Discurso durante a 20ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da necessidade de o Brasil restabelecer as relações diplomáticas com a Venezuela em benefício de ambos os países. Destaque para o fluxos migratórios de venezuelanos e a redução do comércio bilateral. Citação de estudo do Ipea acerca dos prejuízos econômicos e diplomáticos.

Autor
Chico Rodrigues (DEM - Democratas/RR)
Nome completo: Francisco de Assis Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Relações Internacionais:
  • Defesa da necessidade de o Brasil restabelecer as relações diplomáticas com a Venezuela em benefício de ambos os países. Destaque para o fluxos migratórios de venezuelanos e a redução do comércio bilateral. Citação de estudo do Ipea acerca dos prejuízos econômicos e diplomáticos.
Aparteantes
Eduardo Girão.
Publicação
Publicação no DSF de 17/03/2022 - Página 56
Assunto
Soberania, Defesa Nacional e Ordem Pública > Relações Internacionais
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, BRASIL, RESTABELECIMENTO, RELAÇÕES DIPLOMATICAS, VENEZUELA, ENFASE, FLUXO, MIGRAÇÃO, IMIGRANTE, ESTADO DE RORAIMA (RR), COMERCIO EXTERIOR, EXPORTAÇÃO, ALIMENTOS, CITAÇÃO, ESTUDO, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), COMPENSAÇÃO, DIVIDA, FORNECIMENTO, ENERGIA ELETRICA, PREOCUPAÇÃO, FALTA, FERTILIZANTE, AGRONEGOCIO, AGRICULTURA, CORRELAÇÃO, GUERRA, UCRANIA, RUSSIA.

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR. Para discursar.) – Sr. Presidente, Izalci, Sras. e Srs. Senadores, eu trago ao Plenário do Senado Federal assunto da maior importância para Roraima, para o Norte e para o Brasil: é a necessidade de restabelecermos relações diplomáticas com a Venezuela.

    No início de 2020, no auge das tensões políticas com o Governo da Venezuela, lado a lado às sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos, o Brasil rompeu as relações diplomáticas e retirou o seu corpo diplomático de Caracas. Para Roraima e Amazonas, Estados brasileiros que fazem fronteira com a Venezuela, esta ruptura representou uma grande perda, pois nós dormimos com a Venezuela lado a lado, em uma linha de fronteira imaginária de mais de mil quilômetros. Convivemos com eles todos os dias. Há grande fluxo de brasileiros, em especial roraimenses, naquele país, assim como são inúmeros venezuelanos que passam por Roraima.

    De fato, Roraima foi palco, nos últimos anos, de um dos maiores fluxos migratórios da América Latina. Esse é um grande problema que nós vivemos hoje no nosso estado. Por Roraima passaram mais de 700 mil venezuelanos nos últimos três anos, nobre Senador Eduardo Girão, e hoje devem conviver em nosso estado entre 50 e 60 mil venezuelanos.

    Nosso comércio externo com a Venezuela é fonte importante de renda e emprego para o nosso povo. Estudo do Ipea mostra que há uma correlação direta entre as relações diplomáticas entre os dois países e o fluxo do comércio bilateral, que chegou a quase US$6 bilhões no auge das relações bilaterais, sempre superavitárias para o Brasil, caindo para menos de um bilhão nos últimos anos, boa parte composta de bens exportados pelo Amazonas e por Roraima.

    Para que o Senado tenha uma noção mais palpável, mesmo durante o período da pandemia e das relações bilaterais estremecidas, cerca de 3 mil caminhões carregados de produtos, em especial alimentos, saíam do Brasil para a Venezuela, por Pacaraima, na nossa fronteira de Roraima com Venezuela. São cerca de 120 mil toneladas exportadas por terra nesses meses. Empregos e rendas indispensáveis ao nosso país.

    Imaginem o que nosso país pode voltar a exportar para a Venezuela com a retomada de sua economia e com a reabertura das relações diplomáticas?

    Esse mesmo estudo do Ipea mostra que o rompimento total das relações diplomáticas entre Brasil e Venezuela foi prejudicial econômica e diplomaticamente para todo o Brasil, não só para Amazonas e Roraima, inclusive pela suspensão do pagamento da dívida externa daquele país com o Brasil.

    A dívida da Venezuela com o Brasil, segundo o Ipea, poderia ser compensada em apenas quatro anos, com o fornecimento de energia elétrica de Guri, hoje suspenso, gerando economia de 70% do diesel consumido pelas termoelétricas usadas para o fornecimento de energia elétrica para Roraima. São quase R$2 bilhões que o Governo Federal, a Eletrobras, despende, por ano, com a geração de energia térmica, porque o Estado de Roraima não está ainda interligado ao sistema nacional.

    Se as tensões de 2020 poderiam ter justificado aquele rompimento, embora, como Senador da República por Roraima, discorde disso, hoje aquela realidade não existe mais, e é a hora e o momento adequados de revermos esse rompimento, de o Governo Federal rever esse rompimento.

    Há três semanas, convivemos com a dor e o pesar das crueldades da guerra entre a Rússia e a Ucrânia.

(Soa a campainha.)

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR) – A Guerra nos mostra a fragilidade da vida humana e a necessidade de superarmos nossas diferenças de forma pacífica, com respeito e, principalmente, com diálogo. As dificuldades criadas com a guerra nos levam a relativizar uma série de desencontros que, no passado, pareciam ser intransponíveis.

    É o que estamos vendo estes dias: os Estados Unidos, os primeiros a criarem restrições à Venezuela, se aproximam hoje, buscando negociar a retirada das sanções impostas anteriormente, para acessar o petróleo daquele país. Isso é diplomacia, mesmo que seja por interesses econômicos e tardiamente. Mas isso é diplomacia!

    Não podemos ser diferentes no Brasil. Temos, na Venezuela, não só um mercado consumidor de produtos brasileiros, gerando emprego e renda para nossa gente, aqui em nosso país, mas também possibilidade de acessar, no curto e médio prazo, bens extremamente estratégicos para nossa economia, como a energia de Guri, para abastecer o nosso estado, e os fertilizantes fundamentais para a agropecuária brasileira.

    Neste momento de impasse na oferta de fertilizantes da Rússia, o Brasil, um dos maiores produtores e fornecedores de alimentos para o mundo, pode ter dificuldade de continuar a ser o celeiro da humanidade por ser excessivamente dependente de fertilizantes importados. Por mais esforços que façamos agora, não conseguiremos substituir o fertilizante importado pela produção nacional a curto prazo.

    A Venezuela pode se tornar um parceiro importante...

(Soa a campainha.)

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR) – ... do Brasil na superação desse desafio.

    Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, estive hoje no Itamaraty levando ao Chanceler Carlos França essa preocupação e o desejo de ver o Brasil retomar essas relações diplomáticas com a Venezuela. Está na hora de darmos esse passo como nação. É imperioso deixarmos as nossas divergências de lado e agirmos de forma racional e diplomática para superarmos discordâncias entre os dois países com respeito às nossas diferenças.

    Eu faço um apelo ao Presidente da República Jair Bolsonaro, com sua capacidade de entender a especificidade do momento em que vivemos, de tomar a dianteira desta missão de reatarmos as relações diplomáticas com o nosso vizinho da América Latina e garantir ao Brasil e ao nosso povo os ganhos decorrentes dessa decisão de Estado.

    Sr. Presidente, eu gostaria de deixar aqui esta manifestação. Entendo que a Venezuela é um parceiro estratégico do Brasil, somos economias complementares, somos economias que, no sentido recíproco, só têm a ganhar: a Venezuela pela sua elevada produção de petróleo, de fertilizantes, de insumos, que são importantes para a nossa agricultura; e o Brasil, obviamente, pela produção gigantesca de alimento, pois hoje, na situação em que se encontra a Venezuela, claro que ela depende de uma forma muito decisiva...

(Soa a campainha.)

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR) – ... das nossas exportações. Então, gostaria de pedir, vou repetir, ao Senhor Presidente da República Jair Bolsonaro que essas fronteiras fossem deliberadamente abertas para que a diplomacia prevaleça e os interesses nacionais estejam acima de tudo.

    É um novo momento este clima que vivemos na humanidade, estamos vendo um conflito que, na verdade, assusta e amedronta a toda a nossa população, a população mundial, este conflito no leste europeu. E entendemos que, sendo o Brasil este país abençoado por Deus, ele não pode continuar vivendo com diferenças com os nossos vizinhos.

    O Sr. Eduardo Girão (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) – Eu queria pedir um aparte, se o Senador me permitir.

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR) – Concedo um aparte ao nobre Senador Eduardo Girão.

    O Sr. Eduardo Girão (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE. Para apartear.) – Muito obrigado, Senador Chico Rodrigues.

    Eu quero cumprimentá-lo pela oportunidade de trazer este tema aqui com muita coragem, ousadia no bem. Eu acho muito importante. O Parlamento é para isto: a gente tem que buscar alternativas em situações que a gente considere injustas.

    Eu tive a oportunidade de conhecer alguns venezuelanos e venezuelanas, que, de uma certa forma, tiveram que sair daquele país pelo sistema de governo que foi implantado, pela forma de atuar. No Ceará, há muitos venezuelanos. No Brasil, eles fizeram a interiorização, mas, no seu estado, em Roraima, a gente sabe que são entre 50 mil e 80 mil, mais ou menos, não é isso?

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR) – De 50 mil a 60 mil.

    O Sr. Eduardo Girão (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) – De 50 mil a 60 mil. Então, eles são muitíssimo bem-vindos.

    Eu acho que a gente tem que estar com uma questão humanitária. O Governo brasileiro, na Operação Acolhida, iniciou um trabalho... A gente até já conversou aqui algumas vezes sobre esse assunto, e eu acho que não deve faltar esforços do Governo Federal nesse sentido humanitário, para acolher. O brasileiro é, por natureza, extremamente fraterno, humano. Este país nosso é fantástico: acolhe afegãos, acolhe pessoas que vêm de outros países que estão em guerra. Nós somos a maior nação católica do mundo, a maior nação espírita do mundo, uma das maiores nações evangélicas do mundo, todos nós convivemos bem, e o Brasil tem que demonstrar isso com testemunho.

    O senhor traz um fato interessante, que eu apoio que seja discutido. Eu só fico receoso... Eu acho que a diplomacia, o caminho da paz é sempre o caminho – sempre! O senhor está coberto de razão. Agora, há uma linha muito tênue...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Eduardo Girão (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) – ... nessa questão econômica e tudo, que é importante, porque o povo lá e o povo daqui não têm nada a ver com essa situação, muitas vezes ideológica também. Agora, a gente só não pode colocar as nossas digitais, como outros governos fizeram no passado, para legitimar uma ditadura sanguinária, covarde, que acontece naquele país. E o Brasil, de uma certa forma, acabou legitimando, em governos anteriores, mandando dinheiro, fazendo um alinhamento forte, no meu ponto de vista. Respeito quem pensa diferente, mas, por um alinhamento meramente ideológico, investiu muito dinheiro, parece-me que recebeu muito pouco. E a gente não pode... Há uma linha muito tênue para que a gente não compactue com esse tipo de ditadura que existe nesse país, mas o senhor traz um assunto que nós temos que debater, com serenidade. Há questões econômicas. Diplomacia é isso. O povo não tem nada a ver, o povo tem que ser acolhido, no que eu acho que o Brasil está fazendo um bom trabalho e pode até ampliar. Eu subscrevo suas palavras de que a gente precisa, de uma certa forma, avançar, dialogar. Os tempos são outros. Você vê os Estados Unidos já buscando esse diálogo, mas é uma linha muito tênue – e é esta só a ponderação que eu faço – com relação a você legitimar uma ditadura, em que há muita gente sofrendo, muita gente saindo, porque está sendo perseguida.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Eduardo Girão (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) – Professores, jornalistas... E a gente tem que saber pesar, com muito equilíbrio, isso, mas eu tenho certeza de que, com a diplomacia brasileira, o Senado, o nosso Embaixador, o nosso Ministro, de uma certa forma, a gente pode, de alguma forma, tentar encontrar uma solução nesse caminho se for possível.

    Muito obrigado, Senador Chico Rodrigues.

    Parabéns pela sua iniciativa e pela coragem de se posicionar num assunto importante.

    Muito obrigado.

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR) – Eu agradeço o aparte de V. Exa., que sempre enriquece o nosso pronunciamento, com absoluto equilíbrio, com o cuidado que já é próprio de V. Exa., em relação a este tema que nós também interpretamos e analisamos para que não possamos admitir regimes totalitários, mas eu entendo que política é a convivência dos contrários.

    A Venezuela tem o seu regime, que é reprovado por grande parte dos países democráticos. Nós entendemos que temos que ter uma convivência em que possamos até, como o país mais desenvolvido da América Latina, o país que tem... Naturalmente, o Brasil tem uma coisa que eu chamo de liderança consentida, porque não é um país, é um continente e tem todas as características, através da sua negociação pela diplomacia... Nós temos, inclusive, o nosso Chanceler que tem sido admirável na condução do nosso Ministério das Relações Exteriores. É claro que o nosso Chanceler Carlos França tem total capacidade para que, nessa reaproximação, com abertura, inclusive, da embaixada e dos nossos consulados... Porque lá, nobre Senador Eduardo Girão, há quase 30 mil brasileiros, e eles não têm um território de proteção, o que é uma embaixada em um...

(Soa a campainha.)

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR) – ... país, para que possam realmente ter os seus interesses preservados, como nossos compatriotas.

    Acho que este é um momento importante. Disse isso hoje para o Chanceler. Estou aqui pedindo ao Senhor Presidente da República que reveja, na verdade, essa reabertura da nossa Embaixada em Caracas e, repito, dos nossos consulados, porque tenho certeza de que a Venezuela, política e estrategicamente, é muito importante para nós: a Venezuela por ser a quarta maior reserva de petróleo do mundo, o Brasil por ter as suas riquezas imensuráveis. Tudo isso na verdade contribui de uma forma decisiva para que nós assim enxerguemos este momento que vive o Brasil.

    Eu até digo às vezes, nobre Senador Eduardo Girão, que a China, em termos de exportações, representa para o Brasil o que a Venezuela representa para Roraima. De cada US$4 exportados pelo nosso estado, US$3 são para a Venezuela. Então, é o desenvolvimento, é a melhora na economia, é a geração de emprego, é a geração de renda, é a arrecadação de impostos.

    Tudo isso dentro desse arcabouço contribui decisivamente para que essa proposição seja apresentada de uma forma muito vigorosa, esperando que o nosso Presidente realmente tenha a sensibilidade para entender este brado, este grito de alerta, mas, acima de tudo, este pedido para que possamos novamente voltar a convivência com a Venezuela, que são nossos parceiros, nossos irmãos.

    Muito obrigado. Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/03/2022 - Página 56