Discurso durante a Sessão de Premiações e Condecorações, no Senado Federal

Considerações sobre a histórica situação da mulher no Brasil e no mundo, sua luta por isonomia salarial e igualdade de direitos.

Autor
Leila Barros (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Leila Gomes de Barros Rêgo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Homenagem, Mulheres:
  • Considerações sobre a histórica situação da mulher no Brasil e no mundo, sua luta por isonomia salarial e igualdade de direitos.
Publicação
Publicação no DSF de 09/03/2023 - Página 23
Assuntos
Honorífico > Homenagem
Política Social > Proteção Social > Mulheres
Indexação
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO SOCIAL, MULHER, ISONOMIA SALARIAL, IGUALDADE, GENERO, FEMINISMO, COMBATE, VIOLENCIA DOMESTICA.

    A SRA. LEILA BARROS (PDT/PDT - DF. Para discursar.) – Bom dia. Bom dia a todos e todas.

    Eu vou falando aqui enquanto o Plenário se ajusta.

    Dia especial, dia em que todos estão, enfim, comemorando, Sra. Presidente desta sessão, Senadora Eliziane Gama, um momento muito especial, que é o Diploma Bertha Lutz. Mais uma vez, a nova legislatura faz essa premiação, homenageando mulheres muito especiais. Então, é importante que a gente venha aqui para celebrar esse dia em que entendemos que, além de ser um dia muito especial, porque refletimos...

    A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) – Senadora Leila, Senadora Leila...

    A SRA. LEILA BARROS (Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) – Pois não.

    A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA. Fazendo soar a campainha.) – ... com a sua permissão...

    A SRA. LEILA BARROS (Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) – Os homens que estão tumultuando, Senadora.

    A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) – Os homens. A Leila lembra muito bem: eu queria pedir aos homens que estão tumultuando... Nós temos orador na tribuna, então eu pediria aqui o silêncio para que nós possamos ouvir a Procuradora da Mulher do Senado Federal, Senadora Leila Barros.

    Eu gostaria de cumprimentar aqui também a Deputada Federal Roseana Sarney, que também foi nossa colega, nossa Senadora aqui no Senado Federal.

    Senadora Leila Barros.

    Com a palavra a Senadora Leila Barros.

    A SRA. LEILA BARROS (Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) – Sra. Presidente, o evento já está finalizado praticamente, mas eu acho importante, mesmo o diploma tendo sido entregue, que a gente venha à tribuna, principalmente as mulheres, para falar um pouco da importância do diploma e deste dia, o Dia Internacional das Mulheres, 60 dias dos atos antidemocráticos aqui no Distrito Federal contra os Poderes da República e também um dia de muita reflexão. Apesar de ser um dia em que a gente comemora, porque entendemos, para mim, particularmente, não só como Parlamentar, mas, acima de tudo, como mulher, como mãe, como esposa, como cidadã... É um dia que, além de celebrar a vida das mulheres, é um dia também de grande reflexão.

    E nós entendemos – acho que a sua fala foi muito pertinente...

    A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA. Fazendo soar a campainha.) – Eu gostaria de pedir encarecidamente... Nós hoje estamos comemorando, gente, a semana da mulher. Nós temos um grande problema hoje a enfrentar: as mulheres são interrompidas sempre. Nós, às vezes, temos que falar fisicamente um pouco mais alto para a gente poder ser ouvida. E a gente não pode permitir que isso ocorra hoje, 8 de março. Nós temos uma mulher na tribuna do Senado Federal.

    Eu queria pedir aos homens e as mulheres que fizessem silêncio para ouvirmos a Senadora Leila Barros e que se sentassem. Desculpem-me, mas é um desrespeito, inclusive, a nós mulheres brasileiras. Eu pediria mais uma vez o silêncio, educadamente, aqui.

    Senadora Leila Barros.

    A SRA. LEILA BARROS (Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) – Obrigada, Senadora Eliziane.

    Mais uma vez reiterando as palavras que a senhora falou: dia 8 é um dia em que a gente celebra as mulheres, a gente celebra a vida das mulheres, mas a gente tem muito pouco o que celebrar neste momento. É um dia de grande reflexão – reflexão sobre os nossos direitos, o nosso direito de fala, como aqui todos assistiram. Mas é natural, e eu quero dizer que eu compreendo, porque hoje é um dia de celebração e todos estão comemorando e se abraçando. Muita gente saindo para outros eventos.

    Eu fiquei refletindo se iria falar ou não, porque foi tudo muito rápido – e eu entendo, porque temos eleições nas Comissões, temos celebrações em outros eventos –, mas eu acho importante vir a esta tribuna porque é um momento especial, é o momento da diplomação dessa celebração do Bertha Lutz, que eu acho muito importante.

    Então, eu cumprimento as senhoras, todas as Senadoras presentes – ou as que estiveram presentes e as que aqui ainda estão –, brasileiras e brasileiros que acompanham esta sessão tão especial.

    Quero também agradecer a presença dos Senadores, como o Senador Fabiano Contarato e o Senador Kajuru. Outros estiveram aqui prestigiando e acompanhando. E a eles eu também quero agradecer em nome da Bancada Feminina do Congresso Nacional.

    Eu acho que é importante neste momento não só lembrar a diplomação do Bertha Lutz e não só lembrar o dia 8, mas é como você falou: é um momento em que a Casa tem que voltar para fazer uma reflexão sobre o quanto nós tivemos de retrocessos nos direitos das mulheres, principalmente na questão da violência, da violência doméstica, dos atos covardes contra a vida das mulheres. Geralmente, esses covardes estão ao lado delas, são pais de filhos delas e têm a capacidade de matar, muitas vezes, a mulher na frente do próprio filho. Então, a gente vive um momento em que a vida da mulher está muito banalizada – a segurança da mulher, o direito da mulher...

    A gente faz um evento deste, claro, sempre celebrando aquelas que, com muita dificuldade, conseguem galgar postos de poder. Eu sou uma delas e sei o quanto sofro de violência política diariamente, o quanto desrespeito eu sofro... (Pausa.) (Palmas.)

    Não sou somente eu, que trabalho neste Senado; é quem está na rua, é quem está dentro de um ônibus, é quem enfrenta diariamente a violência, é quem está vulnerável; são as mulheres negras, as mulheres gays... Enfim, tantas mulheres têm seus direitos negados!

    Depois de uma pandemia, a gente viu o quanto somos vítimas, o quanto abandonaram as mulheres. A verdade é essa. O Estado abandonou, as autoridades abandonaram. E a gente tem que reagir, meu povo! Nós precisamos reagir, reagir no sentido de que, mais do que direitos, é o respeito à nossa dignidade, é o respeito à gente. Somos nós que, diariamente, nos superamos para sobreviver. Alimentamos os nossos filhos, os criamos, seguimos em frente diante de todas as dificuldades.

    Eu, mais do que nunca, mais do que nunca, diante deste cenário, me sinto com mais vontade, Senadoras Eliziane e Zenaide e mulheres e homens que estão presentes, e com mais motivação de lutar por essa pauta, porque nós não podemos mais aceitar o quanto a mulher está sendo desrespeitada na sociedade brasileira em todos os sentidos – em todos os sentidos!

    Nesta sessão tão especial, eu cumprimento também todos que estão nas redes sociais e peço desculpas pela minha emoção. A minha emoção reflete muito a voz das mulheres não só nesta Casa, mas fora desta Casa, porque isto aqui nos protege de tudo! Agora, aquelas que estão fora desta Casa, absolutamente entregues à sorte, essas, sim, é que me doem! Isso me dói, me indigna e me faz ter forças para continuar os próximos quatro anos aqui, junto com a bancada. Independentemente do campo ideológico de cada uma de nós, tem que prevalecer nesta Casa a sororidade. Tem que prevalecer nesta Casa a mulher como prioridade, independentemente dos campos de atuação ideológicos. (Palmas.)

    Eu queria agradecer. Infelizmente, eu não tive a oportunidade de saudar todas que foram agraciadas com o Bertha Lutz, mas gostaria de citar o nome delas: a cientista política Ilona Szabó de Carvalho; a nossa Diretora-Geral Ilana Trombka; a jornalista Nilza Valeria Zacarias; a Ministra Rosa Weber, que entendemos que também tem uma extensa agenda. Enfim, a todas as mulheres, a todas as mulheres, a essas agraciadas, eu estendo a vocês mulheres que estão no dia a dia, nas suas lutas, a vocês, a todas vocês a minha homenagem em nome dessa bancada.

    Essa justa homenagem que cada uma delas recebeu é o prosseguimento da luta, da dedicação, do esforço e do trabalho de várias gerações de mulheres em busca do fim das desigualdades de gênero.

    Deixo também – desculpa; só um minuto – meus agradecimentos, minha admiração e meu respeito à líder indígena Clara Filipa Camarão e à jornalista Glória Maria, que eu tive o prazer de conhecer, porque já trabalhei como comentarista esportiva na emissora em que ela esteve há anos, uma mulher incrível, de uma generosidade, de uma delicadeza, de um profissionalismo, uma mulher negra que fez história e foi uma grande inspiração, como nós vimos aqui. Então, a ela o meu carinho, a minha gratidão, porque sempre foi generosa comigo, e a todas que vieram depois.

    Mas, ao mesmo tempo em que nos reunimos aqui para contemplar essas grandes mulheres com o Diploma Bertha Lutz, celebramos hoje a passagem de mais um Dia Internacional da Mulher.

    Como sabemos, a data de 8 de março foi escolhida pela Organização das Nações Unidas, em 1975, para comemorar as conquistas sociais, políticas e econômicas das mulheres.

    Também é uma oportunidade de lembrarmos sobre a necessidade de se fazer justiça implantando a igualdade de gênero e dando um fim na discriminação e na violência contra as mulheres.

    O tema da ONU escolhido para reflexão neste ano é: "Por um mundo digital inclusivo: inovação e tecnologia para a igualdade de gênero".

    Enquanto as principais democracias do mundo podem seguir essa pauta, lamentavelmente, aqui no Brasil, nós somos obrigadas a gastar nosso tempo e nossa energia – o que eu estou vivendo aqui agora é um desgaste de energia que já vivo há quatro anos, e a gente sabe disso; desculpa... (Palmas.)

    ... exigindo que se cumpra o nosso direito mais básico: o de viver – o de viver! Nós exigimos ter garantido o nosso direito à vida, e isso nos está sendo negado pelo Estado. Estão nos matando como se fosse banal tirar a vida de alguém. Chega! Basta! Essa violência tem que acabar imediatamente.

    Um trabalho elaborado pela Rede de Observatórios da Segurança, intitulado "Elas Vivem: dados que não se calam", apurou que, em 2022 – pasmem! –, 495 mulheres foram vítimas de feminicídio em nosso país – só em 2022, 495 mulheres!

    Em pleno século XXI, continuam nos matando, e os principais motivos são brigas e términos de relacionamento. Na maioria das vezes, os assassinos são companheiros ou ex-companheiros das vítimas.

    Aqui em Brasília, no ano passado – todo mundo está acompanhando –, 18 mulheres foram vítimas dessa brutalidade, dessa covardia e ignorância. O mais trágico é que, em menos de três meses transcorridos, agora em 2023 já 8 mulheres, Senadora Zenaide, perderam a vida, quase a metade do total registrado do ano passado.

    Sra. Presidente, caros colegas e todos que nos assistem, eu sei que não é uma missão fácil combater a violência contra as mulheres. E não é fácil para mim me expor aqui com vocês, me emocionar, porque quando você chora você é uma desequilibrada, porque quando você grita você é uma louca. Mas eu não vou negar minha essência! (Palmas.)

    Não vou negar, querendo ser forte, porque eu sei o quão forte toda a minha vida eu fui para chegar aqui aonde eu cheguei. Eu fui uma atleta olímpica, eu representei o meu país, e hoje pago por aqui com uma prótese no quadril, e estou aqui todos os dias com vocês nos quatro anos em que eu vivi no Senado. Então, eu sei o preço que eu pago todos os dias para sair da minha casa...

(Soa a campainha.)

    A SRA. LEILA BARROS (PDT/PDT - DF) – ... para deixar meu marido e meu filho, para estar aqui lutando com vocês.

    Então choro, grito, esbravejo e não me importa quem acha que eu sou desequilibrada ou sensível demais para estar aqui representando o Distrito Federal e as mulheres!

    Aumentar o rigor das leis, investir em programas de prevenção, ampliar e melhorar a rede de proteção à mulher e os canais de atendimento são iniciativas eficazes, mas insuficientes. Temos que aliar essas medidas à realização de campanhas educativas de valorização do sexo feminino e contra a violência de gênero. É indispensável também empoderarmos as mulheres.

    Eu não posso deixar de abrir mão destes dados – e o Brasil, pasmem, é uma lástima neste aspecto! –: segundo o Relatório Global de Desigualdade de Gênero, organizado pelo Fórum Econômico Mundial, o Brasil ficou em 94º entre os 146 países pesquisados. E a performance só piorou desde 2020 até o ano passado. É bom que se diga que o ranking avalia – vejam bem – a situação das mulheres em cada país, por meio de indicadores como saúde, sobrevivência, grau de instrução, participação econômica e oportunidades, além de empoderamento político. Quando a comparação envolve os direitos semelhantes que homens e mulheres têm para acessar saúde, o Brasil até que se sai bem. Com relação à participação econômica, conseguimos nos manter um pouco ali na média. Porém, quando comparam o empoderamento da mulher na política, no meio político, as brasileiras em relação às mulheres dos demais países, nos classificam – pasmem! – em último lugar. Nós estamos em último lugar no ranking de empoderamento político, as brasileiras. É isso mesmo. Nosso país é onde menos mulheres participam das estruturas de tomadas de decisão. É no Brasil, este país aqui, o nosso país, que as mulheres menos têm direito a voz na formulação de políticas que afetam a sociedade como um todo.

    Essa situação trágica e vergonhosa não pode continuar. Passou da hora de aprovarmos medidas concretas como as cotas, tanto nas cadeiras dos Legislativos, pelas quais nós estamos lutando aqui, quanto nos conselhos e cargos de instituições públicas. Admitir que a mulher ocupe os espaços que lhe são devidos, valorizar a figura feminina, proporcionando-lhes a voz e poder de decisão, isso será um importante passo para que muitas de nós deixemos de pagar com a própria vida o preço dessa desigualdade.

    Sra. Presidente, caros colegas, todos que nos assistem, é uma honra para mim participar mais uma vez da entrega do Diploma Bertha Lutz, nossa quarta edição, e estar ao lado de tantas mulheres de trajetória brilhante na defesa dos nossos direitos. A partir de hoje elas passam a ter seus nomes associados ao de Bertha Lutz.

    Desde 1918 há registros da batalha de Bertha em favor dos direitos das mulheres. Gerações se sucederam e, apesar das conquistas obtidas, como a possibilidade de votarmos e sermos votadas, ainda muito temos que alcançar para que a justiça se estabeleça no nosso país.

    Como herdeiras e beneficiárias dessa luta – e eu sou uma delas; todas nós que estamos aqui neste Plenário –, devemos prosseguir na busca dessa igualdade plena, amigas.

    Parabéns a cada uma de vocês pela homenagem. Eu não tive a oportunidade... A todas elas eu parabenizo. Parabenizo também, neste dia muito especial, todas as mulheres, inclusive as mulheres do meu ciclo, servidoras do Senado. (Palmas.)

    Parabenizo as mulheres pela sua luta. Às mães que perderam suas filhas para essa covardia – a todas elas – o meu abraço. Que Deus abençoe os filhos dessas mulheres que hoje estão órfãos e, acima de tudo, parabéns para cada uma de vocês por este momento muito especial.

    Saibam que vocês podem contar comigo nessa luta, que não deveria só ser uma causa feminina. Essa causa não é só feminina, ela não é do Senado, ela é uma causa de toda a sociedade. Então vale a reflexão para o dia 8, não para homenagear a mulher porque mulher não precisa ser homenageada – desculpa falar isso para vocês. Mulher não precisa ser homenageada porque todo dia é nosso dia. Nós sabemos os desafios que enfrentamos, mas nós precisamos salvar as mulheres e lutar por elas.

    Obrigada. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/03/2023 - Página 23