A Reforma Trabalhista também já tem mostrado seus resultados - funestos.

    As previsões favoráveis do Governo quanto à população ocupada não podem escamotear esse fato.

    O emprego continua, em grande parte, estagnado; a informalidade tem crescido; o rendimento real do trabalhador até caiu. E é claro que ia cair, com terceirização, com trabalho intermitente, com os sindicatos quebrados nas duas pernas!

    E, por último, temos a Reforma da Previdência.

    O Governo insiste em convencer a população de que, caso não se aprove a Reforma, uma chuva de meteoros vai desabar sobre nossas cabeças - apesar dos inúmeros economistas e instituições que o negam terminantemente.

    A esse respeito, tenho para declarar o seguinte: que a Reforma da Previdência é impopular não é novidade para ninguém. Que ela subtrai, a olhos vistos, os direitos dos trabalhadores, também não.

    Mas o que se tem percebido recentemente é que, ao prolongar o tempo de trabalho de quem contribui, a Reforma da Previdência também vai passar o ferrolho numa janela importante para a juventude: a janela do emprego. É simples: menos gente se aposentando, menos jovens contratados.

    Então, voltando à metáfora do "congestionamento": cada uma dessas tais reformas é como um cone na avenida, interditando o trânsito do jovem, bloqueando o seu caminho, atravancando o seu avanço. Isso não deve ser surpresa para ninguém!

    Para concluir, Sr. Presidente, temos a mais numerosa juventude da nossa história, a quem negamos oportunidades mínimas de desenvolvimento -educação, segurança, emprego -, e a quem só oferecemos mais e mais prisões. E as políticas públicas mais recentes só têm feito agravar esse quadro.

    Ao avanço dessa juventude, fechamos as portas; quando ela fala, tapamos os ouvidos; à figura dela, desviamos o olhar. Até quando?

    Estamos atualmente na crista desta grande onda, a "pororoca jovem". Ou vamos adiante com ela, num delicado equilíbrio, como os surfistas; ou ela nos derruba da prancha e nos joga n'água!

    Ainda nesta semana, Sr. Presidente, pretendo falar aqui, dando continuidade à minha fala de hoje, sobre o Estatuto da Juventude, Lei Federal 12.852/2013, o qual fui relator aqui no Senado.

    Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/2018 - Página 37