Discurso durante a 126ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à Medida Provisória nº 881, de 2019, que institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, estabelece garantias de livre mercado, análise de impacto regulatório e dá outras providências.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Críticas à Medida Provisória nº 881, de 2019, que institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, estabelece garantias de livre mercado, análise de impacto regulatório e dá outras providências.
Publicação
Publicação no DSF de 06/08/2019 - Página 60
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • CRITICA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ASSUNTO, LIBERDADE, ECONOMIA, PREJUIZO, TRABALHADOR, ELIMINAÇÃO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, COMENTARIO, CRISE, LIBERALISMO.

  SENADO FEDERAL SF -

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05/08/2019


    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, minha fala de hoje será sobre a Medida Provisória n° 881 de 2019, a chamada minirreforma trabalhista.

    Depois da escandalosa "contrarreforma" das leis trabalhistas da administração federal anterior, o atual Governo volta à carga contra os direitos dos trabalhadores.

    Essa MP vem travestida com o nome fantasia de "Declaração de Direitos de Liberdade Econômica".

    Eu digo que isso é muita retórica para se cometer um crime.

    O projeto de lei de conversão da MP foi aprovado na Comissão Mista Especial e, durante a tramitação, de forma escandalosa, e aqui eu faço questão de sublinhar, vários "jabutis" inconstitucionais foram incluídos na proposta original.

    Em decisões anteriores, o Supremo Tribunal já havia banido explicitamente o chamado "contrabando legislativo" em Medidas Provisórias.

    Emendas parlamentares não podem fugir da pertinência da norma.

    Mesmo assim, interesses contrários aos do trabalhador querem usar a MP como disfarce para investidas contra o povo brasileiro. Sublinho mais uma vez; isso é inaceitável.

    A MP 881 se tornou um "saco de gatos que reúne assaltos seriados ao trabalhador.

    Salvo engano, há alterações em 36 artigos da Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT.

    Após a desfiguração feita pela contrarreforma trabalhista, voltam à carga para eliminar os poucos direitos que ainda restam.

    Faço questão também de destacar: ninguém é contra o empreendedorismo e a facilitação da geração de emprego para o micro e pequeno empresário.

    Isso deveria ser o objeto de análise desse projeto de conversão, não a eliminação de direitos e a quebra da proteção ao trabalho.

    Afinal, o que liberdade econômica tem a ver com a eliminação dos direitos dos trabalhadores?

    Não é de hoje que se tenta jogar sobre os trabalhadores a responsabilidade pela crise econômica. Isso é covardia, é cruel...

    A classe trabalhadora é o lado mais vulnerável do sistema econômico e a que mais sofre.

    Definitivamente, não é ela a responsável pela crise.

    Já me manifestei na tribuna sobre a falácia da "reforma administrativa".

    Desde que o massacre contra os trabalhadores entrou em vigor, a dor e a desilusão do desemprego só aumentaram.

    A folha de pagamento foi desonerada, e extinguiram direitos que estavam estabelecidos há décadas.

    Como era previsível, não houve benefício econômico para empregadores, muito menos para empregados.

    São 28,5 milhões de pessoas sem emprego, um a cada quatro brasileiros em idade ativa...

    Esse número é o total dos desempregados com os desempregados por desalento, mais aqueles fora da força de trabalho ou os que simplesmente não têm uma ocupação decente.

    Sr. Presidente, são inúmeras modificações que ferem os mais fundamentais direitos do trabalhador.

    Por exemplo, a palavra domingo vem do latim "dies dominica", ou dia do Senhor.

    Aqueles mais religiosos consideram o domingo um dia santo.

    O projeto de conversão não respeita a regra que vale para religiosos e laicos, pois a proposta não poupa sequer os dias de descanso do trabalhador.

    A legislação exige que o trabalho no fim de semana seja remunerado com hora-extra e com regime especial de folga.

    As modernas teorias de administração reconhecem que os períodos de pausa e repouso ampliam a produtividade...

    O que estão propondo no projeto de conversão da Medida Provisória pretende acabar com isso.

    Nem os dias santos serão mais respeitados.

    Outra mudança é institucionalizar duas classes de trabalhadores...

    Propõe-se que as regras do Direito Civil se sobreponham às do Direito do Trabalho.

    Assim, os contratos acima de 30 salários mínimos ficariam desobrigados de cumprir a legislação trabalhista...

    Bom, daqui a pouco, baixa para 25 salários, 20 salários, 15 salários, 10 salários.

    É uma forma de institucionalizar a discriminação, criando "castas" de trabalhadores. Uns sujeitos à proteção da lei trabalhista, e outros sem direito algum.

    Como se não bastasse, o projeto ainda expõe os trabalhadores a mais riscos e acidentes de trabalho.

    A proposta pretende extinguir a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), instância que vem cumprindo importante papel preventivo no mundo do trabalho há décadas.

    No Brasil, o trabalhador sofre um acidente de trabalho a cada 48 segundos. A cada 3 horas e 40 minutos, uma morte acontece durante o exercício da profissão.

    Entre 2012 e 2018, o Brasil teve 4,2 milhões acidentes de trabalho. Foram 16 mil mortes.

    Aumentam as doenças adquiridas ao exercer a profissão, e as péssimas condições de trabalho são sobejamente conhecidas. Muita gente vem a perder completamente a capacidade laboral.

    Com muito esforço, construímos uma rede de proteção para evitar que o pior aconteça e querem destruí-la.

    As jornadas de trabalho são cada vez mais draconianas.

    Esse processo de precarização só expõe ainda mais o trabalhador.

    Os mais vulneráveis são os menos protegidos pelo que resta da Lei.

    A cada três acidentes de trabalho no Brasil, dois são sofridos por empregados terceirizados.

    Isso se soma às longas jornadas, à ameaça constante da demissão e ao assédio moral dos empregadores. Muitos sofrem ofensas e até perseguição.

    Sras. e Srs. Senadores, todos os países que tentaram essas mudanças observaram o mesmo duplo resultado: a queda nos índices de emprego, acompanhada de uma jornada que só fez piorar para quem já estava empregado.

    Em meio à discussão da reforma da Previdência, essa medida provisória vem tramitando sem o necessário debate e pretende desmontar o que levou décadas de luta para ser construído.

    O Congresso precisa dar um basta nesse contínuo processo de precarização do trabalho.

    Sr. Presidente, a MP 881 foi aprovada na Comissão Mista Especial. Sendo aprovada no Plenário da Câmara dos Deputados, ela vai tramitar aqui para o Senado.

    A MP perde a validade no dia 10 de setembro.

    Farei o que for possível para preservar os direitos do trabalhador e o emprego digno para os brasileiros.

    Faço uma pequena observação.

    Os apoiados da MP 881 tratam o liberalismo econômico como saída para a crise econômica brasileira. Que na realidade, no fim das contas, é a retirada de mais direitos sociais e trabalhistas.

    Eu quero lembrar que o governo do Presidente Franklin Delano Roosevelt (1933 -1937), dos Estados Unidos, para sair da crise de 1929 (quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque) fez o chamado "New Deal” (Acordo Novo).

    Até então, o país era regido pelo liberalismo econômico, ou seja, o Estado era proibido de intervir na economia.

    Segundo a lógica liberalista, se houvesse liberdade econômica, haveria mais condições do país crescer e se desenvolver. Mas não foi o que aconteceu.

    O que Roosevelt fez? Investiu na infraestrutura do país. Construindo hospitais, escolas, rodovias, usinas, aeroportos, pontes, hidrelétricas e muitas outras obras.

    Viabilizou uma vida melhor para os cidadãos. Gerou empregos. Reduziu a carga horária de trabalho, não reduziu salários...

    Também incentivou a pequena e a grande agricultura.

    O governo criou novas leis e passou a ter controle sobre o sistema financeiro e a controlá-lo. Assim, evitava fraudes e diminuía ricos bancários.

    Foi criada a Previdência Social, o Seguro Desemprego, seguro para idosos acima de 65 anos, proibição do trabalho infantil, legalização de sindicatos, aumento de salários e um tipo de ajuda para evitar a miséria em que estavam vivendo os desempregados.

    Os resultados foram surpreendentes: o índice de desemprego teve uma grande queda, a renda mensal dos trabalhadores aumentou, a produção ficou em um ritmo desejável e as exportações e vendas para o mercado interno aumentaram.

    O Novo Acordo de Roosevelt inspirou outros Presidentes, como Barack Obama, durante a crise de 2008.

    Respeito quem não concorda com minhas opiniões. A controvérsia é do debate e da democracia.

    Para finalizar, destaco que a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), juntamente com a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) e a Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (Abrat), reafirmam suas preocupações com a MP 881, pois a medida afronta a Constituição Federal, normas internacionais do trabalho, a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho.

    Abre aspas, "as regras constitucionais estão absolutamente atreladas à dignidade da pessoa humana e qualquer alteração que vise a livre iniciativa deve se dar por causa da garantia dessa dignidade e não da garantia tão e somente da ordem econômica como vem estampado no texto, que elimina regras de segurança e saúde no trabalho", fecha aspas.

    Sr. Presidente, pela gravidade do assunto, no dia 13 de agosto, às 14 horas, a Comissão de Direitos Humanos vai realizar uma audiência pública para tratar da MP 881.

    Convidados:

    Hugo Melo Filho

    Presidente da Associação Latino-Americana de Juízes do Trabalho;

    Noêmia Aparecida Garcia Porto

    Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA);

    Ronaldo Curado Fleury

    Procurador Geral do Trabalho do Ministério Público do Trabalho (MPT);

    Ângelo Fabiano Farias da Costa

    Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT);

    Carlos Silva

    Presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (SINAIT);

    Alessandra Camarano Martins

    Presidente da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (ABRAT);

    Luís Carlos Moro

    Presidente da Delegação Brasil da Associação Luso-Brasileira de Juristas do Trabalho (JUTRA);

    Laura Benda

    Presidente da Associação Juízes para a Democracia (AJD);

    Vagner Freitas de Moraes

    Presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT);

    Adilson Araújo

    Presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB);

    Ricardo Patah

    Presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT);

    Miguel Eduardo Torres

    Presidente da Força Sindical;

    Antônio Fernandes dos Santos Neto

    Presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB);

    José Calixto Ramos

    Presidente da Nova Central Sindical dos Trabalhadores (NCST);

    Ubiraci Dantas de Oliveira

    Presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB);

    Edson Índio

    Secretário Executivo da Intersindical (Central da Classe Trabalhadora);

    Representante da CSP-Conlutas - Central Sindical e Popular.

    Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/08/2019 - Página 60