Discurso durante a 83ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apelo à rejeição do veto presidencial em relação ao Projeto de Lei nº 10.159, de 2018, que dispensa de reavaliação pericial a pessoa com HIV/Aids aposentada por invalidez.

Breve histórico sobre o programa brasileiro de resposta à Aids.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Apelo à rejeição do veto presidencial em relação ao Projeto de Lei nº 10.159, de 2018, que dispensa de reavaliação pericial a pessoa com HIV/Aids aposentada por invalidez.
SAUDE:
  • Breve histórico sobre o programa brasileiro de resposta à Aids.
Publicação
Publicação no DSF de 28/05/2019 - Página 32
Assuntos
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Outros > SAUDE
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, REJEIÇÃO, VETO (VET), PROJETO DE LEI, OBJETIVO, DISPENSA, NECESSIDADE, REAVALIAÇÃO, PERICIA, APOSENTADO, INVALIDEZ, PORTADOR, SINDROME DE IMUNODEFICIENCIA ADQUIRIDA (AIDS).
  • COMENTARIO, ASSUNTO, PROGRAMA, RESPOSTA, SINDROME DE IMUNODEFICIENCIA ADQUIRIDA (AIDS), REALIZAÇÃO, PAIS, BRASIL.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Senador Izalci, Presidente da sessão, Senador Lucas Barreto, eu quero já de pronto dizer que conte também com meu apoio nessa sua proposta de emenda à Constituição que este Plenário vai votar amanhã. Senador Girão, um abraço como sempre, cumprimento V. Exa. pelo seu trabalho.

    Sr. Presente, eu vou falar de dois temas. Na verdade, vou aprofundar um tema.

    Quero só agradecer o convite que recebi, em primeiro lugar, do Superior Tribunal de Justiça, na figura da Ministra Nancy Andrighi, Presidente da Comissão Multidisciplinar de Acessibilidade e Inclusão, e também do Ministro João Otávio de Noronha, Presidente, que me convidam para fazer uma palestra sobre este tema, sobre os direitos da pessoa com deficiência, baseado na Lei Brasileira de Inclusão (Estatuto da Pessoa com Deficiência), de que fui o autor. Mara Gabrilli, Romário foram Relatores, o Senador Flávio Arns também foi Relator, o Celso Russomanno... E espero poder estar lá presente. Agradeço muito o convite que recebi para estar lá no tribunal para fazer essa palestra.

    E aproveito também porque, quando a Ministra Diretora Nancy Andrighi me fez o convite, ela me disse também que o pai dela, Sr. Vivaldino Andrighi, com mais de 90 anos, lá de Lagoa Vermelha, no Rio Grande do Sul, acompanha o nosso trabalho aqui no Senado e, como sou do Rio Grande, ela pediu que eu mandasse um nosso abraço para ele.

    Então, Ministra do Superior Tribunal de Justiça, eu estou mandando um abraço para o Sr. Vivaldino Andrighi, que foi amigo de um irmão meu que foi Diretor do Banco do Estado do Rio Grande do Sul, lá em Lagoa Vermelha. Sr. Vivaldino Andrighi, fica aqui meu abraço!

    Mas, Senador Lucas Barreto, eu tenho conversado muito sobre a questão do meio ambiente e confesso, Senador Lucas Barreto, Senador Girão, que ele tem levantado argumentos muito sólidos para mim. Ele conversou longamente comigo há pouco tempo. E eu acho que é isto mesmo: nós temos que debater esse tema, não é, Senador? Como V. Exa. me alertava, debater esse tema é importante. E quero aqui dar um depoimento que eu dei ali para V. Exa. "Paim, vamos debater o tema, mas lembre-se do povo de toda essa Região do Amazonas", foi isso que disse em outras palavras. E eu respondi: "Conte comigo". Então, fica aqui firmado esse acordo, porque debater o meio ambiente é bom. Agora aqui falou o Márcio Bittar, que fez uma exposição da sua visão, do que ele pensa. É um tema que merece, de fato, ser debatido, senão a gente fica falando de um tema sem aprofundar a questão. O meio ambiente é importante, mas o ser humano, os animais, os que vivem lá no meio da floresta, como a gente fala, têm um valor imensurável. É esse o alerta que V. Exa. me deu. E eu ouvi, viu?

    Sr. Presidente, Lucas Barreto, vou falar de um tema que mexe com a alma, com o coração e com a mente de todos nós. E vou começar descrevendo.

    Quero aqui fazer um apelo aos nobres colegas para a derrubada do veto presidencial em relação ao Projeto nº 10.159, de 2018, que dispensa de reavaliação pericial a pessoa com HIV/aids, aposentado então por invalidez.

    Recebi documento do Presidente da Articulação Nacional de Saúde e Direitos Humanos, Sr. Renato da Matta, e é nesse sentido que faço o registro na tribuna.

    O HIV é considerado pelo INSS, em suas novas diretrizes para HIV/aids, como uma doença crônico-degenerativa, pelo consenso de 2008 do Ministério da Saúde, ou seja, ela não regride e vive em constantes agravos.

    Quando a pessoa foi aposentada, a mesma já passou por longos anos de auxílio-doença, até que o perito concluiu que ela estava totalmente incapaz para o trabalho.

    A pessoa, quando começa o tratamento, deixa de transmitir o vírus e adquire uma melhor qualidade de vida, no entanto o vírus, quando atacado pelos medicamentos, se refugia em lugares do corpo a que chamamos de reservatórios, como o sistema nervoso central, provocando uma inflamação crônica que o corpo tenta combater 24 horas por dia. Tal batalha gera um envelhecimento biológico de 10 a 15 anos.

    Muitas dessas pessoas aposentadas há 15, 20 anos, foram de repente desaposentadas. Recebiam em média um salário mínimo. Qual é a empresa que vai contratar um cidadão como esse em época de desemprego e recessão, como estamos vivendo?

    Essas pessoas estavam bem na época em que foram aposentadas, porque com o seu salário mínimo elas podiam se alimentar e pagar uma passagem para buscar os remédios, os medicamentos, mas, a partir do momento em que elas perdem o benefício, vão se manter como?

    Sr. Presidente, no documento da Articulação Nacional de Saúde e Direitos Humanos, há as seguintes indagações: o que custa mais caro, 30 a 70 dias de UTI ou um salário mínimo? É claro que é muito mais caro esse cidadão ir para a UTI. Infelizmente, em muitos e muitos casos, ele morre. Quanto custa uma nova infecção por HIV aos cofres públicos? Renato da Matta complementa, abro aspas:

O impacto social foi terrível. Nunca pensei que fosse viver para ver novamente o horror da aids, em ver pessoas em UTIs que são pele e ossos e morrendo por aids, pela falta de seus benefícios que lhes foram arrancados [...]. O que o governo chama de economia eu chamo [diz o Renato da Matta] de genocídio [...].

    Esse movimento lembra que, entre direita e esquerda, existe uma população no meio que não tem nada a ver com esse debate ideológico, nem de esquerda nem de direita, como é feito hoje no nosso Brasil. Ela só quer viver em paz e ter seus direitos adquiridos garantidos e, principalmente, ter direito a uma vida digna.

    Portanto, faço um apelo para que o Congresso Nacional derrube o veto presidencial ao PL 10.159, de 2018. E faço um apelo ao Presidente do Congresso: que bote essa matéria em pauta para a apreciação dos Congressistas.

    Ainda no tema da aids:

O Movimento Nacional de Luta contra a Aids, formado por redes, coletivos, organizações e ativistas, repudia o Decreto nº 9.795, de 17 maio de 2019, que modifica a estrutura do Ministério da Saúde. Por meio desse decreto, o Departamento de IST, Aids e Hepatites Virais passa a se chamar "Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis".

Não se trata [aqui] apenas de uma questão de nomenclatura: é o fim do Programa Brasileiro de [Combate à] Aids. [Infelizmente] [...], na prática, extingue de maneira inaceitável [...] um dos programas de aids mais importantes do mundo, que foi, durante décadas [e décadas], referência internacional na luta contra a aids.

    Se não me engano, foi na época do Ministro José Serra, que hoje é Senador. Ele foi quem trabalhou para elaborar esse projeto, que é referência mundial.

Mais do que um programa, esse decreto acaba com uma experiência democrática de governança de uma epidemia baseada na participação social e na intersetorialidade. Prova disso é que, há pouco mais de um mês, nas reuniões da Comissão Nacional de IST, HIV/Aids e Hepatites Virais (CNAIDS) e da Comissão Nacional de Articulação com Movimentos Sociais (CAMS), absolutamente nada se falou sobre o decreto e nenhum esclarecimento foi prestado sobre suas potenciais consequências.

O programa brasileiro de resposta à aids foi, durante décadas [repito], referência internacional na luta contra a aids. A relação única de combate e colaboração com uma pujante sociedade civil, a decisão corajosa de oferecer tratamento antirretroviral universal e gratuito [foi um avanço], a ousadia nas campanhas de prevenção fizeram da resposta brasileira ao HIV destaque em inúmeros fóruns internacionais e inspiraram outros países em desenvolvimento.

    Começou lá, na era Fernando Henrique, mas os outros governos todos o mantiveram. Por isso, eu faço um apelo para que seja mantido, e, aí, o Governo teria que colaborar para que esse veto fosse, mediante um amplo acordo, derrubado.

O marco simbólico de ter uma estrutura de governo voltada para o enfrentamento à aids é indicativo de [fundamental] importância [no combate] [...] à epidemia. Por mais que se afirme que "nada mudará", o que fica é [a preocupação] [...] com uma doença que mata cerca de 12 mil pessoas por ano e que, longe de estar controlada, continua crescendo [no Brasil e no mundo], especialmente populações pauperizadas e estigmatizadas, já tradicionalmente excluídas e que com esse ato se tornam mais invisíveis e desrespeitadas.

A resposta ao HIV construída no Brasil não nasceu do dia para a noite.

    Foi uma construção de governos e governos e virou referência, lembro, para todo o mundo. Para que mexer naquilo que está dando certo? Diria mais:

Ao contrário, foi conquistada por meio de mais de três décadas de luta diária das pessoas vivendo e convivendo com o HIV/aids, população LGBT, negras e negros, [brancos, brancas, homens], mulheres, pessoas trans, jovens e ativistas.

    Fizeram essa longa jornada para conquistar esse programa, que, agora, ao que tudo indica, poderá desaparecer. Espero, pois, que o veto seja derrubado.

Essa ação do Governo Federal, extinguindo o programa brasileiro, é inadmissível e se insere numa forma de pensar a sociedade que [torna invisível] [...] qualquer existência que escape à limitadíssima perspectiva [de um pensamento só] [...].

    Como se pobre, setores vulneráveis, aqueles que têm doenças terminais não tivessem de ter tratamento, parecendo que a eles o destino é somente a morte. Podemos, com muito diálogo, mudar essa posição. Com certeza, poderíamos construir um caminho diferente.

    Por não conseguirem entender alguns que a vida é complexa e potente, o Governo não pode, ao vetar essa matéria, ficar com o ônus para si do símbolo de alguém que não admite que a doença possa ser combatida, que não admite que a doença é física – é –, mas ela pode ser mudada e, com isso, salvarmos milhares e milhares de brasileiros.

Contra a política de morte [diz o documento], gritamos: VIVA A VIDA [não à morte]! Não nos calaremos frente ao fim do departamento que salvou [repete aqui] milhares [e milhares] de vidas. Pela manutenção do Departamento de Aids! Nenhum direito a menos!

    Eu li aqui, fiz alguns comentários, na verdade, um documento na íntegra, que é assinado pela Articulação Nacional de Luta contra a Aids, pela Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, Fórum das ONG/Aids do Estado de São Paulo (Foaesp), Grupo de Apoio à Prevenção da Aids do Rio Grande do Sul (Gapa), Grupo de Incentivo à Vida (GIV), Rede Nacional de Pessoas Vivendo com o HIV e a Aids (RNP+Brasil).

    Presidente, esse documento eu peço que fique nos Anais da Casa. Tive o cuidado de lê-lo na íntegra. Fiz pequenos comentários, a pedido, principalmente deste jovem militante que preside a Articulação Nacional de Saúde e Direitos Humanos, o Sr. Renato da Matta. Ele já esteve na UTI, e, mesmo quando ele estava na UTI, ele estava, por telefone, trabalhando aqui, toda vez que podia, claro, desviando ali das enfermeiras. Ele fazia contato com o gabinete: "Como é que está o projeto, Paim?", e eu dizia: "Está indo bem, vai ser aprovado."

    Quando ele se liberou do hospital, porque na verdade ficou um período lá, veio para cá e fez corpo a corpo na Câmara e no Senado, e o projeto foi aprovado por unanimidade e, infelizmente, agora foi vetado.

    Eu nunca me refiro, quando faço algum comentário, a nome de nenhuma pessoa. Se é para falar, falo de bem, mas agora vou fazer um pedido ao Presidente da República: Presidente Bolsonaro, veja com atenção, já houve diversas vezes aqui, nesta Casa, em que situação, oposição e o Governo chegaram num acordo, e a orientação foi para que o veto fosse vetado. Esse aqui é um veto que mexe, como eu digo, com a gente, com o coração, com a alma de cada um de nós, porque, de fato, atinge aquelas pessoas que já estão há anos aposentadas, com o HIV/aids e, de repente... A doença não tem volta, inclusive, os peritos têm dado a eles o direito.

    Então, para que fazê-los passar por todo esse calvário de ficarem na mão de um perito, de outro perito? E não estou aqui fazendo crítica aos peritos, porque deram para eles o direito. Que a gente somente dissesse: aquele que está comprovadamente aposentado por invalidez, com HIV/aids... Ele não tem... Essa doença, como diz o documento, não regride. Ela pode estagnar e depois volta.

    Então, esse é o apelo que eu faço ao Presidente da República, que a gente faça um grande entendimento, Congresso e Executivo, e que esse veto seja apreciado e seja rejeitado.

    Era isso.

    Obrigado, Presidente.

DISCURSO NA ÍNTEGRA ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR PAULO PAIM.

(Inserido nos termos do art. 203 do Regimento Interno.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/05/2019 - Página 32