Pela ordem durante a 76ª Sessão Deliberativa Remota, no Senado Federal

Justificativa da apresentação de voto de repúdio à Juíza Inês Marchalek Zarpelon, da 1ª Vara Criminal de Curitiba, por ter escrito em sentença a expressão "seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça". Crítica ao ato de racismo praticado pela magistrada e defesa da apuração do caso.

Autor
Fabiano Contarato (REDE - Rede Sustentabilidade/ES)
Nome completo: Fabiano Contarato
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela ordem
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Justificativa da apresentação de voto de repúdio à Juíza Inês Marchalek Zarpelon, da 1ª Vara Criminal de Curitiba, por ter escrito em sentença a expressão "seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça". Crítica ao ato de racismo praticado pela magistrada e defesa da apuração do caso.
Publicação
Publicação no DSF de 14/08/2020 - Página 14
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, APRESENTAÇÃO, VOTO, REPUDIO, JUIZ DE DIREITO, VARA CRIMINAL, CURITIBA (PR), MOTIVO, SENTENÇA CONDENATORIA, TERMO, RACISMO, CONDENADO, CRITICA, MAGISTRADO, DEFESA, APURAÇÃO.

    O SR. FABIANO CONTARATO (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES. Pela ordem.) – Sr. Presidente, é muito bom revê-lo e também quero externar minha solidariedade aos 104 mil brasileiros que já faleceram, o que faço também em memória a Carlos Alberto Pereira da Silva, cinegrafista do Senado.

    Sr. Presidente, eu gostaria de comunicar a V. Exa., às Senadoras e aos Senadores que se encontra sobre a mesa o meu requerimento para inserção em ata de voto de repúdio à Juíza Inês Marchalek Zarpelon, da 1ª Vara Criminal de Curitiba, por, em tese, praticar um ato de racismo enquanto proferia uma sentença no dia 19 de junho.

    Passo agora à leitura das razões que me fizeram apresentar este voto de repúdio. Passo direto para a justificação, Sr. Presidente.

    A Juíza Inês Marchalek Zarpelon, da 1ª Vara Criminal de Curitiba, em sentença proferida no dia 19 de junho de 2020, no Processo nº 0017441-07.2018.8.16.0013, escreveu que o réu era – aspas – "seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça". A referência à raça de Natan Vieira da Paz foi feita três vezes na dosimetria da pena, ou seja, por ocasião da dosimetria da pena, com base no art. 59 do Código Penal, ela cita que a prática criminosa ocorreu em razão da raça do sentenciado.

    A República Federativa do Brasil tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana, valor constitucional supremo. A dignidade não é direito, mas qualidade intrínseca de todo indivíduo, independentemente de sua raça ou qualquer outro elemento. Nesse sentido, o Estado brasileiro tem o dever de respeito, de proteção e de promoção dos meios necessários à garantia da vida digna de todos os indivíduos.

    Infelizmente, mesmo decorridos mais de 132 anos da Lei Áurea, que aboliu a escravidão em 13 de maio de 1888, o Brasil ainda sente fortemente os impactos do período escravocrata e é o Estado brasileiro o principal culpado dessa mazela.

    Somente nos últimos dias, diversos atos de racismo praticados por agentes públicos têm sido denunciados pela mídia. No dia 13 de julho, um policial militar de São Paulo pisou no pescoço de uma mulher negra de 51 anos de idade para imobilizá-la. Em 18 de julho, um desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, branco, desacatou um guarda municipal de Santos, negro, chamando-o de analfabeto. No dia 6 de agosto, um jovem negro foi acusado de ladrão e agredido por policiais militares em shopping no Rio de Janeiro enquanto tentava trocar relógio que havia comprado para seu pai.

    Esses casos, Sr. Presidente, além de muitos outros que não são registrados, escancaram o mito da democracia racial brasileira. Ontem, no dia 12 de agosto, outro lastimável fato foi denunciado pelos jornais, motivo pelo qual escrevemos esta nota de repúdio.

    É estarrecedor que uma magistrada – ocupante, portanto, de cargo de papel proeminente na República Democrática brasileira – se valha do racismo para justificar a dosimetria da pena em sua sentença condenatória.

    Segundo Inês Marchalek Zarpelon, o réu era seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça.

    Nessa lamentável sentença, a juíza descumpre o principal objetivo da magistratura, qual seja, o de garantir a justiça mediante aplicação da lei. Ocorre que não há justiça quando o aplicador do direito ignora a dignidade humana.

    A parcialidade da juíza é patente ao entender que uma pessoa é criminosa em razão de sua raça, sendo indiscutível o descumprimento dos artigos 8º e 9º do Código de Ética da Magistratura Nacional:

Art. 8º O magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes, e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito.

Art. 9º Ao magistrado, no desempenho de sua atividade, cumpre dispensar às partes igualdade de tratamento, vedada qualquer espécie de injustificada discriminação. (...)

    Esperamos que a Corregedoria-Geral da Justiça do Paraná e o Conselho Nacional de Justiça analisem o caso com seriedade. É o que propomos com o presente voto de repúdio.

    E quem subscreve juntamente comigo, Sr. Presidente, é o brilhante Senador Paulo Paim, que eu muito admiro e em quem me espelho.

    Peço o apoiamento dos nobres colegas Sras. e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/08/2020 - Página 14