Discurso durante a 132ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Questionamento sobre os esforços despendidos pelos Senadores em discutir o projeto de lei que prevê o uso inadequado de animais, ao passo que outros assuntos, relativos à população e políticas públicas, não possuem o mesmo destaque no Parlamento.

Considerações sobre a importância de se incluir Estados e Municípios na proposta de reforma da previdência.

Autor
Marcio Bittar (MDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Marcio Miguel Bittar
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO:
  • Questionamento sobre os esforços despendidos pelos Senadores em discutir o projeto de lei que prevê o uso inadequado de animais, ao passo que outros assuntos, relativos à população e políticas públicas, não possuem o mesmo destaque no Parlamento.
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Considerações sobre a importância de se incluir Estados e Municípios na proposta de reforma da previdência.
Publicação
Publicação no DSF de 13/08/2019 - Página 29
Assuntos
Outros > SENADO
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Indexação
  • REGISTRO, PROJETO DE LEI DA CAMARA (PLC), ASSUNTO, NATUREZA JURIDICA, ANIMAL, CRITICA, ENGAJAMENTO, SENADO, VOTAÇÃO, MATERIA, COMPARAÇÃO, POLITICAS PUBLICAS, SEGURANÇA PUBLICA, EDUCAÇÃO.
  • REGISTRO, NECESSIDADE, INCLUSÃO, ESTADOS, MUNICIPIOS, REFORMA, PREVIDENCIA SOCIAL.

    O SR. MARCIO BITTAR (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - AC. Para discursar.) – Presidente Plínio, em primeiro lugar, muitíssimo obrigado. De fato, eu saio daqui e vou a um exame médico. Nada assustador, mas vamos acompanhar.

    Presidente e colegas Senadores da República, na semana passada, eu vi a nossa Casa... Talvez o que me tenha mais chamado a atenção foi uma dose de comoção ao votarmos aqui um aprimoramento da lei que pretende prever o uso inadequado dos animais – notadamente, os animais de estimação. Como a matéria veio para o Senado, eu não votaria a favor, porque ela promoveria uma absoluta instabilidade no agronegócio brasileiro, que sustenta milhares de famílias de forma direta e indireta, mas, com as modificações que o Plenário apresentou e o Relator Randolfe incorporou, então, praticamente todos nós acabamos votando.

    E não estamos totalmente livres, Sr. Presidente, de observar que haverá um vácuo jurídico. Vai, sim, haver a possibilidade, já que o animal, mesmo o de estimação, deixou por esta Casa, de ser coisa. Portanto, não é mais uma propriedade. Então, nós vamos ter algumas questões ainda no futuro, como, por exemplo, ser possível que algum juiz entenda que ele passa a ter direito na partilha de uma herança. Mas o.k. Com as emendas que nós fizemos, eu também acabei votando a favor.

    Sr. Presidente, V. Exa., que representa também com muita capacidade a Região Amazônica brasileira... Nós estamos aqui do lado de um Senador do Distrito Federal, um dos maiores IDHs do Brasil. Se Brasília fosse um Estado, seria o Estado de maior IDH do Brasil.

    O que me chamou a atenção? Veja, Presidente, o Brasil está matando 65 mil pessoas por ano. É uma guerra: 65 mil pessoas. Imagine a quantidade de mães, de pais, de maridos, de esposas e de filhos que são atingidos nesse universo. E nós temos uma pauta da segurança fundamental. E eu não observei um dia no Senado, neste ano, em que nós tivéssemos debatido, com tanta ênfase, com tanto calor, a preocupação de aperfeiçoarmos a legislação brasileira para combatermos isso que é uma guerra civil no Brasil, 65 mil pessoas assassinadas.

    E o que me chama a atenção é que fica parecendo que o Congresso Nacional se preocupa mais, não que não deva, com animal de estimação do que com homens e mulheres que estão morrendo por ano. Já são mais de 1 milhão de assassinatos nos últimos anos no Brasil. Isso para não dizer das mortes violentas no trânsito. Nós já tivemos 50 mil. Agora caiu, mas mesmo assim nós somos o quarto país que mais abate vítimas no trânsito, cerca de 40 mil pessoas que, somadas aos homicídios, são 100 mil, ou mais de 100 mil brasileiros que morrem, por ano, de morte violenta.

    Para nós que representamos a Região Amazônica, o que chama a atenção? É que, às vezes, parece, como eu já falei, que um animal de estimação merece mais tempo do Congresso do que homens e mulheres. Assim, Sr. Presidente, parece-me às vezes que uma árvore vale muito mais do que os milhões de brasileiros que moram na Amazônia. Senão vejamos, nos últimos 30 dias... E ainda ontem vendo na Globo, no canal fechado, eu tornei a assistir a mesma coisa, pseudocientistas... Desculpem-me, eu não embarco nessa canoa. Primeiro, não há uma verdade absoluta nem na ciência. Até o Einstein, parte da teoria dele, agora há cientistas que estão trabalhando e questionando. Então, nada é inquestionável. Mas aí uma ditadura do pensamento único passou esses últimos 30 dias dizendo quase que uma coisa só: derrubaram árvores na Amazônia!

    Mas, Sr. Presidente, eu não vejo a mesma eloquência, o mesmo tempo nas televisões para dizer dos índios que eu e V. Exa. cansamos de ver no Norte brasileiro alcoolizados, em Rondônia, em Roraima, perdidos em favelas do Rio Branco, de Boa Vista, de Manaus, de Porto Velho... Eu vejo um tempo imenso... E não quero dizer que não tenha que haver essa preocupação, mas passa para mim um sentimento claro de que a preocupação é muito maior e o tempo que dispensamos aqui é muito maior no debate de derrubou ou não derrubou, como se o resultado dos países ricos do mundo não seja aquele, simetricamente, aqueles que aproveitaram ou aproveitam os seus recursos naturais. Mas para aquele índio que saiu da Raposa do Sol e foi criar mais três favelas em Boa Vista, para esses, Sr. Presidente, eu não vejo o mesmo tempo, os mesmos recursos, as mesmas energias que eu vejo ao ser discutido, por exemplo, se um campo a mais ou a menos de futebol foi aberto ou não.

    Eu não vejo, Sr. Presidente, a preocupação do Congresso Nacional, do Brasil, da mídia brasileira com o que ocorre na nossa região, que é a mais pobre do País. Nós não temos 8% das residências com esgoto sanitário. O que isso significa? Significa doença, doenças primárias. E eu não vejo uma discussão. Ao contrário, o que eu percebi foi uma dificuldade imensa de facilitar uma medida provisória, que precisa da nossa aprovação, agora na Câmara, que possa facilitar ao Poder Público terceirizar as empresas de saneamento da região.

    Então, o que me chama a atenção é o tempo, a energia e a emoção gastos nessas questões, quando eu não vejo a mesma energia e o mesmo envolvimento sendo gastos para tentar solucionar o maior problema ambiental do Norte, que não é a derrubada, mas é o esgoto a céu aberto ou a falta de esgoto.

    E, aí, Sr. Presidente, alguns dados que não me deixam... Já falei dos homicídios, já falei do esgoto e vou falar da violência. E 82% da população do Norte não tem água e esgoto – 82%! Saneamento básico, água e esgoto.

    Homicídios. O Norte do Brasil está empatado com o Nordeste. O Nordeste com 48 assassinatos por 100 mil habitantes e a nossa região com 47. São as duas maiores taxas de homicídios do País. O Acre, Sr. Presidente, com 62, o dobro da média nacional.

    E outro tema, Sr. Presidente, em que eu não vejo o mesmo envolvimento... Eu vi aqui Senadores, colegas nossos, com justiça, mas eu os vi carregados de emoção ao defender que nós temos de aprimorar a lei para proteger os animais de estimação. E, às vezes, contrariando até o que diz o catecismo, que eu procuro ler, há famílias... E o catecismo condena, a minha religião condena isso. Às vezes, há famílias que dão mais importância econômica e afetiva a um animal de estimação do que a uma criança que está morrendo de fome no meio da rua.

    Mas um outro problema para o qual eu não vejo a mesma atenção, Sr. Presidente, é a educação. Todos os exames feitos no Brasil, indistintamente, colocam-nos nas últimas posições. Nós temos um dado estarrecedor: no segundo ano da alfabetização, do ensino básico fundamental, 11% das crianças apenas estão devidamente lendo e escrevendo, 89%, segundo os próprios parâmetros do MEC, não estão no nível 4, que seria o nível adequado. Nas universidades, 38% das pessoas que lá estudam são consideradas analfabetas funcionais, porque não conseguem interpretar ou escrever um texto, uma ideia.

    E eu não vejo, Sr. Presidente, a mesma eloquência, a mesma motivação que eu vi na semana passada... Repito: votamos, mas eu não vejo a mesma vontade, a mesma eloquência, a mesma determinação para resolver questões como a da área da educação. Não vejo nem por parte do Executivo, nem por parte do Legislativo, uma pauta que possa enfrentar esses problemas que, a meu ver, têm muito mais a ver com o ser humano, com homens e mulheres.

    Eu poderia passar aqui, Sr. Presidente, um bom tempo ainda dizendo, por exemplo, dos estupros na Região Norte, a região que mais tem casos de estupros no Brasil, e isso tem a ver com a economia. Aliás, todos esses dados têm a ver com a economia. Eu não desconsidero, Sr. Presidente, nenhuma dessas organizações que se fazem na sociedade civil ou no próprio Estado para tentar proteger a mulher da violência, da gravidez precoce.

    No meu Estado, na semana passada, havia uma manchete que me chamou a atenção extremamente. A manchete dizia, ao mesmo tempo, que o Acre era referência, porque o Estado, nos últimos anos, dotou-se de estrutura para combater a violência contra a mulher. Mas a manchete dizia o seguinte: o Estado é uma referência no combate à violência contra a mulher, mas ainda figura o Acre como um dos Estados mais violentos contra a mulher do Brasil.

    O que eu quero dizer com isso, Sr. Presidente, é que eu não desconheço e dou importância a todas essas movimentações da sociedade civil junto com o Estado. Mas, Sr. Presidente, o que traz solução é crescimento, é PIB, que é a soma da economia, da longevidade e da educação. Isso é fácil de resolver, de mostrar, Sr. Presidente.

    No Brasil, onde é que se estupra mais? É no Norte e no Nordeste ou é no Sul e no Sudeste? É no Norte e no Nordeste. Pegue por países, por região, onde é a que a mulher se sente mais segura? É na Europa Ocidental ou é na América Latina? Onde é que há menos homicídios? É aqui na América Latina, comparando-se com a África, ou é na África? É na África, ou seja, há uma relação.

    No caso de estupro, por exemplo, os maiores casos, estourados, acontecem na residência. E quando você tem déficit habitacional, quando você tem homem vivendo com mulher, com três, quatro, cinco pessoas ou mais numa casa, com doze pessoas, em que muitas vezes ele não é o pai de todas aquelas crianças, é onde acontece a maior parte dos estupros, em qualquer lugar do muno. Então, Sr. Presidente, eu queria aqui apenas fazer essa lembrança.

    Na semana passada, eu fiquei impressionado com a vitalidade com que esta Casa discutiu e aprovou, vindo da Câmara Federal, um tema importante. Mas o que me chamou a atenção é que eu vejo temas tão importantes que dizem diretamente da vida humana, da mulher violentada, da mulher com gravidez precoce, da pobreza do Norte e do Nordeste, que nós representamos, dos índios abandonados...

    Não pensem o Sul e o Sudeste que estão nos assistindo agora que a política indigenista brasileira solucionou problema de índio. Não solucionou coisa nenhuma! A única coisa que fizeram foi criar um zoológico humano, inclusive empurrando até eles para fora das reservas indígenas, como a gente vê nas nossas cidades. Eu não vejo a mesma determinação para resolver essas chagas que afetam diretamente o ser humano.

    Para mim – quero terminar dizendo –, que sou cristão, é clara a definição cristã de que o ser mais importante da face da terra é o ser humano e que toda a política de Estado tem que ser voltada, em primeiro lugar, para que ele, ser humano, tenha uma vida digna.

    Então, Sr. Presidente, era apenas essa observação daquilo que aconteceu na semana passada. São assuntos importantes. Mas eu lamento muito não ver a mesma empolgação, a mesma determinação que eu vi, na semana passada, para discutir esses temas que eu acabo de mencionar aqui.

    Notadamente cento e tantas mil pessoas morrem, no Brasil, por morte violenta, e eu não vejo nem o Executivo, nem o nosso Parlamento, nem a sociedade civil, por exemplo, os artistas, Sr. Presidente, saírem numa campanha para resgatar, de fato, esses índios que estão entregues ao narcotráfico, na nossa região, ou o próprio Ministério Público Federal. Nós temos hoje associações que gastam fortunas em campanhas, entre eles próprios, e eu não vejo o Ministério Público Federal trabalhar uma proposta de ocupação, de combate ao crime organizado na faixa de fronteira da Amazônia, fazendo divisa com a Colômbia, com o Peru e a Bolívia, os três maiores produtores de cocaína do Planeta.

    Eram essas apenas as observações.

    No mais, Sr. Presidente, quero dizer que chegou a esta Casa, na semana passada, a reforma da previdência. Eu disse e quero repetir que o nosso desafio é incluir Estados e Municípios e evidentemente corrigir alguma outra coisa que queiramos corrigir. Mas, fundamentalmente, é colocar Estados e Municípios ou dar a eles a oportunidade de, em querendo, poderem fazer a adesão e fundamentalmente acabar com as pensões precoces e milionárias, que, infelizmente, são uma chaga no Brasil.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/08/2019 - Página 29