Discurso durante a 93ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre as notícias divulgadas pelo site The Intercept Brasil acerca de conversas entre o juiz Sérgio Moro e o Procurador Deltan Dallagnol.

Destaque para a importância da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 33, de 2019, que torna permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB).

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MINISTERIO PUBLICO:
  • Considerações sobre as notícias divulgadas pelo site The Intercept Brasil acerca de conversas entre o juiz Sérgio Moro e o Procurador Deltan Dallagnol.
EDUCAÇÃO:
  • Destaque para a importância da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 33, de 2019, que torna permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB).
Publicação
Publicação no DSF de 11/06/2019 - Página 7
Assuntos
Outros > MINISTERIO PUBLICO
Outros > EDUCAÇÃO
Indexação
  • REGISTRO, MATERIA, DIVULGAÇÃO, SITE, DIALOGO, SERGIO MORO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), PROCURADOR DA REPUBLICA, ASSUNTO, PROCESSO JUDICIAL, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • REGISTRO, IMPORTANCIA, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), ASSUNTO, PERMANENCIA, FUNDO DE MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BASICA E DE VALORIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO (FUNDEB).

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Sr. Presidente Senador Kajuru, Vice-Presidente que vai assumir os trabalhos, Senador Izalci, a imprensa nacional – eu diria – e grande parte também da imprensa internacional estão divulgando – e virou o centro do debate ontem à noite e no dia de hoje – as notícias divulgadas pelo Intercept Brasil sobre o processo Lula e Lava Jato.

    Senador Kajuru, quando eu rascunhava aqui, porque essas questões eu trato com o maior cuidado, eu escrevi as palavras nitroglicerina pura, assim eu resumo as matérias jornalísticas do site Intercept sobre mensagens trocadas entre o ex-Juiz Federal e atual Ministro da Justiça Sergio Moro e o Procurador da República Deltan Dallagnol.

    Conforme as reportagens do Intercept, houve uma interferência indevida no processo judicial, contrariando a própria Constituição Cidadã de 1988, de que eu fiz parte. Lá diz que deve haver isenção, imparcialidade, neutralidade. O Intercept informa em seu site que invocou o mesmo princípio e argumentação que levaram à divulgação de conversas entre a então Presidenta Dilma Rousseff e o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Abro aspas, está escrito lá: "(...) o de que uma democracia é mais saudável quando ações de relevância levadas a cabo em segredo por figuras políticas, poderosas são reveladas ao público" – fecho aspas.

    Eu entendo, Sr. Presidente, que a Justiça não pode ficar sob suspeita – não pode ficar sob suspeita. É preciso que se esclareçam todos os fatos. E, se ela está sob suspeita, o que se há de fazer? A primeira coisa é apurar a verdade, só a verdade e tão somente a verdade, e, se há mais coisas debaixo do tapete, venham de onde vierem, que venham à tona. O combate à corrupção deve ser para todos, corruptos e corruptores, não deve haver lado, peso ou medida; o contrário é a luta do poder pelo poder.

    Registro aqui – e já termino, Sr. Presidente, sobre esse fato – que foi entregue nos gabinetes e para a imprensa uma nota assinada por mais de cem juristas de renome, entre eles Lenio Streck, Pedro Serrano, Gisele Cittadino, Arnóbio Rocha, Carol Proner, Geraldo Prado, Marco Aurélio de Carvalho, Gabriela Araújo, Fabiano Silva, Elaio Morais, entre tantos outros – eu não vou ler todos aqui. Mas o resumo da nota, só boto aqui o resumo, exige a completa investigação do caso. Trata-se de uma questão republicana. Em nome do combate à corrupção, não se pode destruir o Estado democrático de direito e suas instituições. É o que se espera, em nome dos mais altos interesses da República Federativa do Brasil.

    Feito esse registro, Sr. Presidente, do documento que eu recebi, eu vou entrar num tema em que V. Exa. é um dos signatários aqui, eu diria o sujeito principal desta emenda. Sr. Presidente, educação não transforma o mundo; educação muda as pessoas, e as pessoas transformam o mundo. É com essa frase do mestre Paulo Freire em mente, que eu cito como farol a iluminar o nosso caminho, caminho de que venho hoje falar, sobre a importância, Sr. Presidente, e Sr. Kajuru, que é autor da emenda, do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação).

    Nosso maior instrumento de melhoria da educação e de diminuição das desigualdades sociais e econômicas do País, o Fundeb foi criado em 2006, pela Emenda Constitucional 53, de 2007. Foi regulamentado pela Lei nº 11.494. Nos últimos doze anos, o fundo, que é, na verdade, um conjunto de 27 fundos de âmbito estadual, tem sido ferramenta crucial na garantia do direcionamento de recursos públicos para a educação, grande instrumento de transformação e da melhoria da qualidade de vida de todo nosso povo e de toda nossa gente. E não apenas isso, o Fundeb tem contribuído e pode contribuir muito mais para reduzir disparidades regionais quanto ao desempenho escolar, às condições de oferta e ao investimento local por aluno.

    Ocorre que a vigência do Fundeb termina agora, e V. Exa., os dois são da área e entendem até muito mais do que eu, no último dia de 2020. O final do ano que vem pode parecer muito tempo, mas não é, pela importância do tema, que é educação. Digo isso com preocupação, Sr. Presidente Senador Izalci, partilhada por muitos, tenho certeza disso, pois um mecanismo estatal de tamanho alcance econômico e social não pode acabar assim.

    Temos que ser ágeis, temos que mobilizar o Congresso Nacional. E é isso que já, entendo, nós todos aqui nesta Casa estamos a fazer. Tramitam no Congresso algumas proposições que tornam o Fundeb instrumento permanente de financiamento da educação básica pública.

    É o caso da PEC 15, de 2015, iniciada na Câmara, da PEC n° 24, de 2007 – também na Câmara, primeira signatária, Senadora Lídice –, da PEC nº 33 – e o Senado também está nessa linha de frente – e a PEC nº 65, ambas de 2019. A primeira, a que vai liderar, a que vai encabeçar aqui no Senado é de V. Exa., Senador Kajuru; a outra – e V. Exa. aqui me resgatava quando eu comentava com V. Exa. – é do Senador Randolfe, que me parece que vai retirar a dele e vai apresentar emenda àquela que V. Exa. apresentou, que, de fato, é a primeira na Casa, que é a PE nº 33.

    É isso? (Pausa.)

    Está correto aqui, então.

    Garantiremos, assim, a permanência do Fundeb. Isso é fundamental! Mas, para além disso, o ilustre Senador Flávio Arns recentemente nos lembrava de que este é um momento único e fundamental, uma janela de oportunidade que temos para aprimorar a legislação do Fundeb, que é uma política pública estruturante da educação brasileira.

    O caminho, como nós todos sempre dizemos, é o diálogo, o diálogo e o diálogo. Temos de ouvir os especialistas; temos de ouvir a União, os Estados e os Municípios; temos de ouvir os estudantes, os professores, os mestres; temos de ouvir que pensa, viabiliza e faz a educação no Brasil e até no mundo, porque a educação é um compromisso de todos nós, é um compromisso da humanidade.

    O Senado já realizou algumas audiências públicas.

    Para se ter uma ideia da importância do Fundeb, o orçamento total para 2019 é de nada menos que R$156 bilhões, em torno de 2% do PIB.

    O fundo corresponde, hoje, a 63% dos recursos disponíveis para o financiamento da educação básica pública. Essa quantia se destina a um total aproximado de 39,5 milhões de beneficiários, entre alunos da educação infantil, ensino fundamental e ensino médio.

    Outros dados demonstram que o Brasil, apesar de ter aumentado o seu nível de investimento em educação, lamentavelmente, ainda não atingiu o mesmo patamar dos países desenvolvidos.

    Por outro lado, Presidente, com os direitos sociais prestigiados na Carta Magna de 1988 e, depois, com a criação do Fundeb, verificamos um aumento significativo na média da escolarização da nossa gente. Em 1992, um brasileiro de 22 anos tinha 6,4 anos de estudo em média. Já em 2006, cerca de nove anos em média. Em 2015, o tempo médio de escola pulou para mais de 10 anos.

    As fontes de recursos do Fundeb são variadas. Ele recebe 20% do Fundo de Participação dos Estados, do Fundo de Participação dos Municípios, do ICMS, do IPI-Exportação, do IPVA, das desonerações das exportações previstas na Lei Kandir, entre outas fontes. Também recebe complementação da União toda vez que for necessário.

    Essa complementação ocorre sempre que, no âmbito estadual, o valor por aluno não alcança o mínimo definido nacionalmente, ou seja, no mínimo 10% do total que os Estados e os Municípios aportam ao fundo.

    Sr. Presidente, nove Estados têm sido beneficiários constantes dessa modalidade de complementação: Pará, Amazonas e todos os Estados do Nordeste, com exceção de Sergipe e Rio Grande do Norte.

    Em 2019, a complementação da União será de mais de R$14 bilhões.

    No âmbito de cada Estado, os recursos vinculados ao Fundeb são distribuídos entre o próprio Estado e seus Municípios, conforme o número de matrículas presenciais efetivas, levando-se em conta atuação prioritária e multiplicando-se pelos fatores de ponderação, que são diferentes conforme a etapa, a modalidade da educação básica e os tipos de estabelecimento de ensino.

    Uma proporção não inferior a 60% do total dos recursos de cada fundo é destinada ao pagamento dos professores em atividade. Além disso, desde o quarto ano de vigência da Emenda 53, a contribuição federal a cada fundo passou a ser de pelo menos 10% de seu montante, considerando, assim, as contribuições dos entes federados.

    Outro fato a destacar são as transferências dos Estados aos Municípios, que somam R$22 bilhões, no agregado.

    Sr. Presidente, se esse mecanismo de financiamento acabasse de repente, a educação básica no Brasil entraria, com certeza, em colapso. Na maioria das escolas, não haveria dinheiro para pagar os salários de professores e funcionários nem para comprar um lanche ou um lápis sequer.

    Nossa educação básica, salvo o ensino médio, é municipalizada, mas os Municípios brasileiros, na sua grande maioria, são muito pobres, muito dependentes de repasses e transferências da União e dos Estados. Essa é a dura realidade da nossa Federação.

    De forma que eu peço, de forma respeitosa e carinhosa, mas, ao mesmo tempo, fazendo um apelo, a atenção de todos para estarmos nessa mobilização.

    Em recente audiência pública no Senado, o Dr. Paulo Sena trouxe dados históricos interessantíssimos. Ele nos mostrou uma série temporal que vem desde 1933 até os dias de hoje, uma série que relaciona o investimento em educação no Brasil com o total do PIB.

    No longo prazo, houve nítido crescimento. Voltamos aos números. Em 1933, investíamos apenas 1% do PIB em educação. Em 2017, investimos 6% do PIB, lembrando que a educação superior está nessa conta. Mas vamos em frente. Ele disse também que foi a partir da Constituição de 1934 que se adotou, no Brasil, a vinculação orçamentária para a educação. Desde então, foram poucos momentos de exceção a essa regra. Avançamos, e é incrível como fica evidente que, nas últimas oito décadas, sempre que desvincularam os gastos com a educação em nosso País, houve, logo depois, queda significativa no percentual de investimento em educação em relação ao PIB. Ou seja, sempre que, no Brasil, um Estado suspendeu o financiamento obrigatório da educação, o dinheiro público acabou desaparecendo ou sendo utilizado em outras áreas.

    Todos nós sabemos que a melhor maneira de espantar o fantasma da desigualdade e da discriminação é a educação. A educação básica universal, gratuita e de qualidade é que proporciona igualdade de oportunidades e condições. É isso que tem o poder de transformar a vida das pessoas, como eu falava na abertura deste pronunciamento. Se não tivermos um modelo de financiamento justo e eficiente para nossa educação, um modelo que, acima de tudo, priorize a equidade, redistribuindo mais a quem mais precisa, nós jamais vamos superar o ciclo perverso da exclusão social.

    O Fundeb não é perfeito. Podem crer que ele não é perfeito. Sem ele, contudo, estaríamos em condição muito, muito pior. Ele precisa de ajustes? Sim. Precisa de controle e monitoramento, mas não pode acabar, tem que estar cada vez mais vivo. Para que o Fundeb tenha impacto cada vez maior na educação e no combate à desigualdade, é necessário aperfeiçoar a gestão de seus fundos e a gestão dos órgãos envolvidos. Precisamos melhorar a infraestrutura das escolas e capacitar mais os nossos professores. Tudo conta, tudo faz a diferença. Mas o fato é que todas as discussões sobre financiamento da educação básica pública no Brasil sempre convergem para um único ponto: a necessidade de defesa e o fortalecimento de um sistema que promova a redistribuição mais pujante e mais eficaz desses recursos.

    Se quisermos – e aqui termino, Presidente – um Brasil melhor, um mundo melhor, temos de apostar na educação. É a educação que nos liberta. Repito: é a educação que nos liberta. É a educação que transforma o oprimido em sujeito livre e autônomo – e aí voltamos a Paulo Freire com uma última frase. A educação tem esse poder. Ela muda as pessoas. Repetindo: ela muda as pessoas, e as pessoas, sim...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... transformam o mundo.

    Vida longa ao Fundeb!

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/06/2019 - Página 7