Discurso durante a 71ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações acerca de estudo realizado pela Confederação Nacional da Indústria, que aponta obras paralisadas que consomem altos recursos sem benefícios para a população.

Registro dos 131 anos da Lei Áurea, completados no dia 13 de maio. Breve histórico do regime de escravidão e discriminações sofridas pelos negros no Brasil. Destaque para as conquistas dos direitos dos negros, como a Lei nº 10.639, de 2003, que institui a obrigatoriedade do ensino da história da África, e o sistema de cotas para acesso às universidades do País.

Autor
Jorge Kajuru (PSB - Partido Socialista Brasileiro/GO)
Nome completo: Jorge Kajuru Reis da Costa Nasser
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Considerações acerca de estudo realizado pela Confederação Nacional da Indústria, que aponta obras paralisadas que consomem altos recursos sem benefícios para a população.
HOMENAGEM:
  • Registro dos 131 anos da Lei Áurea, completados no dia 13 de maio. Breve histórico do regime de escravidão e discriminações sofridas pelos negros no Brasil. Destaque para as conquistas dos direitos dos negros, como a Lei nº 10.639, de 2003, que institui a obrigatoriedade do ensino da história da África, e o sistema de cotas para acesso às universidades do País.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 14/05/2019 - Página 46
Assuntos
Outros > ECONOMIA
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • REGISTRO, ESTUDO, AUTORIA, CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDUSTRIA (CNI), ASSUNTO, AUSENCIA, CONCLUSÃO, OBRA PUBLICA.
  • HOMENAGEM, LEI BRASILEIRA, ABOLIÇÃO, SISTEMA, ESCRAVO, ANALISE, HISTORIA, PERIODO, COMENTARIO, IMPORTANCIA, LEI FEDERAL, OBRIGATORIEDADE, ENSINO, AFRICA, COTA, ACESSO, UNIVERSIDADE.

    O SR. JORGE KAJURU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO. Para discursar.) – Brasileiros e brasileiras, minhas únicas vossas excelências e meus únicos patrões, como seu empregado público, é evidente que vou buscar outro caminho, todavia na mesma linha de lembrança deste 13 de maio de 2019, posteriormente ao pronunciamento do Senador gaúcho Paulo Paim.

    Senhoras e senhores, Sr. Presidente, amigo do bem, Senador Izalci Lucas, eu estava lendo um relatório de V. Sa. e aproveitei o pouco tempo para chegar até aqui – e ver um pouco de uma homenagem espírita – para dizer das paralisações de obras interrompidas antes da entrega que consomem recursos sem criar benefícios para a sociedade.

    Estudo elaborado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) junto ao Ministério do Planejamento aponta que 2.796 obras estão paralisadas no Brasil, sendo que 517, 18,5%, são do setor de infraestrutura. A área de saneamento básico lidera o ranking com 447 empreendimentos interrompidos durante a fase de execução.

    A Confederação Nacional de Municípios (CNM) reforça ainda que, só em 2017, o Governo Federal deixou de repassar mais de R$37 bilhões para investimento nessas construções em todo o País. Estudo recente da entidade aponta que os chamados Restos a Pagar (RAP) são responsáveis por grande parte do atual cenário de obras sem conclusão. Somam-se, Relator Izalci Lucas, aos recursos prometidos e não repassados, a burocracia e a ineficiência dos órgãos que atuam diretamente no processo.

    Levantamento feito pela organização também mostra que 48% das obras previstas nos PACs 1 e 2, nos últimos dez anos, não foram concluídas. Acrescento que as obras inacabadas ou paradas devem ser continuadas dentro de um acompanhamento e fiscalização do Tribunal de Contas da União para que não haja superfaturamento orçamentário.

    Enquanto isso, cerca de 100 milhões de brasileiros vivem sem coleta de esgoto e 30 milhões não têm acesso à água potável. Além da influência direta na qualidade de vida, a falta de saneamento está associada a surtos de diarreia, hepatite A e a doenças transmitidas pelos mosquitos causadores da dengue, zika e chikungunya ou por ratos causadores de leptospirose e outras enfermidades que pressionam, de forma acentuada, o Sistema Único de Saúde. Não tenho medo em dizer que a falta de saneamento básico onera significativamente o orçamento do SUS. Profissionais que trabalham com saneamento básico declaram que o vagaroso ritmo de entrega de obras de saneamento no Brasil está relacionado a fatores que vão da burocracia para adquirir liberação dos recursos e licenças ambientais à falta de qualidade dos projetos apresentados pelos Municípios quando requerem verbas federais. Por fim, saneamento básico é uma questão de saúde pública do Brasil.

    Eu o cumprimento pelo preciso relatório feito do projeto da Senadora Rose de Freitas e peço a V. Sa., como Vice-Presidente desta Casa, do Senado, que a gente, amanhã, na reunião de Líderes, faça com que se priorize e se coloque em pauta esse assunto tão prioritário no Brasil, nesta semana.

    No dia de hoje, senhoras e senhores, Pátria amada, como bem pronunciou aqui o gaúcho Paim e amigo estimado, 13 de maio, a cronologia histórica brasileira assinala 131 anos desde que, em 1888, a Princesa Isabel, cognominada a Redentora, assinou a chamada Lei Áurea. Recuso-me, como é meu feitio, a usar a lembrança desse dia 13 de maio, data tão significativa, apenas para tecer loas à Princesa Isabel ou para exaltar a libertação do negro brasileiro. Os nossos antecedentes históricos são a prova de que o negro sempre foi discriminado em todos os aspectos. Não tinham, por exemplo, direito à escola e, até a Lei do Ventre Livre ser decretada, não tinham direito nem sobre seus filhos, pois esses, na hora do nascimento, eram considerados propriedades dos senhores, como eram chamados os homens de pele branca que tinham condições financeiras de manter sob o seu poder vários escravos. E, quanto maior a quantidade de escravos, maior seria o seu prestígio na sociedade. Resta-nos, então, Senador Paim, ver como é de fato a vida do negro no Brasil.

    Quanto ao mercado de trabalho, constitui o negro uma reserva de mão de obra barata. Desqualificado, incapaz, é direcionado para trabalhos domésticos e pesados, posições que exigem menor preparo, como construção civil e serviços domésticos, resultando numa baixa condição socioeconômica.

    O Brasil ocupa, pasmem, o número 62, o 62º lugar no mundo, levando-se em consideração o índice de qualidade de vida. Se levarmos em consideração apenas a população negra, o Brasil desce, despenca para o lugar de número 120. O negro é parte considerável da população economicamente ativa, mas é o primeiro a ser atingido pelo desemprego. O negro é o último a entrar no mercado de trabalho e o primeiro a sair dele. Normalmente, trabalha sem carteira assinada. Reservam-se ao negro as possibilidades de trabalho de menor remuneração e projeção social.

    Quanto à educação, Presidente Izalci, estabelece-se um círculo vicioso: pobreza, fracasso escolar, marginalização social. A taxa de analfabetismo entre os afro-brasileiros é, como disse Paim, de 60%. Os negros fazem o supletivo de segundo grau em proporção muitas vezes maior do que os brancos. Na universidade, a possibilidade de ingresso do negro é de 18%; a do branco é de 43%.

    Por fim, quanto à cultura, por outro lado, a produção e a difusão cultural do País refletem também o processo discriminatório. Pesquisa realizada pela Fundação Palmares constata que apenas 4% da programação das principais emissoras públicas do País abordam em entrevistas, programas de auditório e telejornais elementos da cultura negra, mesmo sendo mais da metade de nossa população, conforme já constatamos, declarada negra ou parda.

    Tivemos, entretanto, alguns ganhos nos últimos anos – reconheçamos. O Governo Federal sancionou em março de 2003 a Lei nº 10.639/03, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e estabelece as diretrizes curriculares para a implementação da mesma. A Lei 10.639/03 institui a obrigatoriedade do ensino da história da África e dos africanos no currículo escolar do ensino fundamental e médio. Essa decisão resgata historicamente a contribuição dos negros na construção e na formação da sociedade brasileira.

    Últimas palavras. Tivemos a implantação do sistema de cotas para acesso às universidades. Tivemos a ascensão do Ministro Joaquim Barbosa ao Supremo Tribunal Federal, chegando à sua Presidência. Ele mesmo disse na época – aspas: "Vejo como um ato de grande significação, que sinaliza para a sociedade o fim de certas barreiras, visíveis e invisíveis."

    Ao fim dessas meditações, percebemos que urgem políticas públicas que promovam a integração da população brasileira, de todos os matizes, a uma plena cidadania. Precisamos caminhar rumo a uma segunda abolição, Senador Paim, que depende de nós, autoridades, e é claro, de toda a população brasileira.

    Já que anteriormente o Senador Paim falou de arma, eu quero só terminar "parafraseano" e parafraseando o meu amigo, de quem V. Exas. aí na galeria já devem ter ouvido a canção, o Falcão, do Rappa: "A minha alma está armada e [pronta] [...] para a cara do sossego."

    Agradecidíssimo.

    O Sr. Paulo Paim (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para apartear.) – Senador Kajuru, como V. Exa...

    O SR. JORGE KAJURU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO) – Claro.

    O Sr. Paulo Paim (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... dispõe de 11 minutos e 48 segundos, eu não poderia deixar de fazer um aparte.

    Primeiro, cumprimento V. Exa., porque quando um Deputado ou Senador negro vai à tribuna falar da questão do preconceito racial contra o povo negro, alguns já dizem: "Não, lá está sicrano ou beltrano já falando dessa questão". V. Exa. é um homem que, me permita que assim o diga, tem carinho a todos os segmentos: a negro, a branco, a índio, a cigano. Então V. Exa. indo à tribuna, no meu entendimento, faz um grande serviço à Nação, porque este País só será uma grande Nação, na linha do que eu falei, e V. Exa. também falou, não é que eu falei ou V. Exa. falou, no dia em que nós entendermos o potencial de toda a nossa gente.

    Como alguém já disse, quem não tem um pouco do sangue negro ou índio no seu corpo? É porque vem de geração em geração. São 548 anos, se eu não me engano, o número que eu tinha comigo no meu pronunciamento, enfim, quase 600 anos de uma história que, se tiver que ser reescrita, não negando o que aconteceu, mas reescrever de forma bonita, prazerosa, de uma forma que a gente possa dizer que mulher e homem na mesma atividade têm que ganhar o mesmo salário. Para que discriminar a mulher? Por que agredir covardemente alguém devido à sua orientação sexual? Hoje o mundo é LGBT. Por que tratar de forma, eu diria, covarde, cruel um cidadão que veio de outro país, quando nós queremos muito que os cidadãos do nosso País sejam bem tratados nos países outros em que por ventura estejam? Por que discriminar alguém pela cor da pele?

    Há uma frase do Mandela que eu nunca esqueço. Dizia ele assim: "Como é cruel, como é triste, como é vergonhoso alguém querer ensinar a uma criança a odiar a outra pela cor da pele!" Isso é uma agressão à criança branca, à criança negra; ambas são agredidas.

    Eu vi um vídeo muito bonito, que está circulando, acho que por todo o mundo, em que crianças são perguntadas sobre como elas veem aquele determinado cidadão. E o entrevistador provoca, dizendo assim: "Você não acha que ele é feio, ou que ele é isso, ou aquilo?" E a criança, seja branca ou negra, abaixa os olhos e diz, assim como eu estou aqui: "Mas eu não posso dizer isso. Isso é feio!" Isso mostra que a criança não tem maldade, que a criança nasce com a pureza do céu, eu diria, de Deus, não é? E como é que, com os anos passando, muitas vezes se tornam racistas e preconceituosas.

    Ao ver aquelas crianças brancas, negras, independentemente do seu país, dando aquele depoimento e quando ambas diziam – e aquilo foi filmado ao vivo mesmo: "Não, eu não posso dizer isso, eu não penso isso...", eu percebi que elas choravam. Meu Deus do céu, é disso que a gente precisa mais! Eu achei aquele vídeo lindo, lindo, lindo! Mandei para todo mundo que eu pude, porque, se nós não entrarmos na linha da paz, do amor, da solidariedade, do carinho, do respeito ao outro, nós não vamos a lugar nenhum.

    Desculpe, mas fiz questão de cumprimentá-lo.

    O SR. JORGE KAJURU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO) – Não, pelo contrário; o senhor acrescentou, Senador Paulo Paim, e bem, e me lembrou que ontem – V. Sa. viu Mandela – eu vi aquele filme, Ray, interpretado de forma brilhante pelo Jamie Foxx, ganhador do Oscar. E o Ray Charles, quando partiu para o apogeu, ele lembrava que sua mãe, que lavava roupas, sempre dizia: "Filho, nunca aceite ser discriminado". Então, há vários momentos no filme... Quando ele entra no primeiro ônibus, o motorista o discrimina pela cor, e ele diz ao motorista: "Você está pensando que eu não posso entrar nesse ônibus pela minha cor, mas não; é porque eu perdi a minha visão, eu sou cego", E, aí, tira os óculos escuros dele. Então, são filmes como esse que trazem realmente essa realidade, e essa sua lembrança de Mandela foi, para mim, a melhor delas, sem dúvida alguma.

    Mas lembrei-me, também ontem, do Poetinha Vinicius de Moraes, quando ele dizia: "Eu sou o branco mais negro do País. Então, também nunca podemos nos esquecer do Poetinha Vinícius de Moraes.

    Enfim, Presidente Izalci, por gentileza, vamos tentar colocar na pauta esse projeto da Senadora Rose que o senhor tão bem relatou. E eu tentei aqui, ao ler o seu relatório, colocar algumas palavras sobre a questão das obras paralisadas neste País – e são quase três mil obras – e a tudo o que representa de prejuízo e a tudo que nos preocupa. Daí o nosso dever de pedir ao Tribunal de Contas da União que fiscalize cada obra inacabada, cada obra parada, para que não haja superfaturamento, porque, no meu Estado de Goiás, nos últimos 20 anos, o que houve de superfaturamento em tudo – em tudo, em tudo! Bilhões de reais foram superfaturados.

    Então, esse é um assunto muito importante.

    Agradecidíssimo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/05/2019 - Página 46