Discurso durante a 15ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Lamento pela crise na Venezuela.

Destaque à importância do voto proferido pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello, referente à criminalização da homofobia.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Lamento pela crise na Venezuela.
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Destaque à importância do voto proferido pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello, referente à criminalização da homofobia.
Publicação
Publicação no DSF de 27/02/2019 - Página 13
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • REGISTRO, CRISE, VIOLENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA.
  • REGISTRO, VOTO, CELSO DE MELLO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ASSUNTO, CRIME, HOMOFOBIA, COMENTARIO, EXCLUSÃO, GRUPO, LESBICAS GAYS TRAVESTIS TRANSSEXUAIS E TRANSGENEROS (LGBT), DEFESA, IGUALDADE.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Marcos do Val, Senador Humberto Costa, Senador Kajuru, Senador Luis Carlos, tenho que fazer dois registros que eu ia fazer ontem, mas ontem eu acabei cedendo o meu lugar, pois fui ao dentista. Voltei para cá e tinha terminado.

    Então, se V. Exa. puder dar uma tolerância, eu agradeço muito.

    O primeiro, Sr. Presidente, é um pronunciamento curto, mas não tem como eu, como Presidente da Comissão de Direitos Humanos – eu sempre digo que direitos humanos não têm fronteira –, não falar algo sobre a crise na vizinha Venezuela.

    Sr. Presidente, o Papa João Paulo II dizia: "A violência jamais resolve conflitos, nem sequer diminui suas consequências dramáticas. A guerra é sempre uma derrota da humanidade."

    Diariamente, eu diria que milhares de crianças morrem no mundo em decorrência dos efeitos das guerras, da fome, doenças e falta de ajuda. Uma de cada cinco crianças vive numa região de guerra. Quantos milhões já morreram nas guerras? Quantos inocentes? Quantas famílias destruídas? Perguntas como a quem interessa a guerra deveriam ser permanentes entre nós. A quem interessam os embates armados? Quais os interesses que estão por trás de cada guerra? As potências mundiais não consideram o interesse das pessoas, do povo? Temos que olhar para as pessoas, Sr. Presidente. Temos que olhar para além do que os olhos veem. Direitos Humanos não têm fronteira, seja em qualquer país do mundo. Já disse Martin Luther King: "A injustiça em qualquer lugar ameaça a justiça em todos os lugares." Tudo que afeta alguém diretamente afeta a toda a humanidade indiretamente. Se há conflitos, sejam quais forem, sejam quais as suas matizes, ideológicas, econômicas, sociais, que se resolvam através da paz, da diplomacia, do diálogo. A guerra, repito, é o fracasso da diplomacia, é o fracasso do diálogo. A vida é uma essência do universo, do Planeta. Todos nós temos direito à felicidade e à vida. Repito: direitos humanos não têm fronteira. Que prevaleçam o diálogo e a diplomacia.

    Sr. Presidente, há outro pronunciamento que eu ia fazer ontem, que, infelizmente, não pude fazer por ter ido ao médico. Eu vou falar, Sr. Presidente, também como Presidente da Comissão de Direitos Humanos, sobre o voto do Ministro Celso de Mello sobre criminalização da homofobia.

    Sr. Presidente Senador Marcos do Val, as páginas da história são escritas a partir de acontecimentos, de fatos, de ações, de acumulação de conhecimento, mas também a partir de grandes pronunciamentos – homens e mulheres, governantes, filósofos, cientistas, revolucionários, poetas, artistas, gente do povo, enfim, de todos os segmentos, na Grécia antiga, nas praças, no Senado romano, nos Parlamentos modernos, nas tribunas, nos tribunais, nas assembleias constituintes, nos teatros, nas telas de cinema, nas ondas da internet. Também de consagrados vultos, lembro aqui: Sócrates, Cláudio, Camões, Galileu, Padre Vieira, Danton, José Bonifácio, Abraham Lincoln, Joaquim Nabuco, Gandhi, Dolores Ibarruri, Tancredo Neves, Pepe Mujica, Charles Chaplin.

    Disse Charles Chaplin um dia, num dos seus pronunciamentos: "Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Desejamos viver para a felicidade do próximo. Por que temos de odiar e desprezar uns aos outros? Neste mundo não há espaço para todos?" Claro que há!

    Ao ser condenado à prisão perpétua, Nelson Mandela proferiu um dos mais bonitos discursos da vida. Disse ele: "Acima de tudo, nós queremos direitos políticos iguais, porque sem isso nossa impotência será permanente. Acolhi o ideal de uma sociedade livre e democrática, onde todas as pessoas vivam juntas em harmonia, com igualdade de oportunidades". (Nelson Mandela)

    Herbert de Souza, o nosso querido Betinho, que já foi há um bom tempo, ao pregar a solidariedade mundial, assim disse: "Utopia, sim, que pode se transformar em realidade; afinal, nascemos para isso, para superar os limites e as situações que nos desumanizam e encontrar caminhos da nova humanidade, aquela que construímos com a nossa ação de cidadania, de políticas humanitárias, de democracia".

    Sr. Presidente, temos a liberdade, no dia de hoje, de registrar aqui o voto do Ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello sobre a criminalização da homofobia, concluído na quarta-feira, dia 20 de fevereiro, considerado por muitos, muitos, inclusive pela imprensa brasileira, como um voto histórico.

    Em uma das partes do pronunciamento longo, de mais de 100 páginas, "(...) uma voz firme na defesa dos direitos das minorias, do relavo e importância da Constituição e seus dizeres e das prerrogativas e competências do Supremo Tribunal Federal".

    Foram 155 páginas em que declarou a mora inconstitucional do nosso Congresso em criminalizar a homotransfobia, e, por isso, o Ministro Celso de Mello defendeu a interpretação conforme a Constituição, enquanto não houver legislação específica do próprio Legislativo, que tem que aqui decidir para equiparar essa prática hedionda ao racismo.

    A marginalização imposta aos integrantes dos grupos LGBT foi duramente criticada pelo Ministro como sendo uma afronta à própria democracia, democracia esta que requer igualdade. "Vulnerar populações por aspectos da própria existência é uma ofensa frontal ao Estado democrático de direito", afirmou.

    A questão da homossexualidade, Sr. Presidente, conforme Celso de Mello, surgida em um momento no qual ainda não se debatia o tema, tem assumido em nosso País, ao longo de séculos de repressão, de intolerância e de preconceitos de graves proporções, que tanto afetam as pessoas marginalizadas, estigmatizando e privando-as de direitos básicos, em contexto social que lhes é claramente hostil e vulnerador do postulado da essencial dignidade do ser humano.

    Celso de Mello faz do voto um resgate histórico das perseguições sofridas por esse grupo...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... lembrando casos recentes de violências. Traz dados de morte, de ódio.

    Aqui, Sr. Presidente, eu lembro que o Brasil é o país em que mais se assassina homossexuais no mundo. O País registrou 445 casos de assassinatos em 2017. Presidente, em junho de 2016, 868 perderam a vida de forma violenta. Refiro-me, claro, a travestis e a transexuais.

    Ele conceituou o racismo e ressaltou a amplitude do conceito, sendo entendido como uma lógica de exclusão e de intolerância.

    Chegando às conclusões da reflexão que promoveu, o Ministro Celso de Mello...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... fez a defesa da competência e, mais do que isso, do dever do Supremo em acolher o tema e conhecer essa demanda.

    Ele disse, Sr. Presidente: "É por isso que se pode proclamar que o Supremo Tribunal Federal desempenha as suas funções institucionais e exerce a jurisdição que lhe é inerente, de modo compatível com os estritos limites que lhe traçou a própria Constituição".

    Prossegue o Ministro, Presidente – abrem-se aspas: "Portanto, reconhecer que a prática da jurisdição constitucional, quando provocada por aqueles atingidos pelo arbítrio, pela violência, pelo preconceito, pela discriminação e pelo abuso, não pode ser considerado, ao contrário do que muitos erroneamente supõem e afirmam, um gesto de indevida interferência da Suprema Corte na esfera orgânica dos demais Poderes da República". Fecham-se aspas.

    Sr. Presidente, mais uma vez, quero dar meus cumprimentos ao voto do Ministro Celso de Mello, que eu vou entregar à Mesa na íntegra.

    Por décadas, séculos, o povo brasileiro tem sofrido intolerância, preconceito, racismo, perseguição, marginalização.

    Ataques aos direitos básicos, sociais, civis, trabalhistas, ataques à nossa Constituição Cidadã passam a ser rotineiros em um cenário de total desrespeito às diferenças.

    O País não suporta mais o discurso fragmentado e vazio, posições binárias que só incentivam o ódio e a violência, de uns contra os outros, eles contra nós, nós contra eles – não dá, Sr. Presidente –, num mundo dividido em bem e mal, em sagrado e profano, entre cruz e espada, entre éticos e corruptos.

    Temos de romper essa barreira, atravessar este mar tempestuoso, frio, gelado, contrário à verdadeira condição humana, pois ela separa sonhos e esperanças.

    Somos de carne e de osso, temos alma, choramos, sim. Por que não lembrar? Rimos, somos gente. Nascemos para ser livres, livres como os ventos que abrem caminhos e cortam quietudes nas varandas em fins de tarde.

    Não chegaremos a lugar algum com os vícios das masmorras, com cenários pintados em rubro sangue. O nosso País e a nossa gente são muito maiores do que as discórdias e as inverdades.

    Queremos temperança, equilíbrio e respeito! Queremos aço templado na forja de um País justo. Somos pedra, fogo e luz que encanta e canta canções e poetiza as nossas inquietudes.

    Esse é o Brasil que queremos: um País democrático, um Brasil talvez, sonho meu, que tenha a poesia na ponta da língua para aproximar o outro, que assegure a liberdade, a igualdade e a fraternidade, pois só assim é que esta terra existirá como nação. E a partir do momento que cada um de nós entender que todos somos irmãos, de fato, tudo mudará para melhor.

    E se somos todos irmãos, devemos cantar o amor, desde as profundezas da nossa alma, dos escaninhos do coração. Por que e para que o ódio e a violência, se há algo lindo ao alcance de todos nós, que é essa palavrinha pequena chamada amor? Amor, que Carlos Drummond de Andrade assim rabiscou:

Que pode uma criatura senão,

Entre criaturas, amar? [continua ele]

Amar e esquecer, amar e malamar,

Amar, desamar, amar?

Sempre, e até de olhos vidrados amar?

    Amar e amar!

Que pode, pergunto [eu], o ser amoroso,

sozinho, numa rotação universal,

senão rodar também, [...]

    E ficar com a palavra mais linda que é o amor?

Amar o que o mar traz à praia,

o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,

é sal, ou precisão de amor, ou simples [caminhos de] ânsia?

    Aí eu termino, Sr. Presidente, agradecendo já muito a V. Exa.

Amar solenemente as palmas do deserto,

o que é entrega ou adoração [...],

e amar o inóspito, o cru,

um vaso sem flor, um chão de ferro,

e o peito inerte, e a rua vista em sonho,

[ou] mesmo uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,

distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,

doação ilimitada a uma completa ingratidão,

e na concha vazia do amor, a procura medrosa,

paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor,

e na secura nossa, amar a água implícita,

e o beijo tácito, e a sede infinita.

    Peço, respeitosamente, Sr. Presidente Marcos do Val – pela alegria de ter até este momento me dado a oportunidade de falar um pouco mais –, que registre nos Anais da Casa o voto do Ministro Celso de Mello sobre discriminação da homofobia.

    Obrigado mais uma vez, Marcos do Val, por presidir a sessão.

    Agradeço ao Líder Humberto Costa, porque eu havia feito o pedido a ele, que me disse: "Vai tranquilo, faça lá o teu pronunciamento".

    Presidente Marcos do Val, muito, muito obrigado. Agradeço a V. Exa.

DISCURSO NA ÍNTEGRA ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR PAULO PAIM.

(Inserido nos termos do art. 203 do Regimento Interno.)

    O SR. PRESIDENTE (Marcos do Val. Bloco Parlamentar Senado Independente/PPS - ES) – Senador Humberto Costa.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/02/2019 - Página 13