Discurso durante a 154ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro de audiência pública realizada para debater a reforma da previdência e preocupação com o risco de precarização dos direitos dos trabalhadores mais pobres do País.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Registro de audiência pública realizada para debater a reforma da previdência e preocupação com o risco de precarização dos direitos dos trabalhadores mais pobres do País.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/2019 - Página 16
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS (CDH), DEBATE, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), REFORMA, PREVIDENCIA SOCIAL, ENFASE, APOSENTADORIA ESPECIAL, CALCULO, BENEFICIO PREVIDENCIARIO, APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, PENSÃO, MORTE, DIREITOS, TRABALHADOR, POBREZA.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Senador Lasier Martins, que preside a sessão, Senador Kajuru, agradeço a ambos, porque, como alguns faltaram, V. Exas. poderiam muito bem ter pedido para falar antes de mim. Contudo, entenderam que eu tenho uma reunião com a OAB e diversos advogados com o Relator Tasso Jereissati, porque querem conversar com ele sobre algumas preocupações que eles têm em relação à reforma da previdência. E, ainda depois, às 15h30, eu tenho de estar presente a uma audiência pública na CDH, que o Senador Telmário, gentilmente, vai presidir até que eu retorne dessa reunião com o Relator.

    E o Senador Kajuru me perguntou como foi hoje pela manhã. Hoje de manhã fizemos uma audiência pública lá no Petrônio Portella, presença assinada em torno de 826, 36 pessoas, muitas de movimento social. Tivemos cinco painelistas, que fizeram exposição das preocupações com a reforma, e depois eu abri, quase que numa exceção, para que as entidades também falassem, colocassem o ponto de vista sobre a reforma.

    Há uma apreensão, uma preocupação muito grande. Como lá foi dito, são mais de 300 emendas. Eu entreguei algumas tantas para o relatório preliminar e entrego ainda hoje outras tantas para o relatório final. Mas eu poderia aqui lembrar de alguns pontos que a sociedade civil nesse evento, eu cheguei lá às 9h da manhã e só terminou agora, questão de meia hora atrás terminou, e eu me desloquei para cá...

    O que percebi? As entidades estão muito preocupadas exatamente com os mais pobres. Por exemplo, com a possibilidade de as pessoas se aposentarem com uma renda menor até que o salário mínimo. No caso da pensão, a forma como está articulada. Tanto que se bota numa outra PEC a possibilidade de isso não acontecer, mas vai ficar. Se nós não fizermos uma emenda supressiva, vai ficar a possibilidade de a viúva ou o viúvo receber algum menor que o salário mínimo.

    Muitas preocupações também, foi quase unânime, com a questão das aposentadorias especiais. Quando eu falo especial, eu sempre digo que é insalubre, penoso e periculoso. Estamos tratando dessas pessoas que estão lá no chão de fábrica, numa fundição, ou um eletricista, ou com produtos químicos, ou uma professora, ou mesmo um mineiro, porque, como for, ficou vinculado, continua vinculado, idade e tempo de contribuição.

    Eu repito isso, porque aprendi que repetir é importante até para mim mesmo. Como é que o mineiro só pode trabalhar 15 anos no subsolo e só pode se aposentar com 55 de idade? Ele começou com 21, mais 15, para 55, faltam 19. O que ele faz nesses 19 anos? Pulmão estourado e não pode trabalhar. Ele é proibido de continuar no subsolo. Num país que tem hoje em torno de 13 milhões de desempregados, quem vai contratar uma pessoa com o pulmão estourado? Não vai, ninguém vai contratar. E se ele ficar um período, como é o caso ali, de 19 anos, sem contribuir, perde até o benefício. Mesmo que chegue em 55 um dia, mas, como ele não contribuiu, perde. E a própria conversão do tempo que poderia converter de especial para normal também não é permitida.

    Vamos pegar agora, nem preciso falar dos outros, porque o caso vai ser igual, de os professores ficarem dez anos sem saberem o que fazer da vida, os professores e professoras, quem trabalha com produtos químicos, só como exemplo, e metalúrgicos também, vão ficar na base 15 anos também sem saberem o que fazer da vida, porque terminou o tempo especial, área, digamos, que prejuízos à saúde traz, só que não podem se aposentar, porque não terão a idade.

    Mas vamos pegar o caso do vigilante. O vigilante tem aposentadoria hoje, porque trabalha em área de alto risco, chamada periculosidade. Eles falaram lá hoje de manhã. Estão apavorados. Eles falaram lá hoje de manhã. Estão apavorados. No Brasil, nós temos em torno de 4 milhões de vigilantes, que dão a sua vida para defender as nossas vidas, o nosso patrimônio.

    Passamos, inclusive, um vídeo de um vigilante sendo assassinado. O número de vigilantes que morrem, que se suicidam, tudo foi mostrado lá. Como eu, simplesmente, acabo com o adicional de periculosidade? Alguém vai ganhar com isso, porque o adicional de periculosidade é 30% sobre a remuneração. Eles dizem que não, que não tem que existir o adicional de periculosidade. Haverá um redutor para os vigilantes, presente e futuro, de 30% no salário e não poderão se aposentar, embora estejam numa profissão reconhecida de alto risco. Tem que resolver questões como essa.

    E outras preocupações lá foram mostradas: a média de cálculo. Hoje, você pega as 80 maiores contribuições, faz a média e se aposenta. Dá quase o princípio da integralidade. Agora não. Você vai pegar a média de toda a sua vida, de toda a sua vida. Ali você vai ter casos de redutor de salário de até 40%, 50% ou 20%, conforme o caso, porque você começa a trabalhar, bem dizer, com um salário mínimo – não é? Acho que todos nós começamos ganhando um salário mínimo e, depois que vai crescendo, com os anos, você melhora. Se você pegar as maiores contribuições, a média é uma. Agora, se pegar usando as menores, a média vai ser outra muito mais delicada.

    Então, há uma projeção que mostra: o cidadão projetou para se aposentar em novembro, e a emenda é promulgada em outubro. Se ele ia se aposentar com R$2 mil, ele poderá se aposentar com R$1,2 mil. Olha o que R$800 significam na vida de um cidadão. Pode ser que para nós aqui dentro não signifiquem muito, mas, assim mesmo, eu diria que significam. Calculem para ele, porque é praticamente a metade do seu salário.

    Outra questão: aposentadoria por invalidez. Hoje, a lei diz o seguinte: você está numa firma, trabalhando, tal – não importa se é em 20 anos, 15 anos ou 10 anos – e fica inválido de repente. Você se aposenta com salário integral, baseado na média das 80 maiores contribuições. Como vai ser agora? Você vai se aposentar, se você tiver, por exemplo, menos de 20 anos, com 60% da média de todas as contribuições. Só aí tu perdes 40% do teu salário. Calculem para o cidadão que ficou inválido, só como exemplo, porque teve um AVC. E daí? Como ele vai ficar? Recebendo... Olha, 60% da média de 19, 15 e 20 anos, por exemplo, porque, dali para frente, é aquele cálculo que tem um percentual a mais por ano trabalhado. Mas ele ficou inválido.

    Como disse a Dra. Thais Riedel, que é especialista na área, é investimento de risco para todos, é como se fosse um seguro. Ele fez o seguro, sofreu um acidente, ficou inválido. Como faz? Não é justo, não é justo! Ela explica: alguns passam a vida toda e não têm um acidente. Ela deu o exemplo do carro. Eu tenho seguro de um carro e passo a vida toda sem nenhum acidente. A empresa ganhou. Consequentemente, se um colega meu tiver um ou dois acidentes, ele perde. Bom. A seguridade é a mesma coisa. É a previdência. Ele faz um seguro que lhe garanta tudo isso ou garanta, pelo menos, isso. E daí? Se, agora, de repente, nós mudamos as regras do jogo e dá o azar de ele ficar inválido? Vai receber só 60%.

    E se porventura a viúva perdê-lo – eu já digo a viúva –, se caso ele falecer mais ali na frente, ela vai ganhar só um percentual daqueles 60%. Isso não existe hoje na lei, isso está preocupando a todos.

    Eles querem retirar da Constituição...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... a palavra periculosidade. Não importa se ele trabalha em área de alto risco. E, se nós quisermos colocar de novo a periculosidade, vamos ter que fazer uma emenda constitucional e brigar por dez, quinze, vinte anos, aí todos já morreram até para sua atividade.

    Por exemplo, quem é da polícia militar, quem é da Polícia Federal, que é agente penitenciário... Os vigilantes ficaram totalmente de fora. O que nos pedem? Eles não querem que façam nada por eles, só que não tirem o direito que eles têm assegurado. É só suprimir – e aí não volta para a Câmara – aquele artigo que diz que o adicional de periculosidade não terá efeito para cálculo de aposentadorias especiais. Eles querem só uma supressão e que os deixem cuidar da vida deles como estão cuidando até hoje.

    Essas questões são as que nos preocupam. Vamos, claro, ter uma conversa com o Relator ainda hoje à tarde. Eu estou pensando até mesmo num voto em separado. Eu gostaria de não apresentar, confesso, um voto em separado; eu gostaria de apresentar emendas que suprimissem as principais crueldades contra o povo trabalhador e que nós caminhássemos para um acordo nem que fosse de procedimento. Mas, se for impossível, claro, nós vamos nos obrigar a apresentar um voto em separado.

    Eu tenho uma triste memória, Senador Kajuru. Por que triste memória? Na reforma trabalhista, eu apresentei um voto em separado, ganhamos até na Comissão por um voto, mas perdemos aqui no Plenário. E tudo o que eu disse lá se concretizou depois. Por isso é que há essa situação.

    É só olhar nas ruas, seja no Rio Grande, nessa ou naquela cidade, seja no Rio de Janeiro, seja em São Paulo, seja aqui em Brasília, o quanto aumentou a miséria e o quanto aumentou o chamado serviço informal. Estão aí todos os dados. Eles podem dizer o seguinte: "Aumentou 0,1%, sei lá o quê, em matéria de emprego com carteira assinada". Mas vão ver que aumentou 5%, 10% daqueles trabalhadores na informalidade. Este é o quadro que se apresenta: um quadro de miséria absoluta que vai avançar mais.

    E o povo, nossos filhos e netos vão nos cobrar no futuro. Eles vão dizer: "Pai, tio, avô, você estava lá, você tirou o sistema de seguridade social, um sistema de solidariedade, um sistema de repartição em que a sociedade toda contribuía para que os mais pobres pudessem viver melhor".

    Estou falando que 85% ficam na faixa de um salário mínimo e meio. Uns falam que é R$1.400, mas eu falo num salário mínimo e meio já. É dessa gente que a gente está falando aqui. Estamos falando aqui da última proposta do Governo, nessa mesma linha que não é a de combater a miséria, de querer que o salário mínimo não tenha mais inflação mais PIB. O PIB é desse tamaninho, mas, quando o PIB decola, dispara, quem ganha um salário mínimo tem um percentual a mais. Se o PIB foi dois, ele vai receber 2%, ainda de dois anos atrás; quando o PIB for um, ele recebe um; quando o PIB for zero, ele não recebe nada. Mas foi nessa política, que nós ajudamos a construir, que nós tiramos o salário mínimo de US$60 e elevamos até US$300.

    Hoje, com a posição do Governo de tirar o PIB do salário mínimo, se isso fosse verdade, já fosse fato real há tempos atrás, o salário mínimo hoje seria em torno de R$500, e não mil e trinta e poucos, como estão falando que poderá ir. Mas se tivesse ganhando o PIB...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Mas é uma proposta coerente...

    Aqui eu termino, Senador Lasier. Agradeço já a V. Exa., este minuto é mais que suficiente. V. Exa. já me deu dois, três, eu percebi e já agradeço.

    O que nós estamos falando é que, se a gente fala que a gente não quer mais que o Brasil seja campeão do mundo em concentração de renda... Não há nenhum país da África, da Ásia que tenha uma concentração de renda igual à nossa. E parece que a gente não quer enxergar. A gente quer que só os mais pobres tenham direito a pelo menos um salário mínimo que desse inflação mais PIB. Daria o quê? Mil e cem reais!

    Se lá na frente, oxalá, o Brasil retomar o crescimento e der um crescimento de 4%, 5%, 6%, bom, ele ganhará só o correspondente ao crescimento do Produto Interno Bruto, que para ele claro que é um pão a mais, é um saquinho de leite a mais, é um quilo de feijão a mais, é um lanchinho aqui, quando eles o quiserem fazer. O pessoal da limpeza mesmo aqui, se quiser comprar um lanchinho, R$5, R$10 para eles são importantes; para nós não são nada. É claro que não são nada! Mas, para quem não ganha mais do que um salário mínimo, é muito. Eu digo até para quem ganha dois salários mínimos.

    Tiraram até o abono. Quem ganha até dois salários mínimos, pelo menos uma vez por ano, tem um abono de um salário mínimo. Sabe o que significa no fim do ano para você fazer uma festinha de Natal ou uma comida um pouquinho mais trabalhada, ou comprar uma boneca, um carrinho, um patinete, como no meu tempo...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ...para dar para o filho? Aquele um salário mínimo ajuda, nem que seja para dar uma bola de plástico para a criança.

    Vão desaparecer 13 milhões de pessoas, elas deixarão de receber esse um salário mínimo que a sociedade, no conjunto, porque paga os tributos e impostos em si, é que está colaborando. E pergunto para alguns de nós: faz falta essa contribuição para que aqueles que ganham até dois salários mínimos possam receber uma vez por ano um salário mínimo como abono de emergência? É claro que não faz.

    Eu termino, Senador Lasier, dizendo que esta Casa pode mudar o curso dessa história ajudando principalmente os mais miseráveis.

    Senador Lasier, muito obrigado. V. Exa. me deu cinco minutos, e eu prometi que ia falar só os dez.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/2019 - Página 16